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Do ISOP à ABOP
A história da Orientação Profissional reflete as definições que ela pode assumir, bem como as diferentes teorias e métodos dos quais se utiliza. Para tanto, deve-se considerar que 3 (três) perspectivas são relevantes na Orientação Profissional brasileira: a psicométrica, a clínica e a psicossocial.
A Orientação Profissional no Brasil
A aplicação da Psicologia às relações de trabalho aparece no Brasil na década de 20 principalmente em razão da regulamentação dos cursos destinados à profissionalização para o comércio, indústria e agricultura. Do ponto de vista prático, a primeira experiência de aplicação sistemática da psicologia à organização do trabalho ocorreu em 1924, no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, que consistiu na seleção de alunos para o Curso de Mecânica Prática da referida escola. A esta experiência, muitas outras se seguiram das quais cabe destacar as relativas às empresas ferroviárias: em 1930, foi criado o Curso de Ferroviários de Sorocaba e o Serviço de Ensino e Seleção Profissional da Estrada de Ferro Sorocabana. 
A partir de então, a aplicação da Psicologia ao trabalho teve acelerado desenvolvimento, expandindo-se para um grande número de empresas (Antunes, 1991). O cenário político-econômico brasileiro era composto pelo governo ditatorial de Getúlio Vargas (1930-1945) e pela mudança de um modelo de economia agrário-exportadora para uma economia urbano-industrial.
O governo do General Dutra (1946-1950), por sua vez, foi marcado pela ideologia liberal, pela criação da CLT (1943), e pela mudança na Constituição Federal com relação à Educação (1946), que passou a dar grande ênfase à cultura e à educação. 
Se até então a preocupação da Educação era o preparo das elites, na década de 40 passava a ser o atendimento aos contingentes que se formavam nos centros urbanos. A defesa da educação como direito de todos teve sua contrapartida na hipótese de que as pessoas não eram igualmente dotadas pela natureza para usufruírem a oportunidade que o Estado lhes dava e, para justificar essa conclusão, os testes psicológicos, e seu caráter científico, foram amplamente usados. Neste clima social, foi criado o Instituto de Seleção e Orientação Profissional (ISOP) da Fundação Getúlio Vargas (Goulart, 1985). 
Criação do ISOP
O ISOP foi criado em 1947 com o objetivo básico de contribuir para o ajustamento entre o trabalhador e o trabalho, mediante estudo científico das aptidões e vocações do primeiro, e dos requisitos psicofisiológicos do segundo. 
O ISOP desenvolveu nos dez primeiros anos de seu funcionamento, um trabalho voltado principalmente para a implantação de técnicas de seleção e orientação profissional, dando atendimento à classe média alta, numa tentativa de orientação da futura elite dirigente. Esse instituto também foi responsável pela formação dos primeiros especialistas na área da Psicologia. 
A OP nos anos 40
A finalidade da Orientação Profissional, nesse período, incorporava-se ao ideal de organização e racionalização do trabalho da época, com vistas a uma maior produtividade – orientada segundo o pensamento do homem certo no lugar certo. 
Os testes vocacionais tinham a finalidade de orientar profissionalmente os jovens para uma escolha coerente com suas aptidões, mas principalmente com vistas à maior eficiência do processo produtivo. 
A OP configurava-se como uma modalidade estritamente psicométrica.
A OP direcionava os indivíduos para diferentes profissões pelas suas capacidades, sem considerar as diferentes condições de classe ou a história de vida do sujeito. 
A OP nos anos 60
A metodologia de diagnosticar e aconselhar utilizando como instrumentos os testes psicológicos estava sendo substituída pelo auxílio ao autoconhecimento, influência de Rogers nos Estados Unidos, e à focalização de aspectos inconscientes, influência da psicanálise na França. 
No Brasil, a Psicologia Clínica só tinha valor de conhecimento científico quando conjugada aos estudos experimentais.
A revista Arquivos Brasileiros de Psicotécnica foi, nos anos 50 e 60, o principal instrumento de divulgação dos trabalhos de Orientação Profissional, em sua maior parte baseados na Psicometria. 
A OP passa a atuar na análise das profissões e a caracterização dos atributos individuais, acrescentando em seguida que a estes elementos os especialistas estavam juntando outro: o gosto ou preferência pessoal por uma espécie de trabalho e pelas relações pessoais que o tipo de trabalho engendra.
Nos cursos de Psicologia no Brasil, após a regulamentação da profissão em 1962, predominava a perspectiva técnica e observava-se uma significativa influência da perspectiva positivista. A regulamentação coloca os testes psicológicos como de uso exclusivo do psicólogo, exceto os Inventários de Interesse, que podem ser aplicados, até hoje, pelos pedagogos.
Sob a orientação de Pierre Weil e Célio Garcia, entre outros, foram promovidas experiências de Desenvolvimento em Relações Humanas que incentivavam a autonomia e a abertura em uma atmosfera democrática; destaca-se a adoção de uma abordagem psicossociológica à conduta dos indivíduos em grupo. 
A OP nos anos 70
Os anos 70, no Brasil, representaram os anos de ditadura, e contaram com a reserva do povo que, acostumado ao sistema repressivo, evitava as manifestações públicas. 
A padronização de testes, dentre outros tipos de estudos experimentais de Orientação Profissional que constituíam a quase totalidade dos artigos publicados na época, foi substituída pelas publicações de Informação Ocupacional (IO): descrições de diferentes ocupações e profissões de nível técnico e universitário.
Cria-se o Centro de Informação e Pesquisa Ocupacional (CIPO).
Em 1973, é regulamentada a profissão de Orientador Educacional em uma habilitação da Pedagogia, com as seguintes atribuições privativas do pedagogo: coordenar a orientação profissional do educando; coordenar o processo de sondagem de interesses, aptidões e habilidades do educando; coordenar o processo de informação educacional e profissional com vistas à Orientação Vocacional.
Os psicólogos, então, buscaram uma maneira não-diretiva de orientar que se fundamentava pela fenomenologia e pela estratégia clínica proposta por Bohoslavsky.
Exemplo: Carvalho defendeu sua tese de doutorado sobre Orientação Profissional em grupo em 1979. O processo de Orientação Profissional em dinâmica de grupo que ela desenvolveu consta de 5 sessões de 3 horas de duração cada uma, e tem por objetivo ensinar a escolher e possibilitar a decisão por meio dos fatores básicos para uma boa escolha profissional: autoconhecimento, informação ocupacional e mercado de trabalho.
A OP nos anos 80
A Psicologia, no início dos anos 80, buscava se redefinir e as práticas de Orientação Profissional também. O momento de transição do regime militar para uma democracia estava favorecendo esse questionamento.
Bosi (1982), por exemplo, incentivava a saída da Psicologia dos consultórios e o contato dos alunos de Psicologia com a educação popular, isto é, com as escolas públicas.
Os ensaios publicados nos periódicos de Psicologia da época questionavam os determinantes e a liberdade de escolha profissional e as pesquisas tinham a preocupação de validar e adaptar os testes vocacionais para o contexto brasileiro.
Nos anos 80, o termo vocacional era usado preferencialmente, pois remetia à dimensão clínica da Orientação Profissional. 
Houve mudanças também no ISOP, ou seja, no principal centro de produção e aplicação da Orientação Profissional. Em 1981, ele deixou de ser Instituto de Seleção e Orientação Profissional e passou a ser denominado Instituto Superior de Estudos e Pesquisas Psicossociais.
Os debates giravam em torno das finalidades e objetivos da Informação Ocupacional e sobre o processo de Informação Ocupacional nos (antigos) primeiro, segundo e terceiro graus. Eram questionadas as formas de comunicação da informação e também quais seriam os profissionais responsáveis pelo trabalho de Informação Ocupacional: comunicadores sociaisou psicólogos 
A Orientação Profissional em grupo também era objeto de estudo nesse período.
Em 1983, Soares apresentou, em sua dissertação de mestrado em Educação, na Universidade Federal de Santa Catarina, um processo de Orientação Profissional estruturado para realizar-se em sete encontros de aproximadamente duas horas, com grupo de oito pessoas, um coordenador e um observador participante. Com o objetivo de facilitar a escolha, a autora compreende que devem ser trabalhados o conhecimento de si mesmo, o conhecimento das profissões e a escolha propriamente dita que implica decisão pessoal e viabilização da escolha.
A OP nos anos 90
O cenário do mundo do trabalho, no final do século XX, é marcado pela ruptura com o paradigma industrial e tecnológico, pelo advento da microeletrônica, pelo avanço das telecomunicações e pelo incremento da automação.As problemáticas da escolha profissional, o dilema da escolha profissional e a identidade profissional são categorias centrais nos estudos sobre Orientação Profissional.
Em 1990, o ISOP foi extinto e, a partir de então, a produção científica deixou de estar concentrada nos Arquivos Brasileiros de Psicologia.
A criação, em 1993, da Associação Brasileira de Orientação Profissional (ABOP) foi um marco histórico importante para a Orientação Profissional, já que esta associação objetiva consolidar um espaço onde exista a possibilidade de construção da identidade do orientador profissional, bem como representa a possibilidade de organização da categoria e a definição de políticas para este campo de atividades em nosso país. 
A ABOP organizou e lançou, em 1997, o primeiro número da Revista da ABOP, atualmente denominada Revista Brasileira de Orientação Profissional, e até hoje vem contribuindo para que a produção de novos trabalhos em Orientação Profissional torne-se novamente expressiva.
No início do século XX, as publicações sobre esta área estavam concentradas nos Arquivos Brasileiros de Psicotécnica, sob a responsabilidade do ISOP. Atualmente, podemos dizer que a ABOP é o novo centro organizador e promotor da Orientação Profissional no Brasil.
As publicações da década de 90 revelam que não existe um único referencial teórico e metodológico no qual se baseia a Orientação Profissional, mas é possível reconhecer que a Psicologia oferece importantes referenciais e que predominam, ainda, as perspectivas clínica e psicométrica. Mas a Orientação Profissional não pode prescindir de um referencial psicossocial, ou seja, mais que considerar a relevância dos fatores sociais no processo de escolha, é importante que o orientador baseie sua prática em referenciais teórico-metodológicos psicossociais.
EM RESUMO ...
A Orientação Vocacional no mundo
O surgimento da Orientação Vocacional no início do século XX deu-se como prática ligada ao aumento da eficiência industrial. 
Marcos históricos importantes: 
Anos de 1907/1909 – Criação do Vocational Bureau of Boston; 
Décadas de 1920 e 1930 – forte influência da Psicometria e da Psicologia Diferencial sobre a Orientação Vocacional; 
Década de 1940 – influência de Carl Rogers na forma de condução de processos de Orientação Vocacional; 
Década de 1950 – surgimento da Teoria do Desenvolvimento Vocacional de Super e da Teoria Tipológica de Holland; 
Décadas de 1940 e 1950 – influência de teorias psicodinâmicas na Orientação Vocacional.
A Orientação Vocacional no Brasil
Década de 1920 - o surgimento do Serviço de Seleção e Orientação Profissional para alunos do Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo; 
Ano de 1947 – criação do ISOP (Instituto de Seleção e Orientação Profissional) da Fundação Getúlio Vargas no Rio de Janeiro; 
Ano de 1962 – a regulamentação da profissão de psicólogo no Brasil; 
Décadas de 1960, 1970 e 1980 – forte influência da Estratégia Clínica do psicólogo argentino Rodolfo Bohoslavsky; 
Década de 1990 – extinção do ISOP em 1990; criação em 1993 da ABOP (Associação Brasileira de Orientadores Profissionais) para unificação e desenvolvimento da Orientação Profissional no Brasil; criação da Revista Brasileira de Orientação Profissional, ligada à ABOP.
Desenvolvimento atual: a força da Estratégia Clínica; novos modelos teóricos: Abordagem Integrada em Orientação Profissional de Lassance; Metodologia de Ativação da Aprendizagem de Hissa e Pinheiro; Paradigma Ecológico em Orientação Profissional de Sarriera; Abordagem Sócio-Histórica de Silvio Bock.
ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL NA PÓS-MODERNIDADE
 A Orientação Profissional passou por 4 estágios teórico-práticos, segundo Oswaldo de Barros Santos:
1-Informativo: oferta de informações sobre as profissões, suas perspectivas e exigências;
2- Psicométrico: não atribuía tanta importância à realidade de mercado, e sim às características pessoais para o sucesso em determinado campo profissional;
3-Clínico: enfatizava o papel ativo do indivíduo, atribuindo-lhe potencial e recursos para a autocompreensão e autodireção, sendo que o papel do orientador era facilitar o reconhecimento e o desenvolvimento desse processo;
4-Político e Social: incluía como fator relevante o contexto sociopolítico do processo de escolha profissional, considerando configurações sociais passadas, presentes e futuras.
Essas etapas apresentavam aspectos afins: em todas elas, Orientação Profissional é considerada como “o processo pelo qual o indivíduo é ajudado a escolher e a se preparar para ingressar e progredir em uma ocupação”.
Ou seja, o processo visava a harmonizar a inclusão do indivíduo no mercado de trabalho e a favorecer um desenvolvimento profissional em etapas previsíveis e sequenciais.
A partir dos anos 90, novos paradigmas e novos contextos se impõem devido à nova realidade de contínua ruptura e imprevisibilidade. Agora, a OP passa por um novo estágio: a Era de Kairós, na mitologia grega, significa tempo descontínuo, não linear e imprevisível (onde os eventos ocorrem de maneira pouco previsível). Contrapõe-se à época da Administração Científica (época de Chronos, que significa tempo linear, contínuo e previsível, onde os eventos ocorrem em linha sucessória).
Estamos vivendo agora uma 5ª etapa, a Era de Kairós, onde descortina-se um campo mais amplo e complexo, e introduz-se uma realidade que, na prática, aumenta as dificuldades da OP: a reorganização da sociedade atrelada às novas relações de trabalho (baseadas no modelo de qualificação da mão-de-obra), tem feito surgir novos espaços de intervenção, de reflexão e de trabalho para a OP.
Mudanças de Paradigma
O espaço de trabalho da OP não se atém mais a apenas um momento da vida (jovens no final do ensino médio). Atualmente, é necessário orientar adultos empregados, desempregados, aposentados, entre outros. A transformação do mercado de trabalho e das organizações (downsizing, foco no cliente e na qualidade, etc), a globalização, a inovação tecnológica, e o acesso facilitado à informação em escala mundial, são alguns dos novos desafios à OP moderna. 
O papel que o orientador profissional desempenha é o de resgatar o indivíduo das tendências de valor de uso (vínculo alienado) dando sentido à relação do indivíduo com seu trabalho, assim como o de lhe devolver as atividades que produzem efeitos sobre o mundo (modificações da natureza, objetos novos, produtos culturais, relações sociais, etc), e que são seguidas por um reconhecimento próprio.
É necessário enfatizar o sentido dos vínculos construtivos para si e para os demais, de modo que o indivíduo se sinta criando, preparando e reconhecendo melhor a realidade e os outros seres humanos.
Por fim, cabe ao orientador, nesse novo papel, auxiliar no desenvolvimento de uma identidade interiorizada (capacidade de pensar de modo coeso e em um continuum temporal). 
Como essa ideologia afeta a OP?
É preciso desenvolver novas estratégias que não surjam como modelos estáticos, mas que se reelaborem e se rearticulem a todo o momento com as demandas e as realidades que se apresentam.
A OP deve dar maior ênfase não à teoria ou à técnica, mas à busca do desenvolvimentode aportes diferenciados, adequados a populações específicas, revelando modos mais sensíveis de abordar o problema da escolha profissional, e subordinando-a ao diagnóstico que aponte qual teoria e qual técnica seriam mais relevantes no trabalho com essa ou aquela situação.