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1. DEFINIÇÃO, EPIDEMIOLOGIA, FISIOPATOLOGIA, QUADRO CLINICO, DIAGNÓSTICO (ESCORE PROGNÓSTICO/INTERNAÇÃO), DIAGNÓSTICO, TRATAMENTO E COMPLICAÇÕES DA PAC A pneumonia é a resultante da complexa interação entre agentes agressores e a resposta do hospedeiro no parênquima pulmonar. Geralmente cursa com distúrbios inflamatórios agudos ao nível de alvéolos, interstícios e bronquíolos distais com frequente invasão dos espaços aéreos por microrganismos patogênicos e polimorfonucleares neutrófilos, linfócitos, macrófagos, citocinas e outras células e substâncias inflamatórias. A pneumonia é considerada como adquirida na comunidade (PAC) quando acomete pacientes fora do ambiente hospitalar ou em até 48 horas de eventual internação. Segundo a Organização Mundial da Saúde, a pneumonia é a principal causa infecciosa de morte no mundo e a terceira causa geral, com cerca de 3,5 milhões de óbitos anualmente entre 2000 e 2012. Em 2010, a pneumonia e a influenza juntas foram a nona causa de morte nos Estados Unidos. Tem incidência estimada entre 5,16 e 6,11 casos entre 10 mil adultos ao ano. Cerca de 12 a 20 % necessitam de internação, sendo que 5 a 10 % destes em unidade de terapia intensiva (UTI). O risco de morte é de 0,1 a 5% para os pacientes não internados, podendo exceder 50% naqueles internados em UTI. No Brasil, estima-se que ocorreram 35,15 internações por 10 mil habitantes em 2012, dos quais 61.272 pacientes vieram a falecer. Possivelmente o número de Pneumonias bacterianas 128 óbitos por pneumonia seja maior, já que alguns casos de sepse têm como foco inicial o pulmão, além da pneumonia estar envolvida como evento final de vida em vários pacientes crônicos (p. ex., com neoplasias e quadros demenciais). Segundo banco de dados do DATASUS ocorreram 692.759 internações por pneumonia no Brasil em 2013, sendo maior número de casos entre maio e agosto, meses mais frios. Pneumonia é importante causa de morbidade, mortalidade e gastos em pesquisas nos Estados Unidos. Apresenta maior incidência em extremos etários (abaixo de 5 e acima de 60 anos). É considerada a principal causa de morte em idosos, especialmente acima de 80 anos. Os pulmões são suscetíveis a ação de vários fatores e mecanismos agressores, e de uma forma mais ampla as pneumonias podem ter causas físicas (radiação), químicas (quimioterápicos), serem atribuídas à ação ou presença de agentes infecciosos bacterianos, virais, fúngicos, parasitários (protozoários ou helmintos) ou a alterações imunoalérgicas. Atualmente, poderíamos afirmar que as pneumonias decorrem ainda da combinação entre essas diferentes causas. ATENÇÃO! Do ponto de vista clínico, a pneumonia adquirida na comunidade (PAC) caracteriza-se pelo aparecimento de manifestações agudas do aparelho respiratório (tosse e ao menos mais um entre expectoração, dor torácica e dispneia), pela presença de sinais focais ao exame físico do tórax na dependência da extensão do comprometimento pulmonar (estertores crepitantes e macicez à percussão torácica) e por pelo menos um sinal de comprometimento sistêmico (sudorese, calafrios, febre igual ou superior a 38º C, tremores ou mialgias) ETIOLOGIA Na maioria das ocasiões não se consegue identificar o agente etiológico da PAC, mas os principais agentes etiológicos são bacterianos. As informações sobre viagens para locais onde ocorrem epidemias, contatos com aves, animais, cavernas, doenças crônicas, características sobre as atividades ocupacionais e sobre doenças na família podem nos fornecer preciosas pistas diagnósticas e orientar a terapia empírica inicial. Especialmente, por exemplo, antecedentes de internações e/ou uso de antimicrobianos recentes podem significar maior risco de infecções por microrganismos resistentes. Entre as bactérias destacam-se: Streptococcus pneumoniae, Mycoplasma pneumoniae, Chlamydophila pneumoniae, Haemophilus influenzae, Staphylococcus aureus, Legionella pneumoniae, Klebsiella pneumoniae e Pseudomonas aeruginosa. Entre os agentes não bacterianos, destacam-se os vírus (influenza, parainfluenza, respiratório sincicial, adenovírus, coronavírus e mais recentemente, bocavírus). Mais raramente são encontrados fungos e parasitas. ASPECTOS DA FISIOPATOGENIA As vias de acesso de agentes agressores aos alvéolos são: Via aérea, após microaspiração (mais comum) ou aspiração maciça de secreções orofaríngeas contaminadas e/ou inalação de microrganismos presentes no ar (p. ex., M. tuberculosis). Via hematogênica a partir de outro local de entrada ou com infecção. Por contiguidade ou continuidade de uma área vizinha com infecção. A sequência fisiopatogênica se inicia com a adesão de microrganismos ao epitélio respiratório, onde se multiplicam, colonizando-o. No trato respiratório superior, o epitélio possui receptores para vários microrganismos da microbiota normal local, que competem e impedem a colonização de microrganismos patogênicos. O acesso aos receptores e a susceptibilidade à colonização pode sofrer influência de fatores genéticos próprios do hospedeiro, do agente agressor e do meio ambiente. Assim, por exemplo, pacientes com fibrose cística (fator do hospedeiro) são mais frequentemente colonizados por P. aeruginosa. Infecções virais concorrentes podem induzir modificações na resposta do hospedeiro e favorecer a colonização por alguns agentes bacterianos (agente agressor modifica resposta do hospedeiro). O uso de antimicrobianos modifica a microbiota e favorece a colonização por agentes resistentes e às vezes patogênicos (fator externo). Para chegar aos alvéolos, os microrganismos superaram múltiplos obstáculos, como os batimentos ciliares e a força da tosse que desloca microrganismos aderidos ao muco. Sobreviveram à ação de enzimas e anticorpos IgA e citocinas liberados localmente, resistiram ou se evadiram da fagocitose e outros mecanismos locais de defesa do hospedeiro. Após colonização no trato respiratório inferior, os agentes infecciosos atuam produzindo substâncias, invadindo células e desencadeando a resposta inflamatória que resultará na pneumonia. Como exemplo, S. pneumoniae produz pneumolisina e enzimas implicadas na destruição celular, além de apresentar cápsula para dificultar a fagocitose e ação de macrófagos de defesa. Em pessoas com alterações nos mecanismos de proteção a chance de ocorrência de pneumonia aumenta muito, como em pessoas com doenças neurológicas que alteram o reflexo de tosse ou portadores de doenças crônicas, especialmente cardiovasculares e respiratórias, diabetes melito, alcoolismo, extremos etários, insuficiência renal, portador de neoplasia, tabagista e em tratamento com imunossupressores ou quimioterápicos. A resposta inflamatória na PAC depende de fatores como a patogenicidade e duração do estímulo do agente agressor, balanço entre resposta inflamatória e anti-inflamatória do hospedeiro. Ressalta que a resposta imune inata evita a invasão e disseminação inicial do agente patogênico e que diferentes processos envolvidos nesta resposta podem ser afetados por polimorfismos genéticos. QUADRO CLÍNICO A forma de apresentação clínica da PAC varia em função de características do hospedeiro, como idade, estado imunológico e presença de comorbidades. Os achados clínicos não permitem a distinção entre os diversos agentes etiológicos, uma vez que a resposta inflamatória e o estado imunológico do hospedeiro são os seus principais determinantes. Dessa maneira, a denominação de pneumonia típica ou atípica, baseada na apresentação clínica, não deve ser utilizada como parâmetro de presunção do agente etiológico. Entretanto, uma história detalhada de exposição, viagens, hábitos de vida, história médica pregressa e alguns achados clínicos e radiológicospodem sugerir agentes etiológicos específicos e, dessa forma, permitir a utilização de esquemas antimicrobianos direcionados. A maioria dos pacientes com PAC apresenta febre, calafrios, tosse, dispneia e, ocasionalmente, dor torácica. A tosse é o sintoma mais comum da PAC, podendo ser seca ou vir acompanhada de expectoração. O escarro pode ser purulento, hemático, com cor de tijolo ou ferruginoso na pneumonia pneumocócica, ao passo que na pneumonia por K. pneumoniae pode apresentar coloração vermelho- escura. No caso de abscesso pulmonar, o escarro é malcheiroso e pútrido, indicativo da presença de anaeróbios. Algumas formas de apresentação, embora não patognomônicas da causa, são clássicas. Pacientes com pneumonia pneumocócica comumente apresentam calafrios, febre, escarro mucopurulento e dor torácica ventilatório-dependente. Diarreia pode surgir em casos de pneumonia causada por clamídia ou legionela. Tosse seca, otalgia, miringite bolhosa e ocasionalmente a presença de estado mental alterado podem sugerir pneumonia causada por micoplasma. Cefaleia é comum nos pacientes com pneumonia por legionela. A pneumonia por clamídia é frequentemente precedida por infecção prolongada no trato respiratório superior com laringite, simulando uma infecção viral. Ao exame físico, os sinais mais comuns de pneumonia são taquipneia e taquicardia. A temperatura corporal está comumente elevada. O uso de musculatura acessória, cianose, confusão, taquipneia e hipotensão indicam disfunção respiratória grave. Bradicardia relativa (p. ex., temperatura axilar de 38,3º C e frequência cardíaca menor do que 110 bpm) em paciente não usuário de fármacos inotrópicos negativos é um achado que pode sugerir infecção por Legionella sp.. Na ausculta pulmonar, podem estar presentes crepitações protoinspiratórias e roncos. Sinais de consolidação como macicez à percussão, aumento do frêmito toracovocal e diminuição ou abolição dos sons respiratórios podem estar presentes em consolidações maiores. Sinais de consolidação lobar são comumente encontrados na pneumonia bacteriana. Sinais de derrame pleural devem ser procurados. A presença de confusão mental constitui fator preditor independente de mau prognóstico, devendo ser avaliada de forma objetiva. O Escore de Teste Mental Abreviado é o instrumento mais utilizado e envolve 10 perguntas simples, pontuando cada resposta correta com um ponto. Um escore de oito pontos ou menos define a sua presença. Em pacientes idosos, as manifestações de pneumonia podem ser pouco específicas. Manifestações respiratórias e febre podem estar ausentes, e um estado mental alterado pode ser a única modificação. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS Para o diagnóstico de PAC deve-se considerar a combinação de aspectos clínicos, de imagem e laboratoriais. PAC caracteriza-se pela presença de quadro respiratório agudo com tosse que pode ser inicialmente seca e evoluir para produtiva; dispneia ou taquipneia e graus variáveis de dor torácica do tipo pleurítica. Frequentemente há pelo menos um sinal de comprometimento sistêmico (sudorese, calafrios, febre igual ou acima de 38ºC, tremores ou mialgia). A febre pode estar ausente em 20% dos casos, podendo ocorrer hipotermia, sobretudo em pacientes idosos e lactentes, que costumam se apresentar com queda do estado geral. Os idosos apresentam desorientação e/ou piora de uma condição subjacente, como insuficiência cardíaca. Um aumento da frequência respiratória, acima de 24 irpm tem sido observado em 45 a 70% dos pacientes e pode ser o sinal mais sensível no idoso; a taquicardia também é comum. Em pacientes com tosse crônica ocorrem mudanças da coloração e das características do escarro. Ao exame físico, podem ser identificados os sinais de consolidação pulmonar, como crepitações, som bronquial ou macicez. Entretanto, esta forma clássica de apresentação não é a mais frequente e as evidências de consolidação são observadas em apenas 1/3 dos casos. Em decorrência das limitações dos achados clínicos e dos diagnósticos diferenciais, exames de imagem devem ser realizados, como radiografias de tórax em pelo menos duas incidências. Os achados radiográficos clássicos no tórax podem ser de três tipos: Pneumonia lobar: quando há ocupação de alvéolos contíguos através dos poros de Kohn e dutos de Lambert. Broncopneumonia: quando há ocupação de condutos aéreos pulmonares e parênquima circunvizinho. Pneumonia intersticial: quando afeta os tecidos intersticiais. Podem contribuir para o diagnóstico de PAC a presença de novo infiltrado, de cavitações ou de derrames pleurais. As cavitações surgem a partir de áreas destruídas por ação de enzimas produzidas em infecções por bactérias anaeróbias, S. aureus e M. tuberculosis, por exemplo. Derrame pleural decorre de processo inflamatório justapleural e pode evoluir para empiema. A extensão do comprometimento guarda relação com a gravidade do quadro. As radiografias são úteis no diagnóstico inicial e na avaliação de casos graves, em portadores de doenças crônicas, naqueles com sintomas persistentes ou resposta não satisfatória ao tratamento para identificar possíveis complicações. Diante de uma PAC associada a complicações, em pacientes com doença estrutural pulmonar associada ou suspeita de neoplasia e nos casos mais graves, convém realizar a tomografia computadorizada helicoidal para melhor definição de outras lesões e achados (diagnóstico diferencial) quando disponível. O exame ultrassonográfico, devido ao custo e à facilidade de realização, em comparação com tomografias e ressonâncias, pode ser útil especialmente em casos com derrames para realização de toracocentese dirigida para coleta de derrame pleural. TESTES LABORATORIAIS Há exames para avaliação das condições clínicas e respiratórias do paciente e outros para identificação etiológica. Os materiais a serem examinados são sangue, líquidos e secreções dos pacientes obtidos por punção direta ou outras técnicas (p. ex., toracocentese, lavado broncoalveolar). Os exames básicos usados para avaliação das condições clínicas podem ajudar a definir a necessidade de internação, o tratamento de suporte de acordo com as disfunções encontradas e auxiliar no ajuste de doses dos medicamentos escolhidos. Os exames incluem hemograma, dosagem de eletrólitos, bioquímica (ureia e creatinina) e avaliação da saturação de oxigênio. O hemograma tem baixa sensibilidade e especificidade no diagnóstico de pneumonia e na identificação do agente etiológico. Mostra-se útil como critério de gravidade e de resposta terapêutica. Leucopenia geralmente denota mau prognóstico, independente do agente etiológico. Podem ser acrescidos de outros exames conforme a necessidade e a gravidade de cada paciente. Os exames usados para identificação etiológica têm relevância epidemiológica e incluem hemoculturas, culturas de líquidos e/ou secreções, dosagens de anticorpos e pesquisas de antígenos por diferentes técnicas. Estes exames são especialmente úteis na avaliação de pacientes graves e podem permitir ajustes na escolha de antibióticos, incluindo o reescalonamento. Hemoculturas: recomenda-se a coleta de pelo menos 2 amostras (sendo uma para anaeróbios, que amplia o crescimento de outros microrganismos) e devem ser analisadas em conjunto com outras informações para evitar equívocos, como falso-positivos. Cultura de líquido pleural: ou material obtido por toracocentese. Escarro: são úteis na pesquisa de bacilo álcool- -ácidorresistente (BAAR), P. jiroveci. A cultura quantitativa de bactérias aeróbias tem baixo valor preditivo, mesmo com quantificação de neutrófilos e células epiteliais. (Considera-se uma amostra válida aquela que contém acima de 25 neutrófilos e abaixo de10 células epiteliais). Se o paciente estiver intubado, coletar aspirado endotraqueal quantitativo. Lavado broncoalveolar: a cultura quantitativa do lavado broncoalveolar (LBA) coletado por meio da realização de broncoscopia é um método com boa especificidade especialmente naqueles casos graves e internados em terapia intensiva. As amostras com contagem superior a 104 unidades formadoras de colônia (UFC) são consideradas significativas. Testes sorológicos e pesquisa de antígenos: são úteis naqueles pacientes com PAC grave, com pouca resposta ao tratamento ou suspeitos de estarem acometidos por legionelas, micoplasmas ou clamídias. Mycoplasma pneumoniae: sorologia com titulação de IgG e IgM tem uma sensibilidade de 30 a 60%, mas tem baixa especificidade e passam a se tornar positivos apenas após 7 a 10 dias de doença. Chlamydophila pneumoniae: sorologia é diagnóstica com aumento de quatro vezes nos títulos de IgG ou IgM entre a fase aguda e convalescença ou única sorologia com IgG ≥ 512 ou IgM ≥ 16. Legionella pneumophila: pesquisa de antígeno urinário tem sensibilidade de 70% e especificidade de 100%. Sorologia com titulação de IgG e IgM demonstrando título de IgG superior a 1:128 em único exame ou elevação de 4 vezes entre coleta na fase aguda e convalescença tem sensibilidade de 40 a 60% e especificidade de 96 a 99%. Excepcionalmente, pode ser realizado o exame anatomopatológico de material de biópsia. O diagnóstico por meio de cultura e avaliação histopatológica do tecido pulmonar tem sido considerado um padrão-ouro para diagnóstico de pneumonia. A obtenção da amostra pode ser feita por meio de biópsia transbrôquica (durante realização de broncoscopia) ou biópsia a céu aberto (solicitada cirurgião torácico). Na amostra de tecido pulmonar devem ser solicitados os seguintes exames: Cultura quantitativa para bactérias aeróbias. Pesquisa e cultura de bacilo álcool- ácidorresistente (BAAR). Pesquisa e cultura de fungos. Pesquisa de P. jiroveci. Estudo histopatológico (colorações de hematoxilina-- eosina, Grocott, Ziehl-Neelsen; imuno-histoquímica). ESCORES PROGNÓSTICOS São úteis para definição de exames a serem realizados e como critérios para internação. O importante é identificar rapidamente aqueles pacientes que podem não evoluir bem. Para pacientes adultos imunocompetentes têm sido propostos vários algoritmos preditores de maior ou menor gravidade na broncopneumonia. Muitos autores têm buscado, além do diagnóstico precoce, a identificação rápida de fatores e critérios de gravidade para melhor definir quem e quando internar e tratar mais agressivamente. Os mais conhecidos são o Pneumonia Severity Score (PSI) de Fine e colaboradores, CURB65 (Consenso britânico), SCAP (Severe Community-Acquired Pneumonia) e SMART-COP (sigla mneumônica para lembrar pressão arterial Sistólica, envolvimento Multilobar à radiografia de tórax, Albumina sérica baixa, frequência Respiratória aumentada, Taquicardia, Confusão e Oxigenação). Escore de Gravidade de Pneumonia- PSI (Pneumonia Severity Index) Descrito por Fine e colaboradores, possui foco principal na identificação de pacientes de baixo risco, no qual o tratamento ambulatorial seria a escolha. Constitui-se de duas etapas, em que a primeira foca características demográficas, história e exame físico. Caso nesta etapa nenhum dos dados for confirmado o paciente é definido como risco baixo e o tratamento poderá ser feito ambulatorialmente. Entretanto, se na primeira etapa algum dado for positivo, passa-se para a segunda, que mais complexa, considera dados laboratoriais e radiológicos. Cada uma destas informações, bem como as avaliadas na primeira etapa, recebe pontuação especifica sendo então o paciente classificado em cinco classes, cada uma com o risco aproximado de mortalidade. Tendo em vista que são muitos aspectos a serem analisados no PSI, a sua aplicabilidade no dia-a-dia é pouco prática, principalmente em atendimento primário (postos de saúde). Além disso, pode subestimar a gravidade em pacientes jovens e sem comorbidades. Escore CURB - 65 Escore, criado pela British Thoracic Society, de fácil memorização e aplicabilidade, já que aborda dados quase que exclusivamente do exame físico. Assim como PSI, também é útil para predizer mortalidade em pneumonias adquiridas na comunidade. A ênfase principal é na identificação de pacientes graves, embora sua maior limitação seja a não inclusão de dados que possam acrescentar mais risco, como a avaliação da saturação de oxigênio e da presença eventual de comorbidades que o paciente apresente. Abaixo segue o significado da sigla CURB-65: C - Confusion - Confusão Mental U - Uremia - Uréia plasmática acima de 50mg/dl R - Respiratory Rate - Frequência Respiratória maior ou igual a 30mrpm B - Blood Pressure - Pressão Arterial Sistólica < 90mmHg ou Pressão Arterial Diastólica menor ou igual a 60mmHg 65 - Idade maior ou igual a 65 anos Para cada item do anagrama que seja positivo se considera 1 ponto. De acordo com o resultado obtido, se classifica o risco de acordo com as categorias apresentadas na figura 1. Escore CRB - 65 O CRB-65 é a simplificação do CURB-65 para o CRB- 65, ou seja, não está incluído o item de avaliação da Uremia. Isso facilita a tomada de decisões, caso o médico não possua acesso fácil a exames laboratoriais, podendo definir a conduta somente com a pontuação referente aos dados da anamnese e do exame físico, conforme a Figura 2. As diretrizes da American Thoracic Society/Infectious Diseases Society of America (ATS/IDSA) de 2007. Systolic blood pressure, Multilobar involvement, Albumin, Respiratory rate, Tachycardia, Confusion, Oxygenation, and pH (SMART-COP). Severe Community-Acquired Pneumonia (SCAP). Os três últimos instrumentos estão relacionados à pneumonia grave e internação em UTI. Recomenda-se que o paciente com PAC seja avaliado objetivamente na sala de emergência quanto a gravidade inicial e identificação precoce do risco de evolução para desfechos graves, como necessidade de admissão à UTI, desenvolvimento de sepse grave, necessidade de suporte ventilatório invasivo ou não invasivo, de suporte inotrópico ou do risco de falência terapêutica (SCAP, SMART--COP ou ATS/ISDA simplificado, embora necessitem ainda maior validação externa). Na ausência de PAC grave, ou seja, sem indicações socioeconômicas de internação, sem doenças associadas descompensadas, hipoxemia, impossibilidade de ingestão oral de medicamentos, sem presença de pelo menos 2 pontos no escore CURB- 65, ou de pelo menos 1 no escore CRB-65, ou ainda mais que 70 pontos no PSI, o médico assistente deve considerar o tratamento ambulatorial para pacientes com PAC. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL A PAC pode ter como diagnósticos diferenciais causas infecciosas e não infecciosas. Pacientes com sintomas respiratórios e achados de imagem com consolidação pulmonar devem ter como hipóteses outras: edema pulmonar cardiogênico e não cardiogênico, tuberculose pulmonar, atelectasias, embolia pulmonar, bronquiectasias, câncer de pulmão, doença metastática pulmonar. Outras causas menos comuns incluem: pneumonia em organização criptogênica (POC), corpo estranho, doenças ocupacionais, pneumonia eosinofílica, doenças pulmonares fibrosantes, hemorragia alveolar, sarcoidose, proteinose alveolar, linfoma, criptococose, hitoplasmose, pneumocistose, dentre outras. O local de acometimento da lesão pulmonar, a presença ou não de imunodeficiência, as exposições ambientais e principalmente, a evolução do paciente, com melhora clínica e radiológica completa no período estimado, dita a necessidade de avaliação complementar ou não. Éimportante ressaltar que, muitas vezes, a diferenciação de pneumonia de doenças não infecciosas (como a insuficiência cardíaca) é difícil, e biomarcadores, como o peptídeo natriurético cerebral (BNP) e a procalcitonina, podem auxiliar evitando o uso indevido de antibióticos. PROPOSTAS TERAPÊUTICAS Antibioticoterapia precoce (até 4 horas após o diagnóstico) está relacionada a redução de mortalidade nas formas de pneumonias graves. O período do tratamento é definido de acordo com a gravidade, agente etiológico, complicações associadas e evolução clínica do paciente. A figura 2 apresenta as principais recomendações para terapia antimicrobiana empírica para os pacientes com PAC, de acordo com as nova recomendação brasileira para o manejo de PAC de 2018. PAC ambulatorial: Os pacientes deverão receber tratamento domiciliar se houver garantia do uso do antibiótico prescrito. Para pacientes hígidos, macrolídeos e betalactâmicos são alternativas. A cobertura antibiótica para patógenos atípicos nos casos de PAC de menor gravidade ainda é controversa, e vários estudos não mostraram vantagens com essa conduta. As recomendações norte-americanas, europeias, britânicas e latino- americanas diferem quanto ao tratamento dos casos ambulatoriais devido a diferentes posições quanto a resistência antimicrobiana. Assim, a nova recomendação brasileira para o manejo de PAC de 2018, alega que, em nosso meio, os dados mais recentes apontam que a resistência à penicilina do pneumococo não deve ser uma preocupação para os casos menos graves, e sugerem uso de monoterapia com β-lactâmico ou macrolídeo para os pacientes ambulatoriais, sem comorbidades, nenhum uso recente de antibióticos, sem fatores de risco para resistência e sem contraindicação ou história de alergia a essas drogas. Para pacientes com comorbidades (DPOC, doença hepática ou renal, câncer, diabetes, insuficiência cardíaca congestiva, alcoolismo ou imunossupressão), aqueles que fizeram uso de antibióticos nos últimos 3 meses, ou provindos de regiões onde a taxa local de resistência aos macrolídeos é superior a 25% (por exemplo, nos EUA e em alguns outros países) a escolha entre um betalactâmico + macrolídeo ou fluoroquinolona respiratória por pelo menos 5 dias são as sugestões. A amoxicilina-clavulanato pode ser usada na suspeita de infecção por gram-negativos (Klebsiella, Haemophilus), apesar de não possuir maior atividade contra pneumococo e não cobrir germes atípicos. PAC tratada em enfermaria: A monoterapia com o uso de uma fluoroquinolona respiratória isolada (levofloxacino, moxi- -floxacino ou gemifloxacino) ou a associação de um β-lactâmico a um macrolídeo têm sido recomenda-das por diretrizes para o tratamento de pacientes com PAC internados em enfermaria (Figura 2) devido a boa cobertura e bons resultados no tratamento dos quadros infecciosos, porém persiste a preocupação com o surgimento subsequente de organismos multirresistentes. A monoterapia com macrolídeo está contraindicada devido à alta prevalência de resistência do S. pneumoniae a esta classe de antibióticos (estudo de 2014 demonstra resistência à eritromicina encontrada em relação ao S. pneumoniae de 17,2% em todas as faixas etárias). A escolha da cobertura para germes atípicos continua controversa. Entretanto, a recomendação atual é o emprego de β-lactâmico associado a um macrolídeo ou fluoro-quinolona respiratória isolada. Um β-lactâmico isolado pode ser usado somente se houver exclusão confirmada de Legionella sp. PAC tratada em UTI: Em PAC grave e choque séptico, a utilização de terapia combinada, em comparação com a mo-noterapia oferece maior benefício ao paciente. Em uma revisão sistemática e meta-análise, a associação entre β- lactâmicos e macrolídeos foi superior à associação β- lactâmico com quinolonas mas estudos randomizados devem ser realizados para a confirmação desses resultados. As explicações seriam uma possível coinfecção por patógenos atípicos e/ou efeitos imunomodulatórios dos macrolídeos e/ou sinergismo de fármacos. Para a escolha da terapia combinada deve-se verificar se o paciente apresenta fatores de risco para patógenos específicos, para melhor escolha antimicrobiana. Para P. aeruginosa a presença de doença estrutural pulmonar (DPOC com VEF1 < 30%, bronquiectasias ou fibrose cística), neutropenia (< 1.000/mm³), uso crônico de corticosteroides (> 10mg de prednisona ao dia ou equivalente), uso recente de antibioticoterapia por mais de 7 dias nos últimos 30 dias, internação hospitalar recente nos últimos 7 dias, são fatores de risco. Na ausência de fatores de risco para pseudomonas poderá ser utilizada a associação de betalactâmico (ceftriaxona ou cefuroxima) associado a macrolídeo (azitromicina ou claritromicina) ou betalactâmico (ceftriaxona ou cefuroxima) e quinolona respiratória (levofloxacino ou moxifloxacino). Já na presença de fatores de risco para pseudomonas, a preferência dá- se pela o uso de quinolonas respiratórias, piperacilina- tazobactam, meropenem e/ou polimixina B (em monoterapia ou terapia combinada). Para community-acquired methicillin-resistant S. aureus (CA-MRSA, S. aureus adquirido na comunidade e resistente a meticilina), os fatores de risco que merecem consideração são: internação hospitalar em até 90 dias antes do episódio de pneumonia, uso prévio de antibióticos há 90 dias, imunossupressão. Os medicamentos de escolha para o seu tratamento são aqueles que inibem a produção de toxina: clindamicina, linezolida ou vancomicina, que podem ser utilizados em monoterapia, associados entre si (linezolida e clindamicina ou vacomicina e clindamicina) ou à rifampicina no caso de cepas resistentes. As doses dos antibióticos estão descritos na Figura 3. O tempo ideal de tratamento ainda é muito discutido. A avaliação da gravidade e das comorbidades é feita por meio de parâmetros clínicos (ausência de febre por 48- 72 horas, melhora clínica) e de parâmetros de resposta laboratorial (queda da leucocitose, PCR e procalcitonina). Para pacientes que apresentam boa resposta clínica, pode-se suspender a terapia ao final do 7º dia. Pacientes com PAC e suspeita de pneumonia viral por influenza A subtipo H1N1, além do uso de antiviral, é necessário cobertura para pneumococo e S. aureus, em casos de suspeita de coinfecção. O uso de corticosteroide por via sistêmica em pacientes com PAC grave mostrou redução do número de dias de internação, menores taxas de falha terapêutica, de progressão radiológica e de necessidade de ventilação mecânica. Embora os trabalhos recentes forneçam dados sobre a utilidade dos corticosteroides na PAC grave, são necessários mais estudos para esclarecer seus efeitos sobre a mortalidade, dose e tempo de tratamento. O algoritmo 1 sugere o perfil de pacientes que deveriam receber associação de corticoterapia em vigência de PAC. COMPLICAÇÕES As complicações mais comuns são derrame pleural, que pode evoluir para empiema e necessitar de drenagem e cuidados para minimizar sequelas, como espessamento pleural. Pequenas bolhas (pneumatoceles) e cavitações podem evoluir para bronquiectasias e o paciente ficar sujeito a infecções de repetição. Alguns pacientes podem apresentar pneumotórax e necessitar de drenagem torácica. Outros evoluem com atelectasias causadas por rolhas de secreções. A necrose do parênquima pode levar à formação de tecido fibrótico e aumentar a chance de sequelas mais graves que, esporadicamente, resultem em tratamento cirúrgico (lobectomia). 2. PROGRAMAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA PREVENÇÃO DE DOENÇAS RESPIRATÓRIAS A partir da identificação de situações, doenças e pacientes que apresentem maior chance de desenvolverem pneumonia, devem ser planejadas medidas para minimizara ocorrência da infecção. Entre as mais eficientes estão as vacinas. Estudos com a utilização de vacinas anti-influenza evidenciaram redução no número e na gravidade de complicações respiratórias em pessoas acima de 60 anos no Brasil. Jackson e colaboradores comprovaram a efetividade da vacina contra pneumococo em reduzir a ocorrência de bacteriemias em pessoas acima de 65 anos, mas não encontraram redução no número de pneumonias. No entanto, Skull e colaboradores (2007) não obtiveram proteção para pessoas acima de 65 anos institucionalizados. A vacinação é importante para vários grupos de pacientes, independentemente de faixa etária (diabéticos e portadores de doenças respiratórias crônicas ou infectados pelo HIV). Controle do tabagismo: O principal objetivo dos Programas de Controle do Tabagismo (PCT) é proporcionar melhores condições de vida para as pessoas por meio da progressiva redução da produção, comercialização e consumo do tabaco, que resultará na redução de danos e melhoria da saúde. Três propostas devem ser priorizadas na elaboração de um PCT: Prevenção: para os jovens não se iniciarem no tabagismo Proteção da fumaça ambiental do tabaco: para evitar o tabagismo passivo Cessação: para incentivar e dar condições aos fumantes de pararem de fumar A Política Nacional de Promoção da Saúde inclui o controle do tabagismo como um dos temas centrais e incentiva financeiramente as ações para a criação de ambientes mais saudáveis. As vigilâncias sanitárias dos municípios podem e devem ser capacitadas para as ações de controle do tabagismo, orientando a população e os estabelecimentos comerciais sobre a importância dos ambientes saudáveis, ou seja, sem fumaça de derivados de tabaco. Assim, o cumprimento da Lei Federal nº 9.294/96, que dispõe sobre o uso de derivados de tabaco em recintos de uso coletivo, deve ser incluído entre as atividades fiscalizadas pela Vigilância Sanitária Municipal, após um período de processo educativo sobre a importância de ambientes 100% livres de fumaça. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Instituto Nacional do Câncer (Inca) e a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), por meio das Secretarias Estaduais de Saúde, são os responsáveis por essas ações e podem orientar na implementação delas no plano local. As medidas de proteção da saúde por meio de ações educativas e regulatórias para ambientes livres de fumaça devem ser prioritárias em todas as unidades de saúde, escolas e ambientes de trabalho de todos os municípios brasileiros. Pelas reconhecidas consequências do tabagismo para a saúde humana, o tratamento do tabagismo deve ser valorizado e priorizado nas unidades de saúde da mesma forma que o tratamento para hipertensão ou diabetes. O tratamento do fumante é baseado na abordagem cognitivo-comportamental, modelo de intervenção centrado na mudança de crenças e do comportamento associado a elas, que leva o indivíduo a desenvolver estratégias de enfrentamento das situações de risco. Em pacientes com alto grau de dependência, essa abordagem pode ser acompanhada de tratamento farmacológico para aliviar os sintomas da síndrome de abstinência e facilitar o processo de mudança. O Consenso de Tratamento do Fumante estabelece os critérios que definem se o paciente deverá receber medicamentos para minimizar os sintomas da síndrome da abstinência – adesivos de nicotina, bupropiona e goma de nicotina. Esses medicamentos são disponibilizados pelo Ministério da Saúde se os profissionais da equipe estiverem capacitados para a abordagem intensiva do fumante, conforme estabelecido no Plano de Implantação do Tratamento do Fumante no SUS. A Organização Mundial da Saúde (OMS) criou a Convenção-Quadro para Controle do Tabagismo (CQCT), primeiro Tratado Internacional de Saúde Pública com esta finalidade, que congrega mais de 170 nações. Exercício físico: Antes do início de qualquer programa de atividade física, é necessário que seja feita avaliação clínica pela equipe de saúde de forma a individualizar e adequar os exercícios físicos às necessidades e limitações de cada pessoa. Na pessoa com asma, um programa regular de atividade física pode melhorar sobremaneira a mecânica respiratória e ventilação pulmonar, condicionando-a para o melhor enfrentamento das exacerbações. No entanto, esses programas devem ser adaptados e compostos por exercícios respiratórios diafragmáticos, caminhadas, corridas curtas (quando não resultam em perda do controle respiratório), exercícios posturais e de alongamento, devendo-se sempre atentar para a ocorrência de broncoespasmos induzidos pelo exercício. Essas ações têm caráter preventivo sobre as alterações torácicas e posturais típicas de pessoas com asma. A reabilitação pulmonar (RP) pode ser desde prevenção secundária quanto terciária, com efeitos significativos em vários domínios. A RP melhora a dispneia em pacientes com DRC (doença respiratória crônica), melhora a qualidade de vida e traz benefícios psicossociais aos pacientes, reduz o número de hospitalizações, é custo-efetiva em pacientes com DPOC. Vacinação: contra a gripe e pneumonia em crianças, idosos, portadores de doenças crônicas, assim como os cuidadores destes pacientes.
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