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Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 1 Módulo 1 P7 Reumato Espondiloartropatias Espondiloartropatias (EAP) engloba um grupo de síndromes clínicas. Os subgrupos mais conhecidos são: espondilite anquilosantes, artrite reativa, artrite psoriática e artrite enteropática De acordo com o conceito proposto em 2009 pelo grupo ASAS (Assessment on SpondyloArthritis International Society), as espondiloartrites (EpA) compreendem um grupo de doenças distintas entre si, mas que tem em comum as seguintes características: Axiais e periféricas: envolvimento axial inflamatório (sacroliíte e espondilite); artrite periférica; entesite; dactilite. Extra-articulares: uveíte, doença inflamatória intestinal e psoríase. Radiológicas: sacroiliíte; entesopatias. Epidemiológicas e etiopatogênicas: associação com agregação familiar e ao antígeno de histocompatibilidade HLA-B27. **Em alguns livros pode ser encontrado o termo espondiloartropatias soronegativas se refere à negatividade do fator reumatoide (denominação antiga) Etiopatogenia A fisiopatogenia da EAP é muito mais inflamatória do que auto-imune (relacionado a auto-anticorpos), mas existe uma via comum compartilhada de suscetibilidade imunogênica. As EAP parecem ser da mesma linhagem fenotípica HLA-B27 O papel convencional do HLA-B27 do MHC classe I é apresentar um peptídeo processado ao receptor das células T de um linfócito T CD8 específico, com isso iniciando uma resposta imune contra o patógeno do qual aquele peptídeo foi derivado por proteólise e por processamento intracelulares. Na fisiopatologia da EPA, corre um erro no dobramento do HLA B27, formando dímeros que servem como estímulo antigênico promovendo a produção de IL-23 que é uma citocina essencial para diferenciação de linfócitos em Th 17, os quais produzem IL-17 e exacerbam a resposta inflamatória(IL-1 e TNFα). Outro aspecto fisiopatológico marcante das EpAs é a formação óssea no local das enteses, que é responsável pela limitação funcional, pontes ósseas (sindesmófitos) e anquilose. A neoformação óssea que ocorre no complexo entesosinovial é decorrente da inflamação crônica local e estresse mecânico, que estimulam a formação óssea através da ação dos osteoblastos e osteócitos. A prostaglandina E2 tem papel importante na formação dos sindesmófitos, portanto o uso de AINE no tratamento é eficaz em prevenir e reduzir progressão radiográfica da doença. Manifestações Clínicas As Artropatias tem forte predileção para a coluna vertebral, em particular pelas articulações sacroilíacas . Existe uma tendência compartilhada pela neoformação óssea nos sítios de inflamação crônica, tendo como consequência a anquilose articular. Quando a artrite periférica ocorre, ela comumente afeta o membro inferior e é assimétrica. Existe uma predileção por locais de inserções tendíneas no osso (enteses), de modo que as entesites tornam-se uma das manifestações clínicas mais Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 2 Módulo 1 P7 Reumato específicas da EAP. Qualquer que seja a base para o envolvimento do órgão alvo, a inflamação na êntese e no osso subcondral adjacente é uma característica típica dessa artrite, e a apresentação desta inflamação nas imagens adquiridas por ressonância Magnética (RM) é suficientemente distinta para levar alguns investigadores a usar tais imagens para fins diagnósticos. Predileção pelo envolvimento ocular é a manifestação mais comum de todos os subgrupos da EAP Todos os subgrupos têm uma associação ao alelo B27 do antígeno leucocitário humano (HLA) de classe I Diagnóstico Cada vez mais, os critérios diagnósticos estão sendo utilizados para realçar as manifestações clínicas comuns, principalmente a dor em coluna de caráter inflamatório ou artrite assimétrica de membros inferiores. Com relação a histopatogênese das articulações, locais de inflamação crônica na EAP se associam à neoformações ósseas. **Existem algumas evidências de que as EAP reflitam mais um perfil de citocinas inflamatórias TH2 em oposição ao perfil TH1 da AR A histopatologia sinovial na EAP é caracterizada por neutrófilos abundantes, macrófagos e hipervascularidade Espondilite Anquilosante Epidemiologia A EA é o distúrbio mais comum do esqueleto Axial Acomete principalmente Homens Mais de 90% dos pacientes iniciam os sintomas antes dos 45 anos Envolvimento Familiar é comum Manifestações Clínicas A apresentação clássica de EA é o início insidioso de lombalgia, que persiste por mais de 3 meses, acompanhada de rigidez matinal precoce e tipicamente melhorada pelo exercício O quadro axial costuma ter caráter progressivo ascendente, também acometendo coluna torácica e cervical. A dorsalgia que faz com que o paciente desperte do sono frequentemente é um indício para a dorsalgia inflamatória, que pode ser previamente mal diagnosticada como dor devido a discopatia Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 3 Módulo 1 P7 Reumato degenerativa, sendo essa ultima mais comum de lombalgia na população geral A dor na região média da coluna torácica e a dor cervical particularmente à noite são menos comuns, mas quando ocorrem, sugerem fortemente dorsalgia inflamatória. A fadiga também é um sintoma sugestivo. IMPORTANTE!! Os critérios modificados de Nova York (1984) são os mais utilizados para se classificar um paciente como portador de EA e obrigatoriamente deve-se ter o critério radiológico presente associado a pelo menos 1 critério clínico. No entanto, como a presença de sacroiliíte radiográfica é mandatória pode haver retardo no diagnóstico Oligoartrite periférica é encontrada em até 30% dos pacientes com EA. Tipicamente, trata-se de uma oligoartrite assimétrica com predileção pelos membros inferiores. O envolvimento do quadril pode ocorrer em qualquer ponto do curso da EA e pode seguir um curso de destruição articular As características extra-articulares envolvem principalmente os olhos. O envolvimento ocular pode ocorrer em até 40% dos pacientes com EA, mais tipicamente uveíte anterior aguda (irite), A uveite frequentemente se manifesta por discreto comprometimento na acuidade visual e fotofobia, podendo ser acompanhada de dor ocular. Diagnóstico Exame físico No exame físico do paciente com doença de avançada são achados: perda da mobilidade da coluna, posição do esquiador, retificação da coluna lombar, acentuação da cifose e projeção anterior da coluna cervical retificada. O grau de restrição da mobilidade lombar é mensurado pelo teste de Schober, que consiste em medir com fita métrica a distância entre a transição lombossacra e 10 cm acima, em seguida é solicitado ao paciente que flexione a coluna e tente alcançar as mãos no chão, novamente mensuramos a distância entre transição lombossacra e o ponto previamente traçado 10 cm acima, caso a variação seja menor ou igual a 5 cm existe mobilidade lombar reduzida. O envolvimento da coluna torácica é avaliado através da mensuração da expansibilidade torácica e da coluna cervical da distância tragus-parede e occipito-parede. Já para a avaliação de sacroiliíte utilizamos a manobra de Patrick-Fabere. No Patrick Fabere solicitamos ao paciente que faça um “4” (Flexão ABdução Rotação Externa de quadril), em seguida o examinador coloca uma mão no joelho flexionado e a outra mão na crista ilíaca contralateral e aplica uma força para baixo, se paciente sentir dor na região inguinal homolateral então provavelmente se trate de patologia do quadril, caso a dor seja contralateral e posterior sugere sacroileíte Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 4 Módulo 1 P7 Reumato Apesar do acometimento axial ser o mais característico da doença pode ocorrer entesite, principalmente de calcâneo e fáscia plantar, e artriteperiférica que geralmente é oligoarticular assimétrico e de grandes articulações, como joelho e tornozelos. Ao exame físico a entesite se expressa através de dor importante a palpação de junções costocondrais, apófises espinhosas das vértebras, cristas ilíacas, trocânteres maiores, tuberosidades isquiais e tibiais e pode haver hiperemia e edema. Exames Laboratoriais O VHS e a proteína C-reativa estão tipicamente elevados, mas valores normais não excluem a dorsalgia inflamatória A anemia de doença crônica pode ser observada se a condição for de longa duração Valores séricos de Imunoglobulina A podem estar elevados, mas os autoanticorpos são ausentes Radiologia O exame inicial a ser solicitado é a radiografia de sacroilíacas (incidência em AP e Ferguson) e de coluna cervical, torácica e lombar (AP e perfil). Na radiografia de sacroilíacas podemos graduar a sacroiliíte de 0 (normal) a 4 (anquilose). As alterações clássicas são bilaterais nas articulações sacroilíacas. As alterações incluem erosões na linha articular, pseudoalargamento, esclerose subcondral e, finalmente, anquilose As radiografias de coluna podem revelar quadratura dos corpos vertebrais (perda da concavidade anterior normal das vértebras lombares) e “cantos reluzentes) (esclerose subcondral da margem superior do corpo vertebral), ambos sendo manifestações de entesite Os sindesmófitos representam pontos marginais das vertebras que se desenvolvem e tornam claro o diagnóstico As alterações podem resultar na “coluna de bambu” assim chamada devido as pontes de sindesmófitos poderem de fato mimetizar a aparência de bambu Atualmente, aprecia-se que a osteoporose seja uma característica significativa da EA, provavelmente refletindo tanto a inflamação crônica local quanto a carga biomecânica anormal das vértebras a medida que a doença progride Tratamento A abordagem terapêutica envolve medidas farmacológicas (AINE, analgésico, DMARDs sintéticos e biológicos) e não farmacológicas como evitar posições viciosas, exercícios respiratórios, educação do paciente, atividade física e fisioterapia. Os AINE são primeira linha de tratamento, mostraram evitar e reduzir progressão estrutural. Já os DMARDs sintéticos como sulfassalazina e metotrexate são indicados em pacientes com quadro periférico. Os DMARDs biológicos anti- TNF como Infliximabe, Adalimumabe, Golimumabe e Etanercept são terapia de escolha no quadro axial em que houve falha terapêutica a pelo menos dois AINEs. Mais recentemente foi incluído no tratamento das EpAs axiais, o inibidor da IL17 (Secuquinumabe), que pode ser usado na falha do anti-TNF ou como primeira Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 5 Módulo 1 P7 Reumato opção em caso de falha na terapia de primeira linha e contra-indicação ao anti-TNF. Artrite Psoriática A artrite psoriásica (AP) é uma enfermidade sistêmica de natureza inflamatória que ocorre em pessoas com psoríase. Em média 10 a 20% dos pacientes com psoríase cutânea apresentam artrite psoriásica, sendo que 70 a 80% dos casos a psoríase precede o quadro articular. Não existe predomínio quanto ao sexo e acomete indivíduos entre a quarta e quinta décadas de vida. A idade de inicio pode varias de 30 a 55 anos, com igual predileção entre homens e mulheres Manifestações clínicas As manifestações articulares na AP apresentam amplo espectro clínico, são em sua maioria periféricas (95%) e foram divididas didaticamente, segundo Moll e Wright, em 5 categorias: : mais comum, Artrite oligoarticular assimétrica acomete sobretudo joelhos, pequenas articulações dos pés e das mãos. : comum, semelhante a Artrite Poliartrite simétrica reumatoide, a presença do Fator reumatoide e anti- - CCP auxilia na distinção. Artrite com envolvimento predominante das as alterações ungueais interfalangeanas distais (IFDs): são frequentes. : mais grave, deformidades severas Artrite mutilante com subluxações e “encurtamento” dos dedos (dedos em telescópio). rara, se apresenta Doença axial predominante (5%): com sacroiliíte assimétrica. Diagnóstico As alterações radiográficas na APs envolvem o edema de tecidos moles (particularmente no caso de dactilite), erosões e periostite. O envolvimento axial pode apresentar a imagem de sacroilite assimétrica e sindesmófitos volumosos, assimétricos e não marginais A deformidade clássica em “lápis de xícara” pode sem encontrada em pacientes com doenças das articulações interfalangianas distais O critério de CASPAR (Classification Criteria for Psoriatic Arthritis) é utilizado atualmente para classificar o paciente como portador de AP, sendo necessário pelo menos 3 pontos. Tratamento Inicialmente é recomendado o uso de AINEs e posteriormente pode-se iniciar um DMARD sintético como metotrexate, sulfassalazina, leflunomida e ciclosporina. Os corticoides sistêmicos não costumam ser prescritos pois causam rebote no processo de suspensão do mesmo. Em casos refratários pode-se utilizar anti-TNF, anti-IL12, anti-IL17 e e anti-IL17A (ixequizumabe). Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 6 Módulo 1 P7 Reumato Artrite Enteropática A artrite enteropática (AE) refere-se à artrite associada a doença de Crohn (DC) ou a colite Ulcerativa (CLU) A artrite enteropática tem pico de incidência entre a segunda e terceira décadas de vida e afeta 5 a 10% dos indivíduos portadores de doença inflamatória intestinal, sendo a manifestação extra-intestinal mais comum. Tipicamente trata-se de uma poliartrite não erosiva inflamatória, predominante de grandes articulações Medidas para controlae a doença GI geralmente controlam concomitantemente a doença articular Manifestações Clínicas O acometimento articular periférico não possui relação com a presença do HLA B27; é mais comum que o axial, e é dividido em 2 tipos: Tipo 1: oligoartrite de membros inferiores, grandes articulações. Mais comum, se correlaciona com atividade e extensão da doença intestinal, e pode preceder sintomas intestinais. Tipo 2: poliartrite simétrica de pequenas e grandes articulações, predomina em membros superiores. Menos frequente e não se correlaciona com atividade intestinal. No caso de quadro axial este tem HLA B27 positivo em 70% e manifesta-se com sacroiliíte simétrica e sindesmófitos semelhante à EA, e que, diferente do periférico, não se relaciona com atividade da doença intestinal. Entesite e dactilite também podem estar presentes. As manifestações extra-articulares incluem: episclerite e uveíte anterior, eritema nodoso, pioderma gangrenoso, colangite esclerosante primária e ulcerações orais. Diagnóstico É importante reconhecer que o achado articular de AE pode preceder quaisquer sintoma de GI Na avaliação inicial de um paciente com esta manifestação, é importante realizar coproculturas completas e detalhadas. Se os sintomas de GI persistirem, frequentemente recorre-se a uma colonoscopia diagnóstica para elucidar a questão Não existe nenhum exame específico que confirme o diagnóstico. No laboratório pode haver presença de P- Anca atípico (70% na retocolite ulcerativa e menos de 20% no Chron) e HLA B27 positivo nos casos axiais. Já os exames de imagem têm achados muito semelhantes ao da EA, com sindesmófitos e sacroiliíte simétrica. Tratamento Os AINEs não devem ser prescritos pelo fato de poderem causar ulceração ou sangramento intestinal, que pode induzir fator confundidor de atividade da doença intestinal. Nestes casos, prednisona em baixas doses podem ser prescritos para alívio sintomático. Mesalazina, Sulfassalazina, Metotrexato, Azatioprina podem ser utilizados. Nos casos refratários indica-se o uso de Anti-TNF ou anti-IL17 ou anti- IL12.