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EA D 3 Filosofia Política na Idade Média 1. ObjetivOs • Compreender o desenvolvimento da Filosofia Política na Idade Média. • Analisar os principais pensamentos filosóficos do período no que concerne à política. 2. COnteúdOs • Agostinho e a Cidade de Deus. • Tomás de Aquino e a pedagogia da lei divina. • Texto complementar: Agostinho. • Texto complementar: Tomás de Aquino. 3. Orientações para O estudO da unidade Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que você leia as orientações a seguir: © Filosofia Política50 1) Lembre-se de que há muitas maneiras de pensar o con- ceito de política. As questões autoavaliativas que se- guem ao final das unidades são abertas e querem ajudar na compreensão das polissemias aí presentes. 2) Lembre-se de que, embora o ato de aprender seja soli- tário, a interação com os seus colegas pode ser de fun- damental importância para a troca de informações, para a familiarização com a linguagem filosófica pertinente e com o método filosófico argumentativo. 3) Leia os livros da bibliografia indicada para que você am- plie seus horizontes teóricos, cotejando-os com o mate- rial didático apresentado. 4) Antes de iniciar os estudos de cada unidade, pode ser interessante conhecer um pouco dos dados históricos da época e da bibliografia dos pensadores em questão. Ainda que sites de caráter genérico, tais como os enci- clopédicos, estejam muito aquém de suas necessidades, eles podem auxiliar neste aspecto. 5) Uma prática reflexiva integral, englobando leitura aten- ta, pesquisa bibliográfica e hábito de questionamento são alguns dos atributos que você precisa adquirir e cul- tivar para que possa expandir seus conhecimentos. Cabe ressaltarmos que cada exercício realizado representa um momento em que você exercita o seu poder de compre- ensão e análise de conceitos, de interpretação de textos e de síntese, seu senso crítico e suas habilidades inter- pessoais. 4. intrOduçãO à unidade Na unidade anterior, pudemos compreender as condições de nascimento da Filosofia Política e o seu estatuto. Discutimos o conceito de política e a experiência da democracia. Analisamos também do ponto de vista político os principais pensamentos filo- sóficos do período: a cidade justa (Platão) e o bem comum como finalidade da vida política (Aristóteles). Claretiano - Centro Universitário 51© U3 - Filosofia Política na Idade Média Vamos, agora, iniciar o estudo da Filosofia Política no perío- do medieval da história. Mas por que dedicar uma unidade à filo- sofia medieval? Não é ela toda obscura, fundada sob uma metafí- sica improvável, dominada pelos interesses do poder eclesiástico? Àqueles que possuem uma tendência a suprimi-la uma advertên- cia se faz oportuna: é estupidez tratar toda a Idade Média como uma grande vala da história, ou acreditar que todos os pensadores do seu período disseram o mesmo. Adiante! Vamos ver como dois dos principais filósofos da Idade Média pensaram a política. Embora suas teorias pouco se- jam utilizadas pelos filósofos que atualmente se dedicam aos pro- blemas da política contemporânea, veremos como foram impor- tantes na história do pensamento ocidental. Ao final da unidade, você encontrará dois textos comple- mentares. Sugerimos a leitura de ambos. Trata o primeiro texto de um capítulo retirado do livro A ci- dade de Deus, de Agostinho. O filósofo refere-se à ética enquanto condição e fundamento de uma cidade perfeita, à busca do bem e à relação entre filosofia e felicidade. Notemos como Agostinho se utiliza da obra platônica para os seus próprios fins, e como a filo- sofia ainda aparece atrelada à procura da felicidade. O segundo texto complementar reproduz um trecho de Suma Teológica de Tomás de Aquino. Por ele, podemos visualizar o método pedagógico do filósofo e compreender a utilidade das leis humanas para organização do espaço coletivo. Notemos aí como a política já está efetivamente dominada pelo jurídico e pela prima- zia da confecção das leis. © Filosofia Política52 5. agOstinhO e a Cidade de deus A influência do pensamento de Agostinho não pode ser desmerecida. Poucos escritores marcaram de modo tão decisivo a história e a cul- tura de uma época. A sua imensa obra intitulada A cidade de Deus foi, durante um longo período, durante séculos, uma referência inescusável não somente quanto a pontos controversos da teo- logia, mas, também, quanto à compreensão da história universal e da Filosofia Política. Agostinho preocupa-se menos com a constituição política das cidades onde viviam os homens e mais com estabelecer dis- tinções entre as realidades materiais e espirituais. No prefácio de A cidade de Deus, capítulo que pretende definir o motivo e o ar- gumento da obra, lemos o anúncio da existência de uma cidade diversa da cidade fundada pelos homens: A gloriosíssima Cidade de Deus – que no presente decurso do tem- po, vivendo da fé, faz sua peregrinação no meio dos ímpios, que agora espera a estabilidade da eterna morada com paciência até o dia em que será julgada com justiça, e que graças à sua santida- de, possuirá então, por uma suprema vitória, a paz perfeita – tal é, Marcelino, meu caríssimo filho, o objeto desta obra. Todos os homens vivem numa realidade temporal e terrena, mas há alguns que se destacam por um vínculo especial e formam assim uma cidade eterna e celeste. Os homens que amam a Deus são unidos pelo amor que têm por ele e unidos entre si pelo vínculo do mesmo amor, indepen- dentemente das fronteiras criadas pelos povos e línguas. Assim como os homens unidos pelo vínculo civil se organizam em cida- des tendo em vista um mesmo bem, os bens necessários à vida e a paz, os homens unidos pela busca de um mesmo bem superior, o amor divino e a beatitude, sejam eles do tempo presente, passa- do ou futuro, formam uma cidade diversa, cidade que receberá o nome de Cidade de Deus. Figura 1 Agostinho de Hipona (354-430). Claretiano - Centro Universitário 53© U3 - Filosofia Política na Idade Média Para melhor compreender o que quer dizer Agostinho com a expressão que dá o título da obra, vejamos alguns trechos do Livro XI, capítulo I: Chamamos Cidade de Deus àquela de que dá testemunho a Escritu- ra que, não devido a movimentos fortuitos dos ânimos, mas antes devido a uma disposição da Suma Providência, ultrapassando pela sua divina autoridade todas as literaturas de todos os povos, aca- bou por subjugar toda espécie de humanos engenhosos. (...) Com estes testemunhos e outros que tais, que seria longo citar, sa- bemos que há uma Cidade de Deus da qual aspiramos ser cidadãos movidos pelo amor que o seu fundador infundiu em nós. A este fundador da cidade santa preferem os cidadãos da Cidade Terrestre os seus próprios deuses (...). Vou tratar de expor a origem, o desenvolvimento e os fins destas duas cidades, a terrena e a celeste, que estão, como disse, interliga- das e de certo modo misturadas uma na outra no século presente. A história da humanidade é a história das relações entre as duas cidades. Os grandes acontecimentos aparecem aí como fa- ses de um longo percurso conduzido por um plano de Deus com vistas à plenitude dos tempos. Toda a história é atravessada por um mistério insondável, reflexo de uma atuação ininterrupta da Providência Divina. Embora as duas cidades permaneçam mescladas, há uma realidade espiritual que as distingue. Aqueles que se entregam ao amor divino vivem como eleitos no seio da sociedade terrena. Segundo Agostinho, as duas cidades permanecem juntas e serão separadas e distintamente constituídas no dia do Juízo Final. Aqueles que pertencem à cidade divina são unidos por um sentimento que possui uma força capaz de criar laços comunitá- rios: o amor. Um amor dirigido antes de tudo a Deus, expressão do renunciar ao egoísmo que o pode contaminar. Diz o Livro XIV, capítulo XXVIII, da mesma obra:Dois amores fizeram as duas cidades: o amor de si até o desprezo de Deus – a terrestre; o amor de Deus até o desprezo de si – a celeste. © Filosofia Política54 Os homens foram criados por Deus e possuem uma vital ca- pacidade de amar. Os vícios, frutos de uma vontade corrompida, são contrários à natureza boa do homem. Por isso, todos os ho- mens podem encontrar em si os fundamentos do amor e perten- cer à cidade celeste. Para que se tornem cidadãos de uma cidade magistral, precisam descobrir o amor que há em si e dirigi-lo para a fonte do bem. Agostinho sabe, contudo, que as exigências do amor não são fáceis de acolher. O amor dirigido a Deus é também o que une os homens no século. Ninguém pode utilizar o amor a Deus como desculpa para negligenciar a relação com aquele que está ao seu lado como membro de uma mesma comunidade humana e, por que não dizer, política. Amar a Deus é amar aos homens e o Deus que neles habita. 6. tOmás de aquinO e a pedagOgia da lei divina Tomás de Aquino quer basear sua Filoso- fia Política em princípios de legalidade. Há di- versidade de leis e a relação entre leis de natu- rezas distintas deve estabelecer os parâmetros da vida política e social. Seguindo o rastro da metafísica aristotéli- ca, Tomás de Aquino pensará a ética do homem tendo como premissa que todo ser traz em si uma causa final, toda forma possui um apetite natural que a direciona para determinado fim. Observando os mo- vimentos da natureza, o filósofo acredita numa ordenação univer- sal e racional: todo ser criado possui uma finalidade. Tal acontece com o homem. O objeto necessário de sua von- tade é o bem. Todo homem deseja o bem, todos os homens são iguais no desejo do fim último: a beatitude. Há, porém, uma ca- racterística humana que o distingue dos outros seres. O homem Figura 2 Tomás de Aquino (1225-1274). Claretiano - Centro Universitário 55© U3 - Filosofia Política na Idade Média possui uma vontade livre, podendo escolher livremente os meios que conduzam àquele fim. Ocorre que o homem, na procura do bem que concretize seu fim beatífico, pode escolher meios inadequados. Sendo imperfeito, o homem pode escolher voluntariamente um mau caminho ou pode errar quanto à escolha do melhor caminho, desviando-o de sua fina- lidade. Essa é a dinâmica da vida humana. Há vícios que corrompem tanto a inteligibilidade quanto a fidelidade da vontade. Aí vemos mais uma vez como a confiança na razão marca a história do pensamento ocidental. Na dinâmica da vida humana, a virtude primordial seria a disposição para o agir conforme a razão. Pelo uso da razão, o homem chega ao caminho das virtudes e sua liberdade, antes de dificultar o seu acesso à beatitude, o auxilia. Inteligência e vontade obedecem à reta finalidade e aprendem das três virtudes morais basilares: justiça, temperança e fortaleza. Elas devem regular toda conduta humana, seja ela interna ou externa. Como entender, então, o papel das leis humanas? Segundo Tomás de Aquino, as leis cumprem uma relevante função na me- dida em que visam nortear a vida externa do homem que vive em comunidade. Uma comunidade sem leis seria uma comunidade caótica, fadada ao fracasso. Frutos da razão, as leis devem tornar a terra habitável. Tendo como finalidade uma comunidade perfeita, as leis devem servir ao bem comum: a felicidade e o bem-estar de toda a coletividade. Mas ainda que exista um fundo comum no qual se apóiem todas as leis, elas devem emanar de cada comuni- dade distinta ou de uma pessoa que legitimamente a represente. Cada comunidade possui características próprias que não podem ser desprezadas na elaboração das leis. Dito isso, poderíamos perguntar: o que vem a ser esse fundo comum de toda lei humana? Como defini-lo? O rosto da filosofia de Tomás de Aquino somente aparecerá na resposta à questão: sendo Deus o governador da primeira e maior das comunidades, há uma lei eterna da qual devem emanar todas as leis humanas. © Filosofia Política56 Há uma lei eterna proveniente de Deus e essa lei se manifes- ta na natureza humana de um modo particular. O homem, dota- do de consciência, participa da razão divina pelo que conhecemos como lei natural. Todo homem possui em si uma inscrição da lei eterna conhecida como lei natural. Vejamos como a tese aparece na Suma Teológica, Parte II, Questão 91, Artigos 1 e 2: Suposto que o mundo seja regido pela providência divina, como se mostrou na Parte I, é manifesto que toda a comunidade do univer- so é governada pela razão divina. E assim, a própria razão do go- verno das coisas em Deus, como existindo no príncipe do universo, tem razão de lei. [...] Como acima foi dito, a lei, dado que é regra e medida, pode estar duplamente em algo: de um modo, como no que regula e mede, de outro, como no regulado e medido, porque enquanto participa algo da regra e medida, assim é regulado e medido. Por isso, como todas as coisas que estão sujeitas à providência divina, são reguladas e medidas pela lei eterna, como se evidencia do que foi dito, é manifesto que todas participam, de algum modo, da lei eterna, enquanto por impressão dessa têm inclinações para os atos e fins próprios. Entre as demais, a criatura racional está sujeita à providência divina de um modo mais excelente, enquanto a mes- ma se torna participante da providência, promovendo a si mesma e aos outros. Portanto, nela mesma é participada a razão eterna, por meio da qual tem a inclinação natural ao devido ato e fim. E tal participação da lei eterna na criatura racional se chama lei natural. Todas as leis derivam de uma mesma fonte: a lei eterna. As leis humanas devem, na medida do possível, refluir da lei natural inscrita no coração do homem por Deus. Assim teremos uma so- ciedade humana organizada conforme o seu fim. Como lei natural suprema, temos aquela que determina simplesmente: faz o bem e evita o mal – de uma regra assim constituída decorre o dever da autoconservação e da conservação da humanidade. Quanto à necessidade de uma lei eterna e divina, Tomás de Aquino conclui na sua Suma Teológica, Parte II, Questão 91, Artigo 4: Além da lei natural e da lei humana, foi necessário para a direção da vida humana ter a lei divina. E isso por quatro razões. Em primeiro lugar, porque pela lei é dirigido o homem aos atos próprios em or- dem ao fim último (...). Claretiano - Centro Universitário 57© U3 - Filosofia Política na Idade Média Em segundo lugar, porque, em razão da incerteza do juízo humano, precipuamente sobre as coisas contingentes e particulares, aconte- ceu haver a respeito dos diversos atos humanos juízos diversos, dos quais também procedem leis diversas e contrárias (...). Em terceiro lugar, porque o homem pode legislar sobre aquelas coi- sas das quais pode julgar. O juízo do homem, com efeito, não pode ser sobre movimentos interiores, que estão ocultos, mas apenas sobre os atos exteriores, que aparecem (...). Em quarto lugar, como diz Agostinho, a lei humana não pode punir ou proibir todas as coisas que se praticam mal (...). Os argumentos do filósofo são claros. Uma lei divina é neces- sária porque possui o homem um fim último e o seu fim excede a sua potencialidade humana; para que o homem possa conhecer com segurança os melhores caminhos; para que não somente os atos ex- teriores, mas os atos humanos interiores também sejam ordenados pela retidão; porque não seria possível à lei humana prever todos os casos possíveis de males sem prejudicar a prática de atos bons. Na visão de Tomás de Aquino, para que tenhamos uma co- munidade política ideal, basta que os homens aprendam a escutar as leis naturais inscritas em sua razão e que as leis humanas sai- bam exaurir sua força da lei divina. 7. textOs COmplementares Texto 1 – Agostinho ––––––––––––––––––––––––––––––––––– A Cidade de Deus, Livro VIII, capítulo VIII: Também na filosofia moral os platônicos têm a primazia Resta a parte moral, a Ética, como se diz emgrego, que trata do Bem supremo: a ele referimos tudo o que fazemos; apetecêmo-lo não por ou- tro, mas por si mesmo, pela sua posse termina toda a busca posterior de felicidade. É por isso que também se chama fim porque é para ele que queremos os outros bens, mas àquele queremo-lo por si mesmo. Este bem beatífico, uns dizem que vem ao homem do corpo, outros da alma e outros dos dois conjuntamente. Como viam que o homem é forma- do de corpo e alma, julgavam que quer o corpo, quer a alma, quer os dois conjuntamente é que podiam ser a origem do seu bem, dum bem definitivo, princípio da felicidade ao qual se reportava tudo o que faziam – e não tive- ram que buscar outra coisa a que referi-lo. © Filosofia Política58 Aqueles pois que, diz-se, acrescentaram uma terceira categoria de bens chamados extrínsecos, como a honra, a glória, o dinheiro e outros que tais, não se propunham de forma alguma fazer deles um bem final, isto é, de- sejável por si próprio, mas sim um bem desejado na mira de outro; e assim este gênero de bens seria bom para os bons e mau para os maus. Desta forma este bem do homem que uns exigem da alma, outros do corpo, ou- tros do corpo e da alma, todos eles pensaram que haveria de procurá-lo unicamente no homem. Os que o esperavam do corpo, esperavam-no da parte menos nobre; os que o esperavam da alma, esperavam-no da parte melhor; os que o esperavam do corpo e da alma conjuntamente, espera- vam-no do homem todo. Mas quer seja duma parte ou do todo, é apenas do homem que o esperam. Estas diferenças, embora sejam três, não de- ram origem a três, mas a muitos sistemas ou seitas filosóficas – porque acerca do bem do corpo, acerca do bem da alma, acerca do bem dos dois conjuntamente, diversos filósofos emitiram diversas opiniões. Cedam, portanto, todos estes filósofos que disseram que feliz não é o ho- mem que goza do seu corpo, que feliz não é o que goza da sua alma, mas feliz é o que goza de Deus – não como o espírito goza do seu corpo ou de si próprio, nem como um amigo goza de um amigo, mas como o olhar goza da luz (se é que entre estas coisas alguma semelhança pode existir): qual seja a sua natureza, ver-se-á em outro lugar na medida em que, com a ajuda de Deus, nos for possível. Basta por agora recordar que, segun- do Platão, o bem supremo consiste em viver conforme a virtude – o que só pode ser alcançado por quem tem o conhecimento de Deus e procura imitá-lo: não há outra causa que possa torná-lo feliz. Também não hesita em dizer que filosofar é amar a Deus, cuja natureza é incorpórea. Donde se segue que o desejoso de sabedoria (que o mesmo é que dizer: o filósofo) só se torna feliz quando começa a gozar de Deus. Certamente que se não é feliz pelo simples fato de que goza do que se ama, (muitos de fato são infelizes por amarem o que não deviam amar e mais infelizes ainda por dele gozarem). Todavia ninguém é feliz se não goza do que ama. Mesmo aqueles que amam o que não deve ser amado não se julgam felizes por amarem, mas por gozarem. Portanto, quem goza daquele que ama e ama o verdadeiro e supremo bem – quem senão o mais desgraçado negará que esse é feliz? A esse verdadeiro e supremo bem dá Platão o nome de Deus. Por isso é que diz que o filósofo é o que ama a Deus; e porque a filosofia tende para a vida feliz, é gozando de Deus que quem o ama é feliz (1993). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Texto 2 – Tomás de Aquino –––––––––––––––––––––––––––– Suma teológica, Parte II, Questão 95, Artigo I: Foi útil que algumas leis tenham sido impostas pelos homens? Respondo. Como fica claro pelo que foi dito, está presente no homem, natu- ralmente, a aptidão para a virtude; ora, é necessário que a própria aptidão da virtude sobrevenha ao homem por meio de alguma disciplina. Assim como vemos que o homem recorre a alguma indústria em suas necessidades, por exemplo, no alimento e no vestir, cujos inícios tem ele por natureza, a saber, a razão e as mãos, mas não o próprio complemento, como os demais ani- mais, aos quais a natureza deu suficientemente cobertura e alimento. Para essa disciplina, porém, o homem não se acha por si mesmo suficiente, com Claretiano - Centro Universitário 59© U3 - Filosofia Política na Idade Média facilidade. Porque a perfeição da virtude consiste principalmente em afas- tar o homem dos prazeres indevidos, aos quais os homens são inclinados principalmente e maximamente os jovens em relação aos quais a disciplina é mais eficaz. E assim é necessário que os homens obtenham tal disciplina por outro, por meio da qual se chega à virtude. E certamente quanto àqueles jovens inclinados aos atos da virtude em razão de uma boa disposição da natureza, do costume ou, mais ainda, do dom divino, é suficiente a discipli- na paterna, que se faz mediante os conselhos. Mas, porque se encontram alguns imprudentes e inclinados ao vício, os quais não podem ser movidos facilmente com palavras, foi necessário que pela força e pelo medo fossem coibidos do mal, de modo que, ao menos desistindo assim de fazer o mal, aos outros tornassem tranqüila a vida, e os mesmos, por fim, por força de tal costume, fossem conduzidos a fazer voluntariamente o que antes cum- priam por medo, e assim se tornassem virtuosos. Tal disciplina, obrigando por medo da pena, é a disciplina das leis. Portanto, foi necessário que as leis fossem impostas para a paz dos homens e a virtude (2005). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 8. questões autOavaliativas Confira, a seguir, as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade: 1) Como pensar o conceito de política para Agostinho? 2) Como pensar o conceito de política para Tomás de Aquino? 3) Qual a atualidade dos problemas levantados pela Filosofia Política medieval? 9. COnsiderações Nesta unidade, trabalhamos com a Filosofia Política na Idade Média. Na próxima unidade, ficaremos com a teoria do pacto social e conheceremos os pensamentos de Maquiavel, Hobbes, Locke e Rousseau a respeito da política. 10. e-referências lista de figuras figura 1 Agostinho de Hipona (354-430). Disponível em: <http://investigacao-filosofica. blogspot.com.br/2012/01/deus-homem-mundo-em-agostinho-de-hipona.html>. Acesso em: 26 jun. 2012. © Filosofia Política60 figura 2 Tomás de Aquino (1225-1274). Disponível em: <http://cesaraugustoliveira. blogspot.com.br/2012/01/santo-tomas-de-aquino.html>. Acesso em: 26 jun. 2012. 11. referências bibliográficas AGOSTINHO, S. A cidade de Deus. Tradução de J. Dias Pereira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1991. v. 1. ______. A Cidade de Deus. Tradução de J. Dias Pereira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993. v. 2. AQUINO, T. Suma teológica: a bem-aventurança, os atos humanos, as paixões da alma. Tradução de Aldo Vannucchi e outros. São Paulo: Loyola, 2003. v. 3. ______. Suma teológica: os hábitos e as virtudes, os dons do Espírito Santo, os vícios e os pecados, a pedagogia divina pela lei, a lei antiga e a lei nova, a graça. Tradução de Aldo Vannucchi e outros. São Paulo: Loyola, 2005. v. 5. ______. Suma teológica: justiça, religião, virtudes sociais. Tradução de Aldo Vannucchi e outros. São Paulo: Loyola, 2005. v. 6. BOEHNER, P.; GILSON, E. História da filosofia cristã: desde as origens até Nicolau de Cusa. Tradução de Raimundo Vier. Petrópolis: Vozes, 1982. CHÂTELET, F., DUHAMEL, O.; PISIER-KOUCHNER, E. História das idéias políticas. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. GILSON, E. A filosofia na Idade Média. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2001. KOBUSCH, T. (Org.). Filósofos da Idade Média: uma introdução. Tradução de Paulo Astor Soethe. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2005.
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