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Olá operadores do Direito! Em primeiro lugar, você, caro aluno, merece nossos cumprimentos. Afinal, graças à sua excelente peça elaborada na Seção anterior, o Tribunal de Justiça, de maneira unânime, concedeu a ordem de Habeas Corpus por você impetrada em favor de Gabriel Matos, concedendo-lhe a liberdade provisória, com a da decretação da medida cautelar de monitoramento eletrônico, através do uso de tornozeleira. Graças à sua competência, Gabriel poderá retomar sua vida durante o andamento do processo. Por falar no processo, já temos novidades. Após concluídas as investigações e elaborado o relatório conclusivo pela Autoridade Policial competente, os autos do inquérito foram remetidos ao Ministério Público que, dentro do prazo legal, ofereceu denúncia em face de Gabriel, nos seguintes termos: “Exmo. Sr. Juiz de Direito da __ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Rondonópolis/MT O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MATO GROSSO/MT, por meio de seu Órgão de Execução infra-assinado, vem perante Vossa Excelência, com fulcro no art. 129, inciso I da Constituição Federal, c/c art. 41 do Código de Processo Penal, e com base no incluso Inquérito Policial, oferecer DENÚNCIA em desfavor de GABRIEL MATOS, (nacionalidade), (estado civil), (profissão), (naturalidade), (data de nascimento), (número de identidade e cpf), residente e domiciliado à (endereço), pela prática do fato delituoso a seguir exposto: No dia 03 de março de 2018, por volta das 20h00min, no bar Mendes, situado na Avenida Amazonas n.º 310, nesta Comarca, o denunciado ameaçou causar mal injusto e grave contra Maria, sua esposa e companheira há 12 (doze) anos. Isso porque, conforme consta dos autos de investigação em anexo, na data e local dos fatos, o denunciado teria encontrado sua esposa acompanhada de um sujeito desconhecido. Questionada sobre sua identidade, a vítima revelou ao denunciado que seria Marcos, sujeito com o qual mantinha um relacionamento extraconjungal há 8 (oito) meses. Ainda, a vítima também revelou ao acusado que desejava se separar. Surpreendido com tais revelações, o denunciado disse em alto e bom tom que “jamais aceitaria a separação”, causando à vítima fundado temor de mal injusto e grave, afinal, segundo informações repassadas pela própria vít ima aos policiais, o denunciado estaria bastante irritado com toda aquela situação (termos de depoimentos de fls. 07/09). Após a ameaça, o acusado evadiu o local. Entretanto, por volta das 23h00min do mesmo dia, a vítima, acompanhada por Policiais Militares, encontraram o acusado quando ele se encontrava em sua residência. E, neste momento, foi imediatamente autuado em flagrante. Deste modo, constatada a presença de mal injusto e grave à vítima, não restam dúvidas de que o denunciado praticou o crime de ameaça. Ante o exposto, está o denunciado Gabriel Matos como incurso nas iras do artigo 147, “caput” do Código Penal, pelo que requer o Ministério Público seja recebida a presente denúncia, com a consequente citação do réu para apresentar defesa no prazo legal, designando-se em seguida audiência de instrução, para que ao final seja condenado pela prática do crime de ameaça. Apresenta-se o competente rol de testemunhas, requerendo sua intimação para oitiva em juízo: 1- Maria (vítima), endereço 2- Jorge Márcio (testemunha), endereço 3- Policial Militar 01 (condutor do flagrante), endereço 4- Policial Militar 02 (participante do flagrante), endereço (LOCAL), (DATA) NOME DO PROMOTOR PROMOTOR DE JUSTIÇA” Ao ser pessoalmente citado por Oficial de Justiça, Gabriel faz contato imediato com o seu escritório. Visando elaborar a defesa, você faz carga do processo no Fórum. Ao analisar o processo, entretanto, constata que o inquérito policial que instrui a presente denúncia é composto, tão somente, do auto de prisão em flagrante, com os depoimentos dos envolvido. Nada além disso. Considerando o caso prático a você submetido, e uma vez tendo sido Gabriel citado do recebimento de denúncia em seu desfavor, cabe a você, caro aluno, traçar a estratégia defensiva que melhor couber ao seu cliente. ADVOGADO: Qual a peça defensiva a ser elaborada? Quais as teses a serem arguidas? Considerando que Gabriel foi citado em 02 de abril de 2018, date sua peça com o último dia do prazo. Primeiramente, antes de relembrarmos as aulas de processo penal, devemos nos atentar ao fato de que o presente caso se trata de suposto crime de ameaça praticado em ambiente familiar, com pena cominada de 1 (um) a 6 (seis) meses. Em razão disso, apesar de a pena não ser superior a 2 (dois) anos, deverá ser aplicado ao caso a Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) e não a Lei 9.099/95 (Juizados Especiais). Afinal, o artigo 41 do primeiro dispositivo legal mencionado dispõe que não será aplicada a Lei dos Juizados Especiais aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista. E, não se aplicando os dispositivos legais previstos na Lei 9.099/95, necessário se faz a aplicação do Código de Processo Penal. Assim sendo, retomando às aulas de processo penal, sabemos que a citação é o ato processual que tem por finalidade o chamamento do réu ao processo, para tomar conhecimento do teor da acusação, bem como para oportunizar, desde já, o pleno exercício da garantia constitucional da ampla defesa, nos termos do artigo 5º, LV da CR/88. Já o CPP, nos artigos 396 e 396-A do CPP (procedimento ordinário), prevê: Art. 396. Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias; Art. 396-A. Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa , oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. Como já é sabido, embora exista a preocupação de não se antecipar as teses defensivas de mérito, que fatalmente serão debatidas após a fase de instrução sob pena de se prejudicar o réu, como nosso foco neste projeto é exclusivamente acadêmico, direcionado integralmente à preparação para o Exame da OAB, seremos fiéis ao texto legal. Assim, você, enquanto advogado(a) contratado(a) para defender os interesses de Gabriel, deve desde já alegar todas as teses que possam de alguma forma beneficiar seu cliente. Afinal, nosso objetivo aqui é treiná-lo da forma mais eficaz possível. Como em qualquer outra peça, é fundamental o cuidado com sua estrutura lógica, composta de narração dos fatos, fundamentos jurídicos (questões preliminares e teses de mérito), requerimento de provas a serem produzidas (em especial, rol de testemunhas) e pedidos. Assim, antes de analisar as possíveis teses de mérito, deve-se analisar a existência de questões processuais que deverão ser arguidas em sede preliminar. Para isso, é preciso, em primeiro lugar, estar atento às regras de competência, para saber se a ação foi proposta perante o Juízo correto. Para tanto, deve-se observar o que diz nossa Constituição Federal no art. 5º, incisos XXXVII e XXXVIII, além do previsto no Código de Processo Penal em seus artigos 69 a 91 (em especial o art. 74) e 394. Em seguida, deve-se analisar a necessidade de arguir alguma das exceções previstas no Código de Processo Penal. Para isso, cumpre a verificação do disposto nosartigos 95 a 111 do CPP. Logo após, é necessária a análise da existência de alguma nulidade ocorrida em todo o procedimento até então realizado, nos termos dos artigos 563 a 573 do CPP. Esgotadas as questões preliminares (processuais), passa-se à análise das teses de mérito, que são aquelas que se referem ao fato supostamente criminoso imputado ao réu. Nos crimes de procedimento ordinário e sumário, a arguição destas teses neste momento processual é fundamental, devido à possibilidade de absolvição sumária do réu, caso algumas das hipóteses do artigo 397 do CPP esteja presente: Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou IV - extinta a punibilidade do agente. Além destas, por se tratar de preparação para o Exame da OAB e considerando que o artigo 396-A do CPP fala expressamente em “alegar tudo o que interesse a sua defesa”, você deverá qualquer outra tese de mérito que vier a beneficiar sua cliente. Para tanto, deve-se analisar se o fato existiu; se a classificação do crime está correta; se existem provas de autoria e materialidade, dentre outras questões. No caso em questão, Gabriel foi denunciado pela suposta prática do delito previsto no art. 147, caput, do Código Penal: Art. 147 - Ameaçar alguém por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico de causar-lhe mal injusto e grave: Pena - detenção de um a seis meses ou multa. Desta forma, tratando-se de imputação de crime contra a liberdade individual, mais especificadamente o crime de ameaça, torna-se indispensável que você, caro Advogado, faça uma análise detalhada do crime imputado ao seu cliente. De acordo com Guilherme Nucci, ameaçar significa procurar intimidar alguém, anunciando-lhe a ocorrência de mal futuro, ainda que próximo. Ainda, segundo o autor, requer a lei que haja o anúncio de mal injusto (ilícito ou até mesmo imoral) e grave (sério, verossímil e com capacidade de gerar temor).1 Portanto, não sendo injusto e grave, a conduta do agente seria atípica. 1 NUCCI, Guilherme de Souza, Manual de Direito Penal, 12 ed, p. 676, 2016, Editora Forense, São Paulo. Ressalte-se, ainda, que é necessário a presença do dolo específico que, no presente caso, revela-se na vontade do autor do delito em incutir medo à vítima, ou seja, intimidá-la. Por sua vez, a forma culposa não é admitida em nosso ordenamento jurídico. Por fim, vale ressaltar que a atual doutrina possui o entendimento de que para configurar o tipo penal de ameaça é necessário que se verifique a seriedade e idoneidade, motivo pelo qual é comum encontrarmos decisões judiciais apontando pela não configuração da ameaça quando esta é produto de ato impensado, de revolta, ira ou até mesmo quando o agente se encontra em estado de embriaguez. Em relação as provas, não podemos esquecer de requerer a produção de todas as provas em direito admitidas e aplicáveis ao caso (testemunhal, pericial, documental, etc.). Nos termos dos artigos 396-A do CPP, o arrolamento das testemunhas é obrigatório deste ato, sob pena de preclusão. Por fim, com relação aos pedidos, deve-se atentar para que todas as teses arguidas ao longo da peça tenham seu respectivo pedido, sob pena de inépcia da mesma. No tocante à data da peça, vale analisar o disposto no art. 798 do CPP. Observe o quadro a seguir com uma síntese dos fundamentos legais: Quadro Síntese Resposta à Acusação no Procedimento Comum Arts. 396 e 396-A do CPP. Competência Art. 5º, incisos XXXVII e XXXVIII da CF/88 e arts. 69 a 91 e 394 do CPP Exceções Arts. 95 a 111 do CPP Nulidades Arts. 563 a 573 do CPP. Hipóteses de Absolvição Sumária no Procedimento Comum Art. 397 do CPP. Crime de Ameaça Art. 147 do CP. Fonte: elaborado pelo autor. Com todos os elementos fornecidos, vocês agora já estão aptos a elaborar a resposta à acusação adequada à defesa de Gabriel? Mãos à obra! Você já sabe que qualquer peça começa pelo endereçamento, que, obviamente, não pode estar errado. Conforme dito anteriormente, devemos nos atentar aqui às regras de competência. Deste modo, sugere-se analisar a Constituição Federal no art. 5º, incisos XXXVII e XXXVIII, bem como o Código de Processo Penal em seus artigos 69 a 91 (em especial o art. 74) e 394. Como em qualquer outra peça, é fundamental o cuidado com sua estrutura lógica, composta de narração dos fatos, fundamentos jurídicos (questões preliminares e teses de mérito), requerimento de provas a ser produzidas (em especial, rol de testemunhas) e pedidos. Sobre as provas, não se pode esquecer de requerer a produção de todas as provas em direito admitidas e aplicáveis ao caso (testemunhal, pericial, documental, etc.). Além disso, o rol de testemunhas é obrigatório, sob pena de preclusão. Com relação aos pedidos, deve-se atentar para que todas as teses arguidas ao longo da peça tenham seu respectivo pedido. Lembre-se de que no “Exame de Ordem” você será avaliado pela correta indicação do foro competente, preâmbulo, qualificação das partes, fundamentação jurídica, pedidos e requerimentos, lógica e argumentação, além de ortografia e gramática. E jamais assine a peça na hipótese de provas públicas, ok? Vamos peticionar?
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