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INTRODUÇÃO “A guerra que os judeus levaram a cabo contra os romanos não é apenas a maior que ocorreu com nosso povo, mas é quase também maior dentre todas as cidades e povos.” (JOSEFO, Guerra dos Judeus, I, 1) É assim que Flávio Josefo, o autor de nossa principal fonte documental, inicia sua narrativa, descrevendo-a com minúcia, conforme as observações vivenciadas por este autor, bem como a partir de relatos de testemunhas, dos paralelos com outras fontes sobre tal período e de seu próprio conhecimento. Josefo vive um período turbulento e catastrófico para seu povo. Após anos de atritos com os romanos, mas principalmente entre membros e grupos de sua própria nação, uma revolta sem precedentes na história judia estoura na Palestina do ano de 66 a.C. no governo de Nero. Arrastando toda a população em uma guerra aberta contra os romanos motivada principalmente por sentimentos nacionalistas, anti-romanos e messiânicos, mas que misturou no meio disto tudo interesses pessoais ou corruptos. Josefo é o autor que narra a guerra e também é personagem nela. Ele próprio governou um território e ficou incumbido de defender sua região contra o exército formado para conter a rebelião, liderado pelo general Vespasiano. Os romanos são imbuídos por Deus, segundo Josefo (JOSEFO, Guerra dos Judeus, V, 367), de um papel crucial na punição dos judeus. Esta guerra não é apenas o desencadeamento fortuito de eventos terrenos, mas faz parte também de um plano de Iahweh de castigar todo o povo judeu pelos pecados cometidos por indivíduos e grupos que interpretam mal as leis e costumes do povo, rompem com a Aliança firmada entre o povo e Deus e profanam os locais e objetos sagrados para o culto judeu do período do Segundo Templo. Os romanos assim não são vistos apenas como repressores da revolta, mas também responsáveis de castigar todos os judeus situados na Palestina, acometidos ou não pelos terríveis pecados aos quais abrangem toda a nação, mesmo que tais pecados aflijam uma pequena parcela da população. Neste trabalho, procuramos analisar e compreender a religiosidade judaica tradicional e sincrética, assim como o imaginário social simbólico descrito na narrativa e em grande parte do contexto histórico destes eventos. Com a utilização de obras que tratem da religiosidade judaica do I séc d.C., bem como de elementos sincréticos greco-romanos, o presente trabalho compreende toda esta religiosidade sob os métodos e teorias do historiador das religiões Mircea Eliade e das estruturas do imaginário de Gilbert Durand.