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Reitora L:Jgia Lt1111ina P11patto Vice-Reitor Eduardo D i Mauro eduel .C::::Ç::::::.- EdiroRA dA UNivrnsidAdE EsTAduAl dE LoNdRiNA Conselho Editorial Diretora Patrícia de Castro Santos (Presidente) Antonio Carlos Dourado Fernando Fernandes Francisca So11sa Mota e Pinheiro Fredenco A11g11sto Garcia Femandes João Batista B11zato José Eduardo de Siqueira Lttiz Carlos Bmschi Odilon Vidotto Rossana Lott Rodrigues Patrícia de Castro Santos Paulo Clinger de Souza 1hialétj a Liberdade Dados de Catalogação na Publicação (ClP) Internacional S729p Souza, Paulo Clinger de A dialética da liberdade em Locke / Paulo Clinger de Souza. - Londrina : Eduel, 2003. xxii, 150 p.: il.; 23cm (Série Biblioteca Universitária) ISBN 85-7216-351-4 1. Filosofia inglesa. 2. Liberdade. l. Título. CDU 1(410.1) Direitos reservados a Editora da Universidade Estadual de Londrina Campus Universitário Caixa Postal 6001 Fone/Fax: (43) 3371-4674 86051-990 Londrina - PR E-mail: eduel@uel.br www.uel.br/ editora Impresso no Brasil / Printed in Brazil Depósito Legal na Biblioteca Nacional 2003 A meus pais (in memoriam): Antônio de Souza Pinto e Maria Bento Gonzaga A minha esposa e filhos: Maria Aparecida, Angela, Paulo, Ana e Alexandre. Pelo carinho, compreensão e apoio. "Você tem o direito de agarrar-se a um sonho para que o empurre para frente, mas nunca para que o afaste da realidade" M.Quoist SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ................................................................................... xi PREFÁCIO .............................................................................................. xvii INTRODUÇÃO ......................................................................................... 1 1 DESENVOLVIMENTO DA IDÉIA DE LIBERDADE NA FILOSOFIA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA .......................... 9 , A NOVIDADE APRESENTADA PELA FILOSOFIA DA LIBERDADE DE LOCKE .............................................................. 19 Evol11ção histórica da idéia de liberdade .................................................... 1 9 A filosqfta da liberdade seg11ndo Locke ..................................................... 25 3 CONHECIMENTO E A LIBERDADE EM LOCKE .............. 31 No contexto das obras ............................ : ................................................. 32 A influência da educação no conhecimento ................................................. 42 A i,nportância da educação na idéia liberal de Locke ............................... 4 7 4 A RELIGIÃO E A LIBERDADE EM LOCKE ......................... 61 A influência da religião na idéia de liberdade de Locke ............................. 61 A tolerância religiosa como base da idéia liberal de Locke ................... : .... 75 5 LIBERDADE E SOCIEDADE POLÍTICA EM LOCKE ....... 81 A s idéias de liberdade de Locke ................................................................ 82 J_,iberdade e razão .................................................................................... 85 Estado de natureza e estado de sociedade .................................................. 89 Decisão por maioria ................................................................................. 98 Constituição de uma sociedade política .................................................... 103 O sentido federativo de uma sociedade ..................................................... 113 A soberania popular .............................................................................. 116 A organização política da Caro!ina ........................................................ 123 Liberdade e propriedade em Locke ......................................................... 128 CONCLUSÃO ........................................................................................ 133 BIBLIOGRAFIA .................................................................................... 147 / APRESENTAÇÃO A proteção da vida, da liberdade e da propriedade dos cidadãos nunca fora objeto de extrema preocupação das sociedades como nos tempos atuais. Na verdade, a discussão filosófica a respeito desses temas e da organização da sociedade política, com um governo democrático e representativo, foi introduzida pelo médico, filósofo e economista John Locke (1632-1704), na segunda metade do século XVII, na sua obra- prima: S egundo tratado sobre o governo civil (1690). Quando eclodiu a guerra civil de 1642, entre os parlamentaristas e os partidários do rei Carlos I, Locke tinha apenas dez anos de idade. O episódio marcou sua infância e introduziu na sua mente sólidas concepções de defesa do Parlamento, pelo fato de sua familia ter lutado contra o rei, face as arbitrariedades cometidas pelo soberano. \prcsl'nt,u;ão Perseguida, a família de Locke enfrentou situações de dificuldades de sobrevivência, sendo amparada pelo coronel Alexandre Popham, que também escapou com vida da perseguição dos monarquistas. E m 1649, o rei Carlos I foi decapitado. Os parlamentaristas assumiram o comando político da Inglaterra e estabeleceram a Commonwealth, sob a liderança de Olivier Cromwell, que restabelece a ordem política, financeira e administrativa do país. Com a ascensão de Cromwell, o coronel Popham tornou-se membro influente do Parlamento. Usando da primazia do cargo, Popham agraciou John Locke a matricular-se na melhor escola do país, na época, a Westminster School, em Londres. Da convivência com alunos monarquistas e parlamentaristas Locke desenvolveu suas qualidades de tolerância e habilidades de acumular conhecimentos pela experiência. Mas foi na Universidade de Oxford, a partir de 1652, que Locke, embora estudando medicina, alargou seus conhecimentos sobre a política e sobre a filosofia, os quais demonstrados nos seus trabalhos desenvolvidos posteriormente, influenciaram profundamente na mudança do curso da ação política dos Estados Nacionais e no modo de pensar da humanidade. N o campo filosófico, as influências de Aristóteles e de Descartes foram primorosas na sua formação. Encantava-se com o conhecimento médico desenvolvido por Aristóteles e deslumbrava-se com a metodologia racional de Descartes. Mas o talento de Locke vislumbrava horizontes e caminhos diferentes. Afastando-se da metafísica e da política de Aristóteles e das idéias inatas de Descartes, torna-se um dos principais inspiradores da filosofia \ di 1lc ica da lihndadP l'lll l.och' X 1 EMPIRISTA, segundo a qual o conhecimento humano tem como base a EXPERIÊNCIA. Os fundamentos desta filosofia estão delineados na sua grande obra: Ensaio acerca do entendimento humano (1690). N o campo político, se contrapõe ao autoritarismo de governo proposto por Hobbes, que na sua obra, O Leviatã (1651), subordina os interesses dos indivíduos a um sbberano, com poder para impor-lhes um modus-vivendi único, sob um Estado forte. Locke delineia e edifica suas idéias políticas a respeito da tolerância, direito à vida, à liberdade e à propriedade na sua obra: Segundo Tratado sobre o governo civil. Nesta obra, Locke planta as raízes para a instituição de um governo civil, de características democráticas, eleito por maioria, para gerir a vida dos cidadãos, através de leis aprovadas com o consentimento do povo, capazes de protegê-lo e não escravizá-lo. Estas idéias influíram na mudança do curso das políticas das nações e contribuíram na implantação das diferentes democracias em nosso planeta. Várias nações, inclusive o Brasil, vivem sob a égide de Locke e não se dão conta de divulgar para as gerações o legado desse extraordinário homem público e filósofo. A história atribui a Montesquieu (1689-1755) a primazia da separação dos poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário, mas não faz justiça a Locke como o inspirador, o mentor e o teórico que deixou delineadas as bases e as diretrizes para a organização da sociedadepolítica, com a criação de um poder Executivo e um poder Legislativo, eleitos por maioria, para dirigir e proteger as aspirações individuais. Com relação ao Judicián"o, Locke indica as bases para a sua criação, quando Apresentação xiii sugere a nomeação de magistrados, por um ou outro poder, para dirimirem as controvérsias. Durante sua permanência no exílio, de 1683 a 1689, Locke revisa e conclui suas principais obras: Ensaio acerca da tolerância (1689), Segundo tramdo sobre o governo civil e Ensaio acerca do entendimento humano. Estas obras, sobretudo as duas primeiras, só puderam ser publicadas após a Revolução Gloriosa (1688), que conduziu o príncipe Guilherme ao poder e Locke pode voltar à Inglaterta, na esteira dessa revolução que o consagrou para a posteridade. Atribui-se a Locke a primazia de ser o teórico político que preparou o terreno da revolução, que segundo a história, irrompeu sem derramamento de sangue. N a verdade, a influência de Locke nos destinos da política da Inglaterra, tem início na sua época de acadêmico e professor da Universidade de Oxford. A tolerância era um dos grandes temas debatidos na segunda metade do século X V I I , face a intolerância obstinada entre católicos (monarquistas) e protestantes, que provocava desordem em todo o reino e impedia a construção de consenso nas ações do Parlamento. Locke dedicou-se profundamente à catequese da tolerância, opondo-se a qualquer dogmatismo intransigente. Através da sua pregação, as dissensões, sobretudo no Parlamento, foram atenuadas, e seu projeto político de instauração de uma democracia liberal passou a encontrar espaço para ser implementado. N o período em que exerceu o cargo de Secretário do Conselho de Comércio e Agricultura, para o qual foi nomeado pelo chanceler Lord Shaftesbury, Locke foi um dos principais mentores pelo esboço da Constituição da Província de Carolina do Norte, em 1669. A dial{•tica e.la liberdade em Locke XI\ N o Ensaio acerca do entendimento humano, Locke fundamentou e sedimentou suas idéias e concepções filosóficas sobre a epistemologia do conhecimento. Nesta apresentação, julgamos oportuno inserir o registro de Michaud (1986), como o mais relevante e de justiça a Locke: " Os conceitos do Ensaio constituíram a linguagem e a referência obrigatória de todo empreendimento filosófico ... Loc.ke foi o pensador mais importante, mais respeitável e Q mais na moda... Sob múltiplos aspectos, a filosofia de Loc.ke constituiu a linguagem do Século das Luzes, ... , todo mundo no século XVIII, leu ou queria dar a impressão de ter lido Locke'. Por estas considerações, diferentes autores visitados afirmam que as idéias de Locke influíram na Declaração de Independência e na Constituição dos Estados Unidos; na Revolução e na Constituição francesas; na Constituição Inglesa, e bem assim, a nosso ver, na existência e na constituição dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário do Brasil, tendo em vista ser o inspirador e o sedimentador dessa forma de governo. Na economia, suas considerações na coletânea de Severalpapers relating to monry, Interest na Trade (1696), deram inspiração para que mais tarde fosse formulada a chamada Teoria Quantitativa da Moeda. N a educação, através da obra Alguns pensamentos referentes à educação (1693), Locke mostra como a educação influi na formação das pessoas e da sociedade, na expressão: " a transmissão dos valores de uma sociedade alicerça-se na mação e educação dos joven!'. O autor é testemunha ocular dos efeitos da educação na formação da juventude. A o longo de quarenta anos como educador, pudemos constatar a evolução moral, ética, política e profissional de pessoas de diferentes origens. A liberdade individual bem orientada e estimulada por princípios e objetivos, pode Apresenta<;üo X\' produzir ações relevantes para a coletividade. Como participante, na condição de ex-aluno e ex-dirigente da C N E C - Campanha Nacional de Escolas da Comunidade, entidade criada pelo brasileiro Felipe Tiago Gomes (1922- 1996), para disseminar edt1eação para a juventude, através de Conselhos Comunitários, tivemos a oportunidade de compartilhar e observar como a mobilização das pessoas, em torno de projetos educativos, pode contribuir para a formação de indivíduos livres e plenos para o exercício da cidadania. A entidade chegou a ter mais de 1500 escolas de todos os níveis, e cerca de 500.000 alunos, de 1970 a 1980. Milhares de ex-alunos que tiveram sua base de formação pela entidade, exerceram ou estão exercendo funções relevantes por este país afora. Este relato tem a intenção de informar ao leitor que a vivência do autor em trabalhos comunitários, encontrou no Curso de Mestrado em Filosofia, da U F J F , motivações para resgatar os ideais de Locke para os dias atuais, quando a vida, a liberdade e a propriedade dos cidadãos estão carentes de leis e medidas protetoras. A o longo deste livro procuraremos mostrar que não concordamos na versão de que Locke tenha sido um dos representantes da burguesia inglesa, como rotulam algumas correntes, mas que o seu envolvimento neste ou noutro segmento, em determinadas circunstâncias, tinha o objetivo e a determinação da aprovação do seu projeto político. Paulo Clinger de Souza Juiz de Fora, 08 de maio de 2003. \ di<1h''litil da libcrdadt' em Lockl' \ \ 1 PREFÁCIO E ste livro foi inicialmente concebido como dissertação de mestrado que Paulo Clinger de Souza elaborou no âmbito do programa de mestrado em filosofia da Universidade Federal de Juiz de Fora - U F J F e foi defendida em 20 de agosto de 1999. O autor é graduado em Ciências Econômicas pela U F J F (1964), fez curso de aperfeiçoamento em Análise Econômica no Conselho Nacional de Economia (1966) e de Especialização em Teoria Econômica na Fundação Getúlio Vargas, RJ (1976 e 1977). Atualmente é Professor Adjunto N do Departamento de Análise Econômica da Faculdade de Economia da UFJF. Clinger começou o curso de mestrado preocupado com o sentido e as implicações da visão moderna de liberdade. Estava intrigado com o fato de que não havíamos, na América Latina, constituído o que ficou conhecido como moral social de tipo Prefút io \ ; \ i consensual, já que não nos preocupamos em formar empresários nem nos orgulhamos dos que existem. Pelo contrário, o sucesso e o enriquecimento são vistos com reserva pela maioria das pessoas. Moral social laica e consensual foi a forma de solução do problema ético que propiciou a organização social e política da Inglaterra no século X V I I I e também de boa parte das nações européias e do norte da América na mesma ocasião. Junto a essa moralidade, desenvolveu-se uma filosofia da liberdade que apostaya na autonomia e emancipação do homem e que foi a base do liberalismo político e econômico. A realidade latino-americana é outra desde sua incorporação ao mundo ocidental. A liberdade sofreu restrições em vários campos, do político ao religioso. As razões são conhecidas: o tipo de colonização a que foi submetida, o patrimonialismo ibérico, a moral contra-reformista e a presença de uma Igreja tradicional e vinculada ao Estado. C o m essas categorias, uma geração de filósofos e sociólogos vem se dedicando a entender o que se passa conosco. O resultado desse trabalho sugeriu a urgência de reconstituir o substrato moral de nossa cultura para entender as singularidades das tradições que nos formaram. Muitos estudiosos de prestígio dedicaram-se a essa tarefa: Ubiratan Macedo, Ricardo Vélez Rodríguez, Antônio Pairo, Simon Schartzman e Wanderlei Guilherme dos Santos, entre outros tantos. O que eles concluíram? Que o contra-reformismo ensinou que o homem está na Terra por simples castigo; neste mundo, cabe-lhe exclusivamente cuidar da salvação de sua alma, o que ele consegue, sobretudo, renunciando aos prazeres e à riqueza; e suacondição pessoal é a de um vil bicho da terra. ,\ dialética ela libt>rcladc t'm l.ockl' :-;v11i N a análise de semelhante realidade, Antônio Pairo entende que a sobrevivência desses preceitos morais perpetuaram-se porque nunca foram submetidos a uma avaliação crítica e continuada, o que ele procura fazer. Para tanto, elabora uma profunda análise da situação histórica e religiosa do homem do antigo testamento, mostrando as razões pelas quais aos olhos de uma sociedade pobre, tecnicamente frágil, agr cola e sujeita a todo tipo de intempéries, era importante o perdão das dívidas depois de grandes catástrofes e o combate a avareza. Entende Pairo que embora a avareza e o ócio devam continuar merecendo condenação, vivemos hoje na sociedade da abundância e a conquista desses bens se faz, para a grande maioria, através do emprego. Aparece então a necessidade social dos empresários que, embora não diretamente preocupados com o bem-estar geral, desempenham papel importantíssimo porquanto geram um grande número de empregos. Assim, explica Pairo, uma espécie de rejeição cultural ao capitalismo como a preservação da moral contra- reformista, corresponde a uma brutal distorção do espírito da lei moral que herdamos de nossos mais remotos ancestrais. Foi o que também procuramos mostrar no livro Caminhos da moral moderna, a experiência !uso-brasileira (1995), a crítica ao modelo moral que permaneceu entre nós. Paulo Clinger não enfrentou diretamente essa questão, mas cuidou de explicitar uma outra forma de ver o mundo e a vida, forma que prevaleceu nos tempos modernos. O conceito de liberdade interior fomentado pelo cristianismo não desembocou naturalmente na noção de liberdade política e econômica. A tradição contra-reformista não levou a tanto, já o dissemos. Clinger mostra-nos, no capítulo 2, como na Prefácio história humana a liberdade interior foi, várias vezes, admitida sob circunstâncias de absoluta intolerância religiosa e política. Explica ainda que a tradição liberal e democrática é apenas uma das possibilidades da tradição cristã. Como a questão da liberdade emergiu na modernidade? Nisso consiste o principal mérito do trabalho de Clinger. Ele revela que o problema esteve associado à discussão do fundamento do poder e da ação moral, que não mais se subordinavam à religião. A autonomia da ética e o entendimento de soberania popular eram contrários à antiga organização da sociedade, incluindo-se aí o poder absoluto dos reis. Thomas Hobbes defendera o absolutismo, rejeitando o caráter ético e racional da natureza humana. Ele opôs à visão de uma sociedade virtuosa e justa um espaço de disputa e conflito generalizado resultante da maldade e do egoísmo humanos. Para dar uma alternativa distinta à de Hobbes sem voltar à tradicional visão de homem, John Locke estabeleceu as bases de uma concepção individualista e contratualista da sociedade. Clinger explica como o filósofo fez isso e como compatibilizou a visão de homem com uma teoria ética, política, educacional e religiosa necessária a uma sociedade cada vez mais sensível ao progresso da ciência moderna e da organização eficiente e pragmática dos negócios públicos. A correta compreensão dos desafios da modernidade e a apropriação dos benefícios que ela trouxe foi o que procurou incorporar Locke na sua filosofia. Quem era John Locke? Filósofo e médico inglês que nasceu em Wrington, Somerset, no ano de 1632 e morreu em Oates, em 1704. Passou parte da vida fora da Inglaterra, primeiro na França A dialétil'a da hherdadt l m Lockl \ ' ( e depois exilado na Holanda. Trabalhou para o Conde de Shafestbury, um dos opositores ao absolutismo monárquico. Depois da morte do Conde, Locke manteve-se junto aos líderes que desencadearam e levaram a termo a chamada Revolução Gloriosa. Somente então voltou a seu país com a coroação de Guilherme de Orange. É para atender os desafios daqueles dias que Locke escreveu o Segundo Tratado do Governo Civil, no qual organizou o sistema representativo. O Segundo Tratado e suas implicações foram tratados por Clinger no Capítulo V Depois do êxito da Revolução, Locke revisou as suas idéias sobre tolerância, idéias que Clinger descreve no capítulo IV Essas idéias foram completadas pela doutrina da representação dos interesses, que ainda hoje parece atual e valoriza o esforço do autor deste livro. Para Locke, a questão dos interesses não se restringe aos aspectos econômicos, mas inclui os morais e os religiosos. Solucionar tais disputas também era uma necessidade daqueles dias e a proposta de Locke, examinada por Clinger, mostrou-se eficiente. O filósofo britânico defendeu a liberdade política, mas teve também que elaborar uma severa crítica ao racionalismo de René Descartes para derrubar o inatismo e oferecer uma nova visão do conhecimento humano e do ato educativo. A teoria do conhecimento é um aspecto importante do projeto filosófico de Locke, pois a liberdade intelectual é necessária para a participação responsável na sociedade civil, conforme revela Clinger no capítulo III. Ele mostra como Locke, no primeiro livro do Ensaio acerca do entendimento humano, combate a existência de idéias inatas, rompendo com a tradição cartesiana e com os neoplatônicos de Cambridge. l'refal IO \XI Esses últimos combatiam o empirismo, lembremos que Ralph Cudworth defende a objetividade a];)soluta das idéias de bem e de mal e Henry More proclama princípios absolutos na moral. Ao contrário, Locke afirma que todo conhecimento humano tem origem na experiência que, através das sensações, forma as idéias simples. A atividade do intelecto e a sua capacidade de abstrair e combinar dá origem às idéias compostas de substância, modo e relação, que não têm valor objetivo. Em outras palavras, válidas são as idéias simples no tanto que estiverem subordinadas às sensações. Tal forma de abordar o entendimento humano desemboca numa teoria nominalista da ciência, na qual leis e teorias gerais são somente nomes sem correspondência fatual. O valor dos enunciados científicos é unicamente prático, explica o filósofo. Sem todas essas considerações não haveria como levar adiante nem a política liberal nem o entendimento de que a tolerância é a grande virtude a ser estimulada na vida social, muito menos a noção de que o homem está no mundo para trabalhar, ideal protestante que era caro a nosso filósofo. Locke é o ponto de referência da moderna defesa do Estado de Direito e da cidadania responsável e por isso é um pensador que merece ser um interlocutor dos homens de hoje, como fez Clinger neste seu livro. Ao examinar as idéias do filósofo e sobretudo como elas resolveram os impasses de uma sociedade livre e democrática, notamos quão distantes ainda estamos dos ideais modernos. José Maurício de Carvalho Departamento de Filosofia da Universidade Federal de São João - UFSJ \ diak'lirn da lihl'rcladl' cm Loekl' \ \ 1 1 INTRODUÇÃO A reflexão sobre a história dos povos, suas tradições e vultos, que se destacaram em todos os campos de atividades, só é possível graças à capacidade humana de trazer ao presente aquilo que em outros tempos existiu. Além disso, o homem é capaz de observar, conhecer e ter a sensibilidade para produzir e divulgar conhecimento para a posteridade, pois é, ele próprio, o centro da história, construtor, partícipe e propagador de idéias, valores e promotor de mudanças. Pensar sobre questões suscitadas pela filosofia em outras épocas é uma boa oportunidade de revisitar problemas, dando-lhes uma nova vida. Neste trabalho, examinamos o problema da liberdade na filosofia de Locke. A importância de discutir-se o tema é a necessidade de atribuir alguma qualidade ao uso pleno da liberdade, na busca de aprimorar o entrosamento entre os homens, sobretudo, lntroduçüo agora que aprendemos com autores contemporâneos a distinguir os dois conceitosde liberdade: a liber ade negativa, como a ausência de coerção, e a liberdade positiva, como a autonomia ou desejo de governar a si próprio. O tema sempre mereceu tratamento especial dos filósofos, pois a liberdade faz parte do modo humano de ser. O assunto não se esgotou com Locke e continuará sendo objeto de estudos por todo o tempo: a razão e o fato de estar o homem sempre à procura da melhor maneira de exercitar sua liberdade, em favor da própria sobrevivência e do convívio em sociedade. Entender o homem como sujeito livre é uma questão que ganha, a cada dia, novas implicações, quando, num plano ôntico, ou seja, do ente humano, conceito moderno de natureza humana, a idéia de liberdade se assenta na responsabilidade, autonomia e respeito pelo homem, como um fim em si mesmo. O propósito deste trabalho é estudar as implicações que a idéia de liberdade suscitou como agente de promoção do Estado de Direito. Nesse estado de direito, admite-se a existência de um sistema de regras ou leis capazes de coerção, pois, do contrário, seria impossível pensar a liberdade humana. N o Estado de Direito, os direitos individuais são reconhecidos em lei e devidamente respeitados. Este fato coloca os indivíduos a salvo das ambições pessoais ou de grupos, respondendo aos anseios da sociedade por paz e justiça e respeitando a dignidade humana, com um sistema de segurança, saúde e educação adequado às necessidades dos cidadãos. J o h n Locke, ao discutir a liberdade como uma das propriedades do homem, procurou ampliar o conceito cristão de \ dialética da liberdade ('tn Lockl' 2 liberdade, englobando o direito de cada indivíduo governar a si próprio, num ambiente social, sem interferir no ig u al direito de terceiros. Como entender a contribuição de Locke, no que se refere ao tratamento da liberdade? A esse governar a si próprio; locomover-se no meio social; expressar-se; buscar subsistência; enfim, agir em qualquer direção que o pensamento determinar, foi entendido, desde Locke, como liberdade política ou exterior,.por estar submetida a certas regras estabelecidas por um pacto acordado entre os indivíduos. Pacto esse, cuja formalização discutida por Locke, para a defesa da liberdade, guardando estreita consonância com a liberdade filosófica ou interior, mas a ela não se limitava. Para a preservação da vida, da liberdade e das propriedades, Locke propôs a organização de uma sociedade civil, administrada por um corpo político com regras a que todos deveriam submeter- se. É de acordo com essas regras ou leis que se pretende discutir a liberdade como um atributo da razão humana, garantindo ao indivíduo o direito a ter um mínimo de propriedades que lhe assegurem a própria sobrevivência e forneçam os benefícios de uma vida a salvo de atribulações materiais. Locke discute a liberdade social e civil e a deriva da liberdade perante Deus (interior), segundo a qual o homem só é livre a partir da plena entrega à religião, renunciando às coisas materiais. Essa idéia de liberdade interior, desvinculada do contexto sócio- político, será defendida pela tradição cristã e examinada no Capítulo II. O sentido da liberdade para Locke não podia ser esse. A liberdade não tinha como ser separada da vida em grupo. As conseqüências de um conceito de liberdade, tal como Locke o propôs, tornaram-se a base para o estabelecimento de lntrodw,;áo uma sociedade moderna e pluralista. Nossa discussão revelará adicionalmente gue a filosofia de Locke contribuiu para elaborar o conceito moderno de tolerância e de liberdade civil. C o m o se dá a conquista da liberdade civil? Para o filósofo, este é o objetivo da vida humana, que só se concretiza a partir de certa idade, quando tomamos conhecimento do mundo exterior e da existência de outros seres. N o momento em que começamos a pensar, r e fletir e a tomar conhecimento da existência de outros seres, é que tomamos consciência das coisas que nos afetam. Este período da infância humana, que se estende do nascimento às primeiras percepções captadas pela nossa mente a respeito do ser real que somos e das coisas que nos cercam, é o que Locke teria desig n ado como o estado da tábula rasa. Durante tal período, não se pode pretender qualquer ato consciente de uma criança, já que suas faculdades de pensar, refletir e raciocinar ainda não evoluíram o bastante para o discernimento. Daí a ação dos pais é fundamental para a criança, orientando-a e despertando-a para o conhecimento das coisas da vida. Assim, o entendimento infantil sobre as coisas que nos cercam, tem início quando ela começa a associar sua existência à idéia de liberdade. Idéia que será exercitada com base nas informações recebidas e nas ações que forem desenvolvidas, segundo a natureza de cada um. Logo, a liberdade é uma faculdade própria do ser humano. A idéia de liberdade estava, pois, vinculada à intuição essencial da existência. A partir da prova de nossa existência, pela intuição, Locke demonstra a existência de Deus como um Ser eterno e mais poderoso: por nos ter dotado de sentidos, percepção e razão, que nos permitem usar da liberdade de pensar, refletir e ter conhecimento da existência daquilo que \ diall'li< ,t da lilwrdadP l'lll Lork(' nos afeta. Sendo Deus um Ser onipotente, eterno, inacessível e inatingível, do qual é impossível termos experiência sensível, Locke chega a sua existência, a partir do conhecimento indubitável que temos de nossa própria existência. A idéia de liberdade surge em cada indivíduo, no momento em que este inicia a reflexão e a tomada 1e conhecimento da existência de outros seres no universo e a acreditar na existência de Deus, demonstrada pela grandeza e maravilhas encontradas neste mundo. N a medida que temos liberdade para desenvolver nossas faculdades de pensar, observar, realizar operações e experiências com os objetos, estamos adquirindo e ampliando conhecimento. Estas considerações preliminares preparam nosso modo de desenvolver a questão. N o capítulo 1, discutiremos como alguns pensadores contemporâneos abordam o problema da liberdade e sua vinculação com o ente-humano. Pois, só ele sente; só ele a experimenta; só ele precisa dela para produzir e ampliar conhecimento. O s demais seres, exceto Deus, que é onipotente, precisam da ação do homem para sofrer transformações. Logo, a liberdade não existe fora da natureza humana e divina, mas integram-na de modo inseparável. N o capítulo 2, será explicado de que modo a liberdade interior foi, na perspectiva tradicional, afastada do problema da organização civil da sociedade. A tradição cristã tratou a liberdade como um movimento interior, descuidando-se de constituir uma sociedade democrática, na qual a participação e o consenso são essenciais à harmonia da convivência coletiva. Introdut:ún A contribuição da teoria do conhecimento de Locke ao entendimento do valor da liberdade f:, muito importante para seu projeto político, tendo em vista preparar o homem para o exercício da cidadania, necessário à organização da sociedade. Este assunto será tratado no capítulo 3. Ao discutir a religião, como manifestação exterior do culto, Locke introduziu a preocupação com a tolerância política. A defesa da liberdade religiosa antecede a defesa das liberdades ci;is. A liberdade religiosa exigia como pré-requisito a tolerância, através da qual, todos os homens e todas as facções deveriam respeitar-se mutuamente. Cada indivíduo tem, pela lei da natureza, o direito à liberdade de escolher a maneira que lhe é mais afeiçoada para orar a Deus e confortar a sua alma. Escolha esta que consistia em deixar a cada pessoa, segundo a opinião de Locke, a opção para o ingresso na Igreja que melhor atendesse suas convicções e, na qual cada indivíduo pudesse buscar em Deus a libertação da alma e desarmar o espírito para a participação no pacto social. Como,para Locke, a igreja é uma sociedade voluntária, cuja participação depende da disposição pessoal de cada um em particular, a tolerância para a prática de cultos diferentes constitui a preparação dos espíritos para o exercício político da prática democrática. O Parlamento é uma instituição política em que o respeito às divergências de opiniões e o acatamento das decisões da maioria constituiriam no equilíbrio do funcionamento de uma sociedade civil com a preservação das liberdades individuais. N o capítulo 4, analisaremos como Locke abordou o problema da liberdade sob a ótica da religião. Liberdade e sociedade civil constituem o fundamento de toda a discussão do capítulo 5. Segundo Locke, a sociedade política tem como fim a preservação dos direitos civis, destacando-se a vida, a liberdade e as posses como propriedades pessoais, como razão que leva os homens a formarem uma comunidade. Por outro lado, o conhecimento adquirido, através da experiência e da observação, é fundamental à compreensão da idéia de liberdade e dos valores a ela associados. A liberdade deixou de ser apenas 0 fundamento de uma experiência interior para se tornar o cimento de u m a f o r m a de organização social pactuada. Mas 0 conhecimento só é ampliado através do processo da educação que eleva o nível de instrução das pessoas. Assim, quanto maior 0 número de pessoas que tiver acesso aos diferentes níveis de educação, maior será o alargamento do processo de conhecer e ' portanto, mais preparada e criativa será a sociedade que, no contexto geral, buscará o aperfeiçoamento e a evolução. Assim, conhecimento e educação somam-se para fortalecer O sentimento de liberdade de cada cidadão, e este procurará defender seus direitos pessoais, comuns a toda coletividade. Nesse sentido foi ' muito importante a fundamentação de Locke para justificar a liberdade, a tolerância e a democracia na sociedade civil tendo ' em vista a formação do homem virtuoso e capaz de gerir os negócios, que dizem respeito a si e a sociedade de que faz parte. Portanto, o que promove a evolução das sociedades é a existência ' também, de um ambiente de liberdade com responsabilidade, na busca do bem comum. A propriedade resultante da posse e domínios de bens adquiridos por esforço pessoal e que não tenham causado danos a terceiros é lícita: premia o laborioso e estimula 0 lntrodrn,iio progresso. Locke não admitia a usurpação, a avareza, o perdularismo e a ociosidade. Portanto, seu liberalismo tem um significado ético para a vida dos grupos, na medida em que enfatizava serem os governantes os administradores da comunidade, cuja missão consis e em assegurar o bem-estar e a prosperidade. Iremos discutir as idéias de Locke preocupados com os problemas de nossos dias. A liberdade permite dialogar com os mestres do passado, enquanto pensam-se as circunstâncias que nos desafiam em nosso próprio tempo. A questão da liberdade é muito importante em nosso ambiente cultural, pois ele ainda não distingue o sentido exato da liberdade como experiência de convívio social. Esse equívoco favorece as ações truculentas e radicais de democratismo, cuja base de sustentação política é o apelo às massas. O u seja, espalha a falsa tese de que seremos uma sociedade moderna, rica e democrática, deixando de lado os princípios de uma filosofia da liberdade. O que fica desta lição de Locke é que a liberdade é a base da organização social, ainda que hoje em dia o liberalismo não tenha assumido a verdadeira concepção do exercício democrático. A dial{•tica da liberdade em Locke 8 DESENVOLVIMENTO DA IDÉIA DE LIBERDADE NA FILOSOFIA 1 POLÍTICA CONTEMPORÂNEA U m a das principais preocupações d o pensamento moderno e contemporâneo foi entender o significado da liberdade. A liberdade política, uma das faces da liberdade do homem, desenvolveu-se com a tolerância religiosa. Segundo a tradição cristã ocidental, o homem virtuoso deveria renunciar às coisas terrenas e dedicar-se a uma vida contemplativa de entrega a Deus, para a obtenção da paz interior após a morte. Sua liberdade era para a escolha do bem e visava a garantia desta felicidade posterior. Esse comportamento foi denominado de ética da salvação. O modelo ético preconiza que a conquista da paz interior seria alcançada mediante a libertação da alma com a plena entrega à religião cristã, o que resultaria na liberdade de espírito ou liberdade interior para o alcance da vida eterna. A salvação eterna deveria constituir-se na busca permanente da conquista do Céu e Desenrnlvimento da idéia de' liberdade na filosofia politiea 1·ontt>mporfüwa 9 no repúdio aos prazeres da vida, segundo a filosofia sistematizada por Santo Tomás de Aquino (1224-1275). Esse rúvel do exercício da liberdade é muito restrito, como se verifica pela citação que se segue: ''A moral tomista organizou os valores de modo que a ação humana não se reduzia à experiência da cidadania, mas à humilde submissão à vontade de Deus" (CARVALHO, 1995, p. 51). A idéia de liberdade, segundo os princípios da tolerância religiosa, começa a ser debatida durante o século XVI, com a eclosão das guerras religiosas. O tema tolerância religiosa surge do objetivo de atenuar o caráter dramático das guerras e da necessidade de se criar uma consciência de concórdia, para tolerar as posições discordantes dos dogmas da Igreja Católica, que eram impostos até então. Com o advento da Reforma, no século XVI, a moral social passa a ganhar maior significado, em detrimento da moral individual defendida pela Igreja. N o bojo da moral social, o homem começava a ser destacado, como tendo personalidade própria, capaz de exercer experiências de cidadania sem se afastar da religião, como relata Paul Hazard sobre Bayle (1647-1707): "Bayle chega ao termo de sua demonstração: religião e moralidade, longe de serem indissociáveis, são independentes; pode-se ser religioso sem ser moral; pode ser moral sem ser religioso".(apud PAIM; PROTA; VÉLEZ RODRÍGUEZ, 1997, p.15). Assim, a idéia de liberdade, no cerne da discussão a respeito da moral social, surgia a necessidade de se respeitar a individualidade de cada um e se estabelecer um consenso para as posições discordantes. Com a publicação da Carta Acerca da Tolerância (1685), de John Locke, a idéia da liberdade humana deveria ser deixada a cada indivíduo ou grupo para expressar suas opiniões; viver de acordo com as suas A dialética da libcrdadc cm Locke ( { ) convicções e pertencer à seita ou religião que mais agradasse a seu espírito, respeitando as posições contrárias. As idéias de Locke muito contribuíram para a noção de liberdade exterior, ou política, e exerceram muita influência na organização do sistema representativo. Emmanuel Kant (1724-1804), inspirado nas idéias de Locke, reconhecendo que o homem pertence a dois 'mundos: no campo espiritual, como ser temporal e empírico; e no campo real, como ser inteligível e racional, livre para praticar e assumir seus atos; tenta compatibilizar a moral espiritual com as exigências da razão humana, cujo princípio é o da obediência às leis criadas pelo próprio homem; e para as quais a razão prática, relacionando a imortalidade da alma com a existência de Deus, tenta garantir o compromisso com o bem. O caráter reformista de Kant é o de que as leis passariam a regular as ações individuais para estc'lbelecer a harmonia da vida social. E o indivíduo assume o caráter de cidadão, respondendo por seus atos segundo o princípio de ig u aldade da lei, perante à sociedade e ao Estado por ela constituído. N o Brasil, a discussão sobre a liberdade política foi introduzida e defendida por Ferreira (1767-1846). Sendo adepto de Locke e Condillac, "tenta promover a adesão do pensamento luso-brasileiro à filosofia moderna" (PAIM, 1987b, p. 254). Adversário dos liberais, os contra-reformistas consideram a liberdade como garantia dasvirtudes cristãs e da salvação da alma. Essa corrente de pensadores, tentando preservar uma certa interpretação da filosofia cristã, segundo a qual a liberdade humana só é encontrada em Deus, procurou anular qualquer avanço da Desenrnhimento da idéia de liberdade na filosofia política rnntcmporânea 11 filosofia humanista que permitisse ao homem pensar e refletir sobre os seus atos. O con t r a - r e fo rmismo a l imentou o tradicionalismo lusitano do qual Freire (1738-1798) é considerado o fundador. As características básicas deste tradicionalismo consistiram "na organização da estrutura jurídica, preservando os valores herdados da Contra-Reforma, dando-lhes uma base legal" (CARVALHO, 1995, p. 39). É com Freire que o pensamento tradicional cristão ganha consistência jurídica no solo português. A liberdade humana, admitida como transcendência da entrega da alma a Deus, não pe rmanece mais n o p l eno i so lamento d o indivíduo. O s costumes tradicionais são traduzidos em leis, patrocinadas pelo Estado português, regendo o relacionamento entre as pessoas, e destas com o corpo coletivo. A lei passa, então, a ser o instrumento da razão humana, capaz de relacionar a mensagem d iv ina c o m as ações d o s ind iv íduos n o c a m p o social intermediadas pelo Estado. O exemplo mais característico e singular dessa transição dos costumes para as leis é a instituição do casamento civil. Mantém-se o vínculo com a tradição cristã de consagração matrimonial, a fim de que o casal encontre em Deus a felicidade eterna, mas também limita as ações livres dos cônjuges que possam prejudicar o próprio casal, a prole e a terceiros, no âmbito do corpo social. A cultura brasileira, a respeito da idéia de liberdade, foi influenciada por duas vertentes de grande significação. De um lado, pelo pensamento liberal, através de Silvestre Pinheiro Ferreira, representando a corrente reformista; e, do outro, o tradicionalismo, A dialética da liberdade rm Lockc 12 através da moral edificada pelo Visconde de Cairu. A respeito da primeira, registra Paim: Cabe assinalar que tanto a doutrina liberal de Silvestre Pinheiro Ferreira, como a filosofia de Victor Cousin ' desempenharam nesse processo papel de primeiro plano, a primeira facultando o adequado entendimento da idéia liberal, [ ... ] e a segunda, difundindo numa fundamentação da liberdade humana em plena consonância com o espírito do tempo e atribuindo dignidade teórica à conciliação, de que tanto carecia nossa elite no desempenho da árdua missão de incorporar-nos, finalmente, à Época Moderna (PAIM, 1987b, p. 91). Tentar-se-á, na seqüência, discutir o entendimento da idéia liberal, através de autores contemporâneos, indicando em quais aspectos valem-se da intuição essencial de Locke. O problema da liberdade não se esgota com sua consonância com espírito da Época Moderna, como aponta o próprio Paim, pois ele é perene e imanente à natureza humana. Alg u ns pensadores contemporâneos discutiram o problema da l iberdade sob di ferentes a rgumentos , sem c o n t u d o apresentarem uma solução para o divórcio entre a idéia de liberdade interior, segundo a tradição cristã, e a idéia de liberdade exterior ou política, de acordo com o pensamento moderno. A observação a seguir é muito pert inente: "A liberdade política é u m a conseqüência da liberdade interior estudada na filosofia. Sua conceituação pode e até deve ser diversa, mas sua existência depende da outra" (MACEDO, 1997, p. 18). Como a idéia de liberdade política encontra em Locke uma das principais fontes de inspiração, o presente trabalho objetiva Dcs,•nvoh imento da idéia de li herdade na filosofia política contemporúnca l:{ aprofundar a tentativa de solução elaborada pelo pensador, para essa interação da liberdade interior co1:1 a liberdade exterior, tendo em vista que diferentes correntes têm deixado o assunto aberto à discussão; pelo fato de inexistir, no sentido político, uma finitude de p opósitos que estabeleçam a convergência de conceitos para um ideal comum a respeito do problema da liberdade. A posição de alg u ns pensadores dá uma idéia da diversidade dos pensamentos sobre o tema. Para Hayek (1899-1992): A liberdade é o estado no qual um homem não está sujeito à coerção pela vontade arbitrária do outro; a sociedade liberal ou livre [ ... ] é uma sociedade na qual a submissão dos indivíduos à vontade dos outros e o uso da coerção são minimizados ( H A Y E K , 1983, p. 73). Hayek assume uma postura radical na defesa da liberdade individual e da sociedade liberal. Para ele, nada deve tolher a capacidade criativa do indivíduo, pois o padrão social que ele cria tem relação direta com seu comportamento. A coerção, tolhendo os indivíduos, bloqueia as iniciativas particulares e a sociedade, como um todo, perde, no entender de Hayek. Ele defende a tese de um mercado livre, para o funcionamento da economia, com o argumento de que o mercado constitui um sistema auto-regulador, não necessitando, portanto, de qualquer intervenção exógena. Por esse motivo, "recusa frontalmente o sistema representativo", conforme observou Paim (199 5). Mas essa posição de Hayek confronta com a herança deixada por Locke, pois dá uma indicação de que a vida social não tem outros problemas pela recusa do sistema representativo. Locke propunha exatamente o contrário, como forma de garantir as liberdades e os direitos individuais e das minorias divergentes. A dialética da liberdade Pm Locke Arendt, que se notabilizou com a obra Origens do Totalitarismo (1951), argumenta que a idéia de liberdade é um conceito político e, como tal, está inserida num mundo politicamente organizado. Isso a fez herdeira do conceito de Locke. Para a autora, como a liberdade faz parte da vida cotidiana dos indivíduos, seu âmbito natural, para o desenvolvimento das capacidades e das potencialidades da vida humana, é o âmbito da política. Entendeu a autora que a "liberdade é o verdadeiro motivo pelo qual os homens convivem politicamente organizados" (ARENDT, 1979, p. 192). Argumentou que, sendo a pessoa o fundamento da vida social organizada, a idéia da liberdade filosófica, no sentido da tradição cristã, não poderia ficar alheia à concepção da liberdade política, exortada para a sustentação do convívio em sociedade. Segundo Arendt, os homens, imbuídos apenas da concepção de libertar a alma para a vida eterna, constituíam-se como "indivíduos isolados, atomizados e desenraizados", sendo presas fáceis para movimentos ou lideranças totalitárias. Logo, a difusão e a defesa de liberdade política revestia-se de fundamental importância para a garantia do sistema representativo de organização da sociedade e preservação dos interesses civis, tal como idealizado por Locke. Outro autor que examina a importância da liberdade política é Roque Spencer Maciel de Barros em O Fenômeno Totalitário (1990). Além de enaltecer o sistema de representação política, apresenta os atos humanos, numa sociedade livre, como condição para o devir do progresso da humanidade. Assim argumenta: Somos, até certo ponto, senhores dos nossos atos, à medida que nos caracterizamos precisamente pela condição de 1 >l .,,. l\ o\ 1•1wnto d,1 idei:1 d( libl·rcbde na f losofi.i polítH a co11ternpora11e.1 SERES LIVRES; não somos nunca, entretanto, senhores das conseqüências de nossos atos, que se entrecruzam com outros atos da mesma forma livres [ ... ]. Porém, a vontade dos homens, a sua liberdade, significa sempre um novo começo, que é sempre ameaçador para a inelutabilidade do movimento (totalitário) (BARROS, 1990, p. 134-165). Rogue Spencer, ao concordar com Arendt, para quem os indivíduos despreparados e isolados tornam-se presas fáceis para movimentos demagógicos e totalitários, argumenta ainda que as sociedades totalitárias apostam na "dissolução do indivíduo, do ser pessoal e moral" (1990, p. 68). Para Arendt,o despreparo limita a capacidade do homem de sentir, de pensar, de criar e de se defender. Portanto, isola o homem da esfera política, impedindo- º de agir e de usufruir da sua liberdade. A autora, ao fazer distinção entre o isolamento e a solidão, afirmou: " o isolamento se refere apenas ao terreno da política da vida; a solidão se refere à vida humana como um todo" (ARENDT, 1989, p.527). O isolamento destrói as capacidades políticas dos indivíduos, embora mantenha a integridade de suas capacidades físicas. A solidão destrói o homem, por dentro, afetando sua liberdade interior. Para a autora, a solidão pode manifestar-se até mesmo na companhia de outras pessoas, pois trata-se de um estado de espírito, que se manifesta no homem, quando se sente não pertencente a este mundo. Assim, o isolamento pode levar multidões à solidão e, portanto, impedidas de exercerem sua liberdade na esfera política da vida social. Sua crença na liberdade responsável coloca o homem no centro das ações e da criatividade para renovar o mundo, na medida em que cada pessoa assuma os seus próprios atos, sem pôr em risco sua própria liberdade e concorrendo para o fortalecimento da A dialética da lihcrdade em Lockc 16 harmonia e do equilíbrio do corpo coletivo. Porém, quando as ações individuais, decorrentes do uso irresponsável da liberdade, entrecruzam-se num ambiente de movimento de massa, as conseqüências são, na verdade, imprevisíveis. Rogue Spencer argumenta ainda: "se o pensamento histórico liberar o homem da sujeição divina, esta liberação exige dele a mais absoluta submissão ao devir" (BARROS, 1990, p. 94). Essa liberação consistiria em desligar o homem da tradição cristã de buscar em Deus a liberdade interior. E o homem descompromissado de Deus ficaria exposto ao que o devir lhe reservasse, ou seja, usando a liberdade para o bem ou para o mal, segundo as circunstâncias e ideologias prevalecentes. Essa posição encontra respaldo significativo na idéia de liberdade defendida por Locke. Dos autores contemporâneos que pesquisamos, o que oferece melhores indicações para relacionar a idéia de liberdade em Locke com a idéia da tradição filosófica cristã, é o f ilósofo brasileiro Paim. Segundo o pensador: Desde que se instaurou a tolerância religiosa, as questões morais foram sendo decididas por consenso [ ... ]. Os valores da nossa civilização provêm do ideal de pessoa humana que nos foi legado pelo cristianismo, sendo essa base comum capaz de assegurar a superação de divergências secundárias[ ... ] O sistema representativo repousa na convicção de que todos os interesses humanos são legítimos[ ... ] A educação liberal tem ainda outro componente: o compromisso com a preservação da tradição humanista ... E ainda apud Ralf Dahrendorf. O liberalismo e a Europa (1979) o mais importante para o pensamento liberal é começar a ponderar, em termos novos, como a vida humana está estruturada na sociedade (PAIM, 1987a, p. 28-128-136). Drs(•nvolvinwnto d.t idéia dr liberdade na tilosofia política l'Ontl'mporiull'a 1 ' As indicações precedentes, ainda que muito simplificadas, mostram que o problema da liberdade humana, em geral, e da liberdade política são assuntos importantíssimos. E Locke é ainda um interlocutor significativo para os autores contemporâneos. A dialética da libPrdade ('m Locke A NOVIDADE APRESENTADA PELA FILOSOFIA DA 2 LIBERDADE DE LOCKE N , , EVOLUÇAO HISTORICA DA IDEIA DE LIBERDADE T omás de Aquino, segundo Urbano Zilles (apud,CARVALHO, 1995), aprofundou a discussão a respeitoda definição de Boécio (480-524), de que "o indivíduo era uma substância de natureza racional". Tomás de Aquino atribuiu ao homem status ontológico, considerando-o inviolável, insubstituível e dotado de razão para pensar e refletir a respeito da natureza na qual está inserido. Surge, então, na Idade Média, o conceito de pessoa. Coube a Tomás de Aquino, a primazia de estabelecer a diferença entre homem-individuo e homem-pessoa. Embora Boécio tenha valorizado o conceito de homem-indivíduo, procurando A nov1da(h aprPsentada pela filosoth da liberdadP dt• Lol'kt' 19 explicar o EU, o homem refletindo a imagem de Deus e concebido como substância individual e de natureza racional, poderia alcançar a felicidade eterna, através da contemplação a Deus e à alma. O encontro com Deus resultaria na obtenção da paz interior, necessária para o al_cance do ideal ético e da suprema racionalidade. Essa natureza racional do homem confere-lhe o atributo de um ente completo, cuja vida pessoal, fechada em si mesmo, torna-o invulnerável a outros entes. Urbano Zilles (apud CARVALHO, 1995) argumenta, então, que Tomás de Aquino, ao conferir ao homem o status de pessoa, reconheceu-o com singularidade e dignidade próprias. Dizia Aquino: "pessoa significa o que há de mais perfeito em toda a natureza" (apud CARVALHO et ai., 1998). Assim, o conceito de pessoa, cuja singularidade confere ao homem a liberdade de praticar ou não todas as virtudes terrenas, seja em conjunto com outros homens, ou isoladamente, é uma herança da Idade Média, que encontrou no seio do cristianismo um espaço para o homem desenvolver a purificação da alma na busca da felicidade e libertação interior. A tradição tomista, na esteira de São Tomás de Aquino, defendia a tese de que a liberdade interior do homem assentava- se na plena entrega aos desígnios de Deus. Para tanto, o indivíduo teria de renunciar a tudo o que se relacionasse com o mundo material, apegando-se ao espírito da pureza, da prudência, da justiça, do amor a Deus, da humildade, da pobreza, da castidade, e assim por diante. Só a dedicação a esses preceitos aproximaria o homem da ordem divina e das virtudes da salvação, para buscar em Deus o supremo bem; o reino dos céus. Só o apego a Deus libertaria o homem dos pecados terrenos e o conduziria à vida ,\ clialét1ra lh liberdaclL' c•m Loc ke 20 eterna, à imortalidade da alma. A moral e a ética individual precisavam de paradig mas para conter a impulsão do homem ao mal. O temor ao desconhecido, após a morte , induzia as consciências humanas a seguir as pegadas do Salvador, na busca da felicidade interior. Felicidade esta que se materializava no interior das igrejas com a contemplação ao Cristo, salvador de todas as almas. O apego à religião, como único caminho da salvação, despertava no homem um sentimento de estar na trilha do bem e sob a proteção de Deus. Essa opção teria de ser unicamente individual, tendo em vista que a Igreja não aceitava qualquer pacto coletivo de reflexão religiosa. O relato a seguir é muito oportuno: A Igreja entendeu-se intérprete da mensagem divina, repudiando as novas bases do pacto social. Insistiu que o objetivo da vida social é estabelecer uma ordem justa, atribuindo os problemas sociais ao desvio do caráter e às injustiças engendradas no coração humano (CARVALHO, 1995, p. 33). Assim, o coração do homem só estaria propenso à prática do bem, na medida em que sua alma estivesse livre para a salvação eterna. Essa liberdade interior era a tônica da filosofia tomista. Era uma espécie de introversão da liberdade humana. Só a contemplação do bem era o requisito da felicidade. Uma vez que cada homem estivesse voltado para as coisas divinas, a paz social estaria assegurada, pois os bens terrenos só deveriam ser "buscados em si mesmos para tornar a vida contemplativa mais digna" (CARVALHO, 1995, p. 52), interpretação do autor, para o pensamento aristotélico. Mas a postura filosófica tomista desconsiderava a natureza humana, por não levar em conta as ,-\ novidaclP aprespntad.i pela filosofi,1 da libc nl.tdl' ele• 1 oekt• 21 aspirações individuais, os interesses e a capacidade de trabaJho de cada indivíduo. A natureza humana teria de seguir os seus desígnios. O homem não poderia continuar fechado em si mesmo. A sustentação da felicidadeinterior teria de estar atrelada às virtudes da liberdade exterior que transforma o homem de indivíduo para cidadão na construção do mundo exterior. Assim, a vida em sociedade tornar- se-ia mais plena, em decorrência da troca de experiências e proteção mútua que se constituiriam através do pacto. A natureza gregária do homem estabeleceu a necessidade do relacionamento de uns com os outros. A prática diuturna desse relacionamento despertava em cada indivíduo a consciência da necessidade de se estabelecer limites para as palavras e para as ações, que deveriam sustentar o entendimento das pessoas na busca de maior aproximação entre elas. Como o homem cuida de seus interesses, as desavenças eram constantes e mais freqüentes, rompendo qualquer tipo de limite e submetendo as pessoas ou grupos aos caprichos de outros que se julgavam mais fortes e donos de "sua" verdade. O tomismo dava a esse debate uma caracterização específica, voltada para seus preceitos de libertação, segundo os quais o reino dos céus e a liberdade eterna só seriam alcançados pelos "puros", cuja alma deveria ser entregue a Deus, através da renúncia, da prudência, da humildade. Tentava, sem sucesso, converter todos os indivíduos à resignação das necessidades da vida terrena. Ao buscar a liberdade interior, tinha-se em vista que a ordem social estaria automaticamente implantada. Mas a resignação apenas capacitava o homem a estar em estado de espírito livre para alcançar A dialetin da lt])( rdacle em Locke o reino dos céus, mas não livre para negociar seus interesses com os seus iguais na vida terrena, tendo em vista que a integridade física, a locomoção na busca de víveres e outras necessidades eram sentidas como importantes para todos. A necessidade de relacionamento, nascida da condição social da vida humana, passou a demandar limites para as palavras e para as ações, criando uma consciência de liberdade, que buscava garantir o estreitamento das relações pessoais. Através do pacto, os indivíduos passavam a "tolerar", a "respeitar", a "limitar", a "punir" as ações individuais que poderiam ser objeto de risco para outras pessoas. Nasce, então, a idéia de liberdade exterior, entendida como aquela que se tornou o sustentáculo da razão humana do direito à vida, uso da palavra e da locomoção para sobreviver. Essa idéia de liberdade exterior herdada de Locke foi, em nossos dias, entendida por Arendt como sendo um conceito essencialmente político, brotado da necessidade de organização da vida em sociedade. Embora a autora tenha questionado o sentido da política para relacionar-se com a liberdade, sua argumentação indicou que o objetivo da política vai além da preservação da vida da humanidade. O espaço criado pelas condições modernas para a existência de um Estado de Direito é absolutamente necessário para preservar, também, a liberdade de agir do homem, para que novas iniciativas sejam desencadeadas e o processo da evolução histórica dos povos siga a sua trajetória normal, "porque os homens, enquanto puderem agir, são aptos a realizar o improvável e o imprevisível" (ARENDT, 1993, p.122). A autora, ao discutir a liberdade cristã e a liberdade política, apontou a existência de um relativo divórcio entre a liberdade interior, preconizada pela metafísica A novidade apresentada pela filosofia da liberdade de I.ocke medieval e a liberdade exterior, pela concepção política, pelo fato de a tradição filosófica, desde Agostinho, insistir no distanciamento da vida contemplativa com a vida o mundo exterior. Segundo sua percepção, a idéia de liberdade foi enfatizada no final da Idade Média, sobretudo, com a formação dos estados nacionais, mas num sentido muito restrito. A liberdade interior ficou preservada na discussão moral e teológica. A Igreja não aceitava a transposição da idéia de liberdade do plano espiritual para o plano temporal. Essa dicotomia provocava dissensões e intolerância entre aqueles que divergiam por concepções religiosas e que recrudesciam na esfera política. Thomas Hobbes (1588-1679) foi um dos primeiros a teorizar sobre a necessidade de limite para as liberdades individuais. N a obra O Leviatã (1651), explicou que os homens deveriam renunciar a alguns direitos individuais do estado de natureZfl, em benefício do Estado. O fiador da ordem era o soberano que não tinha qualquer dever para com os súditos, tendo em vista que o Estado estava acima das posições pessoais. Hobbes também escreveu um tratado com o título específico Da liberdade e da necessidade, n o qual p r o c u r o u discut i r a cont rovérs ia da predestinação, mérito, livre arbítrio e reprovação, dentre os temas mais evidentes na época. Mas sua proposta de relacionar os deveres e as liberdades individuais para com o Estado é considerada, por seus críticos, como de natureza absolutista. É com John Locke (1632-1704), como veremos, que o divórcio apontado por Arendt, entre a liberdade inten·or, da tradição filosófica cristã, e a liberdade exterior ( entendida como liberdade política) rompe-se e ganha uma ou outra conotação, segundo as concepções individuais. A dial{)tica da liberdade cm Loeke 24 A FILOSOFIA DA LIBERDADE SEGUNDO LOCK.E O ponto de partida de John Locke, para estabelecer uma relaçã . entre ª. liberd de interior e a liberdade exterior ou polzttca, que 1mpuls1ona as aç.ões humanas, pode ser entendido a partir dos fundamentos morais, éticos e cristãos desenvolvidos na Carta sobre a tolerância (1685). A liberdade inten·or, como meta a ser buscada, no plano cristão, consistia no abandono, pelo indivíduo, das coisas terrenas e na aproximação do homem a Deus. Os valores terrenos ordinariamente eram vistos como obstáculos para a aquisição dos valores mais altos. Quanto mais o homem aprofundasse a busca da paz interior, livrando-se das necessidades materiais, mais próximo estaria do Bem, alcançando a pureza da alma e a virtude cristã. O caminho para essa felicidade seria trilhado segundo o autocontrole, tal requisito, ao proporcionar a paz interior, também conduzia a consciência individual à busca do convívio livre com Deus. " O caminho para Deus era o da mais completa anulação do indivíduo" (CARVALHO, 1995, p. 54). Nisso consistia a essência filosófica do sentido da liberdade interior, tal como foi entendida pelos neotomistas do século XVII. A liberdade interior era, apesar dos problemas gerados no neotomismo, um valor. Com base nele, Macedo afirma: "A liberdade interior, do ponto de vista humano, é a primeira e o fundamento necessário das outras" (1997, p. 19). Mas, em nome e em defesa dessa tradição, a Igreja se colocava como a principal guardiã da moralidade. Quem quer que A noddadP apresPntacla pela filosofia da liberdade de Locke •,e ... ,) se pusesse a refletir sobre uma nova ordem de conduta humana era considerado herege pelos seguidores da tradição. John Locke, percebendo que havia uma profunda contradição entre alguns setores da Igreja, em que muitos praticavam ações destituídas da virtude e do senti.do humanitário, ao discutir a organização da sociedade civil para a preservação da vida, da liberdade e dos bens dos indivíduos, tentou despertar as consciências dos homens, sobretudo, de seu tempo e de seu país, para uma mudança da concepção de liberdade interior, no desenvolvimento da idéia de liberdade relacionada com a convivência em comunidade. Na Carta sobre a tolerância, Locke estabeleceu as bases para a discussão acerca do problema da liberdade exterior. A designação e o fundamento da tolerância residiu na constatação cotidiana da intolerância reinante no seio da Igreja para com aqueles que discordavam da ortodoxia praticada em defesa da fé. Ortodoxia esta que, revestida de pompas, mais se caracterizava pela luta pelo poder e pela dominação dos contrários do gue pela defesa dos preceitos da Igreja de Cristo. A tolerânciadeveria constituir-se no principal sinal característico da Igreja de Cristo. Pois: A verdadeira religião não é instituída para a pompa externa, ou para a obtenção de dominação eclesiástica, ou ainda para o exercício de força compulsiva, mas para a regulamentação das vidas dos homens, segundo as regras da VIRTUDE e da PIEDADE (LOCKE, 1994, p. 239). O apelo de Locke para os aspectos da caridade, mansidão, piedade, virtude, boa vontade, traziam como resultado a tolerância. Em Locke, os preceitos cristãos deveriam ser exortados para fora; para fundamentar o relacionamento de uns com os outros. E para A dialetiea ela lilwrdadL' em Lockc a prática da tolerância, tão necessária para a organização da vida social, assunto que viria a constituir-se em seu principal projeto, delineado no Segundo Tratado sobre o Governo (1690). A prática da tolerância, desenvolvida através da virtude, da piedade, da mansidão, da conversação, do respeito às idéias contrárias, estava muito mais amparada pelas mensagens do Evangelho de Cristo, do que as ações praticadas pela intolerância em nome da ortodoxia da fé e da Igreja. Intolerância que chegava aos requintes de crueldade, submetendo os discordantes à mingüa, pela fraude, prostituição e privação de seus bens, além da perseguição com o fogo e com a espada, chegando mesmo a ceifar suas vidas, com o pretexto da transformação dos homens em cristãos, da busca pela salvação. Tais fatos, argumenta Locke, "são contrários à Glória de Deus, à pureza da Igreja e à salvação da alma" (LOCKE, 1994, p. 240). Para converter os discordantes, todos deveriam seguir o exemplo deixado pelo príncipe da p a z que, ao invés de armar seus mensageiros com a espada e com o estigma da perseguição, colocou em suas mãos o Evangelho da p a z e os instruiu com a "santidade exemplar de sua conversação' a fim de converter as nações para sua Igreja. Segundo Locke: A tolerância para com os defensores de opiniões opostas em questões de religião está tão de acordo com o Evangelho de Jesus Cristo e com a razão pura da humanidade, que parece monstruoso que os homens sejam tão cegos a ponto de não perceberem a necessidade e a vantagem disso diante de uma luz tão clara (1994, p. 242) (grifo nosso). A razão humana, na opinião de Locke, é a principal característica do entendimento entre as pessoas. Se ela for A no,idadc apresentada pela filosofia da liberdade de l .ockc 27 aperfeiçoada, através da tolerância nas dissensões, como uma necessidade para o pacto de preservação, a vantagem para todo o corpo social não tem limites. O u seja, quanto mais se praticar o espírito da tolerância, maior será o crescimento e a maturidade do corpo social, tend.o em vista que as opiniões divergentes, além de enriquecerem a conversação, dão luz para o equacionamento e solução de diferentes assuntos e problemas. Portanto, as discordâncias entre as pessoas facultam a elas, necessariamente, a LIBERDADE D E ESCOLHA, deixando a critério de cada homem a opção para associar-se à seita que, a seu juízo, melhor atenda às necessidades de seu espírito, tanto para a salvação da alma quanto para unir-se a um corpo social, através de um pacto, que vise "a preservar sua LIBERDADE e sua energia, buscando assistência mútua e força conjunta, como forma de assegurar um ao outro seus bens e sua integridade física". Assim, segundo Locke, Deus não instituiu a sociedade civil, mas ensinou aos homens como, pela fé e pelas boas ações, eles podem obter a vida eterna, vê-se a necessidade de organizar a comunidade civil, com um governo e leis por ela estabelecidas e que digam respeito apenas aos interesses civis dos homens, relacionados com as coisas deste mundo, nada tendo a ver com o futuro da alma. Para dirimir as controvérsias entre os homens, no cumprimento das leis civis, seria desig n ado um magistrado para ensinar, instruir e corrigir os erros, através da razão, não cabendo a ele, o cuidado da salvação das almas. Pois, segundo Locke: Os eclesiásticos, além de se absterem da violência e de todos os modos de perseguição, [ ... ], deveriam também com zelo exortar a todos os homens (simples e magistrados), à caridade, A dialética da liberdade em T ,ocke 28 à humildade e à tolerância, e diligentemente se esforçar para aliviar e abrandar todo aquele ardor de relutância excessiva do espírito, que decorrem tanto do fervor entusiasmado de um homem para com sua própria seita como da astúcia de outros contra os dissidentes (LOCKE, 1994, p. 254). Assim, o sentimento da tolerância exortado por Locke, que traz com seu significado o apelo à razão, à benevolência, à humildade enfim ao entendimento entre os homens e ao respeito' ' às opiniões contrárias, constitui-se na ponte que liga a liberdade interior do homem, segundo a tradição cristã, com a liberdade exterior, que diz respeito a todas as coisas relacionadas às ações humanas, na conivência de uns com os outros, cujos limites, segundo Locke, "são estabelecidos por leis pelo poder legislativo (supremo) para toda a comunidade" (LOCK.E, 1994, p. 274), outorgando-as aos cuidados do magistrado civil. E o próprio Locke afirma: É fácil entender os fins que devem ser buscados pelo poder legislativo e as medidas que devem regulamentá-lo; estes são os bens temporais e a prosperidade externa da sociedade, a única razão por que o homem entra em sociedade e a única coisa que nela busca e deseja. Também é evidente que a LIBERDADE DO HOMEM permanece RELACIONADA com a sua SALVAÇÃO ETERNA, e que todos devem fazer o que sua consciência está convencida de que será aceito pelo Todo-Poderoso, de cuja boa vontade e aceitação depende sua felicidade eterna. Porque se deve, antes de tudo, obediência a Deus, depois às leis (LOCKE, 1994 p. 275) (grifo nosso). A novidade apresentada pela filosofia da libcr<lad0 de Locke 29 Apreende-se das palavras de Locke sua intenção de aproximar a liberdade interior com a liberdade política, exaltando as virtudes dos princípios sociais de convivência. A tolerância é a ponte que liga uma à outra. A dialética da liberdade em Locke 30 CONHECIMENTO E A LIBERDADE EM LOCKE O s trabalhos de Locke e as obras de comentadores de renome utilizados na pesquisa como Guilhermo Fraile, J . W Gough, James L. Axtell, Ives Michaud, André e Louis Leroy, Antônio Paim, não estabelecem com clareza uma relação da epistemologia de Locke com sua teoria política. Mas, através de vários pontos e indícios, pode-se constatar que a teoria do conhecimento não é uma parte isolada e dissociada da teoria política. A ponte para essa relação pode ser estabelecida através de A(guns Pensamentos sobre a Educação 1693 {apud A X T E L L , 1968) e Conduta do Entendimento (1697), bem como através de outros tópicos que serão apresentados neste capítulo. Conhecimento e a liberdade em Locke : 1 3 NO CONTEXTO DAS OBRAS Ensaio Acerca do Entendimento Humano e o Segundo Tratado sobre o Governo foram publicado s quase que ao mesmo o temp , co nf orme o relato de Axtell, no inverno de 1689/90, o que deu tempo para Lo cke preparar seus Alguns pensamentos sobre a educação, publicado s em 1693. Tanto no nsaio quanto no Se g undo Tratado, vários aspectos podem ser apreciado s co mo indicad o res da preparação da mentalidade inglesa para o co nvívio em so ciedade so b um go verno po lítico po r ela co nsti tuído . N o Capítul o III do Ensaio, a r espeitada Teoria do Co nhecimento , quando Lo cke trata da extensão do conhecimento humano , abo rda que "há mentes e seres pensantes em o utro s ho mens do mesmo mo do que em si mesmo s, que to do homem tem uma razão , em virtude de suas palavras e ações" (LOCKE, 1978c, p. 284). Observa-se o peso que é atr ibuído às palavras e, po r co nseqüência, às ações humanas. Na discussão so bre o uso adequado das palavras, observo u-se a impo rtância atribuída ao s acerto s e desacerto s, quantoao emprego das mesmas para a designação das co isas. Não send o usadas co nvenientemente, po dem co nduzir à interpretações desastrosas. Assim, a razão de cada ho mem po de ser o bservada, talvez deduzida pelas palavras que ele articula ou pelas ações po r ele praticadas. Vale, entretanto , o bservar que o uso adequado das palavras e as qualificações de suas designações estão intimamente ligadas à educação e ao conhecimento adquirido . Po r outro lado , "apenas o co nhecimento das coisas a ser capturado ; unicamente este valoriza nossos A dialética da liberdade t'm Locke raciocínio s e mo stra o predomínio de um ho mem sobre o outr o , dizendo a respeito das co isas co mo realmente são " (1978c, P· 287). O entendimento dessa afirmação só fica assegurado na medida em que O individuo se prepara para as coisas da vida, como dizia O próprio Lo cke. O co nhecimento aumenta o po der de raciocínio dos ho mens e cria condições para ampliar a capacidade de discernimento so bre o que o afeta no dia--a-dia. E "as palavras são encaradas co mo grandes co nduto r es da verdade e do co nhecimento , [ ... ], e as verdades gerais são encaradas pela mente co mo as que mais ampliam no sso conhecimento " (1978c, p.293). Mas tudo isso só foi po ssível, e também o desenvo lvimento da reunião das palavras, graças às "Escolas que fizeram do s debates a pedra de to que da habilidade do s ho mens" (1978c, P· 302), privilegiando a palavr a final daquele que produzisse o melhor argumento . Denota-se aqui a introdução da Esco la co mo sendo o ambiente natural para o desenvolvimento da criatividade das pessoas, bem co mo para O entendimento das "leis civis ou regras estabelecidas pela co munidade co m respeito às ações de seus co mponentes" (1978c, p.216), assim co mo das r elações que devem prevalece r no cumprimento das o brigações e dos vário s deveres entre o s homens. Nesse sentido , fica evidente a relação de causa e efeito desenvo lvida po r Locke, co m a Esco la, o ferecendo educação e aumentando no s ho mens a sua capacidade de relacionar-se no convívio so cial; pelo fato de que, "em lugares em que ho mens em so ciedade já estabeleceram uma linguagem entre eles" (1978c, p. 248), a co municação do s pensamento s e das idéias, por meio das palavras, mantém um nível elevado da conve r sa e do intercâmbio co tidianos "acerca dos assunto s e conveniências da vida civil" (1978c, p. 251). Conhecimento e a liberdade Pm Locke N o Seg11ndo Tratado, quando Locke desenvolve a Teoria do Pátrio Poder, no Capítulo V I , ele indica que os pais têm uma espécie de governo e jurisdição sobre os filhos, quando estes vêm ao mundo e durante um certo tempo. N o entanto, na proporção em que os filhos ç:rescem, pouco a pouco, vão-se liberando da tutela paterna até se tornarem homens livres. A liberdade, estava, no sentir do filósofo, diretamente vinculada à utilização da razão. Durante a menoridade que, segundo Locke, era o estado próprio dos menores de 21 anos, a alimentação e a educação dos filhos são incumbências tão forçosas aos pais, para o bem dos filhos, que nada pode eximi-los disso. Numa época em que se discutia a formação das sociedades, as poucas escolas existentes eram eclesiásticas e a atuação dos pais considerada imprescindível. Não havia escolas públicas na difusão hoje concebida, razão pela qual Locke enfatizava a obrigação dos pais com a educação dos filhos, recomendando, inclusive, a adoção de tutores e preceptores para o acompanhamento dos jovens. Depois dessa fase, tanto os pais quanto os filhos, tutores e preceptores estavam ig u almente livres e sujeitos a mesma lei. O entendimento do pacto estabelecido requeria um certo nível de instrução para o convívio social, tendo em vista que "a liberdade do homem e a liberdade de ação, [ ... ], baseiam-se em ter ele razão capaz de instruí-lo na lei pela qual terá de governar-se" ( L O C K E , 1978b, p. 40). Pode-se admitir que a idade de 21 anos, sugerida por Locke e introduzida no corpo da lei, para atribuir aos jovens responsabilidade civil, vem perdurando através dos tempos, ainda que pese a tendência atual de reduzi-la. A dialética da Jilwrcfadl' t'm Locke '14 Em seguida, Locke passa a examinar a distinção entre o poder paterno e o poder político. Defende que os dois poderes "estão perfeitamente separados, baseando-se em razões tão diversas e destinando-se a fins tão diferentes" (1978b, p. 44), que tanto o súdito quanto o príncipe, que são pais, estão obrigados a obedecer as regras da sociedade na qual estão incorporados. Assim, os filhos de qualquer indivíduo, estando unid9s aos pais por laços de filiação até a maioridade, ficam na obrigação de respeitá-los e prestar-lhes obediência até a idade capaz para o exercício da vida civil. A partir daí, embora os filhos continuem prestando reverência aos pais, eles adquirem igualdade de condições para o exercício da liberdade e da escolha da sociedade a que tenham de se unir; ou a comunidade à qual vão se submeter, aceitando as regras estabelecidas e sujeitando-se ao pacto já instalado, ou instituindo novo pacto, no caso de iniciação de nova comunidade. Uma vez entendido que o homem, a partir de certo momento, tem de agir por conta própria, assumindo suas responsabilidades e sujeitando-se a este ou àquele poder político, Locke prepara a inserção social do indivíduo com o argumento de que "as próprias comunidades observam e concordam que há uma ocasião em que os homens estão prontos para começar a agir como homens livres" (1978b, p. 40). E a partir dessa ocasião, quando cessa a responsabilidade paterna e o indivíduo passa a responder por seus próprios atos perante as leis da comunidade da qual faz parte, inicia-se a fase política do homem, de submissão a um poder como cidadão ou no exercício de uma atividade pública. Assim, tendo o indivíduo adquirido maioridade e liberdade para seguir sua própria vontade, segundo a lei da natureza, mas C onht>l'llllPnto e a liberdade Plll I ,m'l\l' tomando as diretrizes que lhe são possíveis, segundo as regras estabelecidas por um corpo social, Locke inicia a discussão da formação da sociedade civil ou política. Partindo da sociedade conjugal, considerada a primeira forma de vida em comum entre duas pessoas, atribwu-se aos pais a responsabilidade pela formação moral e virtuosa dos jovens, para tornarem-se cidadãos livres e para entenderem que "a liberdade do homem em sociedade não deve ficar sujeita a qualquer outro poder legislativo, senão o que se estabelece por consenso na comunidade" (1978b, p. 17), Locke tece considerações que merecem ser examinadas, no que toca a sua concepção de liberdade humana, segundo o estado de natureza e segundo as leis que regem a comunidade. O problema da liberdade humana é complexo e tem muitas implicações na vida social e política das sociedades. Com respeito à comunidade e sociedade, no sentido genérico das palavras, Locke não fez uma distinção mais profunda dos termos, quando diz "a comunidade parece-me ser uma sociedade de homens constituída somente para a preservação e progresso de seus próprios interesses civis" (1978b, p. 5). Todavia, quando qualifica em comunidade política, a distinção fica mais clara com a afirmação: "porquanto pode haver comunidades subordinadas num governo" ( LO CKE , 1978b, p. 77). Assim, pode-se entender como comunidades os habitantes de vários bairros de uma cidade, subordinadas ao governo de um Município; as comunidades de várias cidades, subordinadas ao governo de um Estado; e as comunidades estaduais, subordinadas ao governo central de uma nação. Tomando como exemplo as nações federadas modernas, poderíamos falar de comunidades e sociedade municipal; comunidades municipais e sociedade estadual A dialétiea da liberdade em Loeke e comunidades estaduais e sociedade federativa, considerando que a melhor caracterização de sociedade é a
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