Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Profa. Amanda Bagolin do Nascimento 2018 Centro de Ciências das Saúde Departamento de Nutrição NTR 5629 - Fisiopatologia da Nutrição I SUMÁRIO • Doenças Cardiovasculares – Aterogênese – IAM – ICC • Dislipidemia • Definição • Etiologia – Papel da dieta • Valores de referência • Estratificação de risco • Classificação – etiologia • Classificação laboratorial • Tratamento GRUPO de DOENÇAS inter-relacionadas e que muitas vezes coexistem Doença arterial coronariana (DAC) Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) Aterosclerose Doença cardíaca isquêmica (Infarto agudo do miocárdio – IAM) Doença vascular periférica Insuficiência Cardíaca (IC) DCV (RAYMOND; COUCH, 2012) Mortalidade BRASIL (WHO, 2014) Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) Idade (> 45 anos – M; 55 anos F) Diabetes melito Taxa de filtração glomerular < 60 mL/min Microalbuminúria História familiar de DCV Fatores de risco principais Tabagismo – cigarros Inatividade física Dieta inadequada Estresse Sono insuficiente Consumo excessivo bebidas alcoólicas Fatores de risco – Estilo de vida Perfil das lipoproteínas LDL elevado HDL reduzido Triglicerídeo elevado Marcadores inflamatório Fibrinogênio Proteína C reativa Fatores Modificáveis de risco CV HAS Obesidade Síndrome Metabólica Condições relacionadas (RAYMOND; COUCH, 2012) Idade Colesterol total Fumo Pressão arterial sistólica Colesterol HDL FATORES DE RISCO HAS Obesidade Dislipidemia Diabetes Excessos Deficiências DOENÇA CARDIO- VASCULAR DIETA Processo que conduz ao desenvolvimento da ATEROSCLEROSE • Processo insidioso que pode iniciar na infância • Resposta inflamatória crônica local à fatores de risco (multifatorial) • Associado à elevada concentração de LDL-c • Formação da lesão, progressão e eventual ruptura da placa. Há atividade de citocinas pró-inflamatórias (TNF, IL-6 e PCR) e anti- inflamatórias (IL-9, IL-10) ATEROGÊNESE (GROSSMAN; PORTH, 2016; ROSS, 2016) ATEROSCLEROSE (RAYMOND; COUCH, 2012) Acúmulo de colesterol Depósito das lipoproteínas na parede arterial é proporcional à concentração no plasma Lesão Inflamação (citocinas pró e antiinflamatórias) Resposta Fagocitária (Monócitos) Macrófagos Macrófagos ingerem colesterol oxidado Células espumosas estrias gordurosas Formação de capa de fibrina (ATEROMA) Se o ateroma romper: TROMBO Agregação plaquetária, ativação sistema coagulação Oclusão ATEROSCLEROSE (RAYMOND; COUCH, 2012; GROSSMAN; PORTH, 2016; ROSS, 2016) Liberação enzimas que ampliam artérias de tamanho Aneurisma PCR / risco Baixo: < 1 mg/dL Médio: 1 a 2 mg/dL Alto: > 2 mg/dL Muito alto: ≥ 10 mg/dL Lesão Inflamação Resposta Fagocitária (Monócitos) Macrófagos Macrófagos ingerem colesterol Células espumosas estrias gordurosas Formação de capa de fibrina (ATEROMA) Se o ateroma romper: TROMBO Agregação plaquetária, ativação sistema coagulação Oclusão ATEROSCLEROSE (RAYMOND; COUCH, 2012; GROSSMAN; PORTH, 2016; ROSS, 2016) Liberação enzimas que ampliam artérias de tamanho Aneurisma A te ro sc le ro se Artérias coronárias Angina Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) Morte súbita Artérias cerebrais Acidente Vascular Encefálico Isquemia transitória Circulação periférica Claudicação Isquemia Gangrena Principal causa de mortalidade e incapacidade no BR Principal causa: limitação do fluxo coronário (isquemia) levando à necrose Placas de ateroma Liberação de citocinas pró- inflamatórias Agregação plaquetária Trombo (RAYMOND; COUCH, 2012; COSTA et al.,2014) Fatores de risco Genética Sexo masculino Idade < 45 anos para homens e 55 para mulheres Hipertensão arterial Diabete melito Dislipidemia Obesidade Tabagismo Alterações hemostáticas (RAYMOND; COUCH, 2012; COSTA et al.,2014) Angioplastia Cirurgia de Revascularização do Miocárdio Síndrome clínica ocasionada por anormalidade cardíaca em bombear o sangue (disfunção sistólica) e /ou acomodar o retorno cardíaco (disfunção diastólica) Causas Cardiopatia isquêmica crônica + hipertensão Progressão lenta – pode ficar compensada por muitos anos Doença de Chagas Endomiocardiofibrose Cardiopatia valvular reumática crônica (RAYMOND; COUCH, 2012; COSTA et al.,2014) Fatores de risco IAM Idade Hipertensão Arterial Sistêmica Diabetes melito Obesidade Dislipidemia Hipertrofia ventricular esquerda Valvulopatia (RAYMOND; COUCH, 2012; COSTA et al.,2014) Insuficiência cardíaca CONGESTÃO Venocapilar pulmonar e venosa sistêmica RETENÇÃO HÍDRICA Dispneia Edema periférico Fadiga Tosse Qual a relação entre estes sintomas e a dieta??? (RAYMOND; COUCH, 2012; COSTA et al.,2014) IC alterações fisiológicas Estado Nutricional Redução na ingestão alimentar e aproveitamento dos nutrientes ALTERAÇÕES NO TGI: • compressão gástrica; congestão hepática sensação de plenitude pós- prandial • Edema de alças intestinais redução capacidade absortiva enteropatia perdedora de proteína; náuseas e anorexia DISPNEIA e FADIGA Perda ponderal progressiva caquexia cardíaca (perda de peso involuntária de 6 % de massa muscular em 6 meses) % PP = 𝑃𝑈 −𝑃𝐴 𝑃𝑈 𝑥 100 (RAYMOND; COUCH, 2012; COSTA et al.,2014) DCV Tabagismo ATEROSCLEROSE Base fisiopatológica para Hipertensão Dislipidemia (XAVIER et al., 2013) Problema clínico caracterizado pela elevação dos níveis plasmáticos de triglicérides ou pela alteração dos níveis das lipoproteínas que transportam o colesterol e a gordura no sangue (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) • Quilomicrons – síntese nos enterócitos. Transporte de triglicérides originário da dieta • VLDL – síntese no fígado para transporte de TG e colesterol endógeno • LDL – rica em colesterol – transporta colesterol do fígado para os tecidos – Apo B • HDL – transporta o colesterol dos tecidos para o fígado. Apo A – proteína antioxidante anti-inflamatória. Recebe colesterol dietético dos QM e do VLDL (RAYMOND; COUCH, 2012; GROSSMAN; PORTH, 2016; ROSS, 2016) Lp(a) ?? (GROSSMAN; PORTH, 2016) Quando há alteração nos valores das Lipoproteínas: DISLIPIDEMIAS GENÉTICA DOENÇAS METABÓLICAS E COMORBIDADES ALIMENTAÇÃO Mas quais são os fatores que levam à DISLIPIDEMIA? (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) ETIOLOGIA MULTIFATORIAL 1) Maior sensibilidade para o colesterol exógeno 2) Deficiência de receptores de LDL-c (= reduzida remoção do sangue para o fígado) 3) Alteração na síntese de apoproteínas (deficiente ou excessiva) Independente da causa: DISLIPIDEMIA DCV (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) DIETA Dietas ricas em calorias > Produção de VLDL, elevação do TG e alto grau de conversão de VLDL em LDL Consumo excessivo de colesterol Reduz a formação de receptores de LDL (logo, sua remoção) Dieta rica em TG e Gordura Saturada Aumenta a síntese de colesterol e suprime atividade do receptor LDL DM e SM Elevação do TG e LDL, redução do HDL (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) Ácidos GraxosÁcidos Graxos Saturados Cadeia Média (C 8-12) Absorção portal: não afetam colesterol sérico Cadeia Longa (>14) Estereficados nos enterócitos e transformados em TG. Armazenados nos tecidos Láurico (12:0) – gordura de coco Mirístico (14:0) - leite e derivados; Gordura de coco Palmítico (16:0) - gordura animal e o óleo de palma Esteárico (18:0) - gordura do cacau De maneira geral, a gordura saturada (C12:0, C14:0 e C16:0) eleva a concentração plasmática de colesterol, enquanto o C18:0 é neutro em seus efeitos sobre o colesterol (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2013; COSTA, 2014) Ácidos Graxos Insaturados Monoinsaturados Oleico – w-9 Consumo de MUFA não afeta significativamente os níveis de colesterol total circulantes Poli-insaturados Ômega-3 Ácido docosaexaenoico (DHA) Acido eicosapentaenoico (EPA) Alfalinolênico (ALA) Melhora da função autonômica, antiarrítmico, diminuição da agregação plaquetária e da pressão arterial, melhora da função endotelial, estabilização da placa de ateroma e de triglicérides (EFEITO CARDIOPROTETOR) Ômega-6 - Essencial Ácido Linoleico (AL) 5-10% Várias funções fisiológicas Pode se transformar em ácido araquidônico (efeito pró-inflamatório) Trans É o que mais aumenta o LDL Aumento do risco cardiovascular Ácidos Graxos (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2013; COSTA, 2014) Papel deletério do colesterol dietético no colesterol plasmático, bem como seu papel no desenvolvimento de DCV vem sendo intensamente discutido • Gorduras de origem animal – ovo, camarão, vísceras, leite • Efeito menos aterogênico do que os ácidos graxos saturados Colesterol (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2013; COSTA, 2014; SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) “Os estudos revisado são heterogêneos e tem fraco rigor metodológico para respaldar qualquer conclusão sobre os efeitos do colesterol dietético no RCV”. • Importante forma de armazenamento energético • Depositados no tecido adiposo e muscular • A concentração plasmática de TG é muito sensível a variações do peso corporal e a alterações na composição da dieta • Quando em excesso: – Gordura ectópica Doença Hepática Gordurosa Não Alcoólica (DHGNA), esteatose hepática – Pancreatite – Aterosclerose Triglicerídeos Xantelasma (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) GORDURAS vs CARBOIDRATOS SIMPLES DISLIPIDEMIA Desde as décadas de 1960 -1970 se sabia da relação dos açúcares (sacarose) com as DCV Industria açucareira pagou 3 cientistas de Harvard para que a justificativa pelo aumento das DCV fosse relacionada só à gordura - 1º Dietary Guidelines for Americans (1980) Há muitas evidências de que o consumo dos açúcares de adição pode estar associado ao aumento no risco de várias doenças, em especial de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (SCAPIN, 2016) Associação positiva significativa entre o consumo de refrigerante e o risco de desenvolvimento de DCV Associação positiva significativa entre o consumo elevado de açúcares e o aumento na concentração de TG, CT e HDL, bem como na PA, marcadores para o risco de desenvolvimento das doenças cardiovasculares Funções que contribuem para a proteção do leito vascular contra a aterogênese: Remoção de lípides oxidados de LDL Inibição da fixação de moléculas de adesão e monócitos ao endotélio Estimulação da liberação de óxido nítrico Acúmulo plasmático de QM e/ou VLDL HIPERTRIGLICERIDEMIA Acúmulo LDL HIPERCOLESTEROLEMIA (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) http://departamentos.cardiol.br/sbc-da/2015/CALCULADORAER2017/index.html Classificação de risco: ESCORE DE RISCO GLOBAL VALORES DE REFERÊNCIA Indivíduos que apresentem doença aterosclerótica significativa (coronária, cerebrovascular, vascular periférica), com ou sem eventos clínicos, ou obstrução ≥ 50 % em qualquer território arterial • DCV = assintomática • Prevenção! • Pacientes sem uso de estatinas ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO CARDIOVASCULAR – ESCORE DE RISCO GLOBAL (ERG) Risco de IAM, AVC, IC, Insuficiência vascular periférica em 10 anos! 1) RISCO MUITO ALTO (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) Indivíduos em prevenção primária: Portadores de aterosclerose subclínica: presença de placas em carótidas; Índice Tornolezo-Braquial < 0,9; Escore de Cálcio Arterial Coronariano (CAC) > 100 ou presença de placas ateroscleróticas em coronárias. Aneurisma de aorta abdominal Doença renal crôica (TFG < 60 mL/min e em fase não dialítica) LDL-c ≥ 190 mg/dL DM 1 ou 2, e com LDL-c entre 70 e 189 e presença de estratificadores de risco ou doença aterosclerótica subclínica 2) ALTO RISCO • Idade ≥ 48 anos (M) ou 54 anos(F) • Tempo de diagnóstico de DM > 10 anos • História familiar de DCV • Tabagismo • HAS, Síndrome Metabólica, albuminúria (> 30 mg/g; retinopatia; TGF < 60 mL/min (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) Indivíduos com ERG entre 5 a 20 % no sexo masculino e 5 a 10 % no sexo feminino ou ainda diabéticos sem os critérios de DASC ou ER listados anteriormente 3) RISCO INTERMEDIÁRIO Pacientes com risco em 10 anos < 5 % calculado pelo ERG 4) BAIXO RISCO (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) CRIANÇAS E ADOLESCENTES D is lip id em ia s Primárias Alteração genética Secundárias - Uso de medicamento -Hábitos inadequados - Outras doenças • Deficiência de receptores de LDL • Alteração na síntese de apoproteínas Classificação das dislipidemias - etiologia (RAYMOND; COUCH, 2012; COSTA, 2014; GROSSMAN; PORTH, 2016) Ingestão de alto valor calórico Obesidade Diabetes Mellito (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) Classificação das dislipidemias – tipo Hipercolesterolemia Isolada Aumento isolado do LDL-colesterol (LDL-c ≥ 160 mg/dL) Hipertrigliceridemia isolada Aumento isolado dos triglicérides (TG) (TG ≥ 150 mg/dL) Hiperlipidemia mista Aumento do LDL-c e dos TG HDL-c baixo HDL-c baixo isolado ou associado com aumento do LDL-c ou TG (RAYMOND; COUCH, 2012; COSTA, 2014; GROSSMAN; PORTH, 2016) Terapia Nutricional (Redução do Peso) Tratamento Atividade Física Cessação do tabagismo Farmacológico (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) Tratamento Farmacológico Classes de medicamentos utilizados nas hiperlipidemias: estatinas, ezetimiba, colestiramina, fibratos, ácido nicotinico e omega-3 (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2017) COSTA, R. P. Doenças Cardiovasculares. In: CUPPARI, L. Nutrição: clinica no adulto. Barueri, SP: Editora Manole. 2014. cap. 16, p. 385-412. Faludi AA, Izar MCO, Saraiva JFK, Chacra APM, Bianco HT, Afiune Neto A et al. Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017. Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 . GROSSMAN, S.; PORTH, C. M. Fisiopatologia. 9. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. RAYMOND, J.; COUCH, S. Tratamento nutricional clínico da doença cardiovascular. In: Krause – Alimentos, nutrição e dietoterapia. 2012. 13 ed. cap. 34, p. 742-781. ROSS, A. C. et al. Nutrição moderna de Shils na saúde e na doença. – 11. ed. – Barueri, SP : Manole, 2016. SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. I Diretriz sobre o Consumo De Gorduras e Saúde Cardiovascular. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 100, n. 1, 2013.SCAPIN, T. Notificação dos açúcares de adição em rótulos de alimentos industrializados comercializados no Brasil. Florianópolis, 2016. 175p. Dissertação (Mestrado em Nutrição) – Programa de Pós-graduação em Nutrição, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2016. Xavier H. T., et al. Sociedade Brasileira de Cardiologia. V Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose. Arq Bras Cardiol 2013. Referências Ovo Agora essa. Descobriram que ovo, afinal, não faz mal. Durante anos, nos aterrorizaram. Ovos eram bombas de colesterol. Não eram apenas desaconselháveis, eram mortais. Você podia calcular em dias o tempo de vida perdido cada vez que comia uma gema. Cardíacos deviam desviar o olhar se um ovo fosse servido num prato vizinho: ver ovo fazia mal. E agora estão dizendo que foi tudo um engano, o ovo é inofensivo. O ovo é incapaz de matar uma mosca. Sei não, mas me devem algum tipo de indenização. Não se renuncia a pouca coisa quando se renuncia ao ovo frito. Dizem que a única coisa melhor do que ovo frito é sexo. A comparação é difícil. Não existe nada no sexo comparável a uma gema deixada intacta em cima do arroz depois que a clara foi comida, esperando o momento de prazer supremo quando o garfo romperá a fina membrana que a separa do êxtase e ela se desmanchará, sim, se desmanchará, e o líquido quente e viscoso escorrerá e se espalhará pelo arroz como as gazelas douradas entre os lírios de Gileade nos cantares de Salomão, sim, e você levará o arroz à boca e o saboreará até o último grão molhado, sim, e depois ainda limpará o prato com pão. Ou existe e eu é que tenho andado na turma errada. O fato é que quero ser ressarcido de todos os ovos fritos que não comi nestes anos de medo inútil. E os ovos mexidos, e os ovos quentes, e as omeletes babadas, e os toucinhos do céu, e, meu Deus, os fios de ovos. Os fios de ovos que não comi para não morrer dariam várias voltas no globo. Quem os trará de volta? E pensar que cheguei a experimentar ovo artificial, uma pálida paródia de ovo que, esta sim, deve ter me roubado algumas horas de vida a cada garfada infeliz. Ovo frito na manteiga! O rendado marrom das bordas tostadas da clara, o amarelo provençal da gema... Eu sei, eu sei. Manteiga ainda não foi liberada. Mas é só uma questão de tempo. Luis Fernando Verissimo
Compartilhar