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1 NUTRIÇÃO BÁSICA E METABOLISMO NEUZA MARIA BRUNORO COSTA MARIA DO CARMO GOUVEIA PELUZIO Viçosa - UFV – 2007 2 ÍNDICE Conteúdo Página Capítulo 1 – Conceito e Histórico da Nutrição 1 Capítulo 2 – Digestão e Absorção no Trato Gastrointestinal 8 Capítulo 3- Carboidratos 20 Capítulo 4- Fibras 45 Capítulo 5- Proteínas 64 Capítulo 6- Lipídios 84 Capítulo 7- Metabolismo Energético 100 Capítulo 8- Vitaminas 113 Capítulo 9- Minerais 140 Capítulo 10- Água e Eletrólitos 182 Capítulo 11- Antioxidantes da Dieta 192 3 Capítulo 1: CONCEITO E HISTÓRICO DA NUTRIÇÃO Sônia Machado Rocha Ribeiro Neuza Maria Brunoro Costa 1.1. Conceito Nutrição é o processo através do qual os organismos vivos utilizam as substâncias necessárias para a manutenção da vida. Inclui, portanto, não só a retirada da matéria-prima do ambiente, mas todos os processos necessários para a disponibilização das substâncias (nutrientes) dentro da célula, na via metabólica da qual o nutriente participa. A nutrição ocorre em todos os seres vivos, vegetais e animais, unicelulares e pluricelulares, por dois mecanismos, que são a autotrofia e a heterotrofia. Todo esse processo converge para um objetivo geral: obtenção de energia. Quando se considera a inter-relação de todas as formas vivas, percebe-se que, pequena parte da energia solar (a outra parte é destinada ao aquecimento) que alcança a superfície da Terra é absorvida pelos vegetais, que funcionam como conversores de energia, uma vez que transformam energia luminosa em energia química. Esta última é a modalidade de energia utilizável pelos seres vivos e armazenada em moléculas, primariamente na forma de carboidrato, o qual é precursor da síntese de lipídios e proteínas. A partir dessas três moléculas armazenadoras de energia, são sintetizadas outras moléculas não fornecedoras de energia, mas necessárias aos processos biológicos. Assim, quando se consideram os níveis tróficos ou alimentares, a planta verde ocupa o nível trófico de produtor e os animais de consumidores. 1.2. Histórico Nutrição é um campo interdisciplinar da ciência e interprofissional por excelência. Embora o processo da nutrição seja tão antigo quanto a vida no planeta, o interesse pelo entendimento científico do assunto pode ser considerado recente. Por muito tempo, a pesquisa no campo da nutrição foi conduzida por investigadores bioquímicos, visando desvendar os segredos do metabolismo. As vitaminas foram “descobertas” uma a uma, no período de 1910 a 1940, quando foi possível identificar que os fatores causais de diversas doenças estavam associados à carência de alimentos específicos. Até esta data, o conhecimento de nutrição foi caracterizado por poucas, mas grandes descobertas, desde as experiências de Lavoisier, o “pai da nutrição”, no século XVIII, quando várias hipóteses foram elaboradas com poucas comprovações científicas. Pode se afirmar que a vitaminologia constituiu um marco no campo da ciência da nutrição, que até então não existia, enquanto corpo teórico científico. A história da nutrição, como ciência, é a própria história da evolução do conhecimento sobre os nutrientes. Compreende desde a sua identificação, como componentes alimentares até a comprovação de seus efeitos no organismo e a elucidação de vias bioquímicas das quais estes participam. O conhecimento sobre os carboidratos iniciou-se com as descobertas registradas na Índia (3000 a. C.), quando foi descrito o processo de extração do açúcar. Em 1493, com as cruzadas, introduziu- se o açúcar da cana no Novo Mundo, e, a partir de 1812, químicos russos já realizaram estudos químicos preliminares com o amido, submetendo-o aos tratamentos térmico e ácido. Em 1844, foram identificados os átomos componentes dos carboidratos (carbono, hidrogênio e oxigênio) e demonstrada a presença de “açúcar” no sangue, apesar de a “urina doce” já ter sido noticiada pelos hindus, no século VI. Em 1856, Claude Bernard descobriu a presença de “amido” no fígado, o que na época, se acreditava ser formado a partir de alimento protéico. Os estudos bioquímicos marcantes das vias de metabolismo de carboidratos datam de meados do século XX. A determinação das vias glicolíticas, ciclo do ácido cítrico, transporte mitocondrial de elétrons, ciclo da uréia e outras, esclareceu sobre como o meio biológico extrai energia dos macronutrientes. Entretanto, na área de nutrição humana novos conhecimentos emergiram a partir de observações dos diferentes efeitos metabólicos dos carboidratos, constituídos de diversas unidades de monossacarídeos e tipos de ligações glicosídicas. Em meados de 1980, houve uma explosão de evidências científicas que contribuíram para o avanço do conhecimento da nutrição sobre os polissacarídeos não digeríveis pelo organismo humano, culminando na melhor compreensão sobre as estruturas químicas de compostos (polissacarídeos ou não) que constituem a fibra alimentar. No início do século XIX foi descoberta uma substância contendo nitrogênio, a qual era requerida na dieta, mas só um século mais tarde (1930) houve a identificação dos constituintes da proteína. O interesse na caracterização das proteínas, a identificação dos aminoácidos e o estabelecimento de seus requerimentos pelo organismo humano também datam do século XX. Registros da síndrome da deficiência protéica foram feitos no México em 1985, mas sem a associação com a ingestão de proteína. Do final do século XIX até o período pós-guerra (1950) são registradas várias descrições enfocando o quadro clínico da carência protéica, mas apenas em 1959 Jellife denominou a síndrome como a má-nutrição protéico-calórica. A partir de então, intensificaram-se os estudos sobre a deficiência dietética da proteína, em várias regiões do mundo, o que conduziu ao conhecimento do efeito qualitativo e quantitativo das proteínas alimentares sobre o crescimento humano e a necessidade de se estabelecerem quantidades diárias que devem ser ingeridas na dieta. Essa realidade fortaleceu os trabalhos de alguns comitês de nutrição, já iniciados a partir de 1940 e que, através de organismos internacionais são responsáveis pelo estabelecimento das recomendações nutricionais. Pode-se considerar que a proteína foi o nutriente mais pesquisado no início da história da ciência da nutrição humana, justificando a atribuição de função “nobre” à proteína. Atualmente, não se pode considerar um nutriente mais importante que o outro, pois todos têm as suas funções no meio biológico. As pesquisas sobre lipídios iniciaram-se a partir dos estudos sobre o colesterol. Em 1930, ficou demonstrado que ratos sintetizavam menos colesterol quando alimentados com uma dieta contendo colesterol. Em 1950 ficou demonstrado, in vitro, que a síntese de colesterol a partir de acetato no fígado era suprimida pela ingestão de colesterol na dieta. A partir de tais 4 evidências surgiram os estudos para a determinação das vias metabólicas da síntese de lipídios e a grande preocupação com a quantidade de gordura ingerida na dieta, como fator de risco das doenças cardiovasculares. Em 1979, trabalhos científicos evidenciaram a baixa incidência de doença coronariana em esquimós, os quais consumiam deitas ricas em lipídios poliinsaturados. Esse trabalho pioneiro marcou para a nutrição uma nova etapa, na qual se considera que os efeitos dos lipídios dietéticos no organismo dependem não só da quantidade ingerida, mas também de sua qualidade. Os últimos 15 anos do século XX podem ser considerados, para a nutrição humana, os de maior avanço no conhecimento dos lipídios. Em paralelo ao avanço do conhecimento das rotas metabólicas dos macronutrientes, de suas estruturas e funções biológicas, identificou-se a importância dos minerais, bem como foram estabelecidas as funções das vitaminas. A contribuição da medicina foi relevante no despertar da curiosidade científica para investigar as causas de váriasdoenças carenciais de vitaminas e minerais. À medida que se comprovava a participação dos nutrientes no aparecimento de doenças, surgiu a necessidade de se conhecer melhor a composição dos alimentos, visando combiná-los e prepará-los, de forma adequada, para prevenir ou curar tais doenças. Assim nasceu, por uma necessidade da medicina, um ramo da ciência da nutrição, denonimado dietética. Em 1981, Pedro B. Landabure escreveu “a ciência da nutrição tem adquirido nos últimos 30 anos uma importância antes inesperada. Isso resultou da evidência de que a saúde se mantém em conseqüência de uma alimentação correta; muitas enfermidades podem surgir, manter-se ou se curar com uma alimentação adequada”. Percebe-se nesse comentário o conceito de alimentos funcionais, o que, no momento, tem sido apresentado como uma atualidade. É claro que cada continente teve seu próprio percurso no avanço da ciência da nutrição. Na América Latina, os escassos registros históricos têm permitido destacar a influência de alguns trabalhos na evolução do conhecimento da nutrição como uma ciência. Os estudos sobre a relação da alimentação e patologias deram origem a uma transformação dos procedimentos da clínica médica, iniciada oficialmente em 1937, quando Pedro Escudero iniciou sua atuação na cátedra de clínica da nutrição (inspirada e criada por ele) na Universidade de Buenos Aires. Por várias décadas, os trabalhos de Escudero enriqueceram a clínica médica, com estudos que relacionavam patologias e terapêuticas dietéticas, dando subsídios para a proposição das bases doutrinárias da alimentação normal e da dietoterapia, baseada no conhecimento da composição dos alimentos, nos requerimentos do organismo, na fisiologia e na técnica dietética. A partir de então, as leis da alimentação foram o seu guia. Prosseguindo os trabalhos de Escudero, cita-se a contribuição de Jaime Espejo Solá, aluno de Escudero que continuou os trabalhos de seu antecessor, no Instituto Nacional de la Nutrición, na Escuela Nacional de Dietistas. No Brasil, o avanço da ciência da nutrição ocorreu em paralelo à expansão da atuação do profissional nutricionista e às pesquisas realizadas nas diversas áreas afins. Merecem destaque, como pioneiros dos trabalhos científicos envolvendo o tema nutrição humana no Brasil, os professores Nelson Chaves e Josué de Castro. O primeiro, através de suas publicações no período de 1932 a 1944, trouxe grande contribuição para a evolução do conhecimento dos aspectos fisiológicos e sociais da nutrição humana em nosso país, enquanto Josué de Castro sistematizou as informações sobre a situação alimentar e nutricional do Brasil, lançando em 1946 o livro Geografia da Fome. A partir desses trabalhos, nascia a área de estudo no campo da nutrição humana, que é a nutrição em saúde pública. 1.3. Perspectivas da Ciência da Nutrição O avanço da ciência da nutrição esteve, historicamente, e continuará sendo ligado ao aprofundamento dos conhecimentos em outras áreas correlatas. A biologia molecular causou um avanço tão grande na ciência que, no momento, há uma sensação de que o homem estará, em breve, desvendando todos os mistérios dos organismos vivos: conhecendo o código genético de cada um e ainda mais, podendo manipulá-lo. Se isso vier acontecer, não se constituirá, ainda, o limite para a ciência da nutrição. Findados os trabalhos sobre o genoma, prosseguem as pesquisas sobre as proteínas, os moduladores dietéticos da expressão de genes, as interações gene-nutriente, os efeitos do nível de nutrientes sobre a velocidade das reações e suas conseqüências metabólicas. Além disso, a composição dos alimentos necessita ser mais explorada. A nutrição humana trabalha com um grupo limitado de substâncias consideradas nutrientes. Entretanto, as evidências científicas reforçam a idéia de que inúmeros outros compostos “não-nutrientes”, presentes naturalmente ou adicionados aos alimentos, exercem efeitos diversos no organismo humano e potencializam, anulam ou diminuem os efeitos dos nutrientes e de outras substâncias contaminantes do meio biológico. Os estudos de interações químicas dos nutrientes in vitro se avolumam, entretanto as interações químicas no meio fisiológico não são ainda completamente conhecidas. Interações que ocorrem no lúmen intestinal, anteriormente à absorção dos nutrientes, dependem da composição do conteúdo intraluminal, o qual é variável em cada refeição e, muito provavelmente, depende do status nutricional de cada nutriente e da ecologia intestinal de cada indivíduo. 1.4. Ingestão Dietética de Referência – IDR 1.4.1. Considerações gerais A partir de 1940 surgiram, em nível mundial, Comitês de Especialistas em Nutrição Humana com o objetivo de determinar a quantidade que deve ser ingerida de cada um dos nutrientes para o organismo se manter saudável, considerando faixa etária, sexo e estados fisiológicos. Surgiram também os estudos sobre as necessidades nutricionais de energia e de nutrientes específicos, utilizando-se várias metodologias. Atualmente, existem comitês internacionais que estabelecem as recomendações para as populações de países específicos e dos países em geral, os quais ainda não estabeleceram suas próprias recomendações nutricionais. 5 Desde 1941, a Food and Nutrition Board (FNB), da National Academy of Science, nos Estados Unidos, vem estabelecendo Quotas Dietéticas Recomendadas ou Recommended Dietary Allowances (RDAs), com a finalidade de fornecer padrões alimentares de ingestão de nutrientes. RDAs se definem como os níveis de ingestão de um nutriente essencial que, com base no conhecimento científico, são julgados pela FNB como adequados para atingir a necessidade de praticamente todos os indivíduos saudáveis. Não atendem os indivíduos com necessidades nutricionais especiais. As recomendações nutricionais são atualizadas à medida que novos conhecimentos científicos apontam a necessidade de modificações quanto às referências para a ingestão dos nutrientes. A última atualização foi em 1997, quando a FNB estabeleceu novas bases para as recomendações nutricionais de nutrientes, que foram denominadas Ingestões Dietéticas de Referência (IDRs) ou Dietary Reference Intakes (DRIs). As IDRs compreendem conceitos atuais sobre o papel dos nutrientes e componentes dos alimentos na saúde ao longo do tempo, indo além das recomendações para prevenir deficiências nutricionais. As IDRs são valores de referência para níveis de ingestão de nutrientes, estabelecidos através de estimativas, para serem usados no planejamento e avaliação da ingestão dietética de indivíduos sadios. 1.4.2. Conceitos das IDRs As IDRs compreendem quatro conceitos de referência para a ingestão de nutrientes: RDA - Quota Dietética Recomendada ou Recommended Dietary Alowances. As RDAs são quantidades recomendadas considerando os níveis médios de ingestão dietética diários, suficientes para atingir a necessidade nutricional de quase todos os indivíduos sadios (97 a 98%), considerando-se faixas etárias, estados fisiológicos específicos e sexo. São metas para a ingestão dietética de indivíduos sadios. As RDAs não foram determinadas para se avaliar ou planejar a dieta de indivíduos ou grupos populacionais. EAR – Estimated Average Requirement ou Necessidade Média Estimada O EAR é a quantidade de um nutriente que é estimada para atingir a necessidade do nutriente pela metade dos indivíduos sadios de um grupo populacional. É o nível mais baixo de ingestão contínua de um nutriente que irá manter adequado o estado de nutrição de um indivíduo, em relação ao referido nutriente. EAR são usadas para avaliar a adequação da ingestão de grupos populacionais e para estabelecer as RDAs. Se a necessidade de um nutriente segue uma distribuição normal e o seu desvio-padrão é conhecido, então a sua RDA será igual à EAR mais duas vezes o desvio-padrão (RDA = EAR + 2DPEAR). Se os dados da variabilidade da necessidade do nutriente são insuficientes para se calcular o desvio-padrão,o coeficiente de variação de 10% é assumido, estabelecendo-se que RDA = 1,2 x EAR. Se o coeficiente de variação é de 15%, então RDA = 1,3 x EAR. EAR é uma estimativa da necessidade do nutriente e fornece subsídios para o estabelecimento da RDA. AI – Adequate Intake ou Ingestão Adequada As AIs são níveis de ingestão dietética diária recomendados com base em aproximações da ingestão de nutrientes de um grupo de indivíduos sadios, determinados por observações ou registros. O nível de ingestão dietética de nutrientes é estabelecido pela AI quando não se podem determinar as EARs por insuficiência de informação científica para estabelecer as RDAs. Como exemplo, cita-se AI estabelecida para crianças lactentes, para as quais o leite materno é a única fonte de alimento nos primeiros 4 a 6 meses de idade. Nesse caso, a AI para os nutrientes é baseada na média diária de nutrientes fornecidos pelo leite materno, considerando-se crianças a termo e alimentadas exclusivamente ao seio. UL – Tolerable Upper Intake Level ou Nível de Ingestão Máxima Tolerável São os níveis mais altos de ingestão diária de um nutriente, prováveis de não causarem risco ou efeito adverso à saúde de quase todos os indivíduos de determinado grupo populacional. À medida que a ingestão do nutriente aumenta acima do UL, aumenta também o risco do efeito adverso. UL aplica-se para o uso crônico diário de determinado nutriente, proveniente da dieta, e é muito útil para se orientar em questão de alimentos fortificados e de suplementos alimentares. Nem todos os nutrientes têm UL estabelecido. A Figura 1 evidencia que a Necessidade Média Estimada (EAR) é o consumo no qual o risco de inadequação é de 0,5 ou 50%. A Quota Recomendada (RDA) é a ingestão em que o risco de inadequação é muito pequeno: 0,02 a 0,03 (2 a 3%). A Ingestão Adequada (AI) não tem relação consistente com o EAR e RDA por ter sido estabelecida sem ter sido estimada a necessidade. Nos níveis de ingestões situadas entre RDA e UL, os riscos de inadequação e de efeitos adversos estão ambos próximos de zero. Ingestões acima do UL implicam maior risco de efeitos adversos. A linha pontilhada foi usada para AI, visto que a real forma da curva não foi determinada experimentalmente. 6 Figura 1 – Ingestões dietéticas de referência À medida que ocorre o aprofundamento nos conhecimentos sobre as necessidades de determinado nutriente, os comitês de nutrição podem alterar a recomendação do referido nutriente. Assim, as recomendações nutricionais passam por constantes alterações ao longo dos tempos. Ressalta-se ainda que, pelo fato de existirem vários fatores, distintos entre os países, os quais influenciam a nutrição dos indivíduos, o ideal é que cada país adapte as recomendações nutricionais à sua realidade. 1.5. Referências BERDANIER, C. D. Advanced nutrition: macronutrients. Flórida: Ed: Wolinsky, I & Hickson, J. F. CRC Press, 1995. 277 p. BRODY, T. Nutritional biochemistry. San Diego: Academic Press, 1994. 658 p. CASTRO, J. Geografia da fome.11. ed. Rio de Janeiro: Editora Griphus, 1992. IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for calcium, phosphorus, magnesium, vitamin D, and fluoride. Washington, D.C.: National Academy Press, 1997. 432 p. IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for thiamin, riboflavin, niacin, vitamin B6, folate, vitamin B12, pantothenic acid, biotin, and choline. Washington, D.C.: National Academy Press, 1998. 564 p. IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for vitamin C, vitamin E, selenium, and carotenoids. Washington, D.C.: National Academy Press, 2000. 506 p. IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for vitamin A, vitamin K, arsenic, boron, chromium, copper, iodine, iron, manganese, molybdenum, nickel, silicon, vanadium, and zinc. Washington, D.C.: National Academy Press, 2001. 769 p. IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and amino acids. Part 1. Washington, D.C.: National Academy Press, 2002. 484 p. IOM - INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and amino acids. Part 2. Washington, D.C.: National Academy Press, 2002. 480 p. MAHAN, L.K.; ESCOTT-STUMP, S. Krause: alimentos, nutrição & dietoterapia. 10. ed. São Paulo: Ed. Roca, , 2002. 1133 p. (Apêndice, 54). SOCIEDADE BRASILEIRA DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO. Cadernos de nutrição; v. 2, 1990. SOLÁ, J. E. Manual de dietoterapia de las enfermidades del adulto. 5. ed. Buenos Aires: Livraria Ateneo, , 1981. 499 p. 7 STIPANUK, M. H. Biochemical and physiological aspects of human nutrition. Philadelphia: W. B. Saunders Company, 2000. 1007 p. VASCONCELOS, F. A. G. Um perfil de Nelson Chaves e da sua contribuição à nutrição em saúde pública no Brasil. Cadernos de Saúde Pública, v. 17, n. 6, p. 1505-18, 2001. 8 Capítulo 2: DIGESTÃO E ABSORÇÃO NO TRATO GASTROINTESTINAL Neuza Maria Brunoro Costa Regiane Lopes Sales 2.1. Introdução Os alimentos, em sua maioria, são ingeridos na forma não disponível ao organismo e devem ser quebrados em moléculas menores antes de serem absorvidos e transportados nos fluidos corporais. O trato gastrointestinal é o sistema que desempenha as funções de digestão e absorção. Ele se estende da boca ao ânus e consiste de uma estrutura tubular com aberturas para a entrada das secreções da glândula salivar, do fígado e do pâncreas. O sistema gastrointestinal inclui a boca, o estômago, o intestino delgado e o intestino grosso, assim como os órgãos acessórios (glândulas salivares, pâncreas, fígado e vesícula biliar), para proverem secreções essenciais (Figura 2.1). A maior função do trato gastrointestinal é digerir as moléculas complexas dos alimentos e absorver os nutrientes simples, incluindo monossacarídeos, ácidos graxos, aminoácidos, vitaminas, minerais e água. Serve ainda como uma barreira à entrada de bactérias no organismo e contém células especializadas que secretam muco, fluidos, enzimas digestivas, fator intrínseco e alguns hormônios peptídeos. Figura 2.1 – O trato gastrointestinal e as glândulas exócrinas associadas. 9 2.2. Digestão Digestão é definida como o desdobramento químico de alimentos por enzimas secretadas no lúmen do trato gastrointestinal pelas glândulas da boca, do estômago e das células exócrinas do pâncreas e pela borda em escova (brush border) e no citoplasma das células da mucosa do intestino delgado. Assim, a digestão ocorre antes da entrada dos nutrientes nos fluidos intestinais e, portanto, no sistema circulatório, pelo qual os nutrientes são levados a todas as células do organismo. 2.3. Absorção Absorção é o movimento dos nutrientes, incluindo água e eletrólitos, através das células da mucosa nos fluidos intestinais, a partir dos quais caem no sangue ou na linfa. Os processos envolvidos na absorção incluem difusão, difusão facilitada, transporte ativo (primário e secundário), arraste por solvente e endocitose. Assim que os nutrientes deixam as células absortivas do intestino e chegam aos fluidos intestinais, eles podem tanto entrar nos capilares sangüíneos quanto nos vasos linfáticos. Água e outras moléculas podem ser absorvidas por movimento paracelular entre as células. 2.4. Boca Na mastigação, os alimentos são cortados e triturados pelos dentes. O processo da mastigação assegura não só que o alimento será subdividido, mas também que será misturado com a saliva. À medida que ocorre essa mistura, a amilase salivar pode iniciar a digestão do amido e, ainda mais importante, o bolo alimentar já estará lubrificado para facilitar a deglutição. A saliva apresenta diversas funções, incluindo digestão dos nutrientes, atividade bactericida (devido à presença de tiocianato, lactoferrina e lisozima), umedecimento da boca para facilitar a fala e a deglutição e função de tampão.As glândulas salivares secretam α-amilase, que atua no bolo alimentar até ser inativada pela secreção ácida do estômago. A secreção salivar está sob o controle nervoso. Outras enzimas, como a lipase salivar, são de importância insignificante na espécie humana. A deglutição é um processo altamente coordenado. O esfíncter esofagiano relaxa após a deglutição para permitir a entrada do alimento no estômago. A não ser nesse caso, ele permanece fechado para prevenir contra o refluxo de ácido do estômago para o esôfago. Durante a gravidez, o esfíncter esofagiano pode não estar tão contraído como usualmente, e isso pode permitir o refluxo de ácido no esôfago, dando a sensação de queimação ou azia. 2.5. Esôfago O esôfago é um tubo que se estende da orofaringe ao hiato diafragmático, onde se une ao estômago, e mede cerca de 25 cm em um adulto. Nele se iniciam as ondas de peristaltismo, responsáveis por transportar o alimento no trato digestivo. A gravidade não está relacionada a esses movimentos. 2.6. Estômago A principal função do estômago é armazenar os alimentos deglutidos para processá-los, de maneira preliminar, para a sua liberação no intestino delgado. Após a entrada do alimento no estômago, este tem a sua musculatura relaxada (relaxamento adaptado). No estômago, os alimentos são submetidos a modificações físicas e químicas. Embora o estômago não seja importante órgão de absorção, alguma quantidade de água e substâncias lipossolúveis são nele absorvidas, como etanol e ácidos graxos de cadeias curta e média. A mucosa gástrica contém muitas glândulas profundas constituídas, principalmente, por células parietais, principais e mucosa. A secreção mista dessas células é chamada de suco gástrico. Este contém mucina, sais inorgânicos, ácido clorídrico (HCl) e enzimas digestivas ou zimógenos (lipase gástrica e pepsinogênio/pepsina). As células parietais produzem HCl, com secreção de H+ por meio da H+, K+ - ATPase. A acidez gástrica favorece a desnaturação das proteínas, a ativação do pepsinogênio a pepsina e a ação proteolítica da pepsina e destrói muitos microrganismos, que entram no trato gastrointestinal pela cavidade bucal. As células parietais secretam, ainda, fator intrínseco, uma glicoproteína necessária para a absorção de vitamina B12. As células mucosas secretam bicarbonato e muco, enquanto as células principais, pepsinogênio e lipase gástrica. A estimulação da secreção gástrica depende de mecanismos nervosos, endócrinos (hormonais) e parácrinos. As proteínas dos alimentos são um potente estimulante da liberação de gastrina na corrente sangüínea pelas células endócrinas do estômago. Da mesma forma, estímulo vagal, íons cálcio (Ca++) e a alcalinização do estômago promovem a liberação de gastrina. No entanto, a secreção de gastrina é inibida pela presença de ácido no estômago. A pepsina inicia o processo de digestão das proteínas no estômago pela clivagem da proteína em grandes fragmentos peptídicos e alguns aminoácidos livres. A lipase gástrica hidrolisa triacilglicerol (especialmente os de cadeias média e curta), formando predominantemente diacilglicerol e ácidos graxos livres. As contrações peristálticas da porção distal do estômago propulsionam o conteúdo estomacal em direção ao piloro (localizado entre o estômago e o duodeno). O piloro é formado por uma banda densa de músculo circular. Sua contração com os movimentos peristálticos favorece a formação de partículas pequenas. Além disso, o quimo ácido (massa semifluida de alimentos parcialmente digeridos) que não consegue passar pelo piloro será retropulsionado para o interior do estômago, resultando na mistura do quimo e na dispersão das gotículas de lipídios em pequenas partículas emulsionadas. A dispersão das 10 gotículas de lipídios facilitam, sobremaneira, sua subseqüente digestão no intestino delgado pela lipase pancreática. Somente líquidos e pequenas partículas no quimo conseguem passar para o duodeno devido à pequena abertura resultante da contração do esfíncter pilórico. A motilidade e secreção gástricas são reguladas por mecanismos tanto nervosos quanto hormonais. O hormônio que estimula a secreção e motilidade gástrica é a gastrina. O estímulo nervoso é dado pelo nervo vago. O estômago regula a quantidade de alimento presente no duodeno, de forma a não exceder a sua capacidade absortiva. Isso se dá graças à ação de hormônios como o peptídio inibitório de gastrina e a colecistoquinina, que são liberados no intestino delgado em resposta à presença do quimo, inibindo a motilidade, o esvaziamento e a secreção gástricos. 2.7. Intestino Delgado A maior parte da digestão e absorção ocorre no intestino delgado, que é aparelhado para esse fim. Ele mede cerca de 3 m de comprimento e 4 cm de diâmetro e é constituído de três partes: duodeno, jejuno e íleo. O duodeno (cerca de 30 cm de comprimento) recebe o quimo proveniente do estômago e as secreções do fígado e do pâncreas. O jejuno, parte superior do intestino após o duodeno, compreende 40% do comprimento e o íleo, porção inferior, os 60% restantes. A fim de facilitar a digestão e absorção de nutrientes na sua superfície, o intestino delgado é anatomicamente adaptado para aumentar grandemente sua superfície absortiva. Sua área é de aproximadamente 200 m2, em função das dobras da mucosa (parte interna da parede intestinal), vilos ou projeções em forma de dedos e devido aos microvilos da membrana luminal ou borda em escova "brush border", que compõem a camada superficial dos vilos (Figura 2.2). Em conjunto, essas adaptações da estrutura da mucosa aumentam a área superficial do intestino delgado para 600 vezes a área de um cilindro do mesmo diâmetro. Figura 2.2 – Vilosidades intestinais, estrutura, vasos sanguíneos e linfáticos. As células absortivas epiteliais que apresentam a borda em escova são chamadas enterócitos. Essas células são constantemente renovadas, tendo uma vida média de cerca de 72 horas. As criptas (tubos glandulares simples na base dos vilos) contêm unidades proliferativas que provêm diversos tipos de células para o trato gastrointestinal. Essas células migram a partir das criptas para o ápice dos vilos, onde são imediatamente descamadas no lúmen do intestino delgado, podendo sofrer digestão. As células da cripta secretam um fluido chamado de suco entérico, que contém água e eletrólitos. À medida que as células epiteliais proliferam e migram para o ápice dos vilos, a atividade das enzimas digestivas da mucosa e a capacidade de absorver nutrientes aumentam, enquanto a capacidade de secretar muco diminui. A membrana da borda em escova contém diversas glicoproteínas embebidas, que se estendem da membrana até o lúmen. As ramificações de carboidratos dessas glicoproteínas formam um glicocálix próximo à membrana da borda em escova. Esse glicocálix age retendo água e formando uma camada estática de água próximo à superfície de absorção. Muitas dessas Vilosidades Lâmina própria Muscular da mucosa Enterócitos Canal Lâmina própria Veia Artéria Camada submucosa Cripta 11 glicoproteínas são enzimas digestivas. Em razão de essa camada de fluidos próximo à superfície epitelial das células ser pobremente misturada, o principal mecanismo de movimento de solutos através da camada estática de água é a difusão a favor de um gradiente de concentração. 2.8. Digestão no Intestino Delgado A digestão no intestino delgado é realizada pelas enzimas secretadas pelo pâncreas, pelas enzimas localizadas na membrana luminal dos enterócitos e pelas enzimas dentro dos enterócitos. Com a entrada do quimo ácido proveniente do estômago no duodeno, o ácido estimula as células S enteroendócrinas (células endócrinas especiais do duodeno) a liberarem um hormônio gastrointestinal chamado de secretina, que estimula as células acinares do pâncreas (células envolvidas na secreção de água, eletrólitos e enzimas) a secretarem uma secreção rica em bicarbonato, que tem um pH alcalinode aproximadamente 8. Essas células S são encontradas em maior concentração no duodeno e jejuno e em menor concentração no íleo. A presença de lipídios parcialmente hidrolisados (ácidos graxos) e proteínas (aminoácidos e peptídeos) no quimo que chega ao duodeno, assim como o pH ácido do quimo, estimula as células I enteroendócrinas da porção proximal do intestino delgado a liberarem o hormônio colecistoquinina (também chamado de pancreozimina), que promove a liberação de zimógenos das células acinares do pâncreas e a secreção do suco pancreático, rico em enzimas/zimógenos. A secreção pancreática contém α-amilase pancreática, lipases (lipase pancreática e colesterol esterase), pró-fosfolipase A2, enzimas nucleolíticas (ribonuclease e desoxirribonuclease), diversas pró-enzimas proteolíticas (tripsinogênio, quimotripsinogênio, proeslastase e carboxipeptidase) e uma proteína não enzimática, chamada de procolipase. As enzimas pancreáticas são mais ativas em pH na faixa da neutralidade, e a rápida neutralização do quimo ácido pelo bicarbonato do suco pancreático na porção proximal do intestino delgado facilita a digestão dos nutrientes pelas enzimas pancreáticas (Figura 2.3). O fígado secreta a bile no ducto biliar, que se esvazia no duodeno. Nos intervalos entre as refeições, a abertura desse ducto é mantida fechada, e o fluxo biliar flui para a vesícula biliar, um órgão em formato de saco anexo ao ducto biliar hepático, que serve para estocar e concentrar a bile. Os hormônios liberados na porção proximal do intestino delgado estimulam o fluxo biliar. A secretina estimula a secreção biliar pelo fígado, e a colecistoquinina estimula a contração da vesícula biliar e a liberação da bile da vesícula no duodeno. A bile é uma solução alcalina contendo eletrólitos, pigmentos, sais biliares e outras substâncias, como colesterol e lecitina. O ducto pancreático se une com o ducto biliar hepático imediatamente antes de alcançar o duodeno, de forma que as secreções pancreática e biliar se misturam antes de entrarem no intestino. Os sais biliares desempenham importante papel na digestão e absorção de lipídios. 12 Figura 2.3 – Esquema de controle da digestão pela gastrina no estômago, secretina e colecistoquinina no intestino. Embora a digestão da maioria dos nutrientes no intestino delgado seja realizada pelas enzimas pancreáticas, as enzimas localizadas na borda em escova dos enterócitos são responsáveis pela conclusão desse processo e liberam moléculas que podem ser transportadas pela membrana da borda em escova. Diversas α-glicosidases, a β-galactosidase e diversas peptidases estão presentes na borda em escova. Essas enzimas são necessárias para a digestão posterior de oligossacarídeos e peptídeos resultantes da hidrólise no lúmen intestinal, assim como dissacarídeos e outros compostos. Essas enzimas da borda em escova são chamadas de ectoenzimas, por serem localizadas no exterior da célula, ou seja, na fase luminal da membrana. Di e tripeptidases podem penetrar nas células epiteliais do intestino e ser subseqüentemente hidrolizadas para formarem aminoácidos livres pelas peptidases intracelulares. Também estão presentes nas células do epitélio intestinal enzimas envolvidas na assimilação de produtos da digestão de lipídios para formarem triacilglicerol, ésteres de colesterol e fosfolipídios, que serão incorporados nos quilomícrons. 2.9. Motilidade Intestinal A motilidade intestinal (peristaltismo) é adaptada para facilitar a digestão e a absorção de nutrientes no intestino delgado, e a taxa de digestão depende da exposição dos nutrientes às enzimas no lúmen intestinal. Essa motilidade assegura a mistura do conteúdo intestinal, o que favorece sua digestão e absorção. Isso se torna possível devido às ondas lentas de contração seguidas de relaxamento de diferentes segmentos do intestino. A motilidade ainda permite uma migração lenta do quimo do duodeno em direção ao intestino grosso, assegurando um tempo adequado para que a digestão e absorção se processem. 2.10. Absorção no Intestino Delgado Para que os nutrientes possam ser absorvidos, eles devem mover-se através das células da mucosa (enterócitos), que constituem uma barreira entre o lúmen do trato gastrointestinal e o fluido intersticial. Processos de transporte estão envolvidos na captação de nutrientes pela borda em escova ou membrana luminal e também na liberação dos nutrientes através da membrana basolateral (localizada no lado oposto da borda em escova do enterócito) no fluido extracelular. A captação de nutrientes e eletrólitos pelas células epiteliais é usualmente mediada por um dos quatro mecanismos gerais de absorção, quais sejam: 1) transporte mediado, 2) difusão passiva, 3) pinocitose, e 4) paracelular (Figura 2.4). GASTRINA ESTÔMAGO INTESTINO Estimula contração gástrica Células parietais HCl PepsinogênioPepsina Estimulo visual Distensão do estômago Proteína Quimo ácido Células S SECRETINA Secreção de água e bicarbonato PÂNCREAS FÍGADO Presença de Lipídio Aminoácidos Peptídios Células I COLECISTOQUININA Contração da vesícula biliar Produção de enzimas pancreáticas (zimogênios) Secreção de bile Peptídio inibitório de gastrina ALIMENTO Bolo alimentar (proteína) 13 2.10.1. Transporte mediado Requer um carreador específico ou proteína de transporte na membrana. Esses carreadores são localizados na membrana da célula. Tal sistema de transporte pode ser uniporte (transporta apenas um composto), simporte (move dois compostos simultâneos) ou antiporte (move um composto para dentro e outro para fora da célula). O transporte mediado pode ser passivo ou ativo: a) Transporte mediado passivo Envolve um carreador e é também chamado de difusão facilitada. O transporte passivo se dá a favor de um gradiente de concentração, ou seja, de uma área de maior concentração para uma de concentração mais baixa. Pode ser bidirecional e permitir uma equalização da concentração do substrato em ambos os lados da membrana. Exemplos de transporte mediado passivo são os transportadores de hexoses independentes de Na+, como GLUT5, que transporta frutose através da membrana para o interior do enterócito; o GLUT2, que transporta glicose, galactose e frutose para fora do entrerócito pela membrana basolateral; os canais iônicos; e os carreadores móveis de íons, que transportam íons, como Ca2+, Mg2+ e H+. b) Transporte mediado ativo Envolve o gasto de energia. Esse transporte pode ser unidirecional e concentrativo. A energia é suprida pela hidrólise de ATP, mas a energia requerida pode ser primária ou secundária. Por exemplo, a concentração de sódio (Na+) e potássio (K+) na célula é mantida pela Na+, K+-ATPase, que bombeia Na+ para fora da célula e K+ para dentro da célula (contra um gradiente de concentração) às custas da hidrólise de ATP. Esse é o transporte ativo primário de Na+ e K+ por antiporte. A estequiometria da reação Na+, K+-ATPase é 1 mol de ATP hidrolisado conjugado com o bombeamento para o exterior de 3 mol de Na+ e simultâneo bombeamento para o interior de 2 mol de K+, que gera uma baixa concentração de Na+ no citosol e um potencial elétrico de cerca de -60 mV no citosol em relação ao fluido extracelular. Os cotransportes de Na+ e glicose e de H+ e dipeptídeos são, no entanto, por transporte ativo secundário. Nesses processos, a energia é diretamente derivada do gradiente de concentração ou do potencial elétrico através da membrana em vez da energia química da quebra da ligação co-valente, como na hidrólise do ATP. Gradientes podem ser estabelecidos pela hidrólise de ATP, como visto no caso da Na+, K+-ATPase. Por exemplo, o transportador de glicose e de Na+ SGLT1 pode concentrar glicose (contra um gradiente de concentração), devido ao co-transporte de Na+ a favor do seu gradiente eletroquímico. Portanto, é a baixa concentração intracelular de Na+ e o potencial elétrico negativo, que são mantidos pela bomba Na+, K+-ATPase, que provêa força para a captação de glicose. O transportador SGLT1 é um exemplo de transporte ativo secundário por simporte. O transpote mediado permite a captação de nutrientes e outros compostos em sítios específicos, visto que apenas o segmento do intestino delgado que expressa a proteína transportadora é capaz de reter a substância. Uma vantagem desse sistema é a captação de ácidos biliares que só ocorre na porção final do intestino delgado (íleo), permitindo a presença de ácidos biliares adequados no lúmen para a eficiente digestão de lipídios. 2.10.2. Difusão Passiva Este é o tipo de transporte para água, muitas moléculas lipossolúveis e para gases, como H2 ou CO2, pelo fato de eles poderem se difundir pela camada dupla de lipídios das membranas da células epiteliais. Essas substâncias se difundem, através da membrana em ambas as direções, a favor de um gradiente de concentração. Essa forma de absorção pode também ocorrer no estômago e no intestino grosso. 2.10.3. Pinocitose Endocitose mediada por receptores pode ser responsável pela captação de algumas proteínas, assim como de pequenas moléculas que são englobadas dentro de vesículas endocíticas. De forma semelhante, moléculas podem ser transportadas para fora da célula por exocitose. Os quilomícrons são transportados para fora dos enterócitos por exocitose pela membrana basolateral. 2.10.4. Paracelular É um mecanismo de captação de água e eletrólitos através das junções entre as células. A osmolaridade desempenha importante papel na absorção de água e eletrólitos no intestino delgado por esse processo. A osmolaridade do plasma é de cerca de 300 mOsm. Quando uma refeição hipotônica é ingerida, a água é rapidamente absorvida pelo duodeno e jejuno pela via paracelular. A absorção de água facilita a absorção de eletrólitos por arraste. Quando uma refeição hipertônica é ingerida, a água é retida no lúmen. O acúmulo de água no lúmen e a absorção de íons e nutrientes tornam o conteúdo do lúmen isotônico. Dessa forma, a porção proximal do intestino é responsável pela absorção de água de refeições hipotônicas, e a porção distal do intestino delgado o é por sua absorção quando a refeição é hipertônica. 14 Paracelular Transporte ativo primário Difusão facilitada Difusão simples Transporte ativo secundário Pinocitose Figura 2.4 – Meios de absorção intracelular: (a) Transcelular (simporte, antiporte e uniporte) e paracelular. (b) Transcelular: transporte ativo primário, transporte ativo secundário, difusão facilitada, difusão simples, canal iônico, carreador iônico móvel e pinocitose. 2.11. Ácidos Biliares e a Circulação Entero-Hepática O fígado desempenha importante papel na digestão e captação de lipídios pelo trato gastrointestinal devido à sua função de sintetizar e secretar ácidos biliares. Os ácidos biliares primários, ácido cólico e ácido quenodesoxicólico são sintetizados a partir do colesterol no fígado. Esses ácidos biliares são conjugados com taurina ou glicina, tornando-se mais polares. Em função da alta concentração de íons Na e K na bile, seu pH é alcalino, e por isso os ácidos biliares e seus conjugados existem na forma de sais biliares. Algum colesterol pode estar solubilizado nos sais biliares e ser transportado do fígado para o intestino. Os ácidos biliares apresentam propriedade emulsificante, o que aumenta a área de superfície entre lipídio e a fase aquosa e facilita a digestão de ésteres de colesterol, fosfolipídeos e monoglicerídeos, assim como a solubilização e absorção de produtos da digestão dos lipídios. Os ácidos biliares formam agregados chamados de micelas mistas. Os ácidos biliares são recuperados por absorção passiva ao longo do intestino delgado e por transporte mediado por receptor no íleo. A reciclagem de compostos, como os ácidos biliares entre o intestino delgado e o fígado, é chamada de circulação entero-hepática. Essa circulação permite um aproveitamento de cerca de 99% dos ácidos biliares, sendo o 1% restante perdido nas fezes em cada passagem pelo intestino. O "pool" de ácidos biliares, cerca de 4 g, é reciclado através do intestino cerca de 12 vezes por dia, dependendo da freqüência das refeições. Dessa forma, a perda de 1% (0,05 g) em cada passagem resulta numa perda diária de cerca de 0,5 g de ácidos biliares por dia nas fezes. Essa perda é compensada pela síntese diária de quantidade equivalente de ácidos biliares no fígado. A perda de ácidos biliares nas fezes representa a principal forma de excreção de colesterol do organismo. Uma porção dos ácidos biliares primários no intestino pode ser metabolizada pelas bactérias intestinais e levar à desconjugação e à 7α-desidroxilação, produzindo ácidos biliares secundários, ou seja, ácido desoxicólico a partir do ácido cólico e ácido litocólico a partir do ácido quenodesoxicólico. Esses ácidos biliares secundários, especialmente o ácido desoxicólico, podem ser reabsorvidos e participar da circulação entero-hepática, juntamente com os ácidos biliares primários. ① Simporte ② Antiporte ③ Uniporte Carreador iônico móvel Canal iônico (a) (b) 15 2.12. Metabolismo de Nutrientes nos Enterócitos Após a absorção dos produtos da digestão nas células epiteliais do intestino delgado, os nutrientes são assimilados ou pela veia porta ou pelos vasos linfáticos para serem levados às outras partes do corpo ou serem utilizados pelos enterócitos. As células epiteliais do intestino delgado são metabolicamente muito ativas e constantemente renovadas, requerendo alto suprimento de nutrientes absorvidos do intestino para a manutenção da sua estrutura e integridade funcional da mucosa intestinal. O intestino delgado particularmente utiliza glutamina como combustível, que estimula a proliferação dos enterócitos. O jejum causa atrofia da mucosa do intestino delgado, e essa atrofia pode ser revertida pela ingestão de certos aminoácidos, como a glutamina. No interior dos enterócitos, a maioria dos produtos da digestão dos lipídios, particularmente monoacilgliceróis e ácidos graxos de cadeia longa, é reesterificada, formando triacilgleróis, incorporados nos quilomícrons e exportados. Os quilomícrons também transportam colesteril ésteres, fosfolipídeos e vitaminas lipossolúveis. Os quilomícrons são estruturas muito grandes para atravessar os poros dos capilares, mas podem passar através dos vastos orifícios dos vasos linfáticos. Os quilomícrons são liberados do sistema linfático na circulação sangüínea, na altura do ducto torácico, anteriormente à sua entrada no coração. 2.13. Transporte de Nutrientes na Circulação Os nutrientes são absorvidos no trato gastrointestinal e, subseqüentemente, transportados pela circulação portal ou pelo sistema linfático. A maioria dos nutrientes hidrossolúveis (aminoácidos, monossacarídeos, glicerol, ácidos graxos de cadeia curta, eletrólitos e vitaminas hidrossolúveis) é transportada predominantemente pela circulação portal. Esses nutrientes entram nos capilares que alimentam a veia porta, levando o sangue venoso até o fígado (Figura 2.5). Figura 2.5 – Sítios de absorção no trato gastrointestinal – Estômago: álcool, ácidos graxos de cadeia curta e cobre; Duodeno: Cl-, SO4=, Fe, Se, P, Cu, Ca, Zn, Mg; Jejuno: glicose, galactose, frutose, vitamina C, tiamina, riboflavina, piridoxina, ácido fólico, ácido pantotênico; Íleo: proteína, vitaminas A, D, E, K, lipídio, colesterol, sais biliares, vitamina B12; e Cólon: Na+, K+, vitamina K sintetizada por bactérias, água, biotina, ácido pantotênico. As vitaminas A, D, E, K, lipídios e colesterol são captados pelo sistema linfático, caem na veia jugular e subclávia, chegando ao coração através da veia cava superior. Os demais nutrientes entram nos vasos sangüíneos no intestino, caem na veia porta que os leva diretamente ao fígado, que por sua vez os lançam na circulação geral, através da veia cava inferior. O sistema linfático no trato gastrointestinal desempenha papel importanteno transporte de substâncias lipossolúveis. As substâncias transportadas pelo sistema linfático entram na corrente sangüínea pouco antes de chegar ao coração e vão então circular pelo corpo no sangue arterial, enquanto aquelas substâncias transportadas pela circulação portal irão passar primeiro pelo fígado, onde elas podem ser captadas e metabolizadas pelos hepatócitos ou retornar à circulação pela veia hepática. 16 Essa distinção entre transporte linfático e portal é de grande importância para a indústria farmacêutica determinar o destino de certas drogas. O sistema linfático também desempenha importante papel na manutenção do balanço dos fluidos corporais, agindo como um sistema de drenagem para o retorno de excesso de fluidos e de proteínas do espaço intersticial de volta para o sistema circulatório. Embora muitas substâncias transportadas pelo sistema portal possam também ser carreadas pela circulação linfática, o fato de o fluxo de sangue portal ser muitas vezes maior do que o fluxo linfático faz que o transporte linfático seja de pouca expressão, em comparação com o portal para a maioria das substâncias hidrossolúveis. 2.14. Regulação da Digestão e Absorção Digestão e absorção de nutrientes são regulados tanto por mecanismos nervosos quanto hormonais. Em termos de digestão, a regulação envolve a modificação na taxa de liberação do quimo no intestino delgado, a liberação da secreção gástrica, a liberação e composição da secreção pancreática e a liberação da secreção biliar. A regulação da absorção envolve a área de superfície absortiva, assim como a expressão de certas moléculas transportadoras localizadas na membrana da borda em escova. 2.14.1. Controle Nervoso O trato gastrointestinal é inervado pelo sistema nervoso intrínseco e extrínseco. O sistema nervoso intrínseco é responsável, principalmente, pela regulação neural da motilidade e função gastrointestinal. É influenciado pelo sistema nervoso extrínseco, principalmente pelo sistema nervoso parassimpático e, em menor grau, pelo sistema nervoso simpático. Todo o trato gastrointestinal é inervado pelas fibras nervosas aferentes vagais (parassimpático). O termo aferente se refere ao fato de eles carregarem informações do trato gastrointestinal para o sistema nervoso central. O sistema nervoso aferente vagal desempenha importante papel na regulação da função intestinal. O trato gastrointestinal é também inervado pelos eferentes vagais. Eferente se refere ao fato de carregarem informações do sistema nervoso central até o trato gastrointestinal. Um bom exemplo do controle nervoso da função gastrointestinal é a regulação da secreção salivar. A secreção salivar pelas glândulas salivares é quase que exclusivamente controlada pelos sinais nervosos. As secreções gástrica e pancreática, no entanto, são controladas tanto por controles nervosos quanto hormonais. O sistema nervoso parassimpático é o mais importante regulador fisiológico da secreção salivar. Aroma, visão, sabor e textura dos alimentos excitam os núcleos salivares do sistema nervoso central, que, por sua vez, aumentam a atividade parassimpática, inervando as glândulas salivares. Como resultado da ativação parassimpática, a secreção salivar pode ser aumentada em até 6 - 8 vezes. Embora as glândulas salivares sejam também inervadas pelo sistema nervoso simpático, ele parece exercer papel pouco importante na regulação da secreção salivar. O mecanismo neural está envolvido no esvaziamento gástrico mais rápido induzido pela distensão do estômago e na redução do esvaziamento induzido pela presença de uma refeição hipertônica no duodeno. Mecanismos nervosos estão ainda envolvidos na regulação da secreção exógena do pâncreas. Por exemplo, a distensão gástrica estimula a liberação de acetilcolina pelos impulsos vagais, o que, por sua vez, estimula a secreção do suco pancreático, que é rico em enzimas. Os impulsos vagais são também envolvidos na liberação de acetilcolina em resposta à presença de produtos da digestão de lipídios e proteínas no lúmen do intestino delgado. Isso, similarmente, estimula a liberação da secreção pancreática, rica em enzimas. 2.14.2. Hormônios Gastrointestinais Os hormônios gastrointestinais são intimamente envolvidos na liberação coordenada das secreções no duodeno, na manutenção da integridade da homeostase celular, na regulação da motilidade do trato gastrointestinal e no controle da ingestão alimentar. A absorção, ou mesmo a presença de alimento no trato gastrintestinal, contribui para a modulação desse controle. O trato gastrintestinal possui diferentes tipos de células secretoras de peptídeos que, combinados com outros sinais, regulam o processo digestivo e atuam no sistema nervoso central para a regulação do processo digestivo, além da fome e da saciedade. A sinalização ocorre por meio dos nervos periféricos (como pelas fibras vagais aferentes) e por meio de receptores. a) Gastrina Gastrina é o hormônio produzido pelo estômago. Sua principal função é a estimulação da secreção do ácido clorídrico e do pepsinogênio, além da motilidade gástrica. A gastrina ainda desempenha importante papel na proliferação das células da mucosa gástrica. A gastrina é liberada pelas células G no antro do estômago na presença de proteína no lúmen deste. Sua liberação é inibida pela acidificação do lúmen gástrico abaixo de pH 3. Esse mecanismo de retroalimentação regula a quantidade de gastrina liberada e, conseqüentemente, a quantidade de ácido secretada em resposta à alimentação. b) Secretina Secretina foi o primeiro hormônio gastrointestinal descoberto. Secretina é secretada pelas células S do duodeno, estimulada pela acidificação do lúmen duodenal. Sua principal função no trato gastrointestinal é a estimulação da secreção de bicarbonato pelo pâncreas, que neutraliza o quimo ácido e promove a digestão pelas enzimas pancreáticas. Pode também inibir o esvaziamento gástrico. 17 c) Colecistoquinina Colecistoquinina (CCK) é um hormônio gastrointestinal secretado pelas células I enteroendócrinas do duodeno e jejuno, assim como pelos neurônios do cérebro e do trato gastrointestinal. A CCK é responsável pela secreção pós-prandial de enzimas pancreáticas e da contração da vesícula biliar em resposta ao estímulo provocado pela presença de lipídios ou de proteínas no intestino delgado. Além do efeito secretório, a colecistoquinina pode estimular a hiperplasia e hipertrofia do pâncreas. A colecistoquinina exerce influência positiva na liberação de insulina pelo pâncreas. Foi observado que uma infusão intravenosa do hormônio reduz a glicemia em pessoas não-diabéticas e diabéticas não-insulino dependente. Outra função da CCK está relacionada ao controle da ingestão alimentar. Atuando juntamente com outros peptídeos secretados pelo trato digestivo, é um dos responsáveis pela saciedade pós-prandial (saciação). No longo prazo, entre os períodos de jejum a CCK não age na saciedade; seu efeito parece estar limitado ao evento pós-prandial. O papel da CCK na saciedade e os seus mecanismos de ação ainda não estão completamente esclarecidos. d) Somatostatina A somatostatina tem sido encontrada nos neurônios do cérebro e da coluna vertebral e nas células D do trato gastrointestinal. Apresenta grande efeito inibitório na liberação de hormônios, como: hormônio do crescimento, hormônio estimulante da tireóide, gastrina, glucagon, polipeptídeo inibitório gástrico, insulina, motilina, neurotensina, polipeptídeo pancreático, secretina, calcitonina e renina. Da mesma forma, inibe secreções gastrointestinais, como ácido gástrico, pepsina, secreções exógenas do pâncreas e secreções do intestino delgado, e, ainda a motilidade gastrintestinal. e) Grelina A grelina, hormônio gastrointestinal identificado no estômago do rato em 1999, é um potente estimulador da liberação de GH nas células somatotróficas da hipófise e do hipotálamo, sendo o ligante endógeno para o receptor secretagogode GH. Além de sua ação como liberador de GH, a grelina possui outras importantes atividades, incluindo a estimulação da secreção lactotrófica e corticotrófica, atividade orexígena acoplada ao controle do gasto energético; controle da secreção ácida e da motilidade gástrica, influência sobre a função endócrina pancreática e metabolismo da glicose e, ainda, ações cardiovasculares e efeitos antiproliferativos em células neoplásicas. É um dos mais importantes sinalizadores para o início da ingestão alimentar. Sua concentração mantém-se alta nos períodos de jejum e nos períodos que antecedem as refeições, caindo imediatamente após a alimentação, o que também sugere um controle neural. Alguns estudos têm comprovado que a grelina está associada também ao controle da ingestão alimentar no longo prazo. f) Leptina Leptina é um hormônio produzido pelos adipócitos e pela mucosa gástrica e pode servir para coordenar a regulação no curto e longo prazos da ingestão alimentar. A leptina gástrica está envolvida no controle alimentar de curto prazo, atuando em conjunto com a CCK na redução da ingestão alimentar. Está também envolvida na absorção de macronutrientes, principalmente proteína. O nível circulante de leptina correlaciona-se com a quantidade de gordura corporal, e a deficiência desse peptídeo determina obesidade grave. A leptina reduz a ingestão de alimento e aumenta a atividade do Sistema Nervoso Simpático. g) Galanina A galanina é um peptídeo de 29 aminoácidos isolado no cérebro e no trato gastrintestinal. A injeção deste hormônio aumenta a ingestão alimentar. Muito embora o tratamento crônico com galanina não provoque aumento de peso, antagonistas da galanina são potenciais agentes terapêuticos da obesidade. A galanina interage com outros peptídeos, como leptina e colecistoquinina, para regular a ingestão alimentar e a homeostase energética. h) Oxintomodulina A oxintomodulina (OXM) foi recentemente identificada como um supressor da ingestão alimentar no curto prazo. É secretado na porção distal do intestino e parece agir diretamente nos centros hipotalâmicos para diminuir o apetite, a ingestão calórica e os níveis séricos de grelina. i) Glucagon-like-peptide 1 (GLP-1) e polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP) O GLP-1 atua inibindo o esvaziamento gástrico e, assim, promovendo uma sensação de saciedade prolongada. O GIP é secretado em resposta a nutrientes presentes no lúmen do estômago e a outros peptídeos, como as bombesinas e a somatostatina. O GIP e GLP –1 potencializam a liberação de insulina induzida por glicose e, assim, mantém um importante papel na regulação da homeostase de glicose sangüínea. j) Peptídeo YY (PYY) 18 O PYY é um hormônio peptídico intestinal secretado pelas células endócrinas L da porção distal do intestino delgado e intestino grosso, no período pós-prandial, proporcionalmente à quantidade de calorias ingeridas. O PYY diminui a motilidade intestinal e aumenta a saciedade, o que provoca diminuição do apetite e da ingestão de alimentos. 2.15. O Intestino Grosso e a Ação das Bactérias Intestinais O resíduo da digestão e absorção passa pela válvula ileocecal, chegando ao intestino grosso. O cólon ou intestino grosso é mais largo em diâmetro do que o intestino delgado, e não apresenta vilos, mas tem glândulas que secretam muco. O intestino grosso serve para duas funções gerais: o cólon ascendente é o local onde a maior parte da fermentação ocorre e o cólon descendente promove a absorção de água e eletrólitos e formação das fezes. São gastas aproximadamente quatro horas para que a primeira porção de uma dieta-teste alcance a porção inicial do intestino grosso e cerca de oito horas após ter sido ingerida até que toda a parte indigerível de uma dieta entre no intestino grosso. Em contraste, o transporte através do intestino grosso é muito mais lento e pode levar até uma semana para recuperar todos os resíduos de uma dieta nas fezes. Os carboidratos que não são absorvidos no intestino delgado, assim como os carboidratos componentes do muco, são transformados em ácidos acético, propiônico ou butírico pelas bactérias do cólon. Esses ácidos graxos de cadeia curta são amplamente absorvidos no intestino grosso por difusão. Uma vez absorvidos, esses ácidos graxos são metabolizados em corpos cetônicos no epitélio ou são transportados pela veia porta para outros tecidos, onde podem ser usados como fontes de energia. Embora seu significado nutricional na espécie humana seja ainda incerto, para os ruminantes os ácidos graxos de cadeia curta ou voláteis podem contribuir com até 70% do seu requerimento energético. Grande variedade de bactérias no cólon produz gases hidrogênio, metano e dióxido de carbono pelo seu metabolismo (fermentação) de polissacarídeos não absorvidos e outros resíduos alimentares. Outras bactérias consomem gases produzidos pelas bactérias produtoras de gases. O grau de flatulência é determinado pelo balanço entre gases produzidos e consumidos. A microbiota intestinal também possui enzimas que podem metabolizar ácidos graxos de cadeia longa. Os ácidos graxos hidrolisados resultantes, como o ácido hidroxiesteárico (um produto da hidratação do ácido oléico), podem exercer profunda influência no transporte de água e eletrólitos no cólon. Essa inibição induz a diarréia. Quase todo o colesterol que entra no cólon é excretado pelas fezes. Pequena porção é metabolizada pelas bactérias a coprostanol e coprostatane, ambos pouco solúveis e, portanto, pouco disponíveis para absorção. Pequena fração dos ácidos biliares que não são reabsorvidos no íleo entra no cólon, onde são metabolizados extensivamente pelas bactérias. Os produtos dessa degradação são mais lipossolúveis do que os próprios ácidos biliares, facilitando sua absorção passiva no cólon. Os ácidos biliares podem ser seqüestrados por fibras e lipídios, interferindo com a sua absorção. Aproximadamente, 25% da uréia sintetizada no fígado chega ao trato gastrointestinal por difusão pelo sangue. Urease bacteriana no cólon converte uréia em amônia, que se difunde rapidamente pela mucosa do cólon e, pela veia porta, retorna ao fígado, onde é usada para ressintetizar uréia. A absorção de amônia pelo cólon pode contribuir para a elevação dos níveis de amônia no sangue de pacientes com patologias do fígado. 2.16. Referências ALBERTS, B.; BRAY, D.; LEWIS, J.; MARTIN, R.; ROBERTS, K.; WATSON, J.D. Biologia molecular da célula. 4. ed. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004. 1549 p. BATTERHAM, R.L.; COHEN, M.A.; ELLIS, S.M.; LE ROUX, C.W.; WIHTERS, D.J.; FROST, G.S. et al. Inhibition of food intake in obese subjects by peptide YY. N Engl. J. Med., v. 349, n. 10, p. 941-8, 2003. CINTI. S.; De MATTEIS, R.; CERESI E, PICO, C.; OLIVER, J.; OLIVER, P.; PALOU, A.; OBRADOR, A.; MAFFEIS, C. Leptin in the human stomach. Gut., v. 49, p. 155, 2001. COHEN, M.A.; ELLIS, S.M.; LE ROUX, C.W.; BATTERHAM, R.L.; PARK, A.; PATTERSON, M.; FROST, G.S.; GHATEI, M.A.; BLOOM, S.R. 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Fornecem a maior parte da energia necessária para a pessoa se movimentar, executar trabalhos e viver, contribuindo com um porcentual de 50 a 80% das calorias totais da alimentação. Em geral, são os responsáveis pela textura e flavor em muitos processamentos de alimentos. No intestino delgado, são digeridos e absorvidos e, no intestino grosso, fermentados por bactérias (STIPANUK, 2000). Nos países em desenvolvimento, os carboidratos são consumidos principalmente na forma de amido, proveniente de raízes, tubérculos e cereais, enquanto nos países industrializados se consome grande proporção de açúcares simples, particularmente sacarose. De modo geral, a proporção de carboidratos na dieta é maior nos níveis socioeconômicos mais baixos. Embora os grãos sejam uma fonte importante de carboidratos, eles também fornecem a maior parte da proteína para a população mundial. Os carboidratos não são nutrientes essenciais como alguns aminoácidos e ácidos graxos, porém é importante para a saúde e bem-estar que os alimentos contenham certa quantidade de carboidratos. Isso é verdade não apenas para os carboidratos, que podem ser digeridos, absorvidos e metabolizados, mas também para os polissacarídeos indigeríveis, que constituem as fibras da dieta. 3.2. Definição e Importância Carboidratos são polidroxialdeídos (aldoses, que possuem em sua constituição um grupo aldeídico) ou cetonas (cetoses, que possuem em sua constituição um grupo cetona) ou substâncias que produzem esses compostos quando hidrolisadas. São constituídos por átomos de carbono, oxigênio e hidrogênio na proporção: (CH2O)n. Porém, essa simples relação merece atenção, uma vez que não fornece indicação da estrutura. Além disso, essa fórmula geral não pode ser estritamente seguida, pois algumas substâncias, não classificadas como carboidratos, apresentam essa mesma fórmula, por exemplo o ácido acético (GROFF, 1995). Os carboidratos são freqüentemente encontrados ligados, por uma ligação covalente, a proteínas e lipídios. Essa glicoconjugação origina as glicoproteínas, proteoglicanos e glicolipídios (STIPANUK, 2000). Os carboidratos são nutrientes preponderantemente energéticos e mais eficientes que os lipídios e as proteínas no fornecimento de energia para a atividade celular, além de desempenharem outras funções, como: economizam proteínas, poupando-as para a sua função construtora; ajudam a manter a normalidade da oxidação de lipídios, devido à sua ação anticetogênica; e entram na constituição de inúmeros compostos que regulam o metabolismo (CAVALCANTI, 1995). 3.3. Classificação Existem três classes principais de carboidratos de interesse na nutrição: monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos Os monossacarídeos são estruturas simples de carboidratos que não podem ser hidrolisados em partículas menores, fato pelo qual são também conhecidos como "açúcares simples". A glicose é o monossacarídeo que mais interessa nutricionalmente. Oligossacarídeos são constituídos por pequenas cadeias de monossacarídeos duas, três ou quatro, originando os di-, tri- ou tetrassacarídeos. A sacarose, constituída por uma molécula de glicose e uma de frutose, é o dissacarídeo que mais interessa à nutrição, chegando a compreender 1/3 do total de carboidrato da dieta. Por fim os polissacarídeos, que são longas cadeias, centenas ou milhares de unidades de monossacarídeos. Os de maior interesse na nutrição são o glicogênio, encontrado em certos animais, inclusive os humanos, o amido e a celulose, originados de plantas (GROFF, 1995). 3.3.1. Monossacarídeos Os monossacarídeos (Fig. 3.1A), como mencionado anteriormente, constituem os chamados açúcares simples e consistem em uma só unidade aldeídica, quando o grupo carbonila está em uma das extremidades da cadeia carbônica; ou cetônica, quando o grupo carbonila está em qualquer outra posição da cadeia. Os mais simples são as duas trioses (três átomos de carbono): gliceraldeído e diidroxicetona. Aqueles com quatro, cinco, seis e sete átomos de carbono são chamados, respectivamente, de tetroses, pentoses, hexoses e heptoses (LEHNINGER, 1995). As hexoses mais abundantes nos alimentos são a D-frutose e a D-glicose. A D-glicose é o principal combustível para a maioria dos organismos vivos e o monômero primário básico dos polissacarídeos mais abundantes como amido e celulose. Dentre as hexoses, apenas glicose, galactose e frutose podem ser absorvidas por seres humanos (ETTINGER, 2002). Os principais monossacarídeos que ocorrem livres nos alimentos são a glicose, uma aldo-hexose, e a frutose, uma ceto- hexose. A galactose e a manose raramente aparecem na forma livre na natureza, mas podem existir tanto em cadeia aberta quanto em anel. Quando estão ligadas em di ou polissacarídeos, permanecem na forma cíclica. As pentoses, como ribose, desoxirribose, xilose e arabinose, são outros tipos de monossacarídeos não encontrados na forma livre nos alimentos. Elas são derivadas de pentosanas de frutas, dos ácidos nucléicos e de derivados de carne e frutos do mar (ETTINGER, 2002). 21 Glicose A glicose, também chamada de dextrose, é um carboidrato simples abundante em frutas e hortaliças. As células utilizam a glicose proveniente da dieta, onde está presente em sua forma simples ou em formas mais complexas como sacarose, lactose e amido; nesse caso, essas moléculas precisam ser degradadas para serem absorvidas. A glicose também pode ser proveniente dos estoques de glicogênio muscular e hepático e do esqueleto carbônico dos aminoácidos glicogênicos e do glicerol, durante seu metabolismo no processo chamado de gliconeogênse (STIPANUK, 2000). A glicose é a melhor forma de açúcar para ser utilizada quando é necessário um suprimento imediato de energia, uma vez que não requer mudanças para ser empregada, é relativamente barata e pode ser adicionada a alimentos líquidos para aumentar a ingestão de carboidratos, sem afetar o sabor dos alimentos, pois tem cerca de 3/5 da doçura do açúcar da cana. Em condições normais, células, como as hemácias, são incapazes de usar outro tipo de combustívelsenão a glicose, que é também essencial para as células do sistema nervoso central, dos pulmões e do músculo cardíaco. No entanto, a maioria das células do organismo humano também pode utilizar os lipídios e proteínas como fonte energética; por exemplo, em situações de jejum prolongado, o sistema nervoso pode se adaptar para utilizar corpos cetônicos com fonte de energia (STIPANUK, 2000). As células não são capazes de armazenar glicose como monossacarídeo, pois sua estrutura de reserva é o glicogênio, um polissacarídeo conhecido como "amido animal". Porém, a glicose é a forma de açúcar encontrada normalmente na corrente sangüínea, sendo sua concentração no sangue estreitamente regulada; em um indivíduo adulto, a faixa de normalidade compreende 70 a 110 mg/dL de sangue. A digestão do carboidrato da dieta no trato gastrointestinal superior fornece glicose, frutose e galactose para absorção intestinal. A presença de oligossacarídeos não absorvíveis e de fibras como pectinas, β-glicanos e gomas das frutas, vegetais e cereais reduz a eficiência da hidrólise de enzimas e torna mais lenta a velocidade com a qual a glicose entra na corrente sangüínea. A redução na eficiência da hidrólise diminui o índice glicêmico dos alimentos que estão sendo digeridos. Abaixo estão valores de índices glicêmicos de alguns alimentos, tendo com referência o pão branco (IG pão branco=100) (ETTINGER, 2002). Arroz 109 Manga 80 Batata frita 107 Biscoito de aveia 79 Abóbora 107 Batata-doce 77 Melancia 103 Banana 76 Cenoura 101 Inhame 73 Batata assada 100 Chocolate 70 Fubá 97 Macarrão 64 Refrigerante 97 Laranja 62 Biscoito amanteigado 95 Pudim 61 Abacaxi 94 Maçã 52 Batata cozida 93 Iogurte 51 Beterraba 91 Grão-de-bico 47 Pão de hambúrguer 87 Feijão-roxo 42 Sorvete 87 Leite 39 Mamão 83 Ameixa 34 Figura 3.1– Estruturas dos carboidratos - Monossacarídeos. CH2OH HO OH O OH OH α-D-Glicose HO CH2OH OH O OH OH α-D-Galactose HOH2C CH2OH O OH HO α-D-Frutose 22 Índice Glicêmico 60 80 100 120 140 160 0 15 30 45 60 75 90 120 Tempo (min) G lic os e (m g/ dL ) Feijão Batata Figura 3.2 – Índice glicêmico (valores fictícios). A área abaixo da curva do alimento em relação à área correspondente para glicose ou pão branco fornece o índice glicêmico (IG). Frutose A frutose, também chamada de levulose, é encontrada juntamente com a glicose e a sacarose no mel e nas frutas. É um açúcar muito solúvel e o mais doce dos açúcares simples. A frutose, combinada com a glicose, forma sacarose. Constitui a unidade estrutural da inulina, um oligossacarídeo encontrado em certas raízes (alcachofra) e bulbos (cebola e alho). A inulina é muito pouco digerida no trato gastrointestinal e, juntamente com frutooligossacarídeos (FOS), constitui uma das principais fontes de prebióticos na alimentação. Galactose A galactose é raramente encontrada livre na natureza, mas é obtida principalmente pela hidrólise da lactose, encontrada no leite. É menos solúvel em água e menos doce do que a glicose. A galactose também é um constituinte dos glicolipídios e das glicoproteínas, encontrados em muitos tecidos, inclusive no tecido nervoso. No organismo, a glicose pode ser transformada em galactose, para que as glândulas mamárias possam produzir lactose. Índice Glicêmico e Carga Glicêmica O índice glicêmico (IG) é definido como a área abaixo da curva relativa ao aumento da glicose sangüínea no período de 2 h após a ingestão de certa quantidade de carboidratos de um alimento (ex. 50 g), comparado com a ingestão da mesma quantidade de carboidratos de um alimento-referência (pão branco ou glicose), avaliado no mesmo indivíduo, nas mesmas condições, usando a concentração de glicose inicial como ponto de base (Fig 3.2). Assim, o índice glicêmico é a categorização dos alimentos com base na resposta de glicose sangüínea pós-prandial, comparada com um alimento de referência (ETTINGER, 2002). A carga glicêmica média é derivada da mesma maneira que o índice glicêmico, mas sem dividir pela quantidade total de carboidratos consumidos. A carga glicêmica é, portanto, um indicador da resposta glicêmica ou insulínica induzida pelo consumo total de carboidratos e não apenas de uma quantidade preestabelecida, como 50 g para determinação do IG. Alguns alimentos que contêm carboidratos elevam os níveis de glicose sangüínea muito rapidamente, enquanto outros permitem que o organismo mantenha um "estado constante" com relação à liberação de insulina para controlar os níveis de açúcar do sangue (MATHAI, 2002). Esse índice é uma proposta como um meio de prescrever dietas para diabéticos e para controle de energia. Diversos fatores influenciam o IG. E os que mais contribuem para reduzir esse índice são: alta relação entre amilose: amilopectina; maior tamanho de partícula do grão ingerido; menor processamento (cozimento) dos alimentos; menor grau de amadurecimento das frutas, presença de fibra solúvel e de inibidores enzimáticos (α-amilase) e a interação física com lipídios e proteínas. A chave do processo de IG parece ser a taxa de absorção do alimento. 23 3.3.2. Álcoois de Açúcares Os álcoois de açúcares não são carboidratos, mas derivados deles através de hidrogenação, e são encontrados em diversos vegetais (Fig. 3.3). O sorbitol, produzido comercialmente por hidrogenação da glicose e também encontrado em muitas frutas e hortaliças, é absorvido de forma muito lenta na corrente sangüínea, e pode ser metabolizado aparentemente sem insulina. Tem o mesmo valor calórico da glicose, o açúcar do qual é obtido e tem cerca da metade do poder adoçante da sacarose. Em altas doses, o sorbitol tem efeito laxativo. O manitol, obtido comercialmente por hidrogenação da manose, ocorre naturalmente em abacaxis, azeitonas, cogumelos, aspargos e cenouras, podendo também ser adicionado como agente desidratante em outros alimentos. Uma vez que é muito pouco absorvido, o manitol fornece quase a metade do valor energético da glicose. O xilitol, encontrado em menor concentração nas plantas, é derivado da xilose extraída da hemicelulose e tem o mesmo poder adoçante e o mesmo valor energético da sacarose. Tem sido muito utilizado como adoçante, por não ser cariogênico. É tolerável por diabéticos, pois sua transformação em glicose no fígado é lenta e parcial. O inositol ocorre em muitos alimentos, especialmente na casca dos grãos de cereais. Quando combinado com certos grupos fosfato, forma o ácido fítico, que reduz a absorção de cálcio, zinco e ferro nos intestinos. O dulcitol, obtido da galactose por hidrogenação, é, às vezes, adicionado aos alimentos. O glicerol ocorre na natureza e é importante componente dos lipídios. O álcool, ou o etanol, é produzido pela fermentação da glicose por enzimas em leveduras e pode, em certos indivíduos consumidores de grandes quantidades de bebidas alcoólicas, representar parte significativa da ingestão total de energia. Um grama de álcool produz 7 kcal. O etanol não requer digestão e pode ser absorvido no trato gastrointestinal. CH2OH CH2OH CH2OH H C OH HO C H H C OH HO C H HO C H HO C H H C OH H C OH H C OH H C OH H C OH CH2OH CH2OH CH2OH mio-Inositol OH OH OH HO HO OH Sorbitol Manitol Xilitol Figura. 3.3 – Estruturas dos álcoois de açúcares. 24 3.3.3. Dissacarídeos Os dissacarídeos são representados pela sacarose (açúcar da cana ou
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