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Mediação judicial e penal Aula 05 - Desa�os da mediação judicial no Brasil INTRODUÇÃO A mediação como método pací�co de resolução de con�itos apresenta uma forma não adversarial de tratar as questões, diferente da lógica do ganhar-perder que a Justiça promove, privilegiando a disputa e o antagonismo, desestimulando o consenso. Esse enfrentamento entre as partes produz sempre danos para todos os envolvidos. O processo de mediação motiva a negociação, restabelecendo o protagonismo das decisões frente ao con�ito. Esse caminho possibilita a superação de dicotomias, tal como culpado/inocente. Os princípios humanistas que formam a mediação atendem às necessidades do usuário da Justiça quanto aos acordos fechados e cumpridos, bem como ao tempo destinado do procedimento. A mediação é ferramenta importante para o cidadão solucionar seus con�itos paci�camente sem recorrer à disputa judicial. OBJETIVOS Explicar as práticas colaborativas no Direito. Analisar alguns aspectos da mediação judicial no Brasil. Discutir os desa�os da mediação judicial. TRADIÇÃO NA INTERVENÇÃO ESTATAL Há uma relação histórica e teórica entre o processo de formação da sociedade brasileira (e do próprio Poder Judiciário) e as práticas observadas na Justiça. A tradição autoritária, marcada pelo colonialismo e a escravidão, fez com que o saber jurídico e os cargos no Poder Judiciário fossem utilizados para que os herdeiros da classe dominante (aristocracia) pudessem se impor perante a sociedade, sem que existisse qualquer forma de controle democrático. Foi criado um Poder Judiciário marcado por uma ideologia patriarcal e patrimonialista, constituída de um conjunto de valores que de�niu lugares sociais e de poder. Poucos fenômenos são tão perceptíveis como a intervenção do Estado nas relações sociais e políticas. O monopólio estatal como único caminho para a solução de con�itos proporciona o crescente aumento na judicialização de questões atuais. As necessidades de maior intervenção do Estado decorrem da materialização do direito burguês no Estado social (glossário), e não unicamente do crescimento das determinações jurídicas nas sociedades complexas. O Estado social atendeu aos pedidos por maior Justiça. Com isso, estabeleceu um sistema de compensações e regulamentações. A animosidade administrada pela Justiça trouxe o congestionamento do Poder Judiciário. O grande número de processos mostra que o Estado não possui capacidade �nanceira para cumprir as promessas sociais. Uma das consequências é a incapacidade de investimento na administração da Justiça, agravada a partir da década de 1970 (WACHELESKI; MEDEIROS, 2014). Fonte: A globalização e a facilidade de compra e venda aumentaram mais ainda as demandas judiciais. Devido à precária estrutura do Poder Judiciário, tornou-se necessário buscar outros meios sem ferir os mecanismos da lei, capazes de conter a crise jurídica, acelerando a resolução de controvérsias. Mesmo forti�cada e garantindo a imparcialidade perante o Estado de Direito, a Justiça não reduziu o número de ações litigiosas. Por isso, o processo de mediação é mais e�caz do que a sentença judicial. PACIFICAÇÃO EFETIVA DA CONTROVÉRSIA A Justiça deve proporcionar ao cidadão todos os meios jurídicos para que seus interesses sejam defendidos e seus pedidos, satisfeitos. De acordo com Watanabe (2002, p. 46): “[...] o preceito constitucional que assegura o acesso à Justiça traz implicitamente o princípio da adequação, não se assegura apenas o acesso à Justiça, mas se assegura o acesso para obter uma solução adequada aos con�itos, solução tempestiva, que esteja bem adequada ao tipo de con�ito que está sendo levado ao Judiciário”. As crises entre os indivíduos não são iguais nem uniformes. Não existe apenas um método adequado para se resolver diferentes con�itos. Como se sabe, antes de serem jurídicos, eles foram e continuam sendo sociais. Muitas vezes, a diversidade de aspectos, que forma a controvérsia, faz com que apenas a solução jurídica não seja su�ciente no tratamento do con�ito. É necessário utilizar conhecimentos interdisciplinares. Vídeo. A compreensão de certos mecanismos psicológicos utilizados nos con�itos pode ser fundamental para o trabalho de composição das partes. O conhecimento sobre técnicas de negociação é importante para ultrapassar obstáculos que ocorrem nas disputas. A variedade de disciplinas que pode prestar auxílio nessas situações é relevante no alcance de uma resposta mais adequada na resolução de litígios, na medida em que resgata a responsabilidade de cada um. É necessário trabalhar para que se respeitem as garantias constitucionais. O acesso efetivo à Justiça tem relação com uma resposta imediata ao con�ito. Apenas garantir o acesso sem resolver a disputa gera cada vez mais insatisfação entre as partes, o que alimenta o litígio. PRÁTICAS COLABORATIVAS A mudança de um paradigma adversarial para um colaborativo tem sido gradativa. Os advogados têm a oportunidade de aumentar a possibilidade de atuação e con�rmar a presença na resolução de controvérsias no meio judicial. Não há mais lugar para um modo ultrapassado de ver o con�ito, como se fosse formado por partes adversariais. A visão sistêmica das relações compreende os sujeitos com seus direitos e também com sua subjetividade. Ao assessorar seu cliente na mediação, o advogado informa com clareza seus direitos. Ao �nal, valida e viabiliza juridicamente o acordo entre as partes. Incentivar o protagonismo do cliente não é uma tarefa fácil nem menos importante. Não signi�ca para o advogado abrir mão da defesa. É a busca da paci�cação social. A advocacia colaborativa surge entre dois extremos: o advogado como assessor de seu cliente em um procedimento de mediação e o advogado litigante. De acordo com Marodin e Molinari (2016, p. 73): “A proposta da advocacia colaborativa consiste em reunir recursos e ferramentas típicas do mediador com a essência da advocacia: advogados com um papel ativo na resolução do con�ito, utilizando-se de novas técnicas e habilidades, com o objetivo de alcançar, sim, o melhor resultado possível para o seu cliente, porém nunca perdendo de vista o contexto especí�co em que está inserido”. Nos métodos de gestão de con�itos, são apresentadas opções de acordo com cada caso concreto. A advocacia colaborativa surge como mais uma possibilidade de encaminhamento de resolução de con�itos bastante pertinente em várias ocasiões. galeria/aula5/img/slide01.jpg A ideia desse tipo de advocacia surgiu no início dos anos 1990, a partir do advogado de família norte- americano Stuart Webb. galeria/aula5/img/slide02.jpg Esse pro�ssional estava frustrado com os péssimos efeitos causados pelos litígios nos processos familiares. galeria/aula5/img/slide03.jpg Por isso decidiu atuar apenas em negociações, exclusivamente na realização de acordos. Advogados colaborativos só patrocinam causas em que há a possibilidade de acordo. Caso não seja possível, os clientes devem contratar outro advogado para a representação litigiosa. Fonte: De acordo com Marodin e Molinari (2016), para Webb, deve haver uma concordância consciente e prévia entre os dois pro�ssionais do Direito para criar um ambiente positivo para a negociação. A partir dessa visão, houve a ampliação da prática, com a psicóloga Peggy Thompson, que incluiu pro�ssionais de outras áreas, promovendo um enfoque multidisciplinar. À medida que o princípio da cooperação vai ganhando espaço no próprio processo civil, a advocacia colaborativa tem a possibilidade de ganhar mais adeptos que buscam melhorar a gestão de con�itos. Os bons resultados da advocacia colaborativa têm acarretado sua expansão para outras áreas do Direito, como o Civil e o Empresarial. A partir dela, as partes se comprometem a não litigar enquanto a questão estiver submetida a esse mecanismo, e devem colaborar entre si para alcançarem um bom acordo. Dessa forma, a partir do termo de não litigância, os advogados trabalham com pro�ssionais de outras áreas, em geral, especialistas na área defamília, possibilitando uma compreensão maior, de acordo com as características de cada Vídeo. caso. No Brasil, essa prática existe desde 2011 e ganhou o Prêmio Innovare (glossário) na área da advocacia, em 2013, como uma maneira efetiva de contribuir para a mudança de paradigma. Para difundi-la, foi criado, em 2014, o Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas (glossário). ASPECTOS POLÊMICOS DA MEDIAÇÃO JUDICIAL O novo cenário normativo vem acompanhado de muitas inquietações: • Qual o prognóstico da mediação de con�itos no Judiciário brasileiro? • Que desa�os serão enfrentados pelos mediadores e operadores do Direito, em razão da aproximação entre Justiça consensual e Justiça adjudicatória (glossário)? Sem a intenção de esgotar esse tema, vejamos alguns aspectos considerados polêmicos clicando nos títulos a seguir. Obrigatoriedade da mediação (glossário) Presença dos juízes na sessão de mediação (glossário) Acúmulo das funções de mediador e advogado (glossário) Imparcialidade do mediador (glossário) Sessões virtuais de mediação (glossário) NOVOS DESAFIOS DA MEDIAÇÃO JUDICIAL No Brasil, a cultura do litígio ainda é muito forte. Precisamos nos desprendamos da ideia de que a adjudicação é a resposta para todos os problemas da sociedade. https://www.premioinnovare.com.br/ https://praticascolaborativas.com.br/home https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/gon913/galeria/aula5/docs/obrigatoriedade_mediacao.pdf https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/gon913/galeria/aula5/docs/presenca_juizes.pdf https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/gon913/galeria/aula5/docs/acumulo_funcoes.pdf https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/gon913/galeria/aula5/docs/imparcialidade_mediador.pdf https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/gon913/galeria/aula5/docs/sessoes_virtuais.pdf Fonte: A �nalidade da jurisdição não é apenas a sentença ou a resolução de uma questão jurídica, e sim a paci�cação social. O acesso à Justiça não signi�ca só o direito de colocar uma pretensão frente ao Poder Judiciário, mas envolver a tutela jurisdicional (glossário). De acordo com Pinho e Alves (2014), a mediação é o princípio da cooperação, pois seu próprio conceito parte da ideia de participação dos envolvidos para a construção de uma solução adequada. Esse processo também é importante para as �nalidades de tal princípio. É essencial que as partes estejam realmente empenhadas e voltadas para uma postura colaborativa, abertas ao diálogo e sinceras umas com as outras, para que o procedimento seja produtivo. Apenas o tempo e a prática nos tribunais podem con�rmar se a mediação no Brasil é mais e�caz do que a sentença ditada pelo Poder Judiciário. ATIVIDADE PROPOSTA: Analise a seguinte situação: Maria e João namoraram durante dois anos e estão casados há cinco. Dessa união nasceu uma �lha. Logo após, começaram os desentendimentos e as brigas conjugais que resultaram na separação do casal. Após essa separação, que aconteceu há seis meses, Maria tentou entrar em acordo com João sobre a pensão alimentícia da criança, mas eles sempre acabavam brigando mais. Por isso, Maria ingressou com ação na Justiça para resolver o problema. Vídeo. Em audiência, o técnico judiciário informou-lhes que era uma conciliação e logo lhes perguntou se havia acordo. De imediato, Maria respondeu: – Não, eu já tentei um acordo com ele antes e foi o mesmo que nada. Eu nem queria entrar na Justiça, mas ele não concordou. Aqui, o juiz resolve. O técnico judiciário informou a João que é dever do pai cumprir as obrigações paternas e pagar pensão ao �lho. Se ele não chegasse a um acordo, o juiz arbitraria um valor. Diante de não pagamento, João seria preso. O técnico continuou perguntando-lhe quanto seria possível pagar, e João respondeu: – Só posso dar R$ 50,00, porque não tenho trabalho �xo. O técnico perguntou se ele vinha contribuindo �nanceiramente com a criação da �lha, e João respondeu que não, pois Maria não o deixava vê-la. Já alterada emocionalmente, Maria disse: – Não deixo João ver a �lha, porque ele não ajuda em nada, e esse valor proposto por é um absurdo. Convivi sete anos com ele e sei que pode dar muito mais. Ele se prende ao fato de não ter emprego �xo para não contribuir com as despesas da minha �lha. Mas, na época em que estávamos juntos, mesmo fazendo bicos, ele recebia bem e poderia ajudar com R$ 300,00 por mês: R$ 150,00 na primeira quinzena e R$ 150,00 na segunda. João interrompeu Maria e disse: – Você está cometendo um crime em me proibir de ver minha �lha. Eu sei que ela merece mais. Você não merece, mas minha �lha merece muito mais. Vou tentar dar R$ 100,00 por mês. Irritada, Maria não aceitava e repetia tudo o que havia dito. Em um tom de voz mais grave, João disse: – Eu �co estressado só em escutar o nome dela. [Maria] Os advogados das partes tentaram acalmar os ânimos de João e Maria e centralizar a discussão em torno da �lha, expondo que o valor pago seria para suprir as necessidades da criança, e não da mulher. Além disso, essa animosidade não era boa para a �lha. Então, Maria consentiu em reduzir o valor inicial para R$ 150,00 por mês. João não aceitava e voltava a expor sua última proposta, mas já se baseava no discurso dos advogados e, logo, disse: – Maria, a gente não pode confundir nossos problemas pessoais com nossa �lha. Eu quero ter uma boa relação com você. O técnico interrompeu em um momento e disse que tinha de começar outra audiência. Os advogados voltaram, então, a negociar os possíveis valores. Depois de muitas propostas e contrapropostas, concordaram que o valor da pensão �caria estabelecido em 26% do salário mínimo, equivalente a R$ 120,00 por mês. O pagamento seria feito semanalmente no valor de R$ 30,00. Também foi acordado que a pensão seria paga à tia de Maria, mediante recibo, pois as partes não queriam se ver. No entanto, logo após do referido acordo, João disse que pediria a seu advogado para entrar com outra ação, a �m de regulamentar as visitas, pois queria ver a �lha de qualquer jeito. Considerando as atitudes de Maria, de João e do técnico judiciário, o con�ito foi resolvido? Justi�que sua resposta. Resposta Correta EXERCÍCIO: A mediação é uma forma consensual de resolução de controvérsias, em que as partes envolvidas têm a oportunidade de solucionar seus con�itos com a participação de um mediador. Sobre esse tema, analise as a�rmativas a seguir: I - Um dos objetivos da mediação é prevenir con�itos. Esse processo estimula um comportamento de comunicação pací�ca. Quando os indivíduos percebem que essa forma de resolução é adequada e satisfatória, passam a utilizá-la com mais frequência. II - A mediação exige das partes envolvidas a discussão aberta sobre os problemas, comportamentos, direitos e deveres de cada um. III - A mediação reforça a cultura do con�ito, na medida em que abre espaço para que as pessoas falem o que pensam, expondo, abertamente, todos os seus sentimentos negativos. IV - Os princípios da mediação são a liberdade das partes, a não competitividade, o poder de decisão das partes, a participação do terceiro imparcial (mediador), a competência do mediador, a informalidade dos processos e a con�dencialidade do processo. Entre os itens anteriores, está(ão) CORRETO(S): Apenas I I e IV I, II e IV III e IV I, II, III e IV Justi�cativa Glossário TRADIÇÃO ROMANÍSTICA DO DIREITO Tipo de organização política e econômica que coloca o Estado como agente da promoção social e organizador da economia. Nessa orientação, o Estado é o agente regulamentador de toda a vida e saúde social, política e econômica do país, em parceria com sindicatos e empresas privadas, em níveis diferentes, de acordo com o país em questão. Disponível em: https://goo.gl/1fB4GT (https://goo.gl/1fB4GT). Acesso em: 20 out. 2017. JUSTIÇA ADJUDICATÓRIA Ato ou sentença em que há adjudicação. Exemplo: Ato judicial que dá a alguém a posse e a propriedade de determinados bens. Disponível em: https://goo.gl/tprG9r (https://goo.gl/tprG9r). Acesso em: 20out. 2017. JUSTIÇA ADJUDICATÓRIA https://goo.gl/1fB4GT https://goo.gl/tprG9r Função do Estado de dirimir, paci�car e resolver con�itos que surgem em seu âmbito de atuação político-jurídica, seguindo um procedimento de aplicação de leis aos casos concretos, de modo a aproximar-se o máximo possível de uma decisão justa. Disponível em: https://goo.gl/rPgpFQ (https://goo.gl/rPgpFQ). Acesso em: 20 out. 2017. https://goo.gl/rPgpFQ