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Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 CASO 9 - TRANSTORNOS DO SONO-VIGILIA O sono é um dos comportamentos humanos mais significativos, ocupando aproximadamente um terço da vida. Trata-se de um comportamento universal demonstrado em toda espécie animal estudada, de insetos a mamíferos. É um processo que o cérebro requer para um funcionamento adequado. Privar uma pessoa seletivamente de um tipo específico de sono produz rebote compensatório quando o indivíduo pode dormir à vontade. ELETROFISIOLOGIA DO SONO O sono é composto por dois estados fisiológicos: o sono não REM e o sono REM. No sono não REM, que é composto dos estágios 1 a 4, a maioria das funções físicas é nitidamente menor do que na vigília. O sono REM é um tipo de sono qualitativamente diferente, caracterizado por altos níveis de atividade cerebral e fisiológica semelhantes aos da vigília. Cerca de 90 minutos após o início do sono, o não REM passa ao primeiro episódio REM da noite. A latência de 90 minutos do REM é um achado consistente em adultos sadios; encurtamento da latência do REM ocorre em transtornos como narcolepsia e transtornos depressivos. Para aplicações clínicas e de pesquisa, o sono é em geral classificado em períodos de 30 segundos, com estágios definidos pela pontuação visual de 3 parâmetros: eletroencefalograma (EEG), eletro-oculograma (EOG) e eletromiograma (EMG) registrados abaixo do queixo. O EOG registra os movimentos rápidos conjugados dos olhos, que são a característica identificadora do estado do sono (pouco ou nenhum movimento dos olhos ocorre no sono não REM); o padrão de EEG consiste em atividade rápida, aleatória e de baixa voltagem, com ondas de serrote, o EMG mostra uma redução marcante no tônus muscular. Em pessoas sadias, o sono não REM é um estado hipoativo em relação à vigília. A frequência cardíaca costuma baixar a 5-10 bpm abaixo do nível de repouso acordado e é muito regular. A respiração é afetada da mesma forma, e a PA também tende a baixar, com poucas variações minuto a minuto. O potencial muscular em repouso da musculatura corporal é mais baixo no sono REM do que quando desperto. Movimentos corporais episódicos e involuntários estão presentes no sono não REM. Raramente há ereções penianas nos homens. O fluxo sanguíneo pela maioria dos tecidos, incluindo o cerebral, é ligeiramente reduzido. As porções mais profundas do sono não REM (estágios 3 e 4) às vezes são associadas com características incomuns de despertar. Quando as pessoas são acordadas de 30 minutos a 1 hora após o início do sono (em geral no sono com ondas lentas), elas estão desorientadas, e seu pensamento é desorganizado. Breves despertares do sono com ondas lentas também estão associadas com amnésia para eventos que ocorrem durante o despertar. A desorganização no despertar dos estágios 3 ou 4 pode resultar em problemas específicos, incluindo enurese, sonambulismo e pesadelos ou terrores noturnos do estágio 4. Mensurações poligráficas durante o sono REM demonstram padrões irregulares, às vezes semelhantes aos padrões de excitação quando desperto. Por isso, o sono REM também foi chamado de sono paradoxal. Pulso, respiração e pressão arterial ficam todos elevados durante o sono REM (muito mais do que no não REM e frequentemente mais elevados do que quando acordados). O oxigênio no cérebro também aumenta. A resposta ventilatória aos níveis mais elevados de dióxido de carbono (CO2) é deprimida durante o sono REM, de modo que nenhum aumento no volume corrente ocorre conforme aumenta a pressão parcial do dióxido de carbono (Pco2). A termorregulação fica alterada no sono REM. Diferentemente da condição homeotérmica da regulação de temperaturas durante o estado desperto ou o sono não REM, uma condição pecilotérmica (temperatura varia com as alterações na temperatura do ambiente) prevalece durante o sono REM. Quase todo período REM em homens é acompanhado de ereção peniana parcial ou completa. Outra alteração física é a quase total paralisia dos músculos esqueléticos (posturais). Em razão dessa inibição motora, o movimento corporal é ausente no sono REM. Provavelmente a característica mais distinta do sono REM sejam os sonhos. Pessoas despertadas nesse período com frequência (de 60 a 90% das vezes) relatam que estavam sonhando. Os sonhos que ocorrem durante o sono REM costumam ser abstratos e surreais. Eles também ocorrem durante o sono não REM, mas costumam ser lúcidos e propositados. A natureza cíclica do sono é regular e confiável; um período REM ocorre a cada 90 ou 100 minutos durante a noite. O primeiro período REM tende a ser o mais curto, normalmente durando menos de 10 minutos; períodos REM posteriores podem durar até 15 a 40 minutos cada. A maioria dos períodos REM acontece no último terço da noite, enquanto a maior parte do estágio 4 do sono se dá no primeiro terço da noite. Esses padrões de sono mudam ao longo da vida da pessoa. SONO NREM - Diminuição progressiva do tônus, mas não parado. - Cérebro tranquilo com baixa atividade psicológica. - EEG: sincrônico, com formas de onda características (complexos K, fuso de sono e ondas lentas de alta voltagem). - Dividido em N1, N2 e N3 ou SWS (S3+S4). Sendo SWS (“slow wave sleep”) o sono de ondas lentas. - “Um cérebro relativamente inativo, apesar de ativamente regulador, em um corpo relaxado mas móvel”. SONO REM - Atonia total com movimentos periódicos dos olhos. - Intensa atividade cerebral/psíquica. - EEG ativado e dessincronizado. - Maior parte dos sonhos ocorrem no sono REM. - “Cérebro ativo em um corpo paralisado”. No início da vida adulta, a distribuição dos estágios do sono é: - NREM (75%) Estágio 1: 5% ; Estágio 2: 45%; Estágio 3: 12%; Estágio 4: 13%. - REM (25%) Essa distribuição permanece relativamente constante na velhice, apesar de haver uma redução tanto no sono de ondas lentas quanto no sono REM nos idosos. Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 REGULAÇÃO DO SONO A maioria dos pesquisadores acredita que não exista apenas um centro simples de controle do sono, mas um pequeno número de sistemas ou centros interconectados que se localizam no tronco encefálico e que se ativam e se inibem mutuamente. Muitos estudos sustentam o papel da serotonina na regulação do sono. A inibição da síntese de serotonina ou a destruição do núcleo de rafe dorsal do tronco cerebral, que contém quase todos os corpos serotonérgicos do cérebro, reduzem o sono por um período considerável. A síntese e a liberação de serotonina por neurônios serotonérgicos são influenciadas pela disponibilidade dos aminoácidos precursores desse neurotransmissor (ex: L-triptofano). A ingestão de grandes quantidades de L-triptofano (1 a 15 g) reduz a latência do sono e o despertar noturno. No entanto, a deficiência dessa substância é associada com menos tempo de sono REM. Os neurônios que contêm norepinefrina, com corpos celulares localizados no locus ceruleus, exercem importante papel no controle dos padrões de sono normais. O aumento no disparo desses neurônios noradrenérgicos reduznitidamente o sono REM (neurônios REM-off) e aumentam a vigília. A estimulação elétrica do locus ceruleus perturba profundamente todos os parâmetros do sono. A acetilcolina no cérebro também está envolvida no sono, em particular na produção do sono REM. Em estudos com animais, a injeção de agonistas muscarínicos colinérgicos nos neurônios da formação reticular pontina (neurônios REM-on) resulta em uma mudança do estado desperto ao sono REM. Perturbações na atividade colinérgica central estão associadas com alterações do sono observadas no transtorno depressivo maior. Comparados com pessoas saudáveis ou com controles psiquiátricos não deprimidos, pacientes deprimidos apresentam perturbações nítidas dos padrões de sono REM. Essas perturbações incluem latência encurtada de REM (60 minutos ou menos). A administração de um agonista muscarínico, como a arecolina, durante o primeiro ou segundo períodos nREM resulta em início rápido do sono REM. A depressão pode estar associada com supersensibilidade subjacente a acetilcolina. Fármacos que podem reduzir o sono REM, como antidepressivos, produzem efeitos benéficos na depressão. De fato, cerca de metade dos pacientes com transtorno depressivo maior apresenta melhora temporária quando é privada de sono ou quando o sono é restringido. No entanto, a reserpina, um dos poucos fármacos que aumentam o sono REM, também produz depressão. Pacientes com demência do tipo Alzheimer apresentam perturbação do sono caracterizada por sono REM e sono de ondas lentas reduzidos. A perda de neurônios colinérgicos na porção basal do prosencéfalo foi apontada como causa dessas mudanças. A secreção de melatonina da glândula pineal é inibida por luz clara, então as concentrações séricas mais baixas de melatonina ocorrem durante o dia. O núcleo supraquiasmático do hipotálamo pode agir como o local anatômico de um marca-passo circadiano que regula a secreção de melatonina e a condução do cérebro a um ciclo sono-vigília de 24 horas. Evidências mostram que a dopamina tem um efeito de alerta. Drogas que aumentam concentrações de dopamina no cérebro tendem a produzir excitação e vigília. Por sua vez, bloqueadores de dopamina, como a pimozida e as fenotiazinas, tendem a aumentar o tempo de sono. Uma suposta tendência homeostática para dormir, talvez na forma de uma substância endógena – processo S –, pode se acumular durante períodos de vigília e induzir o sono. Outro componente – processo C – pode agir como um regulador da temperatura corporal e da duração do sono. FUNÇÕES DO SONO A maioria dos pesquisadores conclui que o sono exerce uma função homeostática restaurativa e parece ser essencial ao funcionamento normal da termorregulação e da conservação de energia. Como o sono não REM aumenta após exercício e fome, esse estágio pode estar associado com a satisfação de necessidades metabólicas. PRIVAÇÃO DE SONO Períodos prolongados de privação do sono podem levar a desorganização do ego, alucinações e delírios. Privar as pessoas de sono REM acordando-as no início desses ciclos aumenta o número de períodos REM e a quantidade de sono REM (aumento de rebote) quando podem dormir sem interrupções. Pacientes privados de REM podem exibir irritabilidade e letargia. Em estudos com ratos, a privação de sono produz uma síndrome que inclui aparência debilitada, lesões de pele, aumento de ingesta alimentar, perda de peso, aumento de gasto de energia, redução na temperatura e morte. Alterações neuroendócrinas incluem aumento de norepinefrina e redução dos níveis de tiroxina no sangue. NECESSIDADE DE SONO Algumas pessoas têm sono naturalmente curto, necessitando de menos de 6h por noite para funcionar de maneira adequada. Pessoas com sono curto costumam ser eficientes, ambiciosas, socialmente adaptadas e satisfeitas. Pessoas com sono longo precisam dormir mais de 9h por noite para funcionamento adequado. Estas têm mais períodos REM e mais movimentos rápidos dos olhos em cada período (conhecidos como densidade REM) do que aquelas que têm sono curto. Às vezes, esses movimentos são considerados uma medida da intensidade do sono REM e estão relacionados com a vivacidade do sonho. Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 Pessoas com sono longo tendem a ser um pouco deprimidas, ansiosas e socialmente retraídas. A necessidade de sono aumenta com o trabalho físico, exercício, doença, gravidez, estresse mental geral e atividade mental aumentada. Períodos REM aumentam após estímulos psicológicos fortes, como situações difíceis de aprendizado e estresse, e após o uso de drogas que reduzem as catecolaminas do cérebro. AVALIAÇÃO DO SONO Polissonografia - Noite de sono monitorada em diversos parâmetros. - Pode ser feita em ambiente hospitalar ou doméstico. - Também pode ser filmada (videopolissonografia), usada principalmente para avaliar parassonias e movimentos. - Principais indicações: padrão ouro para SAOS e outros distúrbios respiratórios; parassonias (sonambulismo, TCSR, transtorno dos movimentos durante o sono (pernas inquietas, bruxismo); doenças neuromusculares; pacientes com sintomas atípicos relacionados ao sono; insônias secundárias ou refratárias. Teste das múltiplas latências do sono - 5 cochilos durante o dia deitado em ambiente adequado a cada 2h (o paciente é orientado a não se opor ao sono). - Avaliar latência de sono e latência de sono REM. - Principais indicações: Hipersonia e narcolepsia. Teste da manutenção da vigília - Avalia a capacidade de se manter acordado. - 5 oportunidades de cochilo diurno em ambiente adequado a cada 2h (o paciente é orientado a se opor ao sono). Actigrafia - Aparelho móvel, normalmente tipo relógios de pulso. - Mede o nível de atividade motora. - Alguns medem FC e temperatura também. - Grande utilidade para determinar padrões de sono e ritmos circadianos (“diário de sono tecnológico”). MEDIDAS POLISSONOGRÁFICAS COMUNS - Latência do sono: período de tempo desde o apagar das luzes até o surgimento do estágio 2 do sono. - Despertar cedo na manhã: tempo continuamente acordado desde o último estágio do sono até o fim do registro de sono (em geral às 7h). - Eficiência do sono: período total dormido ou período total do registro do sono × 100. - Índice de apneia: número de apneias maiores do que 10 segundos por hora de sono - Índice de mioclono noturno: número de movimento periódicos da perna por hora. - Latência do movimento rápido dos olhos (REM): período de tempo desde o início do sono até o primeiro período REM da noite. - Período REM no início do sono: sono REM nos primeiros 10 minutos do sono. TRANSTORNO DE INSÔNIA Critérios Diagnósticos DSM-5 307.42 (F51.01) A. Queixas de insatisfação predominantes com a quantidade ou a qualidade do sono associadas a um (ou mais) dos seguintes: 1. Dificuldade para iniciar o sono (em crianças, pode se manifestar como dificuldade para iniciar o sono sem intervenção de cuidadores). 2. Dificuldade para manter o sono, que se caracteriza por despertares frequentes ou por problemas para retornar ao sono depois de cada despertar (em crianças, pode se manifestar comodificuldade para retornar ao sono sem intervenção de cuidadores). 3. Despertar antes do horário habitual com incapacidade de retornar ao sono. B. A perturbação do sono causa sofrimento clinicamente significativo e prejuízo no funcionamento social, profissional, educacional, acadêmico, comportamental ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. C. As dificuldades relacionadas ao sono ocorrem pelo menos três noites por semana. D. As dificuldades relacionadas ao sono permanecem durante pelo menos três meses. E. As dificuldades relacionadas ao sono ocorrem a despeito de oportunidades adequadas para dormir. F. A insônia não é mais bem explicada ou não ocorre exclusivamente durante o curso de outro transtorno do sono-vigília (ex: narcolepsia, transtorno do sono relacionado à respiração, transtorno do sono-vigília do ritmo circadiano, parassonia). G. A insônia não é atribuída aos efeitos fisiológicos de alguma substância (ex: abuso de drogas ilícitas, medicamentos). H. A coexistência de transtornos mentais e de condições médicas não explica adequadamente a queixa predominante de insônia. Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 Especificar se: Com comorbidade mental causada por transtorno não relacionado ao sono, incluindo transtornos por uso de substâncias Com outra comorbidade médica Com outro transtorno do sono Especificar se: Episódico: Os sintomas duram pelo menos um mês, porém menos que três meses. Persistente: Os sintomas duram três meses ou mais. Recorrente: Dois (ou mais) episódios dentro do espaço de um ano. Nota: Insônia aguda e insônia de curto prazo (ex: sintomas durando menos de 3 meses, porém que atendem todos os critérios de frequência, intensidade, sofrimento e/ou prejuízos) devem ser codificadas como outro transtorno de insônia especificado. Diferentes manifestações podem ocorrer em horários distintos do período de sono. Insônia na fase inicial do sono (ou insônia inicial) envolve a dificuldade em conciliar o sono na hora de dormir. Insônia de manutenção do sono (ou insônia intermediária) caracteriza-se por despertares frequentes ou prolongados durante a noite. Insônia terminal envolve o despertar antes do horário habitual e a incapacidade para retornar ao sono. A dificuldade em manter o sono é o sintoma mais comum, seguida pela dificuldade em conciliar o sono, enquanto a combinação desses dois sintomas é a apresentação geral mais comum. Com frequência, o tipo específico de queixa de sono varia ao longo do tempo. Epidemiologia O transtorno de insônia é o mais prevalente entre os transtornos do sono. Queixa de insônia é mais prevalente em indivíduos do sexo feminino. Embora, possivelmente, seja independente, a insônia é observada com maior frequência como uma condição comórbida com outra condição médica ou transtorno mental (40 a 50%). Indivíduos com insônia crônica têm mais que o dobro de acidentes com veículos automotores do que a população geral. Ainda assim, 40% ou mais desses indivíduos se automedicam com fármacos sem prescrição médica, álcool ou ambos. Desenvolvimento e Curso O primeiro episódio é mais comum em adultos jovens. Com menos frequência, inicia na infância ou na adolescência. Nas mulheres, o início da insônia pode ocorrer durante a menopausa e persistir mesmo depois da resolução de outros sintomas. Pode iniciar em um período mais tardio da vida, o que está frequentemente associado ao início de outras condições relacionadas à saúde. Geralmente, a insônia ocasional, ou aguda, dura alguns dias ou algumas semanas e costuma estar associada a eventos que ocorrem na vida ou a alterações rápidas nos horários ou no ambiente de sono. De maneira geral, desaparece logo após a regressão do evento precipitante inicial. O curso da insônia pode também ser episódico, com episódios recorrentes de dificuldades para dormir associados à ocorrência de eventos estressantes. As taxas de cronicidade variam de 45 a 75% nos acompanhamentos por períodos de 1 a 7 anos. Mesmo nas situações em que a insônia se tornar crônica, ocorrem variações noturnas nos padrões de sono, com intercalação de sono reparador ocasional com várias noites de sono de má qualidade. Muitos apresentam história de sono “leve” ou facilmente perturbado antes do desenvolvimento de problemas mais persistentes. As queixas de insônia prevalecem mais entre adultos de meia-idade e adultos mais velhos. Dificuldades para conciliar o sono são mais comuns entre adultos jovens, e problemas de manutenção do sono ocorrem com mais frequência na meia-idade e entre idosos. O aumento na prevalência de insônia em adultos mais velhos explica-se parcialmente pela maior incidência de problemas físicos de saúde com o envelhecimento. Embora seu valor seja limitado nas avaliações rotineiras, a polissonografia pode ser mais útil no diagnóstico diferencial entre adultos mais velhos, pois as etiologias da insônia (ex: apneia do sono) são mais frequentemente identificáveis em indivíduos mais velhos. Marcadores Diagnósticos Em geral, a polissonografia mostra a presença de prejuízos na continuidade do sono (ex: aumento na latência do sono e no tempo para despertar e redução na eficiência do sono [percentual de tempo adormecido na cama]) e pode revelar também aumento no estágio 1 e diminuição nos estágios 3 e 4 do sono. Análises eletrencefalográficas quantitativas apresentam maior intensidade de sinais de alta potência do que aquelas que dormem bem no período de início do sono e durante o sono com movimentos não rápidos dos olhos, o que sugere aumento na excitação cortical. Outros tipos de medição laboratorial mostram evidências, embora não consistentes, de aumento na excitação e ativação generalizada do eixo hipotalâmico-hipofisário-suprarrenal (elevação de cortisol, variabilidade na FC, reatividade ao estresse, taxa metabólica). Aparentemente, indivíduos com o transtorno de insônia parecem fatigados ou abatidos ou, ao contrário, superexcitados e “ligados”. No entanto, o exame físico não revela anormalidade característica ou consistente. Possivelmente ocorra aumento na incidência de sintomas psicofisiológicos relacionados ao estresse (cefaleia por tensão, tensão ou dor muscular, sintomas gastrintestinais). Insônia persistente: O problema é a dificuldade de pegar no sono ou de continuar dormindo. Envolve dois problemas que às vezes podem ser separados, mas costumam estar interligados: tensão e ansiedade somatizadas e uma resposta associativa condicionada. Os pacientes costumam não ter outras queixas além da insônia. Podem não sentir ansiedade propriamente dita, mas descarregá-la por meio de canais psicológicos; podem reclamar sobretudo de sentimentos apreensivos ou de pensamentos ruminantes que parecem impedi-los de pegar no sono. Às vezes (mas nem sempre), um paciente descreve a exacerbação da condição em momentos de estresse no trabalho ou em casa e sua remissão durante as férias. Percepção inadequada do estado de sono (“insônia subjetiva”): Caracterizada por uma dissociação entre a experiência de dormir do indivíduo e as medidas poligráficas objetivas. Diagnosticada quando um pacientereclama de dificuldades para iniciar ou manter o sono e não é possível encontrar evidências objetivas de perturbação do Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 sono. Por exemplo, um paciente dormindo no laboratório relata levar mais de 1 hora para dormir, acordar mais de 30 vezes e dormir menos de 2 horas a noite inteira. Contudo, a polissonografia mostra o início do sono ocorrendo em 15 minutos, poucos despertares, eficiência de 90% do sono e tempo total de mais de 7h de sono. A percepção inadequada do estado de sono ocorre em indivíduos aparentemente livres de psicopatologia ou pode representar um delírio somático ou hipocondria. Alguns pacientes com percepção inadequada do sono apresentam características obsessivas em relação a funções somáticas. A percepção inadequada do estado de sono de curto prazo pode ocorrer durante períodos de estresse, e alguns clínicos acreditam que possa ser o resultado de transtornos depressivos ou de ansiedade latentes ou tratados de forma ineficiente. Reclassificar cognitivamente, atenuar as preocupações com o sono, ou ambos, pode ajudar. Ansiolíticos podem reduzir profundamente a percepção da falta de sono sem grandes alterações fisiológicas no sono. Insônia psicofisiológica (“insônia condicionada”): Em geral, se apresenta como uma reclamação primária da dificuldade em pegar no sono. Os pacientes podem afirmar que tem ocorrido por anos e costumam negar que esteja associada a períodos estressantes da vida. Objetos associados ao sono (cama, travesseiro) também se tornam estímulos condicionados que evocam a insônia. A insônia psicofisiológica com frequência ocorre em combinação com outras causas de insônia, incluindo episódios de estresse e transtornos de ansiedade, síndrome de fase do sono atrasada e uso e abstinência de drogas hipnóticas. Diferentemente da insônia dos pacientes com transtornos psiquiátricos, a adaptação no tempo diurno costuma ser boa. O trabalho e os relacionamentos são satisfatórios; contudo, pode haver cansaço extremo. Outras características incluem: preocupação excessiva com não conseguir dormir; esforçar-se demais para dormir; ruminação, incapacidade de esvaziar a mente ao tentar dormir; tensão muscular aumentada ao tentar dormir; outras manifestações somáticas de ansiedade; conseguir dormir melhor longe da própria cama; e ser capaz de dormir quando não tenta (ex: assistindo à televisão). Muitos desses pacientes com insônia psicofisiológica dormem bem no laboratório. Insônia idiopática: Costuma começar nos estágios iniciais da vida, às vezes no nascimento. Como o nome implica, sua causa é desconhecida; causas suspeitas incluem desequilíbrio neuroquímico na formação reticular do tronco cerebral, regulação prejudicada nos geradores de sono do tronco cerebral (ex: núcleos de rafe, locus ceruleus) ou disfunção do prosencéfalo basal. O tratamento é difícil, mas higiene aprimorada do sono, terapia de relaxamento e uso prudente de hipnóticos podem ajudar. Insônia primária: Diagnosticada quando a principal queixa é de sono não reparador ou de dificuldade para iniciar ou manter o sono e a reclamação continua por pelo menos um mês (pelo CID-10, deve ocorrer ao menos 3 vezes por semana por um mês). O termo primária indica que é independente de qualquer condição física ou mental. Excitação fisiológica ou psicológica aumentada noturna e condicionamento negativo para dormir costumam ser evidentes. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO A insônia primária é comumente tratada com benzodiazepínicos, zolpidem, eszopiclona, zaleplon e outros hipnóticos. Essas drogas devem ser usadas com cuidado. Em geral, não devem ser prescritos por mais de 2 semanas, em razão da tolerância e da abstinência que podem resultar. Por muitos anos, bendiazepínicos foram os medicamentos sedativo-hipnóticos mais prescritos para tratar insônia. Os agonistas dos receptores benzodiazepínicos representam o padrão atual dos medicamentos sedativo-hipnóticos. Medicamentos de longa ação (flurazepam, quazepam) são melhores para insônia no meio da noite; os de curta ação (zolpidem, triazolam) são úteis para pessoas que têm dificuldade para pegar no sono. O agonista do receptor da melatonina, ramelteon, também foi aprovado para o tratamento de insônia. Antidepressivos sedativos, como trazodona, também são frequentemente prescritos. Diversos medicamentos sem prescrição médica usados para dormir também estão disponíveis, incluindo anti-histamínicos sedativos, precursores de proteínas e outras substâncias. A melatonina é o principal dos suplementos autoadministrados famosos por aliviarem a insônia. Ela é um hormônio endógeno produzido pela glândula pineal ligado à regulação do sono. A maioria dos medicamentos hipnóticos é aprovada para uso de curto prazo, e não de longo prazo. Exceções incluem zolpidem, eszopiclona e ramelteon, aprovados para terapias de longo prazo. Quando usados de modo apropriado, os hipnóticos podem oferecer alívio imediato e adequado para a falta de sono. No entanto, a insônia normalmente retorna após descontinuação do medicamento. HIGIENE DO SONO Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 OBS: A TCC combina técnicas cognitivas e comportamentais para superar comportamentos disfuncionais, percepções errôneas e ideias distorcidas sobre o sono. Técnicas comportamentais incluem higiene universal do sono, terapia de controle de estímulo, terapia de restrição do sono, terapias de relaxamento e biofeedback. TRANSTORNO DE HIPERSONOLÊNCIA Critérios Diagnósticos DSM-5 307.44 (F51.11) A. Relato do próprio indivíduo de sonolência excessiva (hipersonolência) apesar de o período principal do sono durar no mínimo 7 horas, com pelo menos um entre os seguintes sintomas: 1. Períodos recorrentes de sono ou de cair no sono no mesmo dia. 2. Um episódio de sono principal prolongado de mais de 9h por dia que não é reparador 3. Dificuldade de estar totalmente acordado depois de um despertar abrupto. B. A hipersonolência ocorre pelo menos três vezes por semana, durante pelo menos três meses. C. A hipersonolência é acompanhada de sofrimento significativo ou de prejuízo no funcionamento cognitivo, social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. A hipersonolência não é mais bem explicada por e nem ocorre exclusivamente durante o curso de outro transtorno do sono. E. A hipersonolência não é atribuída aos efeitos fisiológicos de alguma substância (p. ex., abuso de drogas, medicamentos). F. A coexistência de transtornos mentais e de condições médicas não explica adequadamente a queixa predominante de hipersonolência. Especificar se: Com transtorno mental, incluindo transtornos relacionados ao uso de substâncias. Com condição médica. Com outro transtorno do sono. Especificar se: Agudo: Duração de menos 1 mês. Subagudo: Duração de 1 a 3 meses. Persistente: Duração de mais de 3 meses. Especificar a gravidade atual: Leve: Dificuldade em manter o estado de alerta durante o dia por um período de 1 a 2 dias por semana. Moderada: Dificuldade em manter o estado de alerta durante o diapor um período de 3 a 4 dias por semana. Grave: Dificuldade em manter o estado de alerta durante o dia por um período 5 a 7 dias por semana A sonolência excessiva (hipersonolência) é uma condição grave, debilitante, potencialmente fatal e não transmissível. Afeta não só o indivíduo como também sua família, seus colegas de trabalho e o público em geral. A frequência é relativamente a mesma nos sexos. A sonolência pode ser consequência de sono insuficiente; disfunção neurológica básica nos sistemas cerebrais reguladores do sono; sono perturbado; fase do ritmo circadiano de um indivíduo. Um questionário da história do sono costuma ajudar a diagnosticar. Resultados graves da sonolência incluem fracasso escolar, perda de emprego, acidentes com veículos e desastres industriais. Desenvolvimento e Curso O transtorno de hipersonolência tem curso persistente, com evolução progressiva na gravidade. Nos casos mais extremos, os episódios de sono podem durar até 20 horas. Entretanto, a duração média do sono noturno gira em torno de 9h e 30 minutos. Embora muitos indivíduos com hipersonolência sejam capazes de diminuir o tempo de sono nos dias úteis, ele aumenta substancialmente nos fins de semana e feriados (em até 3h). Além de muito difíceis, os despertares são acompanhados de episódios de inércia do sono em aproximadamente 40% dos casos. Na maioria dos casos, a hipersonolência manifesta-se plenamente no fim da adolescência ou no início da fase adulta, com idade média de início de 17 a 24 anos. Em média, o diagnóstico ocorre entre 10 e 15 anos depois do surgimento dos sintomas. Os casos pediátricos são raros. Para a maioria dos indivíduos, o curso é persistente e estável, a menos que o tratamento seja iniciado. O desenvolvimento de outros transtornos do sono (ex: transtorno do sono relacionado à respiração) poderá agravar o grau de sonolência. Embora a hiperatividade talvez seja um dos sinais de sonolência diurna que se apresentam em crianças, os cochilos voluntários aumentam com a idade. Esse fenômeno normal é distinto de hipersonolência. Marcadores Diagnósticos A polissonografia noturna demonstra um período de duração do sono de normal a prolongado, latência curta e continuidade normal a aumentada do sono. A distribuição do sono REM também é normal. Na maior parte das vezes, a eficiência do sono é superior a 90%. Alguns indivíduos apresentam quantidades aumentadas de sono com ondas lentas. O teste de latência múltipla do sono registra a tendência ao sono, normalmente indicada por valores médios de latência do sono inferiores a 8 minutos. Geralmente, no transtorno de hipersonolência, a latência média do sono é inferior a 10 minutos e, com frequência, a 8 minutos ou menos. Períodos de REM no início do sono (PREMIS; ocorrência de sono REM dentro de 20 minutos após o início do sono) podem estar presentes, mas ocorrem menos de duas vezes em 4 ou 5 oportunidades de tirar um cochilo. Comorbidade A hipersonolência pode ocorrer em associação com transtornos depressivos, transtornos bipolares (durante um episódio depressivo) e transtornos depressivos maiores com padrão sazonal. Síndrome de Kleine-Levin: Relativamente rara, consistindo em períodos recorrentes de sono prolongado (do qual os pacientes podem ser despertados) com períodos intercalados de sono normal e vigília alerta. Durante os episódios hipersônicos, períodos despertos costumam ser marcados por retração de contato social e retorno à cama na primeira oportunidade. É a hipersonia recorrente Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 mais reconhecida, apesar de ser incomum. Afeta sobretudo homens no início da adolescência; contudo, pode ocorrer posteriormente na vida e em mulheres. Com poucas exceções, o primeiro ataque surge entre 10 e 21 anos. Na forma clássica, os episódios recorrentes são associados com sonolência extrema (18-20h), alimentação voraz, hipersexualidade e desinibição. Os episódios costumam durar de dias a várias semanas e aparecem de 1 a 10 vezes por ano. Uma forma hipersonolenta monossomática pode ocorrer. A frequência do antígeno leucocitário humano (HLA) é aumentada em indivíduos com essa síndrome. Hipersonia relacionada à menstruação: Em algumas mulheres, episódios recorrentes de hipersonia estão relacionados ao ciclo menstrual, com episódios intermitentes de hipersonia no início (ou pouco antes) da menstruação. Os sintomas costumam durar por 1 semana, resolvendo-se com a menstruação. Fatores endócrinos provavelmente estão envolvidos. O tratamento com contraceptivos orais é efetivo, então se acredita que o transtorno seja secundário a um desequilíbrio hormonal. Hipersonia idiopática: Pode estar associada com períodos de sono muito longos, após os quais o indivíduo continua com sono. Também pode ocorrer sem períodos de sono longo. É um transtorno de sonolência excessiva em que os pacientes não apresentam os sintomas auxiliares relacionados com narcolepsia. Diferentemente da narcolepsia, o sono costuma ser bem preservado, e a eficiência permanece alta, mesmo em formas associadas com horários de sono muito prolongados (12h ou mais). Além do mais, o paciente adormece logo se recebe a oportunidade de cochilar no dia seguinte. Com frequência, há grande quantidade de sono com ondas lentas; contudo, o padrão de sono no EEG é essencialmente o mesmo que o encontrado em indivíduos sadios privados do sono. Diferentemente dos indivíduos privados de sono, o padrão de sono não se modifica até mesmo após várias noites de sono estendido. Como o nome indica, a etiologia não é conhecida; no entanto, presume-se causa no SNC. Há 3 categorias gerais desenvolvidas: - O subgrupo 1 inclui indivíduos que são positivos para HLA-Cw2, têm disfunções no sistema nervoso autônomo e outros familiares afetados. - O subgrupo 2 inclui pacientes com infecção pós-viral (ex: síndrome de Guillain-Barré [polineuropatia ascendente], mononucleose e pneumonia viral atípica). - Os pertencentes ao subgrupo 3 não são familiares nem são pós-virais (verdadeiramente idiopáticos). A idade de início costuma ser dos 15 aos 30 anos, e a hipersonia torna-se um problema vitalício. Além do sono noturno prolongado, não perturbado e não revigorante, a HI está associada com longos cochilos não revigorantes, dificuldade para despertar, embriaguez de sono e comportamentos automáticos com amnésia. Outros sintomas que sugerem disfunção do SNA são enxaquecas, desmaios, síncope, hipotensão ortostática e fenômenos do tipo Raynaud com mãos e pés gelados. Alguns pacientes com HI dormem menos de 10 horas por noite, têm dificuldade para despertar, acordam não revigorados e até confusos e podem tirar cochilos não intencionais e não revigorantes durante o dia. Síndrome do sono insuficiente induzida por comportamento: Surge da não observância do indivíduo aos horários de sono-vigília. Costuma ser subclínica e ocorre numa grande proporção da população. O indivíduo tende a não buscar ajuda médica, pois está ciente da causa da sonolência. No entanto, o sono insuficiente é um assassino insidioso, estando relacionado amuitos acidentes veiculares e industriais. Quando um indivíduo vai se privando cada vez mais de sono, em algum momento, sua dívida de sono terá de ser paga. A sonolência excessiva associada com sono insuficiente pode ser provocada por refeição pesada, ingestão de pequenas doses de álcool, ambiente quente e atividade sedentária. A síndrome é diagnosticada quando um indivíduo não reserva quantidade de tempo suficiente para dormir e, como resultado, sofre de sonolência ao longo do dia, fadiga, perda de concentração, prejuízo de memória, irritabilidade e problemas de humor. Frequentemente, a pessoa dorme de menos ou dorme demais, tira sonecas e aumenta os períodos de sono no fim de semana. Apesar de bebidas cafeinadas serem, em geral, autoadministradas, o tratamento adequado envolve o aumento da duração e da regularidade do sono. Estudos recentes indicam que transtornos metabólicos e resistência à insulina podem ser o resultado de sono insuficiente crônico. Hipersonia devida a condição clínica: Condições conhecidas incluem trauma encefálico, AVC, encefalite, Parkinson, condições inflamatórias, doenças genéticas e doenças neurodegenerativas. Hipersonia devida a droga ou substância: Causada por hipnóticos sedativos, anti-histamínicos sedativos, antiepilépticos, neurolépticos e apioides analgésicos. Também pode ser provocada por abstinência de estimulantes, cafeína ou nicotina. TRATAMENTO A hipersonia causada por sono insuficiente é tratada estendendo-se e regularizando-se o período de sono. S for resultado de condições clínicas ou idiopática, a sonolência costuma ser manejada farmacologicamente. Não há cura para essas condições, mas os sintomas são tratados com a substância promotora de vigília modafinil (primeira linha) ou psicoestimulantes tradicionais, como anfetaminas e seus derivados (se modafinil falhar). NARCOLEPSIA Critérios Diagnósticos DSM-5 A. Períodos recorrentes de necessidade irresistível de dormir, cair no sono ou cochilar em um mesmo dia, ocorrendo pelo menos 3 vezes por semana nos últimos 3 meses. B. Presença de pelo menos um entre os seguintes sintomas: 1. Episódio de cataplexia, definido como (a) ou (b), que ocorre pelo menos algumas vezes por mês: a. Em indivíduos com doença de longa duração, episódios breves (variando de segundos a minutos) de perda bilateral de tônus muscular, com manutenção da consciência, precipitados por risadas ou brincadeiras. Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 b. Em crianças ou indivíduos dentro de 6 meses a partir do início, episódios espontâneos de caretas ou abertura da mandíbula com projeção da língua ou hipotonia global, sem nenhum desencadeante emocional óbvio. 2. Deficiência de hipocretina, medida usando os valores de imunorreatividade da hipocretina-1 no líquido cerebrospinal (LCS) (inferior ou igual a um terço dos valores obtidos em testes feitos em indivíduos saudáveis usando o mesmo teste ou inferior ou igual a 110 pg/mL). Níveis baixos de hipocretina-1 no LCS não devem ser observados no contexto de inflamação, infecção ou lesão cerebral aguda. 3. Polissonografia do sono noturno demonstrando latência do sono REM inferior ou igual a 15 minutos ou teste de latência múltipla do sono demonstrando média de latência do sono inferior ou igual a 8 minutos e dois ou mais períodos de REM no início do sono. Determinar o subtipo: Narcolepsia sem cataplexia, porém com deficiência de hipocretina Narcolepsia com cataplexia, porém sem deficiência de hipocretina Ataxia cerebelar dominante autossômica, surdez e narcolepsia Narcolepsia autossômica dominante, obesidade e diabetes tipo 2 Narcolepsia secundária a outra condição médica: A narcolepsia-cataplexia afeta entre 0,02 e 0,04% da população em geral. Afeta ambos os sexos, com leve preponderância masculina. Em geral, o início ocorre em crianças e em adolescentes ou adultos jovens, porém raramente em adultos mais velhos. Acredita-se que haja dois picos de início, de 15 a 25 e de 30 a 35 anos. O início pode ser repentino ou progressivo (ao longo dos anos). A gravidade é maior nos casos de início abrupto em crianças e diminui com a idade ou com tratamento, de forma que os sintomas como cataplexia desaparecem ocasionalmente. A partir do momento em que o transtorno se manifesta, o curso é persistente e dura a vida toda. Em 90% dos casos, o primeiro sintoma é o de sonolência ou de sono prolongado, seguido de cataplexia. Sonolência, alucinações hipnagógicas, sonhos vívidos e transtorno comportamental do sono REM são sintomas iniciais. O sono excessivo evolui rapidamente para incapacidade de permanecer acordado durante o dia e de manter um sono reparador durante a noite, sem aumento evidente na necessidade de sono no período total de 24 horas. Com frequência, crianças jovens e adolescentes com narcolepsia desenvolvem problemas agressivos/comportamentais secundários à sonolência e/ou falta de sono durante a noite. A carga de trabalho e a pressão social aumentam no período de colégio/universidade, reduzindo o tempo de sono noturno disponível. Aparentemente, a gestação não altera os sintomas de forma consistente. Em geral, depois da aposentadoria, os indivíduos têm mais oportunidades de tirar um cochilo, diminuindo a necessidade de estimulantes. TRATAMENTO Para narcolepsia, fármacos de supressão do sono REM são usados para tratar a cataplexia. Como a cataplexia é, presumivelmente, uma intrusão dos fenômenos do sono REM no estado de vigília, o raciocínio é claro. Muitos relatos indicam que a imipramina e a protriptilina são bastante efetivas para reduzir ou eliminar a cataplexia. Os ISRSs ganharam popularidade por estar associados com menos efeitos colaterais do que os antidepressivos tricíclicos. Mais recentemente, o oxibato de sódio provou ser de extrema eficácia para reduzir a cataplexia, mesmo em casos refratários a outros tratamentos. Estudos também sugerem que ajude a melhorar o sono e alivie um pouco da sonolência associada à narcolepsia. Apesar das farmacoterapias serem os tratamentos de primeira escolha, a abordagem de tratamento geral deve incluir cochilos programados, ajuste de estilo de vida, aconselhamento psicológico, intervalos dos fármacos para reduzir a tolerância (se forem usados estimulantes) e monitoramento cuidadoso de uso de medicamentos além do prescrito, da saúde geral e do estado cardíaco. TRANSTORNO DO SONO-VIGÍLIA DO CICLO CIRCADIANO Critérios Diagnósticos DSM-5 A. Padrão persistente ou recorrente de interrupção do sono devido, principalmente, a alteração no sistema circadiano ou a desequilíbrio entre o ritmo circadiano endógeno e os horários de sono-vigília impostos pelos horários dos ambientes físico, social ou profissional. B. A interrupção do sono leva a sonolência excessiva ou insônia, ou ambas. C. A perturbação do sono causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional e em outras áreas importantes da vida do indivíduo. 307.45 (G47.21) Tipo fase do sono atrasada Baseia-se principalmente em histórias de atraso no horário principal de sono (em geral mais de 2h) em relação aos horários desejados dedormir e acordar, resultando em insônia e sonolência excessiva. Quando autorizados a estabelecer seus horários, os indivíduos exibem qualidade e duração do sono normais. Sintomas de insônia no início do sono, dificuldade para acordar pela manhã e sonolência excessiva nas primeiras horas do dia são proeminentes. A insônia psicofisiológica pode se desenvolver como resultado de comportamentos inadequados que prejudicam o sono e aumentam o despertar em razão de tentativas repetidas para conciliar o sono em um horário mais cedo. Indivíduos com fase do sono atrasada são mais alertas no fim da tarde e no início da noite, ficam acordados até tarde e se sentem mais cansados de manhã. Costumam ser chamadas de notívagas. A confirmação do diagnóstico inclui história completa e uso de um diário do sono ou actigrafia (durante pelo menos 7 dias). O período abrangido deve incluir fins de semana, quando os compromissos sociais e profissionais são menos rígidos, para assegurar que o indivíduo apresente um padrão consistente de sono-vigília atrasado. Biomarcadores como o início da melatonina salivar sob luz tênue devem ser obtidos somente nos casos em que o diagnóstico não for suficientemente claro. Especificar se história familiar de fase do sono atrasada. O tipo fase do sono atrasada pode se sobrepor a outro transtorno do sono-vigília do ritmo circadiano, tipo sono-vigília não de 24h. Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 307.45 (G47.22) Tipo fase do sono avançada Caracteriza-se por horários de sono-vigília que estão várias horas antes dos horários desejados ou convencionais. O diagnóstico baseia-se principalmente em história de antecipação no tempo do período de sono maior (em geral mais de 2h) em relação ao horário desejado de dormir e de acordar, com sintomas de insônia de manhã cedo e sonolência excessiva durante o dia. Quando é possível ajustar os próprios horários, os indivíduos apresentam qualidade e duração normal do sono de acordo com a idade. Indivíduos com fase do sono avançada ficam sonolentos no fim da tarde e querem ir deitar mais cedo e acordar mais cedo e se sentem mais alertas cedo de manhã. Especificar se história familiar de fase avançada do sono. 307.45 (G47.23) Tipo sono-vigília irregular Padrão de sono-vigília desorganizado temporariamente, de forma que o horário dos períodos de dormir e de acordar sejam variáveis ao longo de um período de 24 horas. Os períodos de sono e de vigília ao longo de 24 horas são fragmentados, embora a tendência seja a de que o período mais longo de sono ocorra entre 2 e 6 horas e dure, em geral, menos de 4 horas. Possivelmente ocorram histórias de isolamento ou de reclusão em associação que contribuem para os sintomas pela ausência de estímulos externos para ajudar a produzir um padrão normal. Com frequência, os indivíduos e os respectivos cuidadores relatam a ocorrência de cochilos ao longo do dia. Em geral, o tipo sono-vigília irregular está associado a distúrbios neurodegenerativos, como o transtorno neurocognitivo maior, e a muitos transtornos do neurodesenvolvimento em crianças. 307.45 (G47.24) Tipo sono-vigília não de 24 horas O diagnóstico baseia-se principalmente na história de sintomas de insônia ou de sonolência excessiva relacionada à sincronização anormal entre o ciclo claro-escuro de 24 horas e o ritmo circadiano endógeno. Geralmente, os indivíduos se apresentam com períodos de insônia, de sonolência excessiva ou ambos, que se alternam com períodos assintomáticos curtos. Como o período circadiano não está alinhado com o ambiente externo de 24 horas, os sintomas dependem do momento em que o indivíduo tenta dormir em relação ao ritmo circadiano de propensão para dormir. É mais comum entre indivíduos cegos ou com comprometimento visual que sofreram redução na percepção da luz. 307.45 (G47.26) Tipo trabalho em turnos O diagnóstico baseia-se principalmente na história de indivíduos que trabalham fora da janela diurna normal das 8 às 18 horas (particularmente à noite) em horários regulares. Os sintomas de sonolência excessiva no trabalho e de sono prejudicado em casa de forma persistente são proeminentes. Em geral, os sintomas desaparecem quando o indivíduo volta a trabalhar de forma rotineira durante o dia. Embora a etiologia seja ligeiramente diferente, pessoas que viajam com muita frequência e passam por vários fusos horários poderão sentir efeitos semelhantes aos de pessoas com o transtorno do sono tipo trabalho em turnos que trabalham em turnos rotativos (corresponderia ao tipo jetlag do ICSD-2). 307.45 (G47.20) Tipo não especificado Especificar se: Episódico: Pelo menos um mês, porém menos de três meses. Persistente: Os sintomas duram três meses ou mais. Recorrente: 2 ou mais episódios ocorrem no intervalo de um ano. TRATAMENTO A cronoterapia envolve retardar progressivamente a fase da pessoa até que o oscilador circadiano esteja sincronizado com os horários pretendidos. Quando os indivíduos são privados de pistas ambientais e vão dormir quando sentem sono, o “dia” típico dura de 25 a 26 horas. Isso sugere que adultos jovens e de meia-idade tenham propensão a atrasos de fase. Acredita-se que atrasar fases todas as noites em 2 a 3 horas seja mais fácil do que avançar fases, porque esse método se aproveita de uma tendência natural. Essa terapia pode interferir nas aulas ou no trabalho, por isso, nos últimos anos, a fototerapia superou a cronoterapia. As pesquisas indicam que expor um indivíduo a luzes brilhantes (acima de 10 mil lux; fototerapia) pode alterar o ritmo biológico endógeno. Com a exposição a luzes brilhantes no tempo certo, o relógio biológico pode ser interrompido e reiniciado. O uso experimental da melatonina para tratar o transtorno do ritmo circadiano em cegos, por exemplo, tipo sono-vigília não de 24h, obteve sucesso. Pesquisadores propõem que a secreção de melatonina aja como substrato biológico para o oscilador circadiano interno. Em circunstâncias normais, os níveis de melatonina começam a subir ao anoitecer e permanecem elevados até o amanhecer. A luz brilhante suprime a liberação dessa substância. O ramelteon é aprovado pela FDA para o tratamento de pacientes com insônia da fase inicial do sono, mas é usado off label para todo o espectro de transtornos do ritmo circadiano do sono. De interesse, o único medicamento aprovado para transtorno do sono tipo trabalho em turnos é o modafinil. TRANSTORNO DE DESPERTAR DO SONO NÃO REM Critérios Diagnósticos DSM-5 A. Episódios recorrentes de despertares incompletos, em geral ocorrendo durante o primeiro terço do episódio de sono principal, acompanhados de uma entre as seguintes alternativas: 1. Sonambulismo: Episódios repetidos de levantar-se da cama durante o sono e deambular. Durante o sonambulismo, o indivíduo se apresenta com o olhar fixo e o rosto vazio, praticamente não responde aos esforços de comunicação por parte de outras pessoas e pode ser acordado apenas com muita dificuldade. 2. Terrores no sono: Em geral, episódios recorrentes de despertares súbitos provocados por terror que iniciam com um grito de pânico.O medo é intenso, com sinais de estimulação autonômica como midríase, taquicardia, respiração rápida e sudorese durante cada episódio. Há relativa ausência de resposta aos esforços de outras pessoas para confortar o indivíduo durante os episódios. B. Há pouca ou nenhuma lembrança de imagens oníricas (ex: apenas uma cena visual). Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 C. Presença de amnésia em relação ao episódio. D. Os episódios causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. E. A perturbação não é atribuída aos efeitos fisiológicos de alguma substância (ex: abuso de drogas ou uso de algum medicamento). F. A coexistência de outros transtornos mentais e médicos não explica os episódios de sonambulismo ou de terrores no sono. Marcadores Diagnósticos Os transtornos de despertar do sono não REM surgem em qualquer estágio do sono não REM, embora mais comumente no estágio profundo (sono de ondas lentas). Muito provavelmente, surgem no primeiro terço da noite e não ocorrem com frequência nos cochilos diurnos. Durante o episódio, os polissonogramas podem estar obscurecidos com artefatos produzidos pelos movimentos. Geralmente, na ausência desses artefatos, o EEG mostra atividade com frequência teta ou alfa durante o episódio, indicando despertar parcial ou incompleto. A videopolissonografia pode ser utilizada para documentar episódios. Não há nenhuma característica polissonográfica que seja um marcador para o sonambulismo na ausência da captura real de um evento durante o registro. Como um grupo, indivíduos sonâmbulos demonstram instabilidade no sono REM profundo, porém a sobreposição em achados com pessoas que não são sonâmbulas é suficientemente grande para impedir o uso desse indicador na obtenção do diagnóstico. Diferentemente de despertares do sono REM associados a pesadelos, nos quais ocorre elevação na frequência cardíaca e na respiração antes do despertar, os despertares do sono não REM com terrores no sono começam abruptamente a partir do sono, sem mudanças autonômicas antecipatórias. Os despertares são associados com atividade autonômica acentuada, duplicando ou triplicando a frequência cardíaca. Embora não seja bem compreendida, aparentemente a fisiopatologia se caracteriza pela presença de instabilidade nos estágios mais profundos do sono não REM. À exceção da captura de algum evento durante os estudos formais do sono, não existem indicadores polissonográficos confiáveis da tendência de vivenciar terrores no sono. SONAMBULISMO A caminhada sonâmbula costuma ter seu início perto do fim do 1º ou 2º episódio de sono de ondas lentas. A privação do sono e a interrupção do sono de ondas lentas parecem exacerbar, ou até provocar, o sonambulismo em indivíduos suscetíveis. Episódios podem variar desde se sentar e tentar caminhar até conduzir uma sequência de ações semipropositadas. O sonâmbulo frequentemente consegue interagir com o ambiente (ex: evita tropeçar em objetos). Contudo, pode interagir com o ambiente de maneira inadequada, o que às vezes resulta em ferimentos (ex: sair por uma janela ou andar pela estrada). Há casos em que os sonâmbulos cometeram atos de violência. Um sonâmbulo é difícil de ser acordado. Quando acorda, costuma parecer confuso. É melhor tentar levá-los de volta para a cama gentilmente, em vez de tentar acordá-los agarrando, sacudindo ou gritando. Em seu estado de confusão, eles podem pensar que estão sendo atacados e agir com violência para se defender. Sonambulismo em adultos é raro, tem um padrão familiar e pode ocorrer como parassonia primária ou secundária de outro transtorno do sono. No entanto, é muito comum em crianças e tem seu pico entre as idades de 4 e 8 anos. Após a adolescência, costuma desaparecer espontaneamente. Episódios diários ou semanais de sonambulismo associados com ferimentos físicos do paciente são considerados graves. Existem formas “especializadas” de sonambulismo, em particular comportamento alimentar relacionado ao sono e sexsônia. - Alimentação relacionada ao sono: Episódios de ingestão de alimentos durante o sono com graus variados de amnésia. Os indivíduos podem encontrar evidências desses episódios na manhã seguinte, com pouca ou nenhuma memória de terem comido. - Sexsônia: No comportamento sexual relacionado ao sono, a pessoa se envolve em atividades sexuais (masturbação, carícias, relação sexual) durante o sono, sem consciência. TERRORES DO SONO Às vezes chamados de pavor nocturnus, íncubus ou terror noturno, tendo sido relatado um padrão familiar. O transtorno de terror do sono consiste em um despertar no primeiro terço da noite durante o sono profundo não REM (estágios 3 e 4). Caracterizado por um despertar repentino com medo intenso. Normalmente começa com um grito ou choro agudo e é acompanhado de manifestações comportamentais de intensa ansiedade beirando o pânico. Correlatos autônomos e comportamentais de medo marcam a experiência. Um indivíduo que sofre de terror do sono em geral se senta na cama, não responde a estímulos e, se acordado, fica confuso ou desorientado. Vocalizações podem ocorrer, mas costumam ser incoerentes. É comum amnésia nos episódios. Como no sonambulismo, costumam surgir no sono de ondas lentas. Febre e abstinência dos depressores do SNC potencializam os episódios de terror. Diferentemente dos pesadelos, em que uma sequência elaborada de sonhos se desdobra, os terrores noturnos podem ser desprovidos de imagens ou conter apenas fragmentos de imagens muito breves, mas assustadoramente vívidos, embora às vezes sejam estáticos. Assim como outras parassonias do sono de ondas lentas, a privação do sono pode provocar ou exacerbar terrores do sono. A psicopatologia é raramente associada com os terrores do sono em crianças; porém, uma história de experiências traumáticas ou de problemas psiquiátricos com frequência é comórbida. A gravidade varia de menos de uma vez por mês a ocorrências quase diárias (com ferimento do paciente ou de outras pessoas). TRANSTORNO DO PESADELO Critérios Diagnósticos DSM-5 307.47 (F51.5) A. Ocorrências repetidas de sonhos prolongados, extremamente disfóricos e bem lembrados que, em geral, envolvem esforços para evitar ameaças à sobrevivência, à segurança ou à integridade física e que tipicamente ocorrem na segunda metade do episódio principal do sono. Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 B. Ao despertar de sonhos disfóricos, o indivíduo torna-se rapidamente orientado e alerta. C. A perturbação do sono causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. Os sintomas de pesadelo não são atribuíveis aos efeitos fisiológicos de alguma substância. E. A coexistência de transtornos médicos e mentais não explica adequadamente a queixa predominante de sonhos disfóricos. Especificar se: Durante o início do sono Especificar se: Com transtorno não relacionado ao sono associado, incluindotranstornos por uso de substâncias. Com outra condição médica associada Com outro transtorno do sono associado Especificar se: Agudo: Igual ou inferior a um mês. Subagudo: Superior a um mês e inferior a seis meses. Persistente: Igual ou superior a seis meses. Especificar a gravidade atual: Leve: Menos de um episódio por semana em média. Moderada: Um ou mais episódios por semana, porém menos do que todas as noites. Grave: Episódios todas as noites. Geralmente, pesadelos são sequências oníricas longas, elaboradas e semelhantes a uma narrativa que parece real e cria ansiedade, medo ou outras emoções disfóricas. O conteúdo costuma enfocar tentativas de evitar ou de enfrentar o perigo iminente, mas pode envolver temas que evocam outras emoções negativas. Os pesadelos que ocorrem após experiências traumáticas podem replicar situações de ameaças (“pesadelos replicativos”), embora a maioria não o faça. Ao despertar, são bem lembrados e podem ser descritos com detalhes. Eles ocorrem quase que exclusivamente no sono REM e podem, dessa forma, ocorrer ao longo do sono, mas são mais prováveis na segunda metade do episódio principal do sono, quando os sonhos são mais longos e mais intensos. Fatores que aumentam a intensidade REM logo no início da noite, como fragmentação ou privação do sono, jet lag e medicamentos que interferem no sono REM, podem facilitar a ocorrência de pesadelos no início da noite, incluindo no início do sono. Em geral, os pesadelos terminam com o despertar e o retorno rápido ao estado pleno de alerta. No entanto, as emoções disfóricas persistem até a vigília e contribuem para a dificuldade de retornar ao sono e para o desconforto durante o dia. Quando os pesadelos ocorrem durante os períodos de início do sono REM (hipnagógicos), a emoção disfórica é frequentemente acompanhada por sensação de estar acordado e ser incapaz de se movimentar voluntariamente (paralisia do sono isolada). Estimulação autonômica leve, incluindo sudorese, taquicardia e taquipneia, pode caracterizar os pesadelos. Movimentos do corpo e vocalizações não são características por causa da perda de tônus dos músculos esqueléticos relacionada ao sono REM, embora possivelmente esses comportamentos ocorram em situações de estresse emocional ou de fragmentação do sono e no TEPT. Quando há conversa ou manifestação de emoção, o evento costuma ser rápido, e termina o pesadelo. OBS: Indivíduos com pesadelos frequentes estão sob risco substancialmente maior de ideação suicida e de tentativas de suicídio, mesmo quando gênero e doença mental são considerados. Comuns em crianças dos 3 aos 6 anos (estimativas variam de 10 a 50%), pesadelos são raros em adultos (1% ou menos). Pesadelos frequentes e angustiantes às vezes são responsáveis pela insônia porque o indivíduo tem medo de dormir. Em termos freudianos, o pesadelo é um exemplo do fracasso do processo de sonho que desarma o conteúdo emocional do sonho ao disfarçá-lo simbolicamente, preservando, assim, o sono. A maioria dos pacientes afligidos por pesadelos está livre de condições psiquiátricas. Ter limites frágeis torna esses indivíduos mais vulneráveis; além do mais, eles podem apresentar risco de esquizofrenia. Diversos medicamentos são conhecidos por poderem provocar pesadelos, L-DOPA e bloqueadores β-adrenérgicos, assim como abstinência de medicamentos de supressão de REM. Marcadores Diagnósticos Os estudos polissonográficos revelam despertares abruptos do sono REM, em geral durante a segunda metade da noite, antes de registrarem algum pesadelo. As frequências cardíaca/respiratória e dos movimentos oculares podem acelerar ou aumentar em variabilidade antes do despertar. Pesadelos depois de eventos traumáticos podem também surgir durante o sono não REM, particularmente no estágio 2. O sono típico de indivíduos com pesadelos caracteriza-se por leves alterações (ex: eficiência reduzida, sono com ondas menos lentas, mais despertares), com movimentos periódicos mais frequentes das pernas durante o sono e ativação relativa do sistema nervoso simpático depois de privação do sono REM. Comorbidade Pesadelos podem ser comórbidos com várias condições médicas, como doença cardíaca coronariana, câncer, parkinsonismo e dor, podendo, também, acompanhar tratamentos médicos (hemodiálise ou descontinuação no uso de medicamentos ou no abuso de substâncias). Com frequência, são comórbidos a outros transtornos mentais, incluindo TEPT; transtorno de insônia; esquizofrenia; psicose; transtornos do humor, de ansiedade, de adaptação e da personalidade; e pesar nos momentos de luto. TRATAMENTO Tratamento com técnicas comportamentais pode ser útil. Higiene universal do sono, terapia de controle de estímulo, terapia de sonhos lúcidos e terapia cognitiva também podem melhorar o sono e reduzir pesadelos. Em pacientes com TEPT relacionado a pesadelos, a nefazodona (antidepressivo atípico) também aumenta os benefícios terapêuticos. Os benzodiazepínicos também podem Distúrbios Psiquiátricos e Comportamentais Maysa Araújo Gomes Ferraz FPS MED 14 ser úteis. Evidências do uso de prazosina, um antagonista do receptor do SNC α-1, no tratamento de pesadelos relacionados a transtorno de estresse pós-traumático estão crescendo. A prazosina aumentou significativamente o tempo total de sono e o tempo de sono REM e reduziu de forma relevante pesadelos relacionados a trauma e despertares angustiados.
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