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Mecânica dos Materiais Metais Desenvolvimento do material Paulo Bonfim 1ª Edição Copyright © 2023, Afya. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Afya. Sumário Metais Para Início de Conversa... ............................................................................... 3 Objetivo ......................................................................................................... 3 1. Características Físicas ................................................................................. 4 2. Trabalho a Frio: Encruamento e Usinagens ......................................... 5 3. Trabalho a Quente: Forja e Siderurgia ................................................. 9 Referências ...................................................................................................... 11 Para Início de Conversa... A abundância de metais in natura determinava o quanto uma população poderia prevalecer sobre a outra. O mundo ocidental, moldado pelas tradições greco-romana e pela religião judaico-cristã, dominou as forjas de ferro e aço posteriormente ao oriente (China e Japão), mas as sociedades orientais eram extremamente fechadas, dificultando a expansão do seu o domínio cultural. O ocidente se fez valer de ampla vantagem tecnológica no seu expansionismo cultural, comercial e cultural nos séculos XV, XVI e XVII muito graças ao domínio das forjas de aço. Em especial, o norte da Europa, que possuía jazidas de ferro e carvão em abundância e soprava o carvão com foiles para obter a temperatura necessária para malhar o ferro e obter o aço, já no ano 1000 A.C. Os metais permitiram um domínio bélico sobre as populações do Novo Mundo (América). Nos tempos atuais, existem materiais que superam os metais em tenacidade e resistência, usando alguns compósitos e polímeros de engenharia, como a fibra de carbono. Porém, o custo ainda é elevado para substituir a maioria dos seus usos. Objetivo Introduzir os processos de obtenção e conformação dos cristais metálicos. Mecânica dos Materiais 3 1. Características Físicas Os cristais metálicos são relativamente escassos na natureza por causa do fato de sua oxidação ser mais comum do que sua cristalização. Alguns minérios de ferro, de cobre, de alumínio, de estanho e de mercúrio podem ser encontrados com mais facilidade do que os metais nobres, tais como: prata, platina e ouro. Estes últimos são escassos, também, por razões geológicas e até astronômicas, pois são elementos de maior massa atômica e sua formação, que ocorre no interior das estrelas, por fusão termonuclear, tende a acontecer no final do ciclo dessas estrelas. Logo, entende-se que os metais mais nobres e de massa atômica maior também existem em menor quantidade no cosmos. A natureza das ligações químicas metálicas causa toda a diferença de como os cristais metálicos possuem natureza física diferente das outras substâncias naturais. Segundo Therald (1980, p.239-240): Ligação metálica é uma ligação química de átomos caracterizada normalmente por um subnível eletrônico d completo e um s incompleto, pelo qual os elétrons fluem livremente através de uma estrutura cristalina definida. Em relação às condições normais de temperatura e pressão, a ligação metálica confere a substância um alto ponto de fusão e vaporização e usualmente apresenta uma densidade superior a outras ligações químicas. Tal ligação também fornece outras propriedades tais como facilidade na conformação, ductilidade, brilho e alta condutividade térmica e elétrica mesmo quando no estado líquido. Apesar de que, em alguns aspectos, a definição acima seja questionada pela pesquisa de ponta em materiais, ela concorda em algumas partes sobre o que é observado no uso dos metais: eles são duros, porém dúcteis o suficiente para serem conformados em diversas formas e, geralmente, são mais tenazes do que outros materiais. Dessa forma, as duas grandes características mecânicas dos metais (na sua forma cristalina), que os diferem dos outros materiais naturais, são: Maior tenacidade A tenacidade é a energia total necessária para provocar a fratura do material sob deformação, desde seu comprimento inicial (sem carga) até a sua ruptura.A tenacidade permite um amplo uso dos metais em armas e utensílios, pois faz com que se executem tarefas mecânicas repetitivas diversas vezes, sem que deformações ou fraturas inutilizem a peça. Como exemplo, podemos citar o Machado de Guerra Egípcio, que conferiu a essa civilização antiga uma grande vantagem contra os outros grupos que os atacavam, pois simplesmente deformavam muito pouco em batalha, mantendo seu corte. Mecânica dos Materiais 4 Facilidade de conformação Os metais aceitam tanto conformações quentes (forja) como conformações frias (trefilação, laminação etc.) e podem ser moldados em diversas formas. Basicamente, nenhum outro tipo de material natural possui essa característica. Além das características mecânicas, os metais contam com características físicas importantes: ▪ Alta condutividade térmica e elétrica que os tornam únicos em dispositivos elétricos e máquinas térmicas; ▪ Brilho, fundamental para superfícies refletoras e outros instrumentos óticos; ▪ Dureza, que também contribui com altos ponto de fusão e vaporização necessários em dispositivos que devem suportar altas pressões, temperaturas ou centelhas elétricas de alta voltagem. Modernamente, muitos materiais compósitos (fibra de carbono e grafeno) passaram a competir com os metais em aplicações mais especializadas, tanto na mecânica de alto desempenho (aviação e astronáutica) quanto nas aplicações eletroeletrônicas. Contudo, o reinado do metal cristalino ainda parece distante de ser superado no volume. É possível perceber isso no grande volume produzido anualmente, na casa 1,5 bilhões de toneladas de aço bruto. Isso mostra que o uso de materiais substitutivos ainda é incipiente. 2. Trabalho a Frio: Encruamento e Usinagens A possibilidade de conformação dos metais cristalinos com processos frios faz toda a diferença na escolha de materiais para as diversas atividades tecnológicas. O trabalho a frio, também chamado encruamento, tende a produzir linhas de discordância na estrutura cristalina das ligas de metais cristalinos. Esse processo costuma aumentar a dureza da liga metálica e a sua resistência. A liga metálica consiste em material formado por mais de um tipo de átomo, em que, pelo menos um deles é um metal, e a ligação química predominante é a metálica. O melhor exemplo de liga metálica seria o aço, liga ferrosa que, no mínimo, também possui carbono na sua composição. Figura 1: Linhas de discordância produzidas por encruamento em liga metálica, vistas em microscópio eletrônico. Fonte: CIMM. Mecânica dos Materiais 5 As discordâncias criam falhas mapeadas na estrutura cristalina. Isso altera as características mecânicas da liga metálica, principalmente, a dureza. Geralmente, os materiais encruados tendem a ficar mais duros, mas existe um limite para esse encruamento antes que esse material comece a ficar duro demais e a falhar com rachaduras ou rompimentos. Esse limite é dado pela porcentagem de trabalho a frio: Aqui, A0 é a maior área inicial da peça, em que sofreria laminação ou estiramento, reduzindo sua espessura em direções transversais às áreas iniciais e aumentando sua área final (Af ). Os processos frios de laminação tendem a transformar lingotes de ligas metálicas em lâminas. Tanto a laminação como o estiramento podem ser feitos a frio ou a quente. Neste tópico, estamos tratando dos processos frios, e o estiramento pode ser mostrado pelo processo de trefilação, que consiste em tracionar cilindros ou fios de material metálico, sob forma (fieira), reduzindo seu diâmetro e produzindo um encruamento, o que torna o materialmais duro. Figura 2: Estiramento na forma de uma trefilação. Fonte: EBAH (Alberto Medeiros). No caso da trefilação a frio, a liga metálica deve ser de material já com relativa dureza (fios de aço), pois ele será tracionado pela região de menor diâmetro. Repare que o material está sendo tracionado à direita da fieira. Desse modo, deve possuir limite de resistência à tração (LTR - unidade I) alto. Geralmente, a trefilação é mais comum em ligas de aço e materiais mais duros. Já a extrusão a frio tende a ser mais executada em metais cristalinos e ligas mais macias (alumínio, cobre e suas ligas). Mecânica dos Materiais 6 Figura 3: Extrusão com o mecanismo básico da máquina extrusora. Fonte: EBAH (Adriano Almeida). A extrusão é oposta à região de carga mecânica da trefilação, já que empurra o tarugo de liga metálica sobre a ferramenta de redução da área transversal. Repare que na figura, o pistão empurra o tarugo sobre a ferramenta da esquerda para a direita. Esse método também é utilizado a quente em polímeros e outros materiais mais macios. Pode ser utilizado para conformar tubos de aço. Nesse caso, o aço deve ser aquecido bem acima da sua temperatura de recristalização. Apesar das linhas de discordância da rede molecular serem importantes, a estrutura mais prática para a análise de um metal é a estrutura de grãos. Os grãos do metal, na prática, são mais fáceis de serem analisados, pois são estruturas maiores. O seu tamanho fica na casa dos 1 μm=10-6m, que são mil vezes maiores, em média, do que as células cristalinas na casa dos nanômetros (1 ηm=10-9m), que é a escala molecular. No encruamento, esses grãos são deformados e, junto com as linhas de discordância, tendem a cisalhar menos, pois suas alças passam a se travar, deixando o material mais duro sobre o encruamento. Cisalhamento: deformação a qual está sujeito um corpo quando forças paralelas, contrárias e não concorrentes provocam em um elemento de volume, um deslocamento entre planos diferentes. Figura 4: Deformação dos grãos de uma peça de latão sob encruamento. Fonte: EBAH (Sâmara Pimy). Mecânica dos Materiais 7 Podemos ver, na Figura 4, que o encruamento, provavelmente um estiramento (trefilação) ou laminação, deformou os grãos, o que tornou o material mais duro. Análise dos contornos dos grãos é denominada análise metalográfica e consiste em uma preparação da amostra metalográfica para posterior análise em microscópio metalográfico invertido. Os contornos dos grãos são observados, assim como a presença de impurezas. Todo o processo de observação em microscópio, nos dias atuais, é registrado em fotos e comparado com gabaritos e softwares computadorizados. Geralmente, o gráfico de tensão deformação está correlacionado com a deformação dos grãos. Para melhor análise, podemos sobrepor um gráfico antes e depois do encruamento. Veja. Gráfico 1: Efeito na curva de tensão x deformação quando uma liga é submetida ao encruamento. Fonte: Do autor. O gráfico mostra uma liga metálica genérica com curva ‘A’ submetida a um encruamento, sofrendo uma mudança na sua curva de tensão x deformação. Na extensão B, o material tem claramente seu limite resistência à tração (LTR) aumentado. A visualização de amostra metalográfica antecipa esse resultado e torna desnecessário um ensaio de tração após o encruamento. Mecânica dos Materiais 8 Para materiais ferrosos (ferro fundido, aço e ligas), a maior parte do trabalho a frio se dá nas conformações finais das peças, chamadas usinagens. Isso acontece em função do alto valor da temperatura de recristalização (o que veremos adiante), o que torna esses materiais duros demais para certos encruamentos. A usinagem mecânica é o processo de desbaste de peças metálicas ou não, de forma a dar contornos finais e acabamento. Como exemplo de máquinas de usinagem temos o torno, a fresadora, a furadeira, a retificadora. Quando a peça é submetida à usinagem, localmente a ação de desbaste tende a deformar grãos e tornar o local mais duro. 3. Trabalho a Quente: Forja e Siderurgia Dentre os processos de conformação a quente de metais cristalinos e ligas, destaca-se a forja. Forja é a oficina ou estabelecimento onde se fundem e modelam metais, em especial, os materiais ferrosos, Ferro fundido e ligas de aço, muitas vezes, só são modificados na sua forma em temperaturas maiores do que a temperatura de recristalização. Para muitos autores da ciência dos materiais, todo trabalho executado sobre o metal abaixo da temperatura de recristalização é considerado um trabalho frio. Na prática, perto dessa temperatura, tem-se uma competição entre o surgimento de discordâncias e deformação dos grãos e o recozimento. O recozimento acontece quando, sob temperatura de recristalização, grãos antigos se fundem, transformando-se em grãos novos, destruindo discordâncias e as deformações dos grãos. Nas diversas técnicas de forja, existe uma competição entre endurecer com o trabalho a frio (encruamento) e amolecer com o trabalho a quente. Em especial, isso é bastante evidente nos processos siderúrgicos que tratam exclusivamente de conformar, por meio da fundição, forja e encruamento, ferro e ligas de aço. Mecânica dos Materiais 9 TEMPERATURA DE RECRISTALIZAÇÃO PARA ALGUNS MATERIAIS E LIGAS DE USO COMUM Material Temperatura de Recristalização Cobre Eletrolítico (99,999%) 121 Cu - 5% Zn 315 Cu - 5% Al 288 Cu - 2% Be 371 Alumínio Eletrolítico (99,999%) 279 Alumínio (99,0%) 288 Ligas de Alumínio 315 Níquel (99,999%) 571 Monel (Ni - Cu) 593 Ligas de Magnésio 252 Ferro Eletrolítico 398 Aço de Baixo Carbono 538 Zinco 10 Chumbo -4 Estanho -44 Quadro 1: Temperaturas de recristalização das principais ligas metálica. Fonte: CIMM. Podemos reparar que os valores mais altos estão entre as ligas e cristais metálicos mais duros (níquel e aço). Uma vez forjado, o aço tem um processo dos mais importantes: a têmpera. Além de fixar o carbono, a têmpera também produz tensões residuais importantes. O aço, após a têmpera tende a ficar muito duro, por conta da recristalização rápida. O mais importante na metalurgia é entender que os processos frios e quentes se alternam para alcançar o resultado esperado. Logo, laminações e estiramentos podem ser sucedidos de aquecimentos acima da temperatura de recristalização e têmperas (resfriamentos rápidos, no caso do aço). No fim dos processos, prevalecem os trabalhos frios de usinagem. Os metais cristalinos e suas ligas são especiais por causa de suas características mecânicas únicas, principalmente, em relação à sua tenacidade e facilidade de conformação. Praticamente nenhum outro material natural tem características semelhantes. Mecânica dos Materiais 10 Vimos como o encruamento tende a endurecer os metais e os trabalhos quentes tendem a amolecê-lo, em especial quando acima da temperatura de recristalização. Vimos, também, a diferença entre trefilação e extrusão a frio. Fica claro que cada metal cristalino tem o seu próprio caminho de processos, alternando conforme a necessidade. Enquanto alguns metais praticamente saem da fundição para o uso, outros aceitam diversos tipos de conformação. Referências ASKELAND, D. R.; PHULÉ, P. P. Ciência e engenharia dos materiais. São Paulo: Cengage Learning, 2008. GARCIA, A.; SPIM, J. A.; SANTOS, C. A. Ensaios dos materiais. Rio de Janeiro: LTC, 2000. MOELLER,T. Chemistry: With inorganic qualitative analysis. New York: Academic Press, 1980. SHACKELFORD, James F. Ciência dos materiais. São Paulo: Pearson, 2008. Mecânica dos Materiais 11 _GoBack Metais Para Início de Conversa... Objetivo 1. Características Físicas 2. Trabalho a Frio: Encruamento e Usinagens 3. Trabalho a Quente: Forja e Siderurgia Referências