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Eude Tenório → Med 52 Uncisal Distúrbios do Sódio e Potássio Para o estudo dos distúrbios hidroeletrolíticos, é importante ter em mente o princípio da eletroneutralidade: os compartimentos hídricos extra e intracelular devem ter a mesma concentração (em mEq/L) de cargas positivas (cátions) e negativas (ânions). A partir disso, temos que, no meio extracelular, o principal cátion é o sódio (Na+), que é contrabalanceado pelos ânions cloreto (Cl-) e bicarbonato (HCO3-). Já no meio intracelular, os principais cátions são potássio (K+) e magnésio (Mg2+), contrabalanceados pelas proteínas e fosfatos. Na avaliação inicial desses distúrbios, é essencial uma história clínica bem detalhada, indagando o paciente sobre uso de medicamentos, suplementos, drogas, chás e outras bebidas. No exame físico, buscar criteriosamente qualquer sinal que possa levar a suspeita, embora muitos deles sejam inespecíficos. Distúrbios da Osmolaridade (do Sódio) Por osmolaridade, entende-se a concentração de íons por litro de solução aquosa. Como o sódio é o principal componente da osmolaridade plasmática, os níveis séricos deste eletrólito acabam refletindo o estado osmótico do indivíduo. Para calcularmos a osmolaridade total, em mOsm/L (, temos: 𝑂𝑠𝑚 = 2 𝑥 (𝑁𝑎) + 𝑔𝑙𝑖𝑐𝑒𝑚𝑖𝑎 18 + 𝑢𝑟𝑒𝑖𝑎 6 Já no cálculo da osmolaridade efetiva, desconsidera-se a ureia (pois esta se difunde livremente pelos compartimentos intra e extra celular, não contribuindo para o gradiente osmótico e o movimento da água): 𝑂𝑠𝑚 𝐸𝑓𝑒𝑡𝑖𝑣𝑎 = 2 𝑥 (𝑁𝑎) + 𝑔𝑙𝑖𝑐𝑒𝑚𝑖𝑎 18 Valor de referência: 285 – 295 mOsm/L Os principais reguladores do metabolismo da água corporal são o mecanismo da sede e a vasopressina (Hormônio Anti-Diurético - ADH), que diminuem os efeitos das variações na concentração plasmática de íons no volume celular. Os estímulos que deflagram tais mecanismos são as alterações no estiramento de neurônios osmorreceptores: com o aumento da osmolaridade sistêmica, ocorre diminuição do estiramento da parede celular, que é detectado por esses neurônios no hipotálamo anterior, que respondem intensificando a sede e a liberação de vasopressina pela neuro-hipófise. Outros fatores que estão associados à regulação da vasopressina são os receptores volumétricos de alta pressão, na aorta, e os de baixa pressão, no átrio direito, que enviam seus impulsos, através dos pares cranianos IX e X, pela medulo e pelo tronco cerebral, para inibir a secreção de vasopressina. Assim, diante de um paciente com alterações no sódio plasmático, devemos avaliar criteriosamente seu estado volêmico e sua osmolaridade plasmática. Considera-se hiponatremia uma concentração de íons Na+ < 135 mEq/L, sendo o distúrbio hidroeletrolítico mais comum em pacientes internados e estando associado a piores desfechos. CLASSIFICAÇÃO Classificação conforme a osmolaridade: Frente a detecção de um quadro de hiponatremia, devemos classifica-las quanto a osmolaridade sérica. • Hiponatremia Hipertônica (> 295 mOsm/L): Ocorre quando o sódio é diluído devido ao aumento da concentração de INTRODUÇÃO FIOSOPATOLOGIA Hormônio Antidiurético (ADH / Vasopressina): Hormônio produzido pelo hipotálamo e secretado pela hipófise posterior em resposta a duas situações: 1) osmolaridade sérica elevada (para diluir o sódio) ou 2) volemia/PA reduzidas (para manter o compartimento intravascular e o volume circundante efetivo). Ao se ligar aos receptores de vasopressina nos túbulos coletores, este age aumentando a expressão de aquaporina- 2, proteína de canal de água, na membrana apical, consequentemente promovendo a reabsorção de água livre e restabelecendo a osmolaridade e a volemia. Quando a osmolaridade cai abaixo de 280 mOsm/L, o ADH é suprimido. + Condições que ↑ADH: desidratação, diarreia, sangramento, cirrose, síndrome nefrótica, insuficiência cardíaca, síndrome da secreção inapropriada de ADH (SIADH). HIPONATREMIA Eude Tenório → Med 52 Uncisal outro soluto, que eleva a osmolaridade. É causada geralmente por hiperglicemia, sendo que o aumento de 100mg/dL na glicemia diminui o sódio sérico em 1,6mEq/L. Também pode ser causada por infusão de soluções hipertônicas (manitol e glicose) e intoxicação por álcoois. • Hiponatremia Isotônica (285 – 295 mOsm/L): Ocorre devido a artefatos durante a medição do sódio, sendo chamadas pseudo-hiponatremias. São condições que podem subestimar os valores de sódio: aspecto lipêmico do soro na coleta sanguínea (hipertrigliceridemia, hipercolesterolemia), hiperproteinemia (como no mieloma, hiperbilirrubinemia [Ex: síndrome colestática], imunoglobulinas). • Hiponatremia Hipotônica (< 285mOsm/L): São as hiponatremias verdadeiras, com significado clínico e necessidade de investigação. Pode ser subdividida, quanto ao estado volêmico do paciente, em: euvolêmica, hipovolêmica e hipervolêmica. HIPONATREMIA HIPOVOLÊMICA (↓Volume extracelular) PERDAS EXTRARRENAIS DE Na+ (NaU < 20mEq/L) PERDAS RENAIS DE Na+ (NaU > 20 mEq/L) Suor e queimaduras Diuréticos tiazídicos Vômitos e diarreia Diurese osmótica: glicose, ureia e manitol Hemorragia Insuficiência adrenal Perdas para o 3° espaço: obstrução intestinal, pancreatite, peritonite, rabdomiólise Nefropatia perdedora de sal: DRC e acidose tubular renal x Síndrome cerebral perdedora de sal: neurocirurgia, TCE, hemorragia subaracnóidea HIPONATREMIA HIPERVOLÊMICA (↑Volume extracelular) VOLUME CIRCULANTE EFETIVO REDUZIDO VOLUME CIRCULANTE EFETIVO NORMAL OU AUMENTADO Insuficiência cardíaca Injúria renal aguda Cirrose DRC Síndrome nefrótica x Gravidez x HIPONATREMIA EUVOLÊMICA ASSOCIADA A NÍVEIS ELEVADOS DE ADH NÃO ASSOCIADAS A NÍVEIS ELEVADOS DE ADH Síndrome da Antidiurese Inapropriada: Neoplasias, pneumopatias, doenças do sistema nervoso central e medicações Ingesta baixa de solutos: bebedores de cerveja, dieta restrita de proteínas Síndrome da Antinatriuse Inapropriada Nefrogênica: Mutação gênica causando ativação do receptor V2 da vasopressina; Doença genética ligada ao X Intoxicação por água: infusão parenteral de líquidos hipotônicos, polidipsia primária, afogamento e ressecção transuretral de próstata; Deficiência de glicocorticoides (Ex: síndrome de Sheehan) Doença renal avançada Hipotireoidismo Exercício físico extenuante (estimula produção de ADH [não se sabe a causa]) Intoxicação por MDMA (ecstasy = estimula produção de ADH) Classificação quanto a velocidade de instalação: Podem ser classificadas em aguda (< 48 horas de instalação) e crônicas (> 48 horas de instalação ou quando não se consegue determinar o tempo de instalação pela história). Classificação quanto aos níveis de sódio: Se baseia na concentração de sódio sérica, que mantem correlação com os sintomas. • Leve: Sódio entre 130 – 134mEq/L. Pacientes podem apresentar sintomas como mal estar e náuseas. • Moderada: Sódio entre 120 – 129 mEq/L. Pacientes podem apresentar náuseas sem vômitos, confusão mental e cefaleia. • Grave: Sódio < 120 mEq/L. Paciente apresenta sintomas graves, como: vômitos, desconforto respiratório, sonolência anormal, convulsões e coma (Glasgow < 8). ETIOLOGIAS DE DESTAQUE Insuficiência adrenal: Pode ser classificada em primária (defeitos oriundos da própria adrenal) e secundária (quando há defeito na produção do hormônio que estimula a produção adrenal - ADH). As duas formas podem cursar com hiponatremia: na primária, há deficiência de mineralocorticoide (Ex: aldosterona), que cursa com hipovolemia; já na secundária, há deficiência de glicocorticoides, que cursa com deficiência na supressão de ADH, causando hiponatremia. Hipotireoidismo: Hiponatremia ocorre secundária ao mixedema, porém em casos extremos. Síndrome cerebral perdedorade sal: Sua patogênese está associada a um aumento nos níveis de peptídeo natriurético cerebral decorrente de distúrbios intracranianos, como uma hemorragia subaracnóidea. Insuficiência cardíaca: Devido ao comprometimento do débito cardíaco, o volume circulante efetivo geralmente é reduzido, o que leva a um estímulo neuro-humoral, mediado por barorreceptores, do aumento da secreção de ADH, com aumento na retenção hídrica. Tal efeito contribui, de maneira deletéria, para o estado edematoso do paciente com IC. Cirrose hepática: A cirrose avançada provoca um quadro de vasodilatação sistêmica progressiva, que reduz o volume arterial efetivo e estimula a secreção de vasopressina mediada por barorreceptores, aumentando a retenção hídrica. Eude Tenório → Med 52 Uncisal Síndrome nefrótica: Devido a diminuição da pressão oncótica nesses pacientes, o volume sanguíneo está reduzido e a secreção de ADH está aumentada, podendo evoluir com hiponatremia. Uso de MDMA (Ecstasy): Pessoas em uso dessa droga podem desenvolver hiponatremia de rápida instalação e sintomas graves, devido a SIADH e aumento da sede. Secreção Inapropriada de ADH (SIADH): É a causa mais importante de hiponatremia hipotônica euvolêmica e cursa com secreção de ADH aumentada (devido ao aumento da liberação pela hipófise ou por produção ectópica do hormônio em algumas doenças, como em alguns tumores e doenças pulmonares), além de natriurese e osmolaridade urinária também inapropriadamente altas, com volume plasmático ligeiramente aumentado. As características do quadro incluem: hiponatremia hipotônica (Osm < 285 mOSm/L), sem sinais de hipovolemia, sódio urinário aumentado (natriurese > 40mEq/L ou 20-30 mmol/L), hipouricemia, creatinina normal ou baixa e ausência de outras causas claras de hiponatremia. Como principais etiologias, temos: • Tumores malignos (ex: carcinomas de pulmão, leucemia, linfoma, timoma e etc.) • Distúrbios do SNC (infecções, traumas, tumores e porfiria) • Doenças pulmonares (tuberculose, pneumonia, infecções fúngicas, abcesso pulmonar, ventilação mecânica) • Medicações (antidepressivos, clofibrato, carbamazepina e etc.) Polidipsia primária: Ocorre principalmente em pacientes idosos e com doenças psiquiátricas, por SIADH por aumento do mecanismo da sede devido a uso de medicamentos. TRATAMENTO O tratamento da hiponatremia leve em conta a velocidade de instalação do quadro (aguda ou crônica), a gravidade dos sintomas e outras variáveis da história e do exame físico. A terapêutica visa prevenir maior queda no sódio sérico, reduzir pressão intracraniana (devido à queda da Osm, entrada de água para dentro das células no SNC e consequente edema cerebral) em pacientes com risco de herniação e aliviar os sintomas de hiponatremia. Contudo, não devemos corrigir a hiponatremia de maneira rápida ou excessivamente, sob risco de causar síndrome da desmielinização osmótica. → Hiponatremia aguda: Nesses casos, os pacientes costumam se apresentar em coma ou com convulsões, e os dados da história sugerem instalação rápida, sem o tempo necessário para uma resposta adaptativa do SNC. Configura uma emergência e a correção deve ser feita rapidamente: • Administra-se salina hipertônica a 3%, 100mL IV, em bolus (10min), e observa-se a resposta do paciente durante um intervalo de tempo (10-15min). Caso o efeito clínico desejado não seja obtido (sintomas não resolvidos), podemos fazer bolus de 100mL até 3 vezes (Dose máxima = 300mL). • Após isso, diminui-se o ritmo de correção, aumentando até 8- 9mEq em 24h, porém nunca excedendo 10mEq/24h, sob risco de síndrome da desmielinização osmótica. • Monitorar o sódio sérico a cada 2 horas. • Identificar e tratar a causa de base. • Corrigir Na+ sempre para o valor mínimo de normalidade (135mEq/L). → Hiponatremia crônica: Para pacientes com hiponatremia crônica, podemos tomar algumas medidas gerais, como: identificar e tratar a causa de base, restringir a água livre da dieta ou líquidos hipotônicos, instituir dieta proteica e suspender medicações que possam contribuir com a hiponatremia. Além disso, medidas específicas baseadas na sintomatologia e nos níveis séricos de sódio do paciente podem ser tomadas: • Pacientes com sintomas graves, com patologia do SNC, independentemente do valor de sódio: Fazer bolus de 100mL (em 10min) de NaCl 3% até resolução dos sintomas, com dose máxima de 300mL. A correção de sódio não deve exceder 8mEq/24h. Monitorar sódio a cada 2 a 4h. • Sódio sérico < 120 mEq/L em pacientes edemaciados (cirrose, IC, nefróticos): Fazer NaCl 3%, de 15 a 30mL/h + furosemida 40 mg IV 2x/dia. Dosar o sódio de 4/4h e ajustar a infusão para elevação de 4 a 6mEq/24h. Para correção no valor mínimo de sódio. • Sódio sérico < 120 mEq/L em pacientes sintomáticos: Fazer NaCl 3% 15 a 30 mL, ajustando infusão para que a elevação de sódio fique entre 4 a 6 mEq/L em 24h. Dosar sódio de 4/4h e parar a correção no valor mínimo de sódio. • Assintomáticos com sódio < 120 mEq/L: Procede-se com internação hospitalar, dosagem de sódio de 12/12h e medidas gerais. Como montar solução salina 3%? *Na ausência de NaCl 3%, podemos montar a solução da seguinte maneira: 1 ampola de NaCl 20% = 10mL - 150mL de NaCl 20% + 850mL de Água destilada ou SG 5% - 110mL de NaCl 20% + 890mL de SF 0,9% Fórmula de Adrogue-Madias: Fornece uma estimativa da mudança esperada no Na+ a cada litro de solução infundida. *Caso não haja potássio na solução, desconsiderar essa variável. Eude Tenório → Med 52 Uncisal Considera-se hipernatremia uma concentração de sódio sérico > 145mEq/L. Sua incidência varia na população geral de 0,5 a 3,4%, no momento da admissão hospitalar e em cerca de 0,5% dos pacientes que procuram serviços de emergência. É quase sempre motivada pela perda de água, de causa renal ou extra renal, mas também pode ocorrer por sobrecarga de sódio pelo uso de salina hipertônica ou cloreto de sódio por VO, por alterações do mecanismo da sede e falta de acesso a água. CLASSIFICAÇÃO Classificação conforme o estado volêmico: São classificadas em euvolêmica, hipovolêmica e hipervolêmica. • Hipovolêmica: Ocorre quando o paciente perde água livre e sódio (mais água que sódio), devido a perdas renais (ex: uso de diuréticos, diurese osmótica na DM descompensado, IRA [rim incapaz de concentrar urina], uso de manitol IV) ou extra renais de água (ex: diarréia). • Euvolêmico: Ocorre quando indivíduo tem perda de água livre do plasma, porém a quantidade de sódio permanece a mesma (ex: diabetes insípido ou perdas insensíveis [sudorese, taquipneia]). • Hipervolêmica: Ocorre por sobrecarga de volume, em geral consequência de infusão excessiva de soluções cristaloides, erros em hemodiálise, ingesta excessiva de sal (tentativa de suicídio), hiperaldosteronismo [↑ da retenção de sódio devido a ↑ aldosterona] ou infusão de bicarbonato de Na+. *Os mecanismos de sede e manutenção da osmolaridade são muito eficientes, por isso pacientes alertas, com acesso a água e mecanismo da sede intacto geralmente conseguem manter a osmolaridade dentro do normal. Classificação quanto aos níveis de sódio: • Leve: Sódio entre 146 – 150 mEq/L. • Moderada: Sódio entre 151 – 154 mEq/L. • Grave: Sódio > 155 mEq/L. Classificação quanto a velocidade de instalação: Podem ser classificadas em aguda quando < 48 horas de instalação (paciente pode apresentar irritabilidade, convulsões e coma) e crônicas quando > 48 horas de instalação ou quando não se consegue determinar o tempo de instalação pela história (paciente pode apresentar-se oligo/assintomático, letárgico, confusão mental e etc.). EXAMES COMPLEMENTARES E DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Solicita-se osmolaridade sérica para confirmar diagnósticode hipernatremia (> 295 mEq/L sugere sódio > 145 – 147 mEq/L = todos os pacientes hipernatrêmicos são hipertônicos). Alguns fatores alteram a medição do sódio, como a hiperglicemia, hiperproteinemia e hiperlipidemia, devendo ser investigados. Recomenda-se solicitar função renal e demais eletrólitos (ex: potássio e cálcio). No exame de urina tipo 1, podemos observar alterações na densidade urinária, presença de cilindros hialinos, sugestivos de lesão pré-renal, ou cilindros granulosos, que podem surgir em pacientes com necrose tubular aguda. Já para o diagnóstico etiológico da hipernatremia, é importante solicitar a osmolaridade urinária para avaliar a atividade do ADH. Assim, temos: Osm urinária < 300 mOsm/L Osm urinária > 800 mOsm/L Inefetividade do ADH: - Diabetes insípido central (deficiência do ADH) → Responde a administração exógena de ADH - Diabetes insípido nefrogênico (resistência periférica a ação do ADH) → Não responde a administração exógena de ADH (Osmolaridade urinária não se altera). Resposta adequada do néfron a ação do ADH e capacidade de concentrar urina preservada. Sugere: - Perdas extrarrenais - Diurese osmótica - Sobrecarga de sódio - Ureia (dieta hiperproteica, sangramento digestivo, hipercatabolismo por queimaduras ou uso de esteroides) - Glicose ou manitol em excesso no plasma - Hipodipsia primária (distúrbio raro da sede) Valores de Osm urinária entre 300 - 800 mEq/L sugerem: DI parcial (tanto nefrogênico quanto central), DI central com depleção de volume ou uso de diuréticos de alça. TRATAMENTO Hipernatremias hipovolêmicas: Devemos fazer a reposição da volemia e do déficit de água livre usando solução hipotônica endovenosa (pobre em sódio). A solução de escolha pode ser o SG 5% (1 L de água a cada L infundido), SG 2,5% (Diluir 500ml de SG 5% em 500ml de água destilada) ou NaCl 0,45% (77 mEq/L de Na e 0,5 L de água a cada L infundido). A velocidade de correção nunca deve exceder 8- 10mEq/L/dia nas hiponatremias crônicas, sob risco de causar edema cerebral, herniação de uncus e morte. Nas agudas, a taxa de correção é de 1-2mEq/L/h nas primeiras horas, chegando a 145mEq/L em 24h, quando possível (o que não ocorre em hiponatremias com sódio muito elevado). HIPERNATREMIA Como calcular a correção de Na+? Baseado no peso corporal: - Hiponatremias crônicas: Estima se que fornecendo 1,35mL de água livre para cada 1Kg de peso do paciente, diminui-se a concentração de sódio em 1 mEq/L. O resultado é então multiplicado por 10 (Limite máximo de mEq/L que pode ser reduzido em 24h) para obter-se o volume de solução a ser infundido em 24h. - Hiponatremias agudas: Utiliza-se 5ml de água livre para cada 1kg de peso do paciente. Eude Tenório → Med 52 Uncisal Hipernatremias euvolêmicas: Comumente causada por diabetes insípido. Nesses pacientes, corrigimos o déficit de água livre enquanto tratamos a causa de base: • DI central: prescrever acetato de desmopressina, via subcutânea (1-4 mcg/dia) ou nasal (dose inicial = 5mcg a cada 12-24h, podendo variar até 100mcg/dia). • DI nefrogênico: prescrever dieta hipossódica associada a diurético tiazídico. Além disso, fármacos como a clorpropamida ou a carbamazepina podem aumentar a sensibilidade do túbulo renal ao ADH. Amilorida é feita quando o DI é induzido por lítio. Hipernatremias hipervolêmicas: Em pacientes hipervolêmicos, deve-se suspender o aporte de sódio, repor o déficit de água livre de acordo com as fórmulas já citadas (com SG 5%) e administrar diuréticos (tanto para a sobrecarga volêmica quanto para a sobrecarga de sódio), associando diuréticos de alça e tiazídicos. Distúrbios do Potássio A hipocalemia é definida como concentração sérica de potássio < 3,5 mEq/L. É um problema clínico comum, ocasionado por ingesta reduzida do íon, aumento da translocação celular de potássio e, mais frequentemente, perdas excessivas de potássio pelo TGI ou trato urinário. CLASSIFICAÇÃO • Leve: Potássio entre 3,1 – 3,5 mEq/L. • Moderada: Potássio entre 2,5 – 3 mEq/L. • Grave: Potássio < 2,5 mEq/L. Também pode ser classificada em aguda, em que a queda rápida dos níveis de K+ pode levar o paciente a apresentar sintomatologia com níveis maiores de potássio, e crônica, com o paciente podendo apresentar-se assintomático. ETIOLOGIA As principais causas são diarreias, vômitos e uso de diuréticos. Porém, outras etiologias incluem: Causas induzidas por drogas: Drogas podem levar ao aumento da excreção renal, da perda nas fezes ou do shift intracelular de potássio (entrada de potássio na célula). • Drogas que aumentam a excreção renal: diuréticos (de alça, tiazídicos e acetazolamida), mineralocorticoides, glicocorticoides em altas doses, antibióticos em altas doses (penicilina G, ampicilina), drogas associadas a depleção de magnésio (aminoglicosídeos, cisplatina, anfotericina B). • Drogas que aumentam perda nas fezes: Poliestirenossufato de cálcio (Sorcal), fosfato de sódio oral (usado como preparo intestinal para colonoscopia ou enema baritado), uso contínuo de laxantes. • Drogas associado a shift intracelular de K+: Agonistas beta-2-adrenérgicos (epinefrina, descongestionantes nasais, broncodilatadores), insulina, agentes tocolíticos (inibem contração uterina em trabalho de parto prematuro), vitamina B12, cloroquina, teofilina e etc. Causas não associadas a drogas: • Ingesta dietética inadequada: ingesta < 25 mEq/dia pode ocasionar depleção corporal de potássio, sendo, no entanto, uma causa isolada rara. Pode ocorrer em casos de anorexia nervosa. • Paralisia periódica tireotóxica (shift transcelular) • Paralisia periódica hipocalêmica familiar (shift transcelular): Consiste em herança autossômica dominante rara que causa episódios de paralisia muscular com hipocalemia grave, após gatilhos como ingesta exacerbada de carboidrato ou sal. • Diabetes descompensado: A diurese osmótica causa aumento na perda de potássio. Além disso, a administração de insulina em pacientes em CAD ou EHH pode levar a hipocalemia. • Perda renal de potássio: alcalose metabólica cloro- responsiva (perda de cloro secundária a vômitos e etc), alcalose cloro-resistente (excesso de mineralocorticoide → hiperaldosteronismo primário, hiperplasia adrenal congênita e etc.), acidose tubular renal. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS São principalmente neuromusculares e cardíacas. Estas se apresentam proporcionalmente a gravidade da hipopotassemia e a velocidade de instalação: geralmente não ocorrem até potássio sérico < 3 mEq/L, a menos que a instalação do quadro ocorra rapidamente, quando podem surgir com níveis um pouco mais elevados de potássio. Devemos investigar a história de medicações, doenças e sintomas (IC, síndrome nefrótica, cirrose e sintomas gastrointestinais = vômitos e diarreia). Manifestações cardíacas: A hipopotassemia causa atraso na repolarização ventricular por inibir a atividade dos canais de K+. Recomenda-se ECG na avaliação inicial de paciente com hipopotassemia moderada a grave, o qual pode apresentar alterações como: redução da amplitude da das ondas T Baseado no déficit de água livre: Calcula-se o déficit de água livre a partir da fórmula: Recomenda-se que metade do valor obtido seja reposto nas primeiras 24 horas e o restante nas próximas 48 horas. HIPOPOTASSEMIA (HIPOCALEMIA) Eude Tenório → Med 52 Uncisal (achatamento ou inversão), depressão do segmento ST, ondas U (principalmente em V4-V6) e prolongamento do intervalo QT. Outros achados incluem extrassistolia ventricular, arritmias ventriculares (taquicardia ventricular, fibrilação ventricular) e supraventriculares (taquicardia atrial paroxística, fibrilação atrial e flutter). Manifestações neuromusculares: Em pacientes com quadro de instalaçãoinsidiosa, manifestam-se com K+ < 2,5 mEq/L, já em quadros agudos, podem se apresentar com níveis mais elevados. Paciente irá referir fraqueza muscular de característica ascendente, progressiva, que inicia nas pernas e progride par o tronco e braços, podendo evoluir com paralisia da musculatura respiratória e óbito. Outros achados incluem: hiporreflexia, parestesia, câimbras, rabdomiólise e mioglobinúria. Manifestações no TGI: Náuseas, vômitos, distensão abdominal e constipação (íleo paralítico). TRATAMENTO O tratamento tem como objetivo tratar a sintomatologia (desidratação, vômitos, diarreia, fazer estabilização hemodinâmica, se necessário), corrigir o déficit de potássio e identificar e tratar a causa básica. Para o cálculo da reposição de potássio, é importante salientar que para cada 1 mEq/L de redução no nível sérico de K+, há um déficit corporal total de 150 a 400 mEq/L. → Hipopotassemia leve (K+ ≥ 3,0 mEq/L): Tendem a ser assintomáticos. Nos pacientes sem perda urinária de potássio, recomenda-se reposição oral com cloreto de potássio (KCl) em comprimido (1cp = 6 mEq // 1 a 2 cp, 3-4x ao dia após refeição) ou em xarope 6% (15mL = 12 mEq // 15 a 20 mL, 3-4x ao dia após refeição). 40 – 100 mEq/dia é usualmente adequado. Em pacientes com excreção urinária de potássio elevada e/ou hiperaldo primário, considerar associar diurético poupador de potássio (amilorida ou espironolactona). → Hipopotassemia moderada a grave (K+ < 2,5 - 3,0 mEq/L): Nesses casos, orienta-se a utilização de via endovenosa, concomitante com via oral, se possível. As recomendações para reposição endovenosa incluem: • A diluição da reposição de K+ deve ser feita em solução salina, pois soluções com glicose irão estimular secreção de insulina, podendo gerar uma hipocalemia rebote. • Evitar soluções de K+ muito concentradas: a concentração máxima é de 40 mEq/L em veia periférica e 60 mEq/L em veia central. Assim, temos que usando cloreto de potássio a 19,1% (1mL = 2,5 mEq), 16mL por litro de soro é o máximo em veia periférica e 24 mL em veia central. Ampolas de KCl a 19% disponíveis em ampolas de 10mL. • Infusão deve correr de 5 a 10 mEq/h (no máximo 20 a 30 mEq/h). Considerar infusão em veia central se > 10 mEq/h, pelo risco de dor e flebite. • Infusão deve ser feita em bomba de infusão contínua, para evitar administrações indevidamente rápidas. • A reposição endovenosa deve ser mantida até resolução dos sintomas e níveis séricos superiores a 3 mEq/L. A partir disso, fazer transição para via oral, com dose igual a utilizada na hipocalemia leve a moderada. O tratamento deve ser mantido por vários dias, de modo a suprir o déficit corporal de potássio e evitar outra queda. É definida como hiperpotassemia uma concentração sérica de K+ > 5,5 mEq/L, sendo uma desordem comum, igualmente ameaçadora a vida e reportada em 1 a 10% dos pacientes hospitalizados. CLASSIFICAÇÃO Classificação quanto aos níveis de K+: • Leve: Potássio entre 5,5 – 5,9 mEq/L. • Moderada: Potássio entre 6,0 – 6,9 mEq/L. • Grave: Potássio ≥ 7 mEq/L. Classificação quanto a velocidade de instalação: • Aguda: Pode ocorrer em evento único, com duração de horas ou, no máximo, dias. Requer tratamento de emergência. • Crônica: Evolui durante semanas ou meses, de forma persistente ou periódica, geralmente com necessidade de tratamento ambulatorial. ETIOLOGIA Os níveis séricos de potássio são regulados pela relação entre ingesta oral, excreção renal (estimulada pela ↑K+ sérico, ↑ secreção de aldosterona e ↑ fluxo de água e Na+ no néfron distal) e pela distribuição intra e extra celular do íon. Assim, alterações em um desses componentes podem levar ao desenvolvimento de hipercalemia. Excreção renal prejudicada: Na insuficiência renal aguda e crônica, o paciente apresenta déficit de excreção urinária de potássio com consequente absorção elevada do íon. O mesmo ocorre em casos de hipoaldosteronismo. Grandes destruições celulares: Há aumento do efluxo de potássio para o meio extracelular. Ocorre em condições que cursam com hemólise, na rabdomiólise, síndrome da lise tumoral (definida por lise maciça de grande número de células tumorais) e etc. HIPERPOTASSEMIA (HIPERCALEMIA) Eude Tenório → Med 52 Uncisal Shift de potássio intra → extracelular: Em estados de acidose metabólica, o excesso de H+ no compartimento extracelular é trocado com K+, visando manter a eletroneutralidade, com consequente elevação do potássio sérico. Uso de drogas que retém potássio: IECA, BRA, diuréticos poupadores de potássio, beta-bloqueadores, digitálicos e heparina. ETIOLOGIA Diante da suspeita de hipercalemia, além da coleta da história e exame físico, devemos solicitar dosagem de potássio sérico, função renal, gasometria arterial, glicemia e ECG, além de outros exames de acordo com a suspeita clínica. Elevações agudas nos níveis de potássio geralmente estão associadas com a liberação de potássio para o meio extracelular, o que pode ocorrer, por exemplo, em pacientes traumatizados, com síndrome de lise tumoral ou CAD. Já as hipercalemias persistentes estão mais relacionadas com diminuição da excreção urinária de potássio, quer seja por hipoaldosteronismo, IRA/DRC ou diminuição do volume arterial efetivo (↓ fluxo de água e sódio no néfron distal ↓ excreção de potássio). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As principais manifestações estão relacionadas com a transmissão neuromuscular debilitada. Fraqueza muscular/paralisia: Fraqueza muscular com as mesmas características da encontrada na hipocalemia. Pode evoluir com insuficiência respiratória. Alterações cardíacas: As primeiras alterações a aparecerem são onda T apiculada (eleva-se em amplitude e perde a assimetria, chamada onda T em tenda) e diminuição do intervalo QT, seguidas de prolongamento do intervalo PR e do QRS (com alterações morfológicas), achatamento ou desaparecimento da onda P e, por fim, alargamento do QRS no padrão sinusoidal. Distúrbios de ritmo, como bloqueios de ramo direito, esquerdo ou atrioventricular, e arritmias, como bradicardia, fibrilação ventricular e assistolia, podem ser achados do ECG. Manifestações no TGI: Náuseas, vômitos, redução dos ruídos intestinais, distensão abdominal e constipação (íleo paralítico). TRATAMENTO Várias drogas podem ser utilizadas para redução dos níveis de potássio sérico, levando em consideração a gravidade da situação e a presença de alterações cardiológicas/ECG. Definir e tratar a causa básica é essencial. Cálcio: Age antagonizando o efeito do potássio no potencial de membrana (promove estabilização elétrica do miocárdio). Deve ser a primeira medida a ser realizada, na vigência de alterações no ECG compatíveis com hipercalemia (independente dos níveis séricos de K+) ou quando potássio sérico > 6,5 mEq/L. Este, no entanto, não reduz os níveis séricos de potássio, portanto não deve ser a única medida terapêutica. Não deve ser usado profilaticamente. • Esquema terapêutico: Diluir 10 a 30 mL (1 a 3 ampolas) de Gluconato de Cálcio 10% em 100mL de SG 5% ou SF 0,9% e fazer infusão rápida endovenosa durante 2 – 5 min com monitorização cardíaca contínua (caso não, repetir ECG após infusão). Repetir dose após 5 minutos se alterações eletrocardiográficas persistirem. O efeito se inicia rapidamente (1 a 3 min) e tem duração de 30 a 60 minutos, protegendo o coração de arritmias graves. Medidas que fazem translocação de K+ de EC para o IC: - Solução polarizante (glicose + insulina): Visa diminuir os níveis de potássio aumentando a atividade da bomba Na-K-ATPase e, consequentemente, carreando potássio para o meio intracelular. A glicose entra para evitar a hipoglicemia, no entanto, em pacientes com glicemia > 250 mg/dL, esta pode ser dispensada.- β2-agonistas inalatórios: Também aumentam a atividade da bomba Na-K-ATPase, com ação similar a da insulina. Evitar em pacientes com doença coronária prévia. - Bicarbonato de sódio: Ocasiona elevação do pH sérico e liberação intracelular de íons H+. Para manter a eletroneutralidade, o potássio é então translocado para o interior da célula. Medidas que removem o potássio: - Diuréticos de alça: Promovem aumento da eliminação do potássio na urina, no entanto, requer função renal normal. A principal medicação usada é a furosemida, na dose inicial de 40mg endovenosa. - Resina de troca: são trocadores de cátions e funcionam transferindo potássio para o interior do TGI, com posterior excreção do mesmo. A principal resina usada é o poliestirenosulfato de cálcio (Sorcal), na dose de 30 a 60 g, via oral, de 8/8 até 4/4 h. Tem efeito constipante, motivo pelo qual deve ser diluído em 100mL de manitol 10 a 20%. Se VO indisponível, fazer enema de retenção (via retal). É contraindicado em pacientes com em pós-operatório de TGI, com doença intestinal inflamatória, obstrução intestinal ou colite pseudomembranosa. - Diálise: Preferencialmente a hemodiálise, mas também a diálise peritoneal. Indicada para pacientes com níveis séricos de potássio muito elevados e/ou função renal prejudicada. Em pacientes que já tem o acesso vascular para diálise, este é o método de escolha. Eude Tenório → Med 52 Uncisal
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