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AULA 1 TRANSPLANTE DE CÉLULAS- TRONCO HEMATOPOIÉTICAS Prof. Cristiano Caveião 2 TEMA 1 – HISTÓRICO DO TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO HEMATOPOIÉTICAS A história do Transplante de Medula Óssea (TMO) iniciou-se com o reconhecimento de que o baço salvava animais da irradiação letal. Acreditava-se que a infusão de células-tronco ou as células do baço poderiam impedir óbito por aplasia após irradiação, dessa forma surgiu o conceito de que as células-tronco hematopoiéticas são transplantáveis. Atualmente, a terminologia passou a ser definida como Transplante de Células-Tronco Hematopoiéticas (TCTH), sendo este termo que será utilizado ao longo deste texto. A realização da primeira tentativa de transplante de células-tronco hematopoiéticas em humanos ocorreu em 1939 para o tratamento de um paciente com anemia aplástica induzida por sais de puro, utilizando um doador irmão ABO compatível. Porém, esse transplante não foi bem-sucedido e, após diversas tentativas infrutíferas, os pesquisadores pararam de investir nessa área, pois as dificuldades pareciam ser insuperáveis na época. Existem alguns profissionais no mundo e no Brasil que são considerados pioneiros no transplante de células-tronco hematopoiéticas, são eles: Dirk Van Bekkum, Edward Donnall Thomas, Georges Methé, Jean Dousset, Julio Cesar Voltarelli, Jon Van Rood e Ricardo Pasquini. Cada um apresentou uma contribuição para o desenvolvimento das pesquisas nesta área, para que o serviço evoluísse. Alguns dos importantes destaques são Georges Methé, que, na década de 1950, utilizou os animais como os primeiros modelos de transplante de células- tronco hematopoiéticas. Em 1958, ocorreu um acidente nuclear e os cientistas sofreram irradiação; nesse grupo, foram aplicadas células-tronco hematopoiéticas. Os casos obtiveram sucesso entre humanos que não eram gêmeos idênticos. Também em 1963, o cientista observou que o transplante de células-tronco hematopoiéticas em uma criança com leucemia aguda provocou mudança do grupo sanguíneo e descobriu com esse caso a recidiva da doença. Ainda, seus estudos fortaleceram o descobrimento de doenças secundárias após o TCTH. Na época, os pesquisadores tinham algumas indagações: 1) Como destruir a medula do receptor?; 2) Como infundir as células do doador no receptor para que estas cheguem até a medula para poder ser proliferar e originar um novo 3 tecido que possa produzir nova linhagem hematopoiética?; 3) Como fazer o receptor não rejeitar a medula? Essas indagações foram respondidas ao longo do tempo com os estudos realizados. Já Edward Donnall Thomas realizou, em 1956, o TCTH em gêmeas idênticas, em 1969, entre indivíduos com compatibilidade imunológica e, em 1970, publicou o primeiro artigo relatando vários casos de TCTH em pacientes com leucemias avançadas. Ao final de década de 1960, ele identificou e compreendeu a contribuição do sistema HLA (Human Leukocytes Antigens), ou seja, a histocompatibilidade, que está codificada no cromossomo 6, colaborando, dessa forma, para o avanço do TCTH. Os seus estudos contribuíram para o aumento da taxa de sobrevivência, após transplante, nos casos de leucemia e linfoma, sendo a taxa estimada de zero para mais de 90%. Ele recebeu o Prêmio Nobel em Fisiologia e Medicina. Dirk Van Bekkum entre as décadas de 1950 e 1960, descobriu a doença secundária após o TCHT, que hoje é denominada como doença do enxerto contra o hospedeiro. Ainda, descobriu que o efeito de cura com o TCTH estava relacionado com à pega das células-tronco hematopoiética e não por fatores humorais. Portanto, as décadas de 1950 e 1960 foram marcadas por frustações e desapontamentos. A maior incidência para a realização dos TCTH era em pacientes de fase terminal, que não tinham sobrevida suficiente para a avaliação da eficácia do enxerto. E os enxertos que apresentavam sucesso comumente apresentavam a reação do enxerto contra o hospedeiro ou septicemia de difícil controle, o que transgredia para a alta mortalidade após o procedimento. No Brasil, no município de Curitiba – PR, no ano de 1979, Ricardo Pasquini e Eurípedes Ferreira realizaram o primeiro transplante, com muita dificuldade e improvisação, no Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC/UFPR). O HC/UFPR também foi considerado o pioneiro na América Latina a realizar TCTH de cordão umbilical para transplante alogênico e o primeiro a instalar um programa de transplante com doadores não aparentados. Esse serviço atualmente encontra-se entre um dos principais centros mundiais e está filiado ao International Bone Marrow Transplantation Registry, órgão que mantém o maior registro de informações sobre transplantes de medula óssea do mundo. 4 Cabe destacar que, junto a todo esse avanço, também sugiram técnicas de mobilização e congelamento das células precursoras, o que permitiu que o transplante autólogo fosse realizado nos pacientes com tumores sólidos. Além disso, nos últimos anos, o sangue de cordão umbilical humano vem tornando-se uma fonte alternativa viável para a obtenção de células tronco hematopoiéticas. O seu uso ocorre com frequência em inúmeros centros de transplante em todo o mundo para tratar doenças hematológicas, oncohematológicas, hereditárias e imunológicas. TEMA 2 – DADOS EPIDEMIOLÓGICOS DO TRANSPLANTE DE CÉLULAS- TRONCO HEMATOPOIÉTICAS O transplante de células-tronco hematopoiéticas é um procedimento realizado há mais de cinquenta anos e com constante evolução. Nos últimos dez anos, teve grande avanço no tratamento das complicações relacionadas às afecções genéticas, neoplásicas, hematológicas, endócrinas e autoimunes. O maior número de transplantes realizados hoje no Brasil, segundo a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos, por meio da publicação do Registro Brasileiro de Transplantes (2017), é o Estado de São Paulo, com 1.442 transplantes realizados em 2017. Em relação ao tipo de transplante, predomina em todo o território nacional, o transplante autólogo. Foram realizados, em 2016, 1.126 transplantes alogênicos e 1.668 autólogos, totalizando 2.794 transplantes. Hoje, conta-se para a realização dos transplantes em 12 estados, com 67 equipes atuantes, sendo o Estado de São Paulo com a maior predominância (31 equipes) seguido do Rio Grande do Sul e Minas Gerais respectivamente (6 equipes). A principal dificuldade na operacionalização e realização dos transplantes de células-tronco hematopoiéticas, encontram-se na incompatibilidade genética. Apesar de o Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (REDOME) apresentar em 2018, 4.703.976 doadores voluntários cadastrados, em média tem- se 850 pacientes cadastrados no Registro Nacional de Receptores de Medula Óssea (REREME) em busca de um doador não aparentado. Dentre as regiões do Brasil com o maior número de cadastrados no REDOME, encontra-se o Sudeste e Sul. E quanto aos receptores no REREME Sudeste e Nordeste. O perfil dos doares cadastrados do REDOME, são em primeiro lugar as mulheres seguidas dos homens, com idade entre 30 e 39 anos. 5 Sobre os receptores cadastrados no REREME são homens e depois as mulheres, com predominância de idade entre 20 e 44 anos. Denota-se pelos números que nos últimos cinco anos, ocorreu grande variação no cadastro de novos doadores no REDOME, sendo: 2013: 230.143 novos doadores; 2014: 290.553 novos doadores; 2015: 342.330 novos doadores; 2016: 330.359 novos doadores; 2017: 284.029 novos doadores. Porém, com a constante entrada de novos doadores, os números aumentam a cada ano, não havendo regressão. Com esses números,é possível disponibilizar aproximadamente 70% de doadores compatíveis aos pacientes brasileiros. Também é possível realizar a busca na rede que integra os registros em diversos outros países, sendo esta busca internacional, com um universo de mais de 26 milhões de doadores. O Brasil encontra-se interligado a rede Worldwide Network For Blood & Marrow Transplantation (WBMT), que permite a busca mundial. TEMA 3 – EQUIPE MULTIDISCIPLINAR E MULTIPROFISISONAL NO TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO HEMATOPOIÉTICAS O transplante de células-tronco hematopoiéticas é um procedimento de infusão de células hematopoiéticas do próprio paciente ou de um doador compatível, sendo a sua infusão via intravenosa, para os pacientes em tratamento de doenças oncológicas, hematológicas, imunológicas e hereditárias. Antes da sua infusão, ocorre um preparo do paciente com seções de quimioterapia e radioterapia, para ele possa estar condicionado, ou seja, preparado para receber o transplante. Diante disso, ao longo de todo o processo, o paciente requer cuidados específicos, em decorrência do seu comprometimento imunológico, isolamento, afastamento da sociedade e necessidades de cuidados frequentes. Para tanto, são necessários recursos humanos especializados. Durante todo o procedimento de transplante de células-tronco hematopoiéticas, o paciente receberá acompanhamento de vários profissionais que tem o objetivo de auxiliá-lo e orientá-lo sobre o seu tratamento e recuperação. 6 O atendimento ao paciente e seus familiares no serviço de transplante de células-tronco hematopoiéticas, é multidisciplinar e multiprofissional, sendo que os profissionais de enfermagem se encontram presentes em todas as etapas do processo de tratamento. Os profissionais envolvidos no TCTH na grande maioria dos serviços são: enfermeiros, técnicos em enfermagem, assistente social, psicólogo, médicos (oncologista, hematologista, imunologista, infectologista), farmacêutico clínico, nutricionista, fisioterapeuta, odontólogo e terapeuta ocupacional. A seguir, será descrita uma síntese da atribuição de cada profissional no processo de transplante de células-tronco hematopoiéticas. 3.1 Atribuições do enfermeiro e equipe de enfermagem Cabe ao enfermeiro realizar a consulta de enfermagem em ambulatório; sistematizar as ações relacionadas ao cuidado; realizar procedimentos técnicos específicos em ambulatório e no setor de transplante, como acompanhar o processo de aspiração e infusão de medula óssea, cordão umbilical e placentário e precursores hematopoiéticos de sangue periférico. Acompanhar a realização de exames específicos e procedimentos, realizados pela equipe multiprofissional. Orientar e executar procedimentos técnicos relacionados ao doador de células- tronco hematopoiéticas. Além disso, planejar, coordenar, supervisionar e avaliar a Sistematização da Assistência de Enfermagem ao paciente submetido ao transplante. Outro ponto importante e de extrema particularidade na atuação do enfermeiro é a relação com o cateter de longa permanecia e os seus cuidados, bem como a assistência com a mucosite. Os cuidados com o cateter envolvem curativo, heparinização e coleta de sangue. É necessária atenção especial devido às principais complicações relacionadas ao cateter de longa permanência, como: infecção do sítio de inserção; fratura, obstrução e deslocamento do cateter; extravasamento de medicamentos; pneumotórax, hemotórax, hidrotórax; trombose venosa; hematoma e arritmia cardíaca. Ainda, tem um importante papel para as ações de educação e pesquisa, pois cabe a ele promover a educação e a orientação dos pacientes que vão se submeter ao procedimento, bem como os seus familiares. É necessário que o profissional esteja em constate atualização, realize e participe de treinamentos e 7 eventos científicos. Cabe ressaltar que, nesta área, também desenvolve e participa de pesquisas sobre a temática. Aos demais integrantes da equipe de enfermagem, de nível técnico, realizam a execução da prescrição médica e de enfermagem, verificação dos sinais vitais e balanço hidroeletrolítico, promoção/realização da higiene pessoal do paciente. Participa na preparação e administração de medicamentos e hemocomponentes; cuidados com acesso venoso central e periférico; realiza/orienta alimentação. Participa de programas de treinamento promovidos para atualização e capacitação de forma contínua. 3.2 Atribuições do assistente social O assistente social, em virtude da sua inserção socioinstitucional, atua em três pontos: na singularidade (fatos ou problemas isolados de tipos de família ou comunitários), na universalidade (visão mais ampla e completa de realidade), na particularidade (situa o problema apresentado dentro deste universo). Sua atuação refere-se às ações socioeducativas, para proporcionar uma rede articulada de apoio ao paciente, durante a hospitalização e após. O contato inicia- se no ambulatório ou na unidade de internação e continua durante todas as fases até a sua reinserção na sociedade. O paciente e a família passam por uma avaliação socioeconômica, após a indicação médica do transplante. Posteriormente; realiza-se uma reunião com a equipe multiprofissional de transplante para discussão do procedimento. Caso seja necessário, também realiza visita domiciliar para avaliar as condições mínimas da residência, relacionadas à infraestrutura para receber o paciente após a alta hospitalar. Ainda, esse profissional avalia as condições de permanência de um acompanhante confiável, de acomodação e permanência no próprio município onde será realizado o transplante. Ele realiza orientações gerais e previdenciárias ao paciente e aos familiares; apoia e orienta o paciente em suas necessidades socioeconômicas; auxiliar na seleção, orientação e apoio ao acompanhante do paciente; cria condições para o paciente e seu acompanhante permaneçam na Unidade de transplante de células-tronco hematopoiéticas ou próximo dela durante o período pós-transplante imediato; busca recursos e cria soluções para assegurar ao paciente acesso aos medicamentos após a alta hospitalar; monitoriza e auxiliar a reintegração do paciente à sua comunidade de origem. 8 3.3 Atribuições do psicólogo Realiza avaliações psicológicas, visando à compreensão da psicodinâmica do paciente, ou familiar/acompanhante. Pode também elaborar laudos, pareceres técnicos, relatórios e outras comunicações profissionais. Realiza intervenção individual ou em grupo para orientação, aconselhamento psicológico ou psicoterápico. Também participa das ações de ensino e pesquisa. 3.4 Atribuições da equipe médica Além de a equipe médica participar das atividades relacionadas ao ensino e à pesquisa na área, ela atua em cinco principais situações: unidade de internação: atendimento intensivo aos pacientes que passaram ou passarão pelo procedimento, aos doadores e em situações de reinternamento; ambulatório de retornos: atendimento aos pacientes que receberam alta hospitalar e encontram-se em nível ambulatorial; ambulatório de novos casos: atendimento ao paciente que passará pelo procedimento, desde a descoberta da doença até a definição do tipo de transplante que será realizado. No ambulatório, realizam-se os riscos e benefícios do transplante e a existência de tratamentos alternativos; ambulatório de falência medular: comumente são atendidos pacientes sem doadores compatíveis; coleta de células-tronco hematopoiéticas: realização do procedimento em centro cirúrgico para a extração das células-tronco hematopoiéticas do doador. 3.5 Atribuições do farmacêuticoclínico O farmacêutico clínico do transplante de células-tronco hematopoiéticas vai além do preparo dos antineoplásicos, com o objetivo da manutenção das características do produto e não agregar nenhuma carga microbiana. A sua atuação refere-se ao auxílio na escolha dos melhores horários para a utilização de cada um dos fármacos, de modo a evitar as interações medicamentosas e a orientação referente aos efeitos adversos e cuidados com cada fármaco. Atuam também na validação da prescrição para evitar erros adversos. 9 3.6 Atribuições do nutricionista O nutricionista realiza orientação referente a dieta em todas as etapas do procedimento de transplante de células-tronco hematopoiéticas, ao paciente e aos seus familiares. Realiza a avaliação nutricional na internação, durante a internação e no ambulatório. Procede a prescrição de dietas conforme as fases do tratamento, bem como a via de administração mais indicada segundo as condições clínicas do paciente. A avaliação do consumo alimentar ocorre diariamente, com estímulo da ingesta oral, em virtude da diminuição da ingestão de alimentos e o aumento das necessidades metabólicas do paciente. Eles podem apresentar anorexia, náuseas, êmese, mucosite, hipogeusia, disgeusia e diarreia. Destaca-se que outro fator importante na atuação desse profissional é a garantia de uma alimentação com o mínimo de agentes patogênicos infecciosos, e todos os alimentos passam pelo processo de cocção e os líquidos são fervidos ou autoclavados. No setor de nutrição orienta-se a equipe quanto aos cuidados referentes a aquisição, manipulação, conservação, preparo e transporte dos diferentes tipos de dietas, de acordo com a prescrição. Esse profissional também participa das reuniões multidisciplinares para discussão dos casos, de eventos, pesquisas e elabora protocolos referentes à terapia nutricional. 3.7 Atribuições do fisioterapeuta O fisioterapeuta atende às necessidades do paciente em decorrência do isolamento protetor e a restrição de atividade física, sendo esta associada à toxicidade dos agentes quimioterápicos utilizados durante o regime de condicionamento pré-transplante, podendo potencializar os efeitos para o sistema cardiopulmonar. Assim, os efeitos provocados pela ausência de atividade ou repouso prolongado no leito, são prevenidos ou reduzidos, com as ações fisioterápicas. São utilizadas principalmente quatro tipos de reabilitação: paliativa, de suporte, restauradora e preventiva. O atendimento comumente é realizado no durante a hospitalização, no ambulatório e em situações de reinternação. O principal objetivo do tratamento é reduzir ou prevenir a atrofia muscular, tratamento ou prevenção de infecções respiratórias e microatelectasias de pulmão. A fisioterapia é importante para auxiliar no tratamento dos pacientes 10 submetidos ao transplante de células-tronco hematopoiéticas, promovendo melhorias na função global ou auxiliando no tratamento dos sintomas apresentados. 3.8 Atribuições do odontólogo O odontólogo realiza o exame clínico e radiológico para avaliar a presença de focos infeciosos, instrui a realização de higiene oral e controle da placa bacteriana. Realiza a raspagem e alisamento radicular, remoção de cálculo e cemento contaminado, de tecido cariado e confecciona restaurações e próteses provisórias. Remove aparelhos ortodônticos e protéticos que possam danificar a mucosa dentária durante o período de imunossupressão. Ele acompanha diariamente a evolução das lesões da mucosa oral durante o período de internação. Monitora as mucosistes e proporciona um tratamento adequado para cada grau de envolvimento. Além disso, monitora as lesões de origem fúngica ou virais decorrentes da imunossupressão desenvolvidas pelo tratamento de quimioterapia e radioterapia. Após o transplante, acompanha o paciente e orienta o dentista na cidade de origem quanto ao tratamento dentário necessário pós-transplante. Realiza procedimentos como gengivectomia de hiperplasia gengival de origem medicamentosa, biópsia e glândula salivar menor para confirmação de Doença do Enxerto Contra o Hospedeiro (DECH). 3.9 Atribuições do terapeuta ocupacional Ele elabora o diagnóstico terapêutico ocupacional e avaliação cinética- ocupacional; analisa e estuda as alterações psicossociais e emocionais; orienta os espaços físicos, mobiliários e utensílios a serem utilizados no ambiente doméstico, para a autonomia nas atividades de vida diária, alimentação higiene, vestuário, locomoção e comunicação. TEMA 4 – ASPECTOS ÉTICOS VOLTADOS AO TRANSPLANTE DE CÉLULAS- TRONCO HEMATOPOIÉTICAS Partindo dos conceitos relacionados a Bioética já conhecidos, é necessário levar em consideração: a autonomia, o benefício, o não malefício e a justiça. 11 A autonomia se refere à liberdade de o paciente escolher/optar pelo seu tratamento. Inclui a relação entre a equipe e o paciente para a liberdade de tomada de decisão ou não da conduta, nesse quesito inclui-se também o consentimento para o diagnóstico e tratamento. Para que o paciente possa tomar sua decisão, a equipe necessita repassar todas as informações necessárias, para que ele se sinta apto a decidir. A autonomia, como descrito por Sá e Moureira (2012), decorre da possibilidade de o indivíduo assumir uma postura de autodeterminação a qual dispensa interferências exteriores, ou seja, ele pode decidir, inclusive para determinar configurações de uma vida que lhe é própria. O benefício e o não maleficio são a busca de decisões éticas que possam garantir o maior benefício, a maior porção do bem em relação ao mal, ou a menor maleficência. Quando os transplantes iniciaram, a justificativa ética para a realização era baseada na intuição. Acreditava-se que se houvesse a possibilidade de alcance de resultados promissores, resguardando a vida do paciente no procedimento, cabia ao médico encontrar um doador. Com o passar do tempo, com os avanços no aprimoramento dos transplantes de células-tronco hematopoiéticas, com a descoberta de novos fármacos, surgiram também novos questionamentos para a realização do transplante. Destaca-se que, nos últimos 40 anos, ocorreu a progressão da utilização do transplante partindo de procedimentos com número pequeno de resultados para resultados exitosos. Nessa evolução, passou-se a utilizar o consentimento informado para o receptor, com descrição minuciosa de todos os possíveis riscos e os resultados; a liberdade dos familiares e do doador em aceitar ou recusar a conduta apresentada; melhoria no processo de comunicação; maior rastreabilidade entre possíveis doadores compatíveis, e local adequado para a realização do transplante, garantindo, assim, segurança para o doador e receptor durante todo o processo. No consentimento informado, incluem-se discussões sobre a doação de medula óssea, indicação do procedimento, ressuscitação cardiopulmonar, riscos, benefícios, complicações, intercorrências, qualidade de vida, alocação de recursos e novas terapias, entre outros. 12 Em relação ao período pós-transplantes, também são considerados os preceitos éticos relacionados à incompatibilidade, sendo a aceitação ou não do organismo, das células enxertadas, o que pode determinar, por exemplo um resultado ruim no transplante, porém esse resultado se torna imprevisível no momento da escolha e decisão do transplante. Um grade e importante passo no Brasil ocorreu em 1997, com a promulgação da Lei Federal n. 9.434 e do Decreto n. 2.268, complementado em 1998 pela Portaria n. 3.407, que fortaleceram o subsídio legal para o transplante de órgãos e tecidos.Um ponto importante a ser considerado na legislação, encontra-se descrito no artigo 9° da Lei 9.434/1997: Art. 9º É permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos, órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuge ou parentes consanguíneos até o quarto grau, inclusive, na forma do §4º deste artigo, ou em qualquer outra pessoa, mediante autorização judicial, dispensada esta em relação à medula óssea. Diante disso, passou-se a buscar e estabelecer os critérios e as indicações para o transplante de células-tronco hematopoiéticas, foram estabelecidos pelo National Heart, Lung and Blood Institute and Leukemia Society of America, e atrela os critérios ao complexo de histocompatibilidade entre o doador e o receptor, principalmente no que se refere aos antígenos leucocitários humanos (HLA). Portanto, é possível a disposição de forma gratuita para fins terapêuticos a utilização de órgãos de pessoas vivas em benefício de outras, mas somente em 2001 passou-se a disponibilizar a utilização de órgãos e tecidos de doador vivo para receptores sem vínculo de parentesco ou matrimônio sem precedida autorização judicial, por meio da Lei n. 10.211/2001. Além disso, é importante considerar, por parte da bioética, o paciente em seus vários aspectos, por exemplo o psicossocial, além das questões legais, sempre alicerçados no suporte familiar, nas condições de moradia, nível cultural entre outros. É necessário que sejam criadas alternativas para reflexão e o estabelecimento de diretrizes de conduta, principalmente envolvendo os profissionais que cuidam dos pacientes submetidos a esse procedimento. De modo a alicerçar os conhecimentos, e seguindo uma vertente paralela ao que se refere ao transplante de células-tronco hematopoiéticas, os pacientes necessitam de repetidas transfusões sanguíneas até a “pega” do enxerto, frente a isso existem alguns dilemas éticos em relação a hemotransfusão em Testemunhas de Jeová. 13 Saiba mais Para elucidar e melhorar os conceitos, sugere-se a leitura do seguinte material: FRANÇA, I. S. X.; BAPTISTA, R. S.; BRITO, V. R. S. Dilemas éticos na hemotransfusão em testemunhas de Jeová: uma análise jurídico-bioética. Acta Paulista de Enfermagem, v. 21, n. 3, p. 498-503, 2008. TEMA 5 – HUMANIZAÇÃO EM TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO HEMATOPOIÉTICAS Em 2001, o Ministério da Saúde criou o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar, desde então essa necessidade tornou- se uma demanda continua dentro da assistência prestada pelos serviços de saúde. Em 2003, foi criada a Política Nacional de Humanização (PNH) para avanço e qualificação da atenção e gestão do Sistema Único de Saúde em todo o território nacional. A PNH se pauta em três princípios: a inseparabilidade entre a atenção e a gestão dos processos de produção de saúde, transversalidade e autonomia e protagonismo dos sujeitos. No setor de transplante de células-tronco hematopoiéticas, em virtude da complexidade da assistência prestada, e o tempo de hospitalização, o vínculo entre profissional de saúde, paciente e familiar. Frente às fragilidades, dor, dependência e sofrimento em decorrência das características desses pacientes, é necessário que os profissionais possam assisti-los de modo holístico, e não somente de forma técnica. A humanização no TCTH requer sempre considerar vários aspectos, pois os princípios que norteiam a PNH abrangem o atendimento ao paciente, as condições de trabalho dos profissionais de saúde e o atendimento às necessidades básicas institucionais, ou seja, administrativas, físicas e humanas. Considerando que o conceito de humanização está inter-relacionado com ao de cuidado, uma vez que, quando se considera a humanização, faz com que ela englobe as relações interpessoais éticas em uma dinâmica que envolve potencialidades do ser humano. Quando o paciente é recebido na unidade de TCTH, são considerados os cuidados essenciais para que possam ser protegidas as integridades física e psíquica dele. Cada profissional atuante no serviço, seguindo as suas atribuições, estabelece uma relação de confiança e cumplicidade com o paciente, firmando o 14 respeito no trabalho. O diálogo com linguagem simples, adequado à cultura do paciente, são características que enaltecem os profissionais de saúde e os aproximam dos pacientes. Assim, é possível compreender as necessidades do paciente, suas capacidades e desejos durante o tratamento, pois é nesse momento que ele está ameaçado de sua existência, enquanto que a equipe é o fator mobilizador de esperança, e acaba acolhendo-o de forma humana. Durante o período, é fundamental orientá-lo em manter a valorização do próprio ser, e cabe ao profissional auxiliar nesse quesito fundamentado em um cuidado real com atendimento humanizado. O decurso da humanização envolve muitos indivíduos e inúmeras práticas e técnicas diferentes, que estão dirigidas a um único objetivo comum. Ela está além dos profissionais, e inclui também a estrutura física das instituições de saúde, pois o ambiente propenso ao conforto e aconchego faz com que o atendimento tenha um diferencial. A humanização ocorre desde a chegada do paciente ao setor até as situações relacionadas a fase final de vida, sendo esta de grande dificuldade para aceitação. O tratamento nem sempre segue o percurso desejado pelos profissionais, por exemplo, a rejeição do enxerto, estrado de debilitação, entre outras intercorrências relacionadas a imunodeficiência decorrente da imunossupressão. Nessa fase, quando a morte é inevitável, a equipe de saúde deve permanecer neutra frente às questões de crenças do paciente e seus familiares. Porém, a permanência da equipe é indispensável, para que a assistência possa ter continuidade. A aceitação da morte pelos familiares e pacientes pode ser considerada um momento de grande dificuldade para a equipe, pois surgem sentimentos de impotência e incapacidade que, muitas vezes, acentuam-se pelo vínculo afetivo que foi criado durante o tratamento. Cabe ressaltar que a superação da morte vem com a continuidade da luta pela cura de outros pacientes e pelos desenvolvimentos de trabalhos internos de suporte biopsicossocial. Assim, é uma atitude favorável ofertar uma assistência humanizada em todas as fases do tratamento, independentemente do seu desfecho. A humanização é um processo amplo, demorado e complexo, ao qual se oferece resistência, pois envolve mudanças de comportamento que normalmente 15 despertam receios. É uma necessidade iminente e se faz presente em todas as instituições de saúde. 16 REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS. Dimensionamento dos transplantes no Brasil em cada estado (2010-2017). Registro Brasileiro de Transplantes, ano XXI, n. 4, jan./dez., 2017. ANDERS, J. C. et al. Aspectos de enfermagem, nutrição, fisioterapia e serviço social no transplante de medula óssea. Medicina, Ribeirão Preto, v. 33, p. 463- 485, 2000. BRASIL. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar. Série C. Projetos, Programas e Relatórios, n. 20, Brasília: Ministério da Saúde, 2001. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Cadernos HumanizaSUS; v. 3; Atenção Hospitalar. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. CORGOZINHO, M. M.; GOMES, J. R. A. A.; GARRAFA, V. Medula óssea no Brasil: dimensões bioéticas. Revista Latino Americana de Bioética, 2012, v. 13, n. 1, p. 36-45. ORTEGA, E. T. T. et al. Compêndio de enfermagemem transplante de células- tronco hematopoiéticas: rotinas e procedimentos em cuidados essenciais e em complicações. Curitiba: Maio, 2004. RODRIGEUS, A. B.; MARTIN, L. G. R. M.; MORAES, M. W. Oncologia multiprofissional: bases para assistência. São Paulo: Manole, 2016. SÁ, M. F. D.; MOUREIRA, D. L. Autonomia para Morrer: eutanásia, suicídio assistido e diretivas antecipadas de vontade. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.
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