Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Liderança e gestão Apresentação A noção de liderança é discutida em diversas áreas na atualidade, sendo o universo corporativo um dos que mais abordam a figura desse papel nos processos organizacionais. Contudo, essa posição não surge de forma automática nem por uma atribuição. Assumir a postura de um líder envolve uma série de aspectos e qualidades na relação com os seguidores. Não é simples exercer essa função. O conceito de liderança envolve uma série de aspectos. Há mais de um século, diversas explicações para o termo e abordagens teóricas buscam compreender esse fenômeno nas relações sociais, desde perspectivas que compreendem o líder como herói até aquelas que o inserem num processo coletivo, avisando a transformação de uma situação. Ademais, deve-se distinguir o papel de um gestor do papel de um líder, uma vez que não são sinônimos. Liderança é um aspecto que se desenvolve pela prática relacional e se legitima por ela, enquanto gestão é uma função atribuída dentro da hierarquia organizacional. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar as definições sobre o tema, compreender as principais abordagens teóricas sobre liderança desde o início do século XX e analisar as distinções do gestor e do líder no contexto corporativo. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Definir liderança.• Identificar as diferentes teorias do conhecimento científico sobre liderança. • Distinguir liderança de gestão.• Desafio O líder não surge de uma atribuição de cargo ou algo posto na hierarquia corporativa, como acontece com os gestores quando assumem uma função. O surgimento de um líder depende de vários fatores qualitativos envolvidos nas relações pessoais que circundam os membros de uma equipe, como proximidade, confiança, transparência, solidariedade, etc. Liderança se constrói pelas relações que envolvem um grupo de pessoas numa organização. Não é uma função dada, como um cargo de gestor; ela se desenvolve informalmente e adquire um papel de valor entre as pessoas envolvidas, uma vez que o líder contribui para amadurecer os laços entre a equipe e a motivação para alcançar objetivos. Para refletir sobre as características da liderança, analise a situação a seguir: Como você, gestor de pessoas do hospital, vai atuar para identificar as características de potenciais líderes entre os recursos humanos do local? Cite pelo menos três ações indispensáveis nesse processo. Infográfico No contexto atual, diversos estilos de liderança estão presentes no espaço corporativo. Alguns líderes auxiliam as organizações a compartilhar seus valores e objetivos institucionais; outros exercem papel mais autoritário para fiscalizar e cobrar resultados; há também os mais democráticos, que buscam motivar a equipe em sua atuação. Neste Infográfico, confira alguns aspectos relacionados aos modelos de liderança nas organizações atuais, tendo em vista a variedade de estilos. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/0aacee91-32ff-49d6-8924-e1d46af1d088/2367ab22-e19d-4eb3-91e5-eca0720babb8.jpg Conteúdo do livro O líder é muito imporante para alcançar determinado objetivo, seja no contexto corporativo, comunitário ou político. Para exercer tal posição, há uma série de aspectos ligados ao fenômeno da liderança, como influência, relacionamento e confiança. O significado de liderança é discutido em diferentes aspectos que envolvem essa situação. Além disso, desde os primeiros estudos sobre o tema, diferentes correntes teóricas enxergam o líder como herói, como algo comportamental, uma posição, algo transformacional, etc. Cada uma contribui com a discussão do tema, mas todas apresentam limitações. Outro ponto a considerar para discutir o tema são as diferenças entre líder e gestor. No capítulo Liderança e gestão, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, conheça as definições de liderança, as principais correntes teóricas sobre o tema e aprenda a diferenciar líder de gestor. Boa leitura. DESENVOLVIMENTO GERENCIAL E LIDERANÇA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Definir liderança. > Identificar as diferentes teorias do conhecimento científico sobre liderança. > Distinguir liderança de gestão. Introdução A liderança é um tema que tem recebido atenção de pesquisadores há mais de um século. Por isso, existe uma série de definições e correntes teóricas que tratam esse fenômeno a partir de diferentes aspectos que envolvem a atuação de um líder, seja compreendendo-a como um processo, uma interação ou uma influência entre pessoas de um grupo. Ao longo do tempo, as diversas pesquisas realizadas entenderam a liderança como a figura de um herói, uma posição que estimula o processo de produção nas empresas, com uma postura comportamental e uma relação de influência. Além disso, o tema passou por discussões sobre as distinções entre o papel de um líder e o de um gestor. Acredita-se que o primeiro é algo que surge de forma mais espontânea/natural, ao passo que a posição de um gestor é um cargo atribuído a alguém. Neste capítulo, você vai conhecer as principais definições de liderança. Além disso, vai conferir quais foram as principais linhas teóricas existentes sobre o tema ao longo da história. Por fim, você vai conhecer as distinções entre líder e gestor de um ponto de vista crítico. Liderança e gestão Jessica de Cássia Rossi O que é liderança? A liderança é um conceito bastante discutido na atualidade em diferentes situações cotidianas. O líder está presente em organizações, nas comunidades, na política, entre outros. Por se tratar de um tema abrangente, a literatura da área apresenta uma série de definições sobre o termo liderança (BENDASSOLLI; MAGALHÃES; MALVEZZI, 2014; TURANO; CAVAZOTTE, 2016). A seguir, confira algumas definições de liderança, levando em consideração os elementos comuns verificados nas definições existentes. De acordo com Bendassolli, Magalhães e Malvezzi (2014, p. 419), é possível afirmar que a liderança: – é um processo; – envolve influenciar outras pessoas; – ocorre em grupos; – envolve a busca, tanto da parte dos líderes como da parte dos liderados, de mudanças reais; – envolve o estabelecimento de objetivos comuns. Em relação à ideia de liderança como um processo, depreende-se que ela é passível de desenvolvimento por meio de relacionamentos e trocas que ocorrem nos grupos que trabalham em instituições. Nesse contexto, o papel do líder não é de uma pessoa da alta direção, mas sim de qualquer indivíduo que influencie outros sujeitos a partir de processos. No que diz respeito à ideia de liderança como influência, trata-se da maneira como os gestores inspiram liderados, bem como a influência mútua entre eles ao longo do desenvolvimento de uma situação. A persuasão ocorre por meio de comportamentos que não são forçados, ou seja, em que não se faz uso da autoridade para influenciar o grupo. Essa relação ocorre de forma livre e de modo multidirecional, e a influência pode ocorrer por meio de diferentes fluxos, como vertical, horizontal, etc. Acredita-se que essa formação ocorra em situações de formulação de objetivos, de questões comportamentais e da dimensão cultural da organização. Além disso, a ocorrência da liderança em grupos se refere à noção de vínculos criada entre líderes e seguidores, em que ambos criam “[...] uma dinâmica de legitimação e reconhecimento mútuos” (BENDASSOLLI; MAGA- LHÃES; MALVEZZI, 2014, p. 420). Cabe salientar que o conceito de seguidor deve ser entendido como um agente ativo nas relações com o líder, e não como subordinado, uma vez que se trata de uma relação dinâmica de influência, na qual quem é seguidor também pode ser líder. No entanto, de acordo com Rost (1993), a posição de líder e liderados não é igual, pois há diferenças entre o Liderança e gestão2 tipo de influência exercido por cadaum. Em geral, o líder se compromete mais com a relação de influência, em virtude de ter mais propensão para aplicar os recursos de poder de que dispõe para inspirar seus liderados. Trata-se de um papel que se alterna, dependendo do contexto em que os sujeitos estão inseridos. Contudo, de qualquer modo, deve-se considerar o papel do seguidor como atuante junto ao seu líder ao questioná-lo, apresentar suas perspectivas, dar sua opinião, entre outros. Assim, seria totalmente contrário à noção de liderança pensar os liderados como pessoas passivas, já que a liderança é uma prática “[...] negociada, multidirecional, situacional, de influência” (BENDASSOLLI; MAGALHÃES; MALVEZZI, 2014, p. 421). Já a liderança entendida como a promoção de mudanças reais se con- cretiza por meio de falas e ações que impactam de forma imediata para o alcance de um objetivo que promoverá a alteração desejada. Essa liderança ocorrerá futuramente, mas dependerá do que será feito pela equipe e de outros aspectos adicionais. Além disso, a transformação deve promover algo que seja valorizado por líder e liderados e que faça sentido para os membros envolvidos. Portanto, é uma situação que demanda comprometimento e serie- dade da equipe para que se consiga obter os resultados desejados, embora o retorno obtido possa ser compreendido de diferentes formas pela literatura especializada em liderança (BENDASSOLLI; MAGALHÃES; MALVEZZI, 2014). Por fim, a definição de liderança como estabelecimento de objetivos comuns se refere há uma finalidade acordada entre o gestor e sua equipe, não sendo algo unilateral, em que os seguidores apenas executam o que é solicitado. Vale lembrar que a liderança se dá por meio de relações que geram interdependência entre as partes envolvidas e é construída diariamente para o alcance de um propósito comum. É a liderança que dá sentido às trocas realizadas entre a equipe, sendo o líder a figura que motiva e apoia os liderados a alcançarem suas metas e objetivos. O Quadro 1 apresenta os componentes das definições de liderança. Liderança e gestão 3 Quadro 1. Componentes das definições de liderança Liderança Relacionamento baseado em influência � Influência multidirecional. � Comportamentos não coercitivos. Líderes e seguidores são pessoas nesse relacionamento � Os seguidores são ativos. � Deve haver mais de um seguidor e, em geral, mais de um líder no relacionamento. � O relacionamento é inerentemente desigual, pois os padrões de influência são desiguais. Líderes e seguidores visam a mudanças reais � Líderes e seguidores desejam, de forma pro- positiva, certas mudanças. � Mudanças reais são substanciais e transformadoras. � Líderes e seguidores não precisam produzir mudanças para que a liderança ocorra; es- sas mudanças podem ocorrer no futuro (se ocorrerem). � Líderes e seguidores visam a diversas mudan- ças ao mesmo tempo. Líderes e seguidores desenvolvem propósitos mútuos � A mutualidade dos propósitos é obtida em relacionamentos não coercitivos. � Líderes e seguidores desenvolvem propósitos (purposes), e não objetivos (goals). � As mudanças visadas refletem os propósitos de líderes e seguidores. � Os propósitos mútuos tornam-se propósitos comuns. Fonte: Adaptado de Bendassolli, Magalhães e Malvezzi (2014). Como visto, o conceito de liderança é abordado por diferentes perspecti- vas, e cada qual tem a sua especificidade e contribuição para as discussões sobre o tema. Cada líder tem o seu estilo de atuação para influenciar a sua equipe nas relações que se processam entre ambos nas organizações. Seja qual for a perspectiva pela qual a liderança for explicada, todas elas apre- sentam reflexões sobre a relevância do líder junto à sua equipe na vivência organizacional. Liderança e gestão4 Tim Cooks, atual CEO da Apple, é um líder que prefere focar sua atuação nas áreas que domina, acompanhando todos os detalhes do seu trabalho e delegando para outros profissionais tarefas que não domina. Focar o trabalho em tarefas essenciais é uma estratégia que auxilia a maximização de resultados, pois o líder não precisa acompanhar todas as tarefas, “[...] mas sim escolher pessoas altamente capacitadas para executar essas demandas, além de dar a elas recursos, encorajamento e confiança suficientes para exercer as suas capacidades” (CONHEÇA a técnica usada por Tim Cook e Jeff Bezos para aumentar a produtividade, 2021, documento on-line). Em contrapartida, o antecessor de Cooks, Steve Jobs, um ícone da marca Apple que levou a empresa a se tornar uma das mais valorizadas no mundo, preferia acompanhar todas as tarefas de perto, exercendo uma considerável pressão sobre a sua equipe (CONHEÇA a técnica usada..., 2021). Jobs era muito perfeccionista e entendia que o gestor deve acompanhar e controlar todas as fases de um processo, a fim de garantir que tudo seja feito com extrema qualidade. Esse estilo de liderança permitiu que a Apple se tornasse uma grande empresa, com produtos que se tornaram ícone da cultura digital, tais como iPod, iPad e iPhone. Os líderes contribuíram para o sucesso que a empresa desempenha no mercado mundial há décadas, estimulando a equipe a acreditar no objetivo da empresa e a oferecer o melhor que podem no contexto em que estão para que ele se torne possível. Teorias sobre liderança As reflexões teóricas sobre liderança são bastante diversas, pois há uma gama intensa de perspectivas e discussões sobre o assunto, já que se trata de uma área de conhecimento com mais de cem anos de estudos. O tema é estudado por diferentes perspectivas das ciências sociais, uma vez que está presente em diferentes áreas, sendo um assunto multidisciplinar especialmente abordado nas áreas de administração e gestão de negócios. Segundo Burns (1978), até os anos 1970, havia diversas conceituações sobre liderança sem que nenhuma fosse a principal ou amplamente aceita, dada a sua natureza multifacetada e complexa. Apesar disso, é preciso reconhecer que as definições são entendidas a partir de características distintas do fenômeno da liderança (BENDASSOLLI; MAGALHÃES; MALVEZZI, 2014). Em síntese, a liderança pode ser entendida como um processo relacional em que líderes inspiram a sua equipe a aplicar esforços para alcançar um determinado objetivo. No Brasil, de acordo com Delfino, Silva e Rohde (2010), as maiores publica- ções sobre o assunto ocorreram no período de 1995 a 2009, mas considera-se parte desses estudos ainda limitados, pois não se tornaram publicações Liderança e gestão 5 científicas. Fonseca, Porto e Borges-Andrade (2015), acreditam que, embora tenha havido um aumento considerável nas últimas décadas, os estudos sobre liderança ainda são limitados, uma vez que há mais estudos qualitativos exploratórios. A abordagem do tema liderança está presente em várias disciplinas (p. ex., sociologia, psicologia e economia) e em diferentes momentos históricos (do período clássico à pós-modernidade). Do ponto de vista econômico e social, a área foi abordada em conjunto com teorias sobre as organizações e os aspectos administrativos, focando-se em aspectos como cultura es- tratégia e redes. Já sob o ponto de vista da psicologia, área que contribuiu significativamente para a discussão sobre liderança na contemporaneidade, o tema é abordado por meio de noções como “[...] personalidade e diferenças individuais, interações sociais e do comportamento em grupo” (TURANO; CAVAZOTTE, 2016, p. 437). Em relação às teorias clássicas, que se referem a personagens históricos para abordar a liderança, recorre-se a nomes de conquistadores e figuras militares para descrever a liderança dentro do contexto histórico a partir do qual esses líderes surgiram e os desafios que eles enfrentaram. Essas pesquisas passaram a ser desenvolvidas no início do século XX, porém há textos mais antigos que são referenciados até a atualidade. Conforme Turano e Cavazotte (2016), o livro O príncipe (1513–1514), escritopor Maquiavel, trata das atividades políticas da sua época, assim como A arte da guerra, original de 400–320 a.C., aborda os ensinamentos de Sun Tzu, sendo considerada uma grande obra sobre liderança. A escola dos traços, também conhecida como a teoria do grande homem, foi a primeira linha de pensamento formal sobre liderança. Até o final da década de 1940, essa abordagem buscou compreender os aspectos comuns de um líder e o fascínio que ele despertava nas pessoas. Nessa linha de pensamento, entendia-se que ser líder era um dom que algumas pessoas tinham para exercer tal papel, de modo que se buscou entender quais eram as características inatas dessa atuação. Todavia, a abordagem foi conside- rada limitada, pois foi vista “[...] como determinista, [por] ignorar fatores situacionais e não tratar [do] processo da liderança de [uma] maneira [mais] holística” (NORTHOUSE, 2010 apud TURANO; CAVAZOTTE, 2016, p. 437-438). Posteriormente, nos anos 1950, dado o crescimento do capitalismo in- dustrial, a liderança passou a ser pensada como uma posição de gestão, e não mais como papel de heróis. Desse modo, os estudos se voltaram para a discussão sobre o modo de agir do líder nos processos de trabalho, pas- sando a ser analisadas as condutas do grupo diante do gestor. Postulava-se Liderança e gestão6 que líderes voltados para pessoas poderiam construir um relacionamento intenso com os seus seguidores, ao passo que os líderes orientados por tarefas estimulariam mais a produtividade e o alcance de metas. Apesar de essas reflexões terem se reduzido posteriormente, elas foram incorporadas por teorias mais atuais. Já nos anos 1960, no cenário da Guerra Fria, engendraram-se reflexões sobre liderança que sugeriam a necessidade de adaptação e compreensão racional de um contexto, o que desencadeou a criação das teorias contin- genciais. Discutia-se que o líder deveria levar em consideração as diversas situações (como a origem da tarefa a ser feita, sua legitimidade e poder, a relação com os membros, etc.) às quais estaria exposto para adaptar seus comportamentos a elas, a fim de poder influenciar a sua equipe. Embora tivesse uma orientação para situações práticas, uma das limitações dessa teoria é que ela não foi verificada empiricamente de forma mais profunda para testar e validar as suas hipóteses. Com o tempo, esses estudos foram sendo reduzidos e pouco verificados no início do século XXI (GARDNER et al., 2010). Na sequência, houve a escola relacional de liderança, que procurou ponde- rar sobre os laços entre o líder e cada membro do grupo como foco central da teoria. As linhas de pensamento anteriores abordaram o aspecto relacional do líder, mas de forma complementar, como fizeram as teorias comportamental e contingencial. As teorias da escola relacional iniciaram-se com a teoria dos vínculos didáticos verticais e foram até a abordagem das trocas entre líder e seguidores (TURANO; CAVAZOTTE, 2016). Pela perspectiva relacional, o tipo de interação desenvolvido entre líder e seguidores variava qualitativamente de relações formais com papéis formais bem-definidos a interações mais intensas, com base na confiança e no respeito. Defendia-se que esta última forma de relação tende a promover resultados mais satisfatórios do que aquelas em que a não há proximidade entre os envolvidos. Contudo, a escola não conseguiu explicar quais aspectos estimulariam um relacionamento mais intenso do líder com seus liderados. À medida que o campo científico sobre liderança foi amadurecendo, pes- quisadores passaram, entre os anos 1970 e 1980, a contestar as reflexões tra- dicionais sobre o tema, pois compreendiam que a liderança se legitimava mais pelo significado que tinha para os seguidores do que pelas ações do líder em si. Desse modo, os estudos tornaram-se céticos em relação ao papel do líder, considerando-o pouco relevante. Nesse contexto, surgiram as teorias implíci- tas de liderança, com base “[...] no pressuposto de que expectativas sobre o líder influenciavam as percepções dos indivíduos sobre o seu comportamento” (TURANO; CAVAZOTTE, 2016, p. 439). Outras abordagens teóricas centradas Liderança e gestão 7 nos liderados foram as teorias focadas no processamento de informações, que enfatizavam como os aspectos dos liderados influenciam o fenômeno da liderança. Aqui, surgem as primeiras discussões sobre o autogerenciamento de equipes e as bases para o conceito de liderança compartilhada. Concebeu-se, também, o modelo de extensão total da liderança (full-range leadership theory), conhecido como a “escola da nova liderança”, em que estão inseridas as teorias das lideranças transformacional e transacional. A partir do texto seminal de Burns (1978), passou-se a debater como as relações de transformações promovem reflexos nos seguidores mais do que as interações de troca, transacionais, pois aquelas estão fundamentadas na transcendência e na realização de objetivos partilhados por toda a equipe. Trata-se de uma perspectiva mais coletiva do que individualista, focada apenas no interesse de cada parte, visando a obter algum benefício: a teoria transacional. Em meio às discussões, surgiu também a abordagem carismática sobre liderança; juntas, essas teorias produziram diversos estudos entre o final do século XX e o início do século XXI. Nas grandes questões e transformações dos anos 2000, desenvolveu-se a teoria da liderança autêntica, fundamentada em abordagens filosóficas e da psicologia positiva. Tal corrente debateu como poderia ocorrer uma liderança mais assertiva para o contexto contemporâneo. Para essa abordagem, as principais posturas de um líder autêntico são: “(a) processamento balance- ado de informações, (b) perspectiva moral internalizada, (c) transparência relacional e (d) autoconhecimento” (GARDNER et al., 2005 apud TURANO; CAVAZOTTE, 2016, p. 439–440). No entanto, considera-se que essa teoria não é inovadora, pois apresenta características da teoria da liderança ética e, em alguns pontos, da teoria transformacional (TURANO; CAVAZOTTE, 2016); ademais, entende-se que ela precisa amadurecer as suas reflexões. Como visto, há diversas linhas de pensamento e discussões sobre a lide- rança, de modo que este capítulo abordou de modo resumido cada aborda- gem. Todas as abordagens tentam explicar o fenômeno da liderança em si, bem como os aspectos que determinam a sua efetividade, ao tratarem das características do líder, das fontes de poder, dos traços dos seguidores e dos relacionamentos e como eles potencializam a transformação. Diferenças entre liderança e gestão Nas discussões sobre liderança na atualidade, uma das distinções abordada recorrentemente é entre líder e gestor. Por isso, faz-se relevante compreender as especificidades da gestão, a fim de compará-las e debatê-las com as da Liderança e gestão8 liderança. É importante salientar que liderança e gestão não são sinônimas, já que a liderança se estabelece por meio de um vínculo relacional, e a gestão, como uma função na hierarquia organizacional. A gestão é uma área do conhecimento que aborda como as organizações podem atingir os seus objetivos por meio do planejamento, da execução e da avaliação de suas atividades. Conforme Drucker (2008), para que ela se realize, faz-se necessário trabalhar o comportamento das pessoas e das organizações. Esse processo é “[...] constituído por um conjunto de funções que são essenciais para alcançar os objetivos organizacionais, de forma eficaz e eficiente” (BORGES; MENDES, 2014, p. 96). A partir disso, as empresas precisam atuar de forma eficiente e eficaz para alcançar os seus propósitos. Desse modo, é indispensável que haja uma distribuição organizacional equilibrada para a autoridade e o trabalho que será desempenhado por cada função. A responsabilidade assumida por cada cargo é proporcional à posição ocupada na pirâmide hierárquica; ou seja, quanto mais alto for o cargo, maior será a responsabilidade e o poder atribuídoa ele. A posição de um gestor é definida pelo organograma da empresa, em que se identifica as suas responsabilidades e os seus subordinados. Quanto mais alta for a sua posição, maior será a sua responsabilidade na gestão de uma organização. Nesse contexto, o gestor precisa ter determinadas competências para que possa exercer a sua função, como habilidade de organização e orientação da sua equipe de trabalho, tendo em vista os objetivos e os valores insti- tucionais. Trata-se de um papel que é atribuído a um indivíduo conforme o organograma de uma empresa. O gestor pode estar presente em nível diretivo e em posições intermediárias, como, por exemplo, em um setor ou em uma unidade organizacional (BORGES; MENDES, 2014). Entre as competências de um gestor, destacam-se: planejar; desenvolver ações de curto prazo; dar suporte aos cargos técnicos; manter o cumprimento de regras; impor limites às ações desempenhadas pelos colaboradores; priorizar a estabilidade organizacional do trabalho dos subordinados para alcançar os objetivos propostos; e avaliar os resultados do grupo. O poder do gestor é legitimado formalmente na organização, e ele deve contar com as seguintes características: ter papel de supervisão; ter baixa proximidade emocional; evitar ser impulsivo (não medir as palavras utilizadas em cada Liderança e gestão 9 situação); ter uma visão racional das tarefas que devem ser desempenhadas; e ter uma postura mais conservadora, com clareza do que deve ser feito (BORGES; MENDES, 2014; CUNHA et al., 2007; REGO; CUNHA, 2007; ROUCO, 2012). O papel do gestor envolve uma atuação mais disciplinar, autoritária e fiscalizadora junto aos funcionários de uma instituição. Portanto, refere-se a uma posição muito mais racional e menos empática junto à equipe em questão, dificultando que existam laços de proximidade, confiança e influ- ência do gestor entre eles. Em contrapartida, o papel do líder se estabelece por meio de um vínculo relacional que se estabelece com os seguidores, legitimado pela prática. Na gestão pública, a presença de líderes que possam influenciar a consecução de um objetivo por um grupo é essencial para o bem- -estar da população. No entanto, muitas vezes, os gestores responsáveis por tais decisões são políticos que foram eleitos ou designados para o cargo, como cargos de confiança, e que não adotam a postura de líder, agindo apenas como gestores ou, por vezes, em prol dos próprios interesses. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Ipsos em 2021 sobre as características que as pessoas esperam de um líder para enfrentar a pandemia de covid-19 mostrou que 42% dos brasileiros desejam que os “[...] políticos priorizem os interesses do País ao invés de suas próprias carreiras. Esta e outras caracte- rísticas como ‘ser honesto’, ‘tomar decisões certas na hora certa’ e ‘agir rápido para proteger as pessoas’ tiveram destaque entre os brasileiros” (LARA, 2021, documento on-line). Confira, a seguir, as principais características de gestores e líderes (CUNHA et al., 2007). � Gestores: focam no presente, buscam a manutenção das ações; têm ações mais imediatas; são orientados por regras; priorizam como as coisas serão feitas; buscam o controle das situações; preferem a com- plexidade; valorizam a lógica; e cuidam dos interesses da organização. � Líderes: preocupam-se com o futuro; buscam a mudança; focam no longo prazo; se inspiram em uma visão; priorizam o porquê das ações; empoderam seus seguidores; valorizam a simplificação; alimentam a confiança; e têm uma visão social ampla. A partir disso, verifica-se que o papel desenvolvido por ambos é bem distinto, de modo que não se deve tratá-los como sinônimos, como ocorre, muitas vezes, no senso comum. Há muito mais gestores nas organizações Liderança e gestão10 na contemporaneidade do que líderes, pois há uma diferença qualitativa substancial entre as posições. A liderança depende dos valores, dos com- portamentos e das relações que surgem em um dado grupo de pessoas. Já a gestão é uma posição muito recorrente nas pirâmides hierárquicas de organizações que valorizam estilos de gestão assimétricos. O líder ocupa um papel de forma espontânea e informal, ao passo que o gestor tem um papel instituído e formalizado, conforme os interesses da empresa. Alguns gestores, por vezes, preferem não se apresentar como “chefes” para os seus subordinados, mas sim como líderes, uma posição valorizada no mundo corporativo, enquanto a noção de chefe é vista como autoritária. No entanto, a posição de líder não está relacionada com a função de um gestor, mas sim com a uma atuação que é construída informalmente nas relações que envolvem um grupo de pessoas no contexto corporativo. O gestor pode até se tornar um líder, se tiver um posicionamento e um vínculo relacional que o levem a isso, mas isso vai além da sua função, de modo que nem sempre se verifica essa qualidade nos cargos gerenciais. Desse modo, faz-se necessário ter cuidado com o uso da expressão líder, já que se trata de um termo bastante aplicado no mundo corporativo na atualidade, para que não seja atribuído um significado equivocado ao termo. As dimensões da liderança podem enriquecer os processos corporativos, porém, se utilizadas de modo inadequado, podem perder a credibilidade e gerar frustração entre os envolvidos. Por isso, faz-se imprescindível que as empresas compreendam muito bem qual é a diferença entre o papel de um líder e o de um gestor, a fim de dar o valor apropriado atribuído a cada um. Referências BENDASSOLLI, P. F.; MAGALHÃES, M. O.; MALVEZZI, S. Liderança nas organizações. In: ZANELLI, J. C.; BORGES-ANDRADE, J. E.; BASTOS, A. V. B. (org.). Psicologia, organizações e trabalho no Brasil. 2. ed. Porto Alegre: Artmed. 2014. BORGES, F.; MENDES, J. F. S. Competências do gestor e do líder: estudo de caso. Lusíada. Economia & Empresa, n. 18, p. 89–120, 2014. Disponível em: http://dspace.lis.ulusiada. pt/bitstream/11067/1363/1/LEE_n18_3.pdf. Acesso em: 23 abr. 2021. BURNS, J. M. Leadership. New York: Perenium, 1978. CONHEÇA a técnica usada por Tim Cook e Jeff Bezos para aumentar a produtividade. Pe- quenas Empresas & Grandes Negócios, 24 mar. 2021. Disponível em: https://revistapegn. globo.com/Dia-a-dia/Gestao-de-Pessoas/noticia/2021/03/conheca-tecnica-usada-por- -tim-cook-e-jeff-bezos-para-aumentar-produtividade.html. Acesso em: 23 abr. 2021. CUNHA, M. P. et al. Manual de comportamento organizacional e gestão. 6. ed. Lisboa: RH Editora, 2007. Liderança e gestão 11 DELFINO, I. A. L.; SILVA, A. B.; ROHDE, L. R. A produção acadêmica sobre liderança no Brasil: uma análise bibliométrica dos artigos publicados em eventos e periódicos entre 1995 e 2009. In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO, 34., 2010, Rio de Janeiro. Anais [...]. Rio de Janeiro: ANPAD, 2010. Disponível em: http://www.anpad.org.br/admin/pdf/gpr2749.pdf. Acesso em: 23 abr. 2021. DRUCKER, P. F. O essencial de Drucker: uma selecção das melhores teorias do pai da gestão. Lisboa: Actual, 2008. FONSECA, A. M. O.; PORTO, J. B.; BORGES-ANDRADE, J. E. Liderança: um retrato da pro- dução científica brasileira. RAC - Revista de Administração Contemporânea, v. 19, n. 3, p. 290–310, maio/jun. 2015. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rac/v19n3/1415- 6555-rac-19-03-00290.pdf. Acesso em: 23 abr. 2021. GARDNER, W. L. et al. "Can you see the real me?" A self-based model of authentic leader and follower development. The Leadership Quarterly, v. 16, n. 3, p. 343–372, 2005. GARDNER, W. L. et al. Scholarly leadership of the study of leadership: a review of The Leadership Quarterly’s second decade, 2000-2009. The Leadership Quarterly, v. 21, n. 6, p. 922–958, Dec. 2010. LARA, M. Brasileiro quer líder que priorize o país e não as eleições. Estado de São Paulo, 28 mar. 2021. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,brasileiro- -quer-lider-que-priorize-o-pais-e-nao-as-eleicoes,70003663085.Acesso em: 23 abr. 2021. NORTHOUSE, P. G. Leadership: theory and practice. Thousand Oaks, CA: Sage, 2010. REGO, A.; CUNHA, M. P. A essência da liderança: mudança x resultados x integridade. 3. ed. Lisboa: RH Editora, 2007. ROST, J. C. Leardership for the twenty-first century. Westport: Praeger, 1993. ROUCO, J. C. D. Modelo de gestão de desenvolvimento de competências de liderança em contexto militar. 2012. 565 p. Tese (Doutorado em Gestão) — Faculdade de Ciências da Economia e da Empresa, Universidade Lusíada de Lisboa, Lisboa, 2012. TURANO, L. M.; CAVAZOTTE, F. Conhecimento científico sobre liderança: uma análise bibliométrica do acervo do The Leadership Quarterly. RAC - Revista de Administração Contemporânea, v. 20, n. 4, p. 434–457, jul./ago. 2016. Disponível em: https://www.scielo. br/pdf/rac/v20n4/1982-7849-rac-20-4-0434.pdf. Acesso em: 23 abr. 2021. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Liderança e gestão12 Dica do professor Hoje há diversos exemplos de grandes líderes que inspiram pessoas na busca de um objetivo. Um desses personagens é Bill Gates, proprietário da Microsoft, cuja atuação é até hoje usada como exemplo de liderança. Na Dica do Professor, confira alguns apontamentos do empresário sobre o papel dos líderes na atualidade. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/cee29914fad5b594d8f5918df1e801fd/41acc15fadde86dd6939fe16517fd41c Exercícios 1) Liderança é um conceito estudado e definido por vários aspectos. Considere as afirmações: I. Liderança é uma função definida pela hierarquia organizacional. II. Liderança é o estabelecimento de objetivos comuns ente líder e seguidores. III. Liderança é a habilidade de influenciar um grupo de pessoas. Está correto o que se afirma em: A) I, apenas. B) I e II, apenas. C) I e III, apenas. D) II, apenas. E) II e III, apenas. 2) Teorias clássicas de liderança no início do século XX usavam figuras históricas para demonstrar o papel de um líder, apontando como esses indivíduos enfrentaram situações do contexto em que viviam e os resultados que obtiveram. Um exemplo de líder, por essa perspectiva, seria: A) Aristóteles. B) Leonardo da Vinci. C) Alexandre, o Grande. D) Sócrates. E) Platão. 3) Problemas econômicos, escândalos organizacionais, problemas socioambientais etc. são alguns dos desafios que as organizações passaram a enfrentar nas últimas décadas. Nesse contexto, a liderança autêntica, inspirada na filosofia e psicologia, que surgiu para compreender como o líder deve atuar nesse contexto corporativo, aponta que ele deve: A) saber delegar atividades. B) conhecer a si próprio. C) ser autoritário. D) negociar interesses. E) ser dissimulado. 4) Sobre as diferenças entre as noções de gestor e líder, considere as afirmações: I. O gestor se preocupa em empoderar seus seguidores frente às ações cotidianas. II. A atuação do líder é orientada pela preservação das regras numa empresa. III. A existência de um líder depende do relacionamento construído com a equipe. IV. O papel de um gestor depende das funções atribuídas pela estrutura organizacional. Está correto o que se afirma em: A) I e II, apenas. B) I e III, apenas. C) II e III, apenas. D) II e IV, apenas. E) III e IV, apenas. 5) Uma das percepções sobre liderança é que ela se refere à habilidade de influenciar sua equipe num determinado contexto, mas para isso é necessário engajar as pessoas envolvidas. Tendo isso em vista, qual das alternativas a seguir expressa corretamente a postura do líder que contribui para obter a adesão dos liderados em situações propostas por ele? A) Explicar as razões do que será feito. B) Controlar as ações realizadas. C) Focar as ações do presente. D) Orientar a equipe a ser disciplinada. E) Valorizar a complexidade nos processos. Na prática Ser líder exige uma postura nem sempre associada a um gestor, uma vez que se refere a um posicionamento qualitativo que se constrói nas relações de um grupo. Apesar disso, em algumas situações, é possível que um gestor seja também um líder devido a alguns valores e comportamentos próprios do indivíduo. Veja, Na Prática, o exemplo de um gestor que também apresenta algumas qualificações como líder na gestão de um conhecido clube de futebol brasileiro. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Saiba + Para ampliar seu conhecimento no assunto, veja a seguir as sugestões do professor: Liderança autêntica e gestão do conhecimento O texto a seguir aborda o exercício da liderança ligado à autenticidade e aos valores éticos e morais, discutindo como a ética pode criar e compartilhar conhecimento. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. O líder e sua equipe: criando (?!) e solucionando conflitos O vídeo a seguir apresenta uma peça teatral organizada pela Trupe Jeito HC, apresentada no Congresso sobre Gestão de Pessoas. Ela encena a relação entre o líder e seus seguidores na resolução de conflitos no ambiente de trabalho. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Indivíduo, liderança e cultura: evidências de uma gestão da criatividade O trabalho a seguir aborda a relação entre a gestão da criatividade, o processo de liderança e a cultura em equipes de trabalho no contexto organizacional, analisando a prática gerencial com base no indivíduo em seu grupo, no processo de liderança e na cultura. https://www.scielo.br/pdf/gp/v24n1/0104-530X-gp-0104-530X898-13.pdf https://www.youtube.com/embed/XhvUyL6aGu4 Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://www.scielo.br/pdf/rac/v21n1/1415-6555-rac-21-01-00107.pdf
Compartilhar