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Aula 4 - História

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HISTÓRIA E TENDÊNCIAS DA 
EDUCAÇÃO DOS SURDOS – 
COMUNICAÇÃO E 
BILINGUISMO 
AULA 4 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. Rhaul de Lemos Santos 
 
 
 
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CONVERSA INICIAL 
Anteriormente, realizamos uma breve retrospectiva da história da 
comunidade surda e como os métodos de educação aplicados na educação de 
surdos influenciam na formação educacional desses sujeitos. Nesse sentido, 
nesta etapa, vamos discutir como o movimento surdo nacional vem lutando pelo 
direito a uma educação bilíngue, exigindo políticas educacionais e linguísticas 
voltadas para a comunidade surda. 
No Brasil, as pessoas surdas sempre resistiram a tentativas audistas em 
querer corrigir e normalizar seus corpos, seguindo uma normativa estipulada 
pelo modelo clínico-terapêutico, e continuaram, assim como as outras 
comunidades surdas, espalhadas pelo mundo, a defender a sua língua materna, 
a Libras. À vista disso, toda essa movimentação resultou em políticas públicas 
que permitiram uma melhoria na educação de surdos. Mas, apesar da existência 
dessas leis, muito ainda precisa ser feito, principalmente quando falamos sobre 
a Libras como língua oficial no país. 
Diante disso e pensando na organização e movimentação do movimento 
surdo no Brasil, os objetivos propostos para esse capítulo são os seguintes: 
• Conhecer os encontros e eventos promovidos pelo movimento surdo em 
defesa da educação bilíngue para surdos; 
• Discutir as decisões políticas sobre a educação de surdos na educação 
básica. 
TEMA 1 – “A EDUCAÇÃO QUE NÓS SURDOS QUEREMOS” 
Nas discussões anteriores, estudamos que o movimento surdo no Brasil 
ganha mais força com a criação da Federação Nacional de Educação e 
Integração de Surdos (Feneis), no final da década de 1980, com as pessoas 
surdas ocupando os cargos de presidência, essa movimentação tinha relação 
com os vários movimentos insurgentes pelo mundo, liderados pelas 
mobilizações realizadas pelo Deaf Power. Ao ser reorganizada, a Feneis dá 
continuidade à luta pelo direito linguístico da Libras e a exigência de uma 
educação bilíngue, pautada pelo uso da língua de sinais. 
Com a insurgência do movimento surdo, a partir da Feneis, inicia-se um 
processo de ocupação nos espaços políticos, por meio de representantes 
surdos. Essas lideranças realizavam encontros com a comunidade surda, 
 
 
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pensando na elaboração de documentos voltados para os seus direitos civis. De 
acordo com Fernandes e Moreira (2014) 
Podemos indicar os anos 1990 como o marco da insurgência dos 
movimentos surdos brasileiros. Nessa década, iniciam-se os debates 
conceituais sobre língua de sinais, bilinguismo, os reflexos dos 
modelos clínicos-terapêuticos e socioantropológicos na educação de 
surdos, teorizações sobre a cultura e identidades surdas e os impactos 
de todos esses estudos na organização de um processo de educação 
bilíngue para surdos no Brasil. (Fernandes; Moreira, 2014, p. 52) 
Toda essa movimentação vai refletir na construção no ano de 1996, no 
Núcleo de Pesquisa em Políticas de Educação para Surdos (NUPPES), na 
cidade de Porto Alegre. Esse grupo de estudos será importante para a formação 
acadêmica de investigadores subalternos surdos e a produção de pesquisas 
voltadas para a educação das pessoas surdas. 
A iniciativa acadêmica pioneira de formação desse campo discursivo 
se deu na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em 
seu Programa de Pós-Graduação em Educação, na década de 1990, 
onde se constituiu o primeiro Núcleo de Pesquisa em Políticas de 
Educação para Surdos (NUPPES), sob a influência e mediação central 
do professor visitante argentino Carlos Skliar. O NUPPES forma 
importantes pesquisadores pioneiros na área da Educação de Surdos 
como: Adriana Thoma, Lodenir Becker Karnopp, Liliane Ferrari 
Giardini, Madalena Klein, Maura Corcini Lopes, para citar alguns 
nomes. O fato demarcador de uma nova política institucional para 
surdos foi o ingresso da primeira pós-graduanda surda – Gladis Perlin 
– que veio a se tornar a primeira doutora surda em educação no Brasil. 
(Fernandes; Moreira, 2014, p. 54, 55) 
A partir da formação desses pesquisadores e principalmente com o 
doutoramento da primeira doutora surda no Brasil, Gladis Perlin, as pesquisas 
científicas produzidas por esses investigadores proporcionaram pensar a surdez 
de uma forma localizada no campo da diferença e alteridade, rompendo com as 
discursividades produzidas pela clínica. Outro fator importante é que, com o 
ingresso de pessoas surdas na Pós-graduação, foi possível realizar encontros 
acadêmicos para elaboração de propostas políticas voltadas para a comunidade 
surda. 
No ano de 1999, na cidade de Porto Alegre, foi realizado o V Congresso 
Latino-Americano de Educação Bilíngue para Surdos, organizado pelo NUPPES. 
Nesse encontro, os surdos e os seus aliados realizaram discussões sobre 
direitos humanos, educação de surdos, artes surdas, relação dos surdos com a 
família entre outros. Esses debates culminaram na produção do documento A 
educação que nós surdos queremos. De acordo com esse documento, 
 
 
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quando discutido sobre os direitos humanos das pessoas surda no campo da 
educação, é necessário 
1. Propor o reconhecimento da língua de sinais como língua da 
educação do Surdo em todas as escolas e classes especiais de surdos. 
2. Assegurar a toda criança surda o direito de aprender línguas de 
sinais e também português e outras línguas. 
15. Em educação, assegurar ao surdo o direito de receber os mesmos 
conteúdos que os ouvintes, mas através da comunicação visual. 
Formas conhecidas, em comunicação visual importantes para o ensino 
do surdo são: línguas de sinais, língua portuguesa e outras línguas no 
que tange à escritura, leitura e gramática. (Feneis, 1999) 
 A produção desse documento foi de grande importância para as políticas 
futuras destinas à educação de surdos e o reconhecimento da Libras como meio 
de comunicação da comunidade surda. As propostas citadas nos revelam o 
quanto a educação para as pessoas surdas é uma das prioridades para a 
comunidade surda, valorizando a língua de sinais. Revelando, dessa forma, a 
exigência do movimento surdo, do direito de uma educação que priorize a Libras 
em sala de aula. 
TEMA 2 – EDUCAÇÃO DE SURDOS EM DISPUTA 
Além disso, uma outra exigência da comunidade surda é pelo direito de 
receber os mesmos conteúdos programáticos similares aos dos estudantes 
ouvintes nas escolas regulares, mas respeitando a visualidade dos estudantes 
surdos, sendo utilizada uma educação visual, pautada na pedagogia visual. 
Campello (2008, p. 133) afirma que a pedagogia visual é “aquela que se ergue 
sobre os pilares da visualidade, ou seja, que tem no signo visual seu maior aliado 
no processo de ensinar e aprender”. 
Outra questão destacada no documento é a importância do aprendizado 
da língua portuguesa como segunda língua na modalidade escrita. Pois, como 
lembrado por Almeida e Lacerda (2019) 
A aquisição da escrita, imersa no processo de aquisição da linguagem, 
tem para o surdo um caminho diverso do ouvinte: enquanto este 
reconstrói a história de sua relação com a linguagem por meio da 
língua oral, o surdo percorre tal caminho orientando-se pela língua de 
sinais. (Lacerda; Almeida, 2019, p. 900) 
Observa-se que a língua de sinais é a primeira língua no processo de 
aquisição da linguagem por crianças e estudantes surdos, e que a língua 
portuguesa, ao ser ensinada na sala de aula, será adquirida por meio da Libras. 
 
 
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Ao darmos prosseguimento à leitura do documento A Educação que nós surdos 
queremos, a próxima discussão será sobre a escola de surdos: 
25. Elaborar uma política de educação de surdos com escolas 
específicas para surdos. 
26. Considerar que a escola de surdos é necessária e deve oferecer 
educação voltada para princípios culturais e humanísticos, 
promovendo o desenvolvimento de indivíduos cidadãos e sendo um 
centro de encontro com o semelhantepara produção inicial da 
identidade surda (Feneis, 1999). 
Uma outra questão exigida pela comunidade surda é a criação de escolas 
bilíngues para surdos, espaços que valorizam a identidade e cultura surda e que 
priorizem a Libras como língua de aprendizagem das disciplinas ministradas. 
Essa solicitação da comunidade surda está de acordo com o que Fernandes 
(2003) relata sobre a educação de surdos. Para a autora, 
As práticas de educação inclusiva, por exemplo, da forma como vêm 
sendo propostas institucionalmente, negam aos grupos minoritários o 
exercício de suas especificidades socioculturais, na medida em que 
acabam por celebrar a diversidade, apenas constatando a existência 
do pluralismo cultural, sem medidas efetivas para o reconhecimento 
político das diferenças no cotidiano da escola. (Fernandes, 2003, p. 38) 
Nesse sentido, diferente do que é divulgado por especialistas que 
defendem a educação inclusiva, ao exigir uma educação bilíngue, o movimento 
surdo não deseja nem está promovendo um movimento de segregação, mas 
pretende que as suas especificidades culturais e educacionais sejam atendidas 
e respeitadas. Por isso, o ser incluído na Lei de Diretrizes e Bases (LDB), por 
meio da Lei n. 14.191/21, a educação bilíngue de surdos, ao ser reconhecida 
legalmente como uma modalidade da educação, permite que os surdos tenham 
a oportunidade de frequentar escolas bilíngues. 
Por isso, nos anos anteriores, em especial, no ano de 2011, a comunidade 
surda inicia uma movimentação política contra o fechamento das escolas para 
surdos, como o Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), culminando 
na mobilização denominada “Movimento surdo em defesa das escolas bilíngues 
para surdos”. 
TEMA 3 – MOVIMENTO SURDO EM DEFESA DAS ESCOLAS BILÍNGUES 
PARA SURDOS 
 O ano é 2010, o movimento surdo se organiza exigindo que as escolas 
de surdos permaneçam funcionando, requerendo o direito da comunidade surda 
 
 
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de estudar em espaços bilíngues que respeitam as suas subjetividades e 
identidades. 
A história de lutas aqui tratada teve início no ano de 2010 e foi marcada 
pela maior mobilização da história de todo Movimento Surdo Brasileiro. 
O início dessa história deu-se durante a realização da Conferência 
Nacional da Educação, CONAE 2010, no período de 28 de março a 1º 
de abril de 2010. Os resultados dessa Conferência serviram de base 
para a elaboração do Plano Nacional da Educação – PNE. Este evento 
marcou um retrocesso na educação de surdos, a partir do momento 
em que a proposta dos delegados surdos presentes nesta Conferência 
não foi atendida. (Campello; Rezende, 2014, p. 73) 
Esse movimento teve início com a ameaça do fechamento do Instituto 
Nacional de Educação de Surdos, escola inaugurada no século XIX, sendo a 
primeira escola para surdos no Brasil. Este instituto foi responsável por receber 
e formar alguns investigadores subalternos surdos, representando um espaço 
de produção de conhecimento e valorização da Libras. 
O Instituto Nacional de Educação de Surdos é uma escola centenária, 
a primeira escola de surdos no País, que abrigou e educou vários dos 
líderes surdos de todo o País, representando o berço e resistência da 
língua de sinais e da cultura surda. Alunos surdos, formados no INES, 
no retorno às suas cidades de origem, fundaram associações de 
surdos, o que propiciou a formação da Identidade Linguística da 
Comunidade Surda aflorada por todo o país. Por isso, consideramos o 
INES como o berço da nossa língua de sinais e da nossa cultura surda. 
(Campello; Rezende, 2014, p. 77) 
Em Brasília, surdos e aliados uniram forças para se manifestar contra as 
decisões do Ministério da Educação (MEC), que tinha como objetivo futuro a 
inclusão total dos estudantes com deficiência e surdos. Os dias 19 e 20 de maio 
de 2011 foram dias de grande mobilização e organização do movimento surdo. 
Foi exigido que os parlamentares considerassem as reivindicações da 
comunidade surda e que votassem contra a decisão do MEC de fechar as 
escolas para surdos, aderindo à inclusão total. As lideranças surdas, 
representando os surdos do Brasil, redigiram a seguinte carta 
Nós, surdos, militantes das causas dos nossos compatriotas surdos, 
apelamos a Vossa Excelência pelo nosso direito de escolha da 
educação que melhor atende aos surdos brasileiros que têm a Libras 
como primeira língua. Concordamos que “O Brasil tem que ter 100% 
das crianças e jovens com deficiência na escola”, sim, mas não 
concordamos que a escola regular inclusiva seja o único e nem o 
melhor espaço onde todas essas crianças e jovens conseguem 
aprender com qualidade. Afirmar que “A política de educação inclusiva 
permitiu um crescimento espetacular, de forma que os estudantes com 
deficiência convivem com os outros estudantes e os outros estudantes 
convivem com eles” nos angustia, pois queremos conviver com os 
demais cidadãos brasileiros, sim, mas queremos, acima de tudo, que 
a escola nos ensine. [...] Escrevemos essa carta, juntos, para dizer-lhe, 
 
 
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respeitosamente, mas com a ênfase necessária à gravidade que o 
tema exige que suas falas não tenham fundamento científico ou 
empírico, conforme mostram nossas próprias pesquisas e as de um 
sem-número de outros pesquisadores brasileiros. Várias pesquisas 
mostram que os surdos melhor incluídos socialmente são os que 
estudam nas Escolas Bilíngues, que têm a Língua de Sinais brasileira, 
sua língua materna, como primeira língua de convívio e instrução, 
possibilitando o desenvolvimento da competência em Língua 
Portuguesa escrita, como segunda língua para leitura, convivência 
social e aprendizado. (Carta..., 2012) 
A entrega da carta no Ministério da Educação (MEC) marca as 
mobilizações do movimento surdo durante os anos seguintes, exigindo atenção 
por parte dos governantes para as suas pautas políticas e educacionais. No ano 
de 2014, foi aprovado o texto do Plano Nacional de Educação (PNE), por meio 
da Lei n. 13.005/2014. Ao ser aperfeiçoado, realizando algumas mudanças em 
relação ao seu texto anterior, o PNE passava, a partir do ano de 2014, a ter como 
meta “articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e 
definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para 
assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino, em seus diversos níveis, 
etapas e modalidades” (Brasil, 2009). 
À vista disso, a Feneis, como órgão representativo da comunidade surda, 
exige que seja inserido em uma das metas do Plano Nacional de Educação, a 
educação bilíngue de surdos. De acordo com a Feneis, o texto que seria incluído 
no PNE, deveria 
 
Garantir a oferta de educação bilíngue, em Língua Brasileira de Sinais 
– LIBRAS como primeira língua e na modalidade escrita da Língua 
Portuguesa como segunda língua, aos alunos surdos e com deficiência 
auditiva de 0 (zero) a 17 (dezessete) anos, em escolas e classes 
bilíngues e em escolas inclusivas, nos termos do art. 22 do Decreto n. 
5.626, de 22 de dezembro de 2005, e dos arts. 24 e 30 da Convenção 
Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, bem como a adoção 
do Sistema Braille de leitura para cegos e surdocegos. (Brasil, 2010). 
 
Além do mais, toda essa mobilização sobre o direito à educação bilíngue 
para surdos irá resultar no Setembro Azul, realizado no dia 26 de setembro de 
2011, sendo um momento de exigências e comemorações da comunidade 
surda. Na ocasião, foi entregue ao Ministério Público Federal uma carta-
denúncia do movimento surdo, que destacava a evasão dos estudantes surdos, 
destacando a importância da abertura de escolas bilíngues de surdos. 
 
 
8 
 
Somos uma minoria linguística na luta pela preservação da língua de 
sinais e sua instituição como língua de instrução em nossa educação; 
não queremos a educação inclusiva como é preconizada, e muito 
menos a educação especial, queremos uma educação linguística, uma 
política linguística traçada pelo nosso “ser surdo”. (Campello;Rezende, 
2014, p. 88) 
TEMA 4 – A LUTA PELA EDUCAÇÃO BILINGUE 
Uma das esferas que permite que os estudantes surdos compartilhem 
entre si as suas vivências e experiências, a partir da língua de sinais, são escolas 
bilíngues de surdos. Por meio do ensino da Libras como primeira língua (L1) e a 
língua portuguesa como segunda língua (L2), na modalidade escrita será 
possível às pessoas surdas que fazem parte desses espaços escolares construir 
as suas identidades e conhecer mais sobre a história do povo surdo no país. 
Como destacado por Skliar (2016), ao explicar sobre a importância da educação 
bilíngue, este autor diz que existe nesses espaços: 
A potencialidade da aquisição e desenvolvimento da língua de sinais 
como primeira língua; a potencialidade de identificação das crianças 
com seus pares adultos surdos; a potencialidade do desenvolvimento 
de estruturas, formas e funções cognitivas visuais; a potencialidade de 
uma vida comunitária e desenvolvimento de processos culturais 
específicos. (Skliar, 2016, p. 26) 
Por isso a importância de lutar por uma educação bilíngue. As escolas 
bilíngues de surdos são espaços essenciais para a construção da linguagem nos 
estudantes surdos, além de serem espaços para o fortalecimento da Libras. É 
importante ressaltar que nas escolas bilíngues de surdos é importante se pensar 
sobre currículos bilíngues, que atendam às especificidades dos estudantes 
surdos, sempre levando em consideração a importância da aquisição da Libras 
como meio de comunicação da comunidade surda, além de ser o canal que 
possibilita o entendimento dos gêneros discursivos produzidos na sociedade. 
TEMA 5 – A EDUCAÇÃO BILÍNGUE DE SURDOS RESISTE! 
Retornamos às disputas do movimento surdo, durante o ano de 2011, nas 
tentativas de fechamento das escolas para surdos. Durante a Conferência 
Nacional de Educação (CONAE), foi possível observar como o 
audismo/ouvintismo estava presente naquele espaço e quanto a comunidade 
surda precisou se unir e lutar na busca de serem atendidos e consultados pelos 
 
 
9 
parlamentares para o não fechamento das escolas bilíngues. Mesmo assim, 
Campello e Rezende (2014, p. 89) explicam que 
Depois de três longínquos anos de luta no Congresso Nacional 
acompanhando a tramitação do Plano Nacional de Educação (PNE), 
com intensas negociações nos bastidores e audiências públicas, no dia 
28 de maio de 2014, finalmente foi aprovada a redação do plano na 
Câmara dos Deputados e sancionada pela Presidenta da República do 
Brasil, Dilma Roussef, em junho de 2014. (Campello; Rezende, 2014, 
p. 89) 
Essa resistência surda nos mostra o quanto o movimento surdo precisou 
resistir e persistir nas mobilizações e movimentações políticas, principalmente 
na sociedade audista/ouvintista em que vivemos, que nega a alteridade surda, 
com base na cultura e na identidade e invisibiliza as pautas políticas da 
comunidade surda, não oportunizando que esses sujeitos ocupem os espaços 
políticos. Por isso, a necessidade de uma organização de um movimento social 
de pessoas surdas, que lutem pela oficialização da Libras e exijam que seus 
direitos linguísticos e sociais sejam respeitados e aplicados. Nesse sentido, 
Fernandes (2003) relata que, quando se trata de políticas linguísticas para as 
pessoas surdas, 
Ignora-se sua diferença linguística, impondo-lhes uma educação 
mediada pela língua nacional - o português - desconhecida para eles. 
Sua língua natural – a de sinais – é silenciada, por vezes pela 
desinformação e desconhecimento e, por outras, pelo autoritarismo de 
práticas conscientemente logocêntricas (Fernandes, 2003, p. 39). 
Nesse sentido e pensando nas políticas linguísticas e educacionais para 
as pessoas surdas, torna-se importante o fortalecimento dos movimentos sociais 
de surdos para a luta e defesa dos direitos da população surda locais e mundiais, 
ocupando os espaços de poder e disputando as discursividades produzidas 
nesses espaços. 
Absurdo! ABSURDO! A-B-S-U-R-D-O! Absurdo de verdade. O quê? O 
INES fechar!? Calma aí! Não dá pra engolir isso. Não dá. Não, por 
favor! Por favor, eu imploro. Peço pelo que há de mais sagrado. Parem 
tudo! Acordem! Divulguem. Fechar o INES, NÃO! Eu quero que vocês 
surdos pensem bem. Olhem só isso, defendem os surdos! Os surdos 
vão perder a convivência em língua de sinais, a cultura, a identidade. 
Perder isso pra sermos oprimidos numa inclusão de ouvintes? NÃO! 
Abram os olhos! Por favor! Eu peço a vocês: Não vamos deixar essa 
brutalidade acontecer. Os surdos vão perder a sua cultura. Estou 
chorando por dentro, meu coração dói. Por favor! Surdos, vamos 
discutir sobre isso. O MEC não pode mudar o INES. O INES é assim! 
Não podemos aceitar isso de braços cruzados. Levantem! Lutem! 
Conto com vocês e fiquem atentos. FONTE: 
http://www.youtube.com/watch?v= yl6cfWmUrtU 
 
 
10 
NA PRÁTICA 
Saiba mais 
Para a compreensão de como foram as discussões durante o Conae 
2011, sugerimos que os estudantes assistam ao discurso da Prof. Dra. Patrícia 
Rezende durante a plenária que decidiu o fechamento ou não das escolas 
bilíngues de surdos. O vídeo se encontra disponível no Youtube, com tradução 
para a Libras do tradutor/intérprete Jonatas Medeiros. 
FENEIS: Patrícia Rezende na Audiência Pública no Senado Federal. 
Feneis, 2017. Disponível em: 
<https://www.youtube.com/watch?v=ds4MsrLKM1w>. Acesso em: 25 jul. 2023. 
O vídeo nos mostra as disputas discursivas que aconteceram durante a 
conferência e reforça a importância das lideranças surdas em ocupar os espaços 
políticos, tendo a oportunidade de representar a comunidade surda sinalizante, 
defendendo a educação bilíngue para surdos, assim como lutando pelo 
reconhecimento como minoria linguística. 
FINALIZANDO 
Observamos que as relações são construídas e elaboradas com 
intenções políticas e ideológicas, tendo como propósito posicionar os sujeitos. 
Nesse sentido, a comunidade surda defende o direito a uma educação bilíngue, 
que tem a Libras como primeira língua (L1) e a língua portuguesa na modalidade 
escrita, como segunda língua (L2). Vimos como é importante a implementação 
da educação bilingue para surdos, visto que é por meio da Libras que os 
discursos e entendimento dos diferentes gêneros discursivos serão elaborados. 
Além do mais, as escolas bilíngues de surdos servem de espaço para a 
construção da cultura e identidade surda, permitindo que os estudantes surdos 
tenham contato desde a primeira infância com a língua, possibilitando que a sua 
linguagem seja construída desde cedo. 
Vale ressaltar que a educação bilíngue para surdos valoriza a Libras como 
língua instrução dos conteúdos, assim como é um espaço que auxilia na 
formação subjetiva dos estudantes surdos. Outro aspecto importante é pensar 
que as escolas bilíngues são espaços que oportunizam a construção discursiva 
 
 
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das pessoas surdas, dando-lhes a oportunidade de entender e analisar as 
discursividades produzidas nas sociedades ouvintizadas. 
 
 
 
 
12 
REFERÊNCIAS 
ALMEIDA, D. L; LACERDA, C. B. F. de. Português como segunda língua: a 
escrita de surdo em aprendizagem coletiva. Trabalho de Linguística Aplicada, 
Campinas, v. 2, n. 58 p. 899-917, maio/ago. 2019. 
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Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 12 nov. 2009. 
CAMPELLO, A. R. S. Pedagogia visual na educação de surdos-mudos. Tese 
(Doutorado em Educação) – Universidade Federal de Santa Catarina, 
Florianópolis, 2008. 
CAMPELLO, A. R.; REZENDE, P. L. F. Em defesa da escola bilíngue para 
surdos: a história de lutas do movimento surdo brasileiro. Educar em Revista, 
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CARTA ABERTA dos doutores surdos ao Ministro da Educação, 8 jun. 2012. 
Disponível em: 
<http://ch.revistas.ufcg.edu.br/index.php/RLR/article/view/1553/1295>. Acesso 
em: 29 jun. 2023. 
FENEIS – Federação Nacional de Educaçãoe Integração dos Surdos. A 
educação que nós surdos queremos. Documento elaborado pela comunidade 
surda a partir do pré-congresso ao V Congresso latino-americano de Educação 
Bilíngue para Surdos, realizado em Porto Alegre/RS, no salão de atos da reitoria 
da UFRGS, 20-24 abr. 1999. 
FERNANDES, S. F. Educação bilingue para surdos: identidades, diferenças, 
contradições e mistérios. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade 
Federal do Paraná, Curitiba, 2003. 
FERNANDES, S; MOREIRA, L.C. Políticas de educação bilingue para surdos: o 
contexto brasileiro. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, ed. esp., n. 2, p. 51-69, 
2014. 
SKLIAR, C. A Surdez: um olhar sobre as diferenças. 8. ed. Porto Alegre: 
Mediação, 2016.

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