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Resumo DIP: Síndrome Febril Indiferenciada e Exantemática ABORDAGEM DA SÍNDROME FEBRIL INDIFERENCIADA E EXANTEMÁTICA EM ÁREA TROPICAL Apresentação de casos reais com o objetivo de estabelecer uma sistemática sobre como investigar uma síndrome febril, as suas hipóteses diagnósticas, as principais perguntas a serem feitas, os principais exames a serem solicitados e, por fim, da melhor conduta a ser tomada e fatores relacionados à vigilância epidemiológica. Parte 1 – caso mais simples e comum. Síndrome febril aguda (1 dia); - Lembrar que síndrome é um conjunto de sinais e sintomas, e não apenas febre isoladamente. Cefaleia intensa, mialgia, artralgia; Procedente da zona norte de Manaus, área peri-urbana. Investigação: - Não houve vômitos, somente os sintomas citados acima; - Febre de caráter intermitente; Febre aferida variando de 38° a 40°C; Febre de início súbito. - Paciente desconhece episódio pregresso similar; - Não realizou viagem a áreas endêmicas; - Não utilizou medicação para febre, apenas banho; - Não teve contato com água parada, local de alagamento, nada significativo; - Nenhum contactante próximo com os mesmos sintomas ou sintomas parecidos; Apenas algumas pessoas gripadas, próximo a sua residência, porém nada com muita importância ao caso. - Desconhece seu histórico vacinal; - Reside em casa de alvenaria; - Cefaleia holocraniana; - Nega diarreia; - Idade: 32 anos; - Não possui ocupação fixa, realiza serviços de pedreiro, motoboy, capina jardim; - Não possui horário fixo para trabalhar, realiza serviços diurnos e noturnos; - Já teve mais de um episódio malárico; - Provavelmente já teve dengue; - Não possui parceira fixa, é heterossexual e não utiliza preservativo; - Nunca realizou teste anti-HIV; - Paciente hígido previamente, sem episódios de internação recente, já teve outras doenças febris, mas não sabe precisar tempo. Talvez já tenha tido um passado de doença ictérica, mas também não sabe informar corretamente; - Paciente não possui comorbidades, doença crônico-degenerativa, nada significativo relacionado a patologias prévias. - Não faz uso de medicações; - Não possui alergias significativas; - Exame físico normal; - Estado geral bom. Foi investigado deslocamento, história vacinal, contato com outras pessoas doentes, outras condições de exposição (água, pessoas, histórico de malária, dengue), forma de trabalho (de que maneira se expõe). Há mais um fator importante de ser sempre investigado, apesar da idade de 32 anos: investigar comorbidades. No contexto de uma doença infecciosa, as comorbidades podem descompensar e trazer mais gravidade ao quadro, então deve fazer parte da investigação inicial. Resumo do caso: 24 horas de doença febril aguda, estado geral bom, exame físico normal, não possui comorbidades, não apresenta sinais de alerta ou gravidade. A ausência de sinais de gravidade pode ser confirmada no exame físico. 5 passos importantes à investigação: 1. Tempo de evolução; 2. Estado geral; 3. Exame físico; 4. Comorbidades; 5. Sinais de gravidade. Lembrar que, em uma síndrome febril aguda com cefaleia intensa, deve-se pensar em meningite, confirmando ao exame físico se há rigidez de nuca, sinais de Kernig, Laségue e Brudzinski positivos, alteração do nível sensorial. Os exames a serem pedidos dependem do local em que o paciente está sendo atendido. O paciente foi atendido no PA da FMT. Exames: - Não há indicação clínica para exames complementares nesse momento. Paciente sem sinais de alarme ou gravidade, com apenas 24 horas de evolução, quadro semelhante a somente uma viremia, não há indicação para exames laboratoriais como hemograma, bioquímica. Exceções para essa regra são: extremos de idade, gestantes, comorbidades (doença crônica), imunossupressão, estado geral comprometido. Um hemograma, nesse momento, provavelmente seria inespecífico, independente da doença que o paciente possua, excetuando-se uma sepse grave, doença meningocócica. Então nessas 24 horas não valeria a pena fazer qualquer exame, pode, até mesmo, complicar a interpretação do quadro. - O único exame que vale a pena ser pedido, nesse momento, é a gota espessa, a qual foi feita no paciente. Resolução do caso: Diagnóstico clínico: SÍNDROME FEBRIL AGUDA INDIFERENCIADA. Diagnóstico laboratorial: MALÁRIA VIVAX (++). Desfecho: ALTA APÓS 14 DIAS DE SEGUIMENTO AMBULATORIAL. o Conduta ambulatorial com alta pós o período de tratamento. O ideal é explicar ao paciente que, nesse momento, não há sinais de gravidade, não há sinais de alarme, que ele pode ir para casa com sintomático e hidratação, fazer repouso, se necessário/possível, e com 48 a 72 horas, se mais algum sintoma surgir, retornar para avaliação. Na maioria dos casos, o que se espera é que, em uma infecção viral, o quadro seja autolimitado, então entre 3 e 5 dias esse quadro deve evoluir para cura, independente do que seja feito. No caso de uma infecção malárica, caso o primeiro exame seja negativo, nos próximos dias a paresitemia irá aumentar, a febre se intensificará, pode entrar na cronologia típica da febre malárica (que consta na literatura, terçã, quartã etc.). Mas, particularmente na primeira semana de doença, não possui cronologia, pois a explosão das hemácias e dos hepatócitos se dá a qualquer hora, os plasmódios só começam a sincronizar a partir da primeira semana, então o quadro não tem melhora. No caso de uma arbovirose grave, dengue grave, o paciente irá defervescer e, com a defervescência, os sinais de alerta irão aparecer. No caso de uma gripe, essa febre pode se intensificar nos primeiros dias, os sintomas respiratórios irão aparecer, e o quadro fica mais fácil de ser identificado. No caso de uma pneumonia, em algum momento o sintoma respiratório se fará presente. É essencial a conversa durante a consulta, o exame físico e a orientação ao paciente na alta. Parte 2: Síndrome febril aguda (14 dias); Mialgia, calafrios, cefaleia, artralgia; Estado geral ruim, astenia, hiporexia; Procedente de Maués há 20 dias (barco). Investigação: - Febre diária há 14 dias, mais de uma vez ao dia; Intermitente, vários episódios por dia (2 a 3); Febre não aferida, mas muito alta. - Estado geral ruim – toxemiado; - Idade: 26 anos; - Sem comorbidades; - Hepatoesplenomegalia discreta; - Não possui icterícia; - Hipocorado; - Sem manifestação hemorrágica; - Sem adenopatia; - Não está dispneico nem taquicárdico; - Profissão desconhecida; - Adoeceu depois que chegou em Manaus; - Não tem conhecimento se tomou água contaminada (tomou a água que tinha no barco durante a viagem); - Desconhece contato com roedores; - Ausculta respiratória e cardíaca normal; - Desconhece seu histórico vacinal; - Não frequentou mata fechada; - Nunca teve quadro parecido (em relação ao tempo), mas já teve várias sintomatologias parecidas em sua vida; - Já teve malária; - Não tem náusea, vômitos; - Nunca fez anti-HIV; - Parceira fixa há 12 anos; - Urina um pouco escura (cor de guaraná), sem outras queixas urinárias; - Sinais vitais normais. - É importante questionar se o paciente tomou alguma medicação nesse período, pois ele pode ter tomado algum antimicrobiano que interferisse na evolução do quadro. Esse paciente não tomou nada. Resumo do caso: 14 dias de doença febril (quadro febril prolongado), estado geral ruim, não possui sinal de alerta (hepatomegalia por si só não é sinal de alerta, apenas se for dolorosa), não possui comorbidades, exame físico alterado (hepatoesplenomegalia) e talvez algum grau de icterícia, em vista da urina escurecida. Exemplos do que seriam sinais de alerta: Torpor, alteração do nível de consciência, agitação psicomotora (nada disso o paciente tem). Esse paciente deve ser atendido no nível de atenção emergência, em vista do seu estado geral comprometido. Esse pacientenão está grave nesse momento, mas não possui tanto tempo parar esperar uma avaliação a nível ambulatorial, pode vir a ficar grave. Hipóteses diagnósticas: - Malária; - Leptospirose; - Bacteremia no geral; - Febre tifoide; - Doença de Chagas aguda; - Meningite e sepse não são boas hipóteses, pois lembrar que, em uma infecção bacteriana com 14 dias de evolução, deve-se pensar em bactérias que não sejam tão agressivas, nessas doenças mais graves o paciente já teria ido a óbito. Deve-se pensar em uma doença insidiosa. - Hepatite aguda não é uma boa hipótese em vista da febre alta e da ausência de icterícia, somente se for um hepatopata crônico descompensando com uma infecção bacteriana que justifique os 14 dias de febre; - Arboviroses não entram nas hipóteses em vista do padrão da febre, nenhuma cursa com 14 dias de febre, elas duram no máximo 1 semana. - O único vírus que pode fazer febre prolongada é o da Mononucleose infecciosa, pelo Epstein bar. Pode ser citomegalovírus, ou uma fase aguda de toxoplasmose (protozoário). Mas mononucleose infecciosa talvez seja a única doença viral que cabe ser investigada nesse caso. De resto, esquecer vírus. - Infecção respiratória, como pneumonia, poderia se arrastar por mais tempo, mas o paciente precisaria apresentar sintomas respiratórios. - O paciente pode ter alguma lesão, mas nada grave, que não tenha dado importância, e que estivesse fazendo uma bacteremia transitória, mantendo esse quadro. - Endocardite bacteriana – entra no diagnóstico diferencial de doença febril persistente, mas nesse caso o paciente apresentava a ausculta normal. - Não se pensa em febre reumática, pois não há edema, artrite migratória, é somente a dor. - Calazar – Leishmaniose visceral - justificando a hepatoesplenomegalia. - Tuberculose, formas não pulmonares. - Várias dessas doenças entram no diagnóstico diferenciais de febres de origem obscura/indeterminada, e também doenças não infecciosas como linfoma, leucemia, neoplasias de outra natureza. *As doenças em negrito foram as que tiveram maior relevância ao caso. Exames: - Gota espessa: Pesquisa de Plasmódio: negativa (02 amostras). - Hemograma: WBC: 4600 – 80% NE – sugere infecção bacteriana; Hb: 11,2; ↓ Hto: 34%; ↓ PLT: 97000. ↓ *Hemograma: Plaqueta baixa, série vermelha baixa, leucócitos tendendo à diminuição, com percentual importante de neutrófilos → sugere infecção bacteriana. *Bioquímica: Transaminases aumentadas, mas não tão elevadas como em uma hepatite aguda; enzimas canaliculares também aumentadas, mostrando provavelmente inflamação hepática com compressão dos canalículos; bilirrubina total pouco acima do limite superior, as custas de bilirrubina direta e creatinina aumentada, que não necessariamente indica lesão renal, mas pode ser uma lesão pré-renal (paciente com 14 dias de febre, pode estar desidratado). - USG abdominal: hepatoesplenomegalia leve; *Descartar uma doença febril importante: abscesso hepático – febre prolongada, hepatomegalia, colestase. Com relação à etiologia, abscesso hepático bacteriano (se dá mais em idosos acima de 50 anos) e amebiano (ler a respeito! Doença importante na região). O valor de leucócitos provavelmente seria maior caso o abscesso fosse bacteriano ou misto (ameba e bactéria), mas o abscesso hepático amebiano não necessariamente cursa com leucocitose. - Hemocultura: Salmonella typhi. *Caso se pense em febre tifoide com duas semanas de evolução, deve-se pedir cultura das fezes (coprocultura). A partir da primeira semana de febre, a coprocultura é o método mais indicado para diagnóstico de Salmonella typhi, ou a mielocultura, porém conta-se o risco benefício (internar o paciente para realização de aspirado de medula). *A hemocultura, nesse caso, serviria para investigar salmonela, micobactéria, e bactérias aeróbias comuns, como stafilo. *Era necessário fazer o antibiograma? Nos centros de referência, geralmente esse exame já vem atrelado à cultura. Em outros serviços, é necessário pedir. A resistência das salmonelas não é algo expressivo, não é um problema de saúde pública, apenas seria se o paciente tivesse um histórico de uso de antibióticos. Mas não seria errado pedir para o caso. - Obs.: não seria necessário um EAS, pois apesar da urina escura, o paciente não possui queixa urinária. A urina pode estar escura por desidratação. - O diagnóstico específico de leptospirose é a sorologia – Elisa para leptospira – não foi feito. A salmonela é um bastonete Gram-negativo, seu tratamento pode ser feito com cefalosporinas de 2ª geração em diante, ou quinolona (mesmo princípio da infecção urinária). O paciente deve ser tratado internado, com hidratação (reverter a possível lesão pré-renal) e antibiótico. Resolução do caso: Diagnóstico clínico: SÍNDROME FEBRIL AGUDA INDIFERENCIADA. Diagnóstico laboratorial: FEBRE TIFOIDE. Desfecho: ALTA APÓS 7 DIAS DE INTERNAÇÃO E 14 DIAS DE SEGUIMENTO AMBULATORIAL. o O paciente foi hospitalizado com o diagnóstico de febre tifoide, ficou internado por 7 dias, em uso de Ceftriaxona no ambiente hospitalar, e teve seguimento ambulatorial por mais 14 dias. o Iniciou-se tratamento empírico para infecção bacteriana de trato digestivo, uma vez que a hemocultura não sai na hora. Lembrar que na febre tifoide é importante se ter a coprocultura de controle. Às vezes trata-se o paciente, o mesmo se recupera do quadro, mas a bactéria fica viável na vesícula biliar, e o paciente vai eliminado a salmonela nas fezes. Dependendo do seu meio de trabalho ou seus hábitos de higiene, ele pode transmitir essa bactéria para outras pessoas (lembrar da Mary typhi). - Bioquímica: AST: 234; ↑ ALT: 167; ↑ FAL: 350; ↑ FFT: 240; ↑ Bb totais: 1,5; ↑ Creatinina: 1,8. ↑ Um importante ponto na história epidemiológica desse paciente é a história do barco. Ficam muitos indivíduos reclusos ao mesmo ambiente, utilizando o mesmo banheiro, a água não necessariamente é potável, a comida é preparada com essa mesma água, então a chance de contaminação por doenças de veiculação por alimentos é muito grande. Poderia ser uma intoxicação alimentar por Shigella, mas isso seria um quadro mais agudo com diarreia e vômito, que não é um caso. O paciente tem uma doença mais insidiosa, sem sintomas digestivos, mas sendo espoliado com bacteremia. Pelo quadro clínico, exame laboratorial, exame de imagem (exclui abscesso, calazar), prende-se à hipótese de infecção bacteriana, dentro dessas infecções tem-se a febre tifoide. Quando se pede a gota espessa para o diagnóstico de malária, é o mesmo exame específico para Chagas. Parte 3: Síndrome febril aguda (07 dias); Mialgia, calafrios, cefaleia, artralgia, astenia; Procedente do Vieiralves; sem deslocamentos; Diabetes insulino-dependente. Investigação: - Idade: 82 anos; - Febre aferida: 38 a 39°C; - Artralgia sem padrão específico, problema articular prévio em joelhos e tornozelos, exacerbou com o quadro; - Não teve perda de peso; - Sem sintomas respiratórios; - Sem sintomas urinários; - Sem porta de entrada evidente; - Não fez uso de medicação, somente a insulina e antitérmico; - Sem comorbidades além do diabetes; - À ausculta: MVF pouco diminuído bilateralmente, mas já apresentava dificuldade de expansão torácica; - Netos apresentando espirros; - Não é tabagista; - Etilista social; - Pai e mãe com histórico de neoplasia – próstata e mama, respectivamente; - Estado geral regular; - Urina normal; - Cefaleia e calafrios acompanham a febre (passa a febre, cessam esses sintomas); - Sem lesões de pele; - Nunca teve malária, já teve dengue; - Toma vacina contra Influenza todos os anos, é vacinada contra febre amarela; Resumo do caso: Uma semana de evolução (passando do limite das doenças virais e entrando no período das doenças bacterianas), estado geral regular, exame físico mal feito, presença de comorbidade,sinal de alerta não possui. Hipóteses diagnósticas: o Pneumonia; o Neoplasia; o Tuberculose; o Infecção urinária *Infecção em idoso: investigar sistema respiratório e trato urinário. Exames: - Raio-x de tórax; *Infiltração em base, área de opacidade em ápice direito, borda cardíaca imprecisa (infiltração parahilar), sugerindo broncopneumonia. - Pesquisa de Plasmódio: negativa (02 amostras); - Hemograma: WBC: 6000 – 60% NE; Hb: 13; Hto: 39%; PLT: 360.000. *Hematócrito de 39% não é um padrão regular para mulheres, particularmente aquelas que ainda menstruam. Não é o caso da paciente, que é idosa. Caso fosse baixo, poderia se suspeitar de algum sangramento oculto, como nas fezes, na vigência de um câncer de intestino, por exemplo, ou algum fator de consumo como um linfoma, leucemia. Não se pensaria em hemoconcentração, na vigência de alguma arbovirose, em vista do valor de plaquetas que está normal. - Bioquímica: Glicose: 350; Creatinina: 2,8. *Doença de base descompensada e lesão renal, que talvez não seja aguda. Pode ser uma lesão renal prévia por diabetes mal controlado. - USG abdominal: sem anormalidades; *A indicação foi rastreio: síndrome paraneoplásica faz quadro febril, pode simular quadro infeccioso. - Hemocultura/urinocultura: negativa. Tratamento de PAC no paciente idoso: o Hospitalizar – extremo de idade, doença de base descompensada; o Cefalosporina de 2ª ou 3ª geração, quinolona respiratória, macrolídeo para os atípicos (azitromicina, claritromicina, quinolona respiratória). Ou seja: pode-se usar somente a quinolona respiratória, ou fazer a associação de ceftriaxona com claritromicina. *Quanto à lesão renal, não é necessário ajustar a dose de nenhum desses antimicrobianos. A paciente precisa ser hidratada, corrigida a glicemia e avaliar se há perda de albumina na urina (traduziria uma lesão renal mais antiga). Agentes etiológicos prováveis: Streptococcus pneumoniae (gram +); Haemophilus influenzae (gram - ) – assume uma importância relativa em vista da idade; Moraxella catarrhalis (gram - ). Acrescenta-se os atípicos em vista da necessidade de hospitalização. Resolução do caso: Diagnóstico clínico: SÍNDROME FEBRIL AGUDA INDIFERENCIADA. Diagnóstico laboratorial: PNEUMONIA ADQUIRIDA NA COMUNIDADE. Desfecho: ALTA APÓS 7 DIAS DE INTERNAÇÃO E 14 DIAS DE SEGUIMENTO AMBULATORIAL. Parte 4: Síndrome febril aguda (3 dias); Febre baixa, mialgia, artralgia; Estado geral bom; Procedente de Manaus (D. Pedro). Investigação: - Idade: 14 anos; - Exantema apareceu no 3º dia; Difuso, pruriginoso. Iniciou sentido crânio-caudal. Apareceu subitamente. - Febre aferida: 38,5 a 39,5°; Intermitente. - Ninguém próximo com febre; - Artralgia é importante durante a febre; A partir do exantema, sente como se estivesse inchado, tem dificuldade de mover as articulações. - Vacinas da infância atualizadas; - Não tem hiperemia conjuntival; - Não fez viagem recente nos últimos 20 a 30 dias; - Exame físico somente o relatado, além de edema e dificuldade de mover as articulações; - Tomou medicação para a febre; - Não sabe se já teve dengue; - Não possui rigidez de nuca; - Sem comorbidades; - Edema articular; Resumo do caso: Síndrome febril exantemática com 3 dias de evolução, estado geral bom, exame físico com exantema e queixa articular, sem comorbidades, sinal de alerta ausente. *Deve-se ter certeza se o exantema é somente exantema mesmo – vitropressão (pega-se lâmina, pressiona na área do exantema, o normal é ficar branco na área. Se houve alguma petéquia, não é somente exantema, mas há também extravasamento de sangue. Deve ser feito em várias áreas do corpo. O fenômeno hemorrágico às vezes começa a aparecer nas áreas de atrito – mulher: alça do sutiã, homem: cintura, criança: extremidade ou área de grande pressão como periorbital, caso a criança esteja vomitando). *O exantema é causado por vasodilatação dos capilares mais superficiais da derme, possui diversas causas. Não é por hemorragia, o endotélio está preservado, não há extravasamento de sangue, apenas vasodilatação. Hipóteses diagnósticas: o Arboviroses: Chikungunya (principalmente pela artralgia), dengue, zika. A menos provável é zika, devido ao padrão da febre. o Parvovírus; o Sarampo; o Malária (tomar cuidado ao descartar! O paciente pode ter malária, tomar antitérmico, sofrer quadro alérgico e apresentar exantema). Exames: - Pesquisa de Plasmódio: negativa. - Hemograma: WBC: 6000 – 50%NE; Hb: 12,2; Hto: 37%; PLT: 197.000 - Com 3 dias, pode ser pedido isolamento viral ou PCR para dengue, zika ou chukungunya. Ou pode-se pedir para o paciente voltar após 7 dias e fazer as sorologias, menos para zika. *Qual foi a indicação do hemograma? O estado geral era bom, não havia sinal de alerta nesse momento, mas a chance de ser arbovirose é alta. Fez-se o exame para ter uma referência, apesar de não se saber o valor normal de hematócrito do paciente. Se em 24/48h o paciente retornar com piora do quadro, tem-se a referência para comparar os resultados dos exames. Essa poderia ser uma justificativa, mas é inviável que se faça em todos os pacientes, principalmente em situação de epidemia. Possivelmente tratou-se o exantema como um sinal de gravidade, o que é um erro muito comum no manejo de arboviroses, por achar que exantema é sinônimo de hemorragia. O exantema não é um sinal de gravidade! É possível haver paciente sem exantema, mas com estado muito grave. Conduta: Sintomáticos (antitérmico – dipirona ou paracetamol, nunca AAS -, hidratação e anti- histamínico – algum que não dê sono/sede o paciente, para não perder critério de gravidade). De preferência não fazer intramuscular, pelo risco de hematoma caso o paciente tenha plaquetopenia. Doença exantemática: evitar medicação IM, somente se for de extrema necessidade! *As arboviroses, em geral, fazem dor muito intensa; o paciente tende a repetir a medicação mais do que o médico prescreve, e a dose aumenta, por isso evita-se o paracetamol (dose tóxica >4g), risco de hepatotoxicidade com um vírus que já pode agredir o fígado por si só. Dengue é um flavivirus, Chikungunya é um flavivirus, assim como o vírus da febre amarela e o vírus da hepatite C. Retorno caso piorar, ainda que não piore, retorno recomendado com 48/72h. O frio ajuda na artralgia, se não controlar bem com o antitérmico pode-se fazer ibuprofeno. A artralgia importante é incapacitante, no adulto pode-se fazer 1g de dipirona combinada, ou não, com ibuprofeno (tem efeito anti-inflamatório, mas é menos agressor da mucosa gástrica); Resolução do caso: Diagnóstico clínico: SÍNDROME FEBRIL EXANTEMÁTICA AGUDA. Diagnóstico laboratorial: DENGUE SEM COMPLICAÇÕES – confirmado pela sorologia. Desfecho: ALTA APÓS 7 DIAS DE SEGUIMENTO AMBULATORIAL. Alguns critérios foram estabelecidos depois que surgiu a epidemia de Chikungunya, mas vale para todas as doenças. Por isso que se tem abordado a estratégia da abordagem sindrômica, uma vez que é difícil, no primeiro momento, apostar em que doença se está tratando. Pode-se ter uma abordagem mais ampla, que resolverá a grande maioria dos casos. Parte 5: Síndrome febril aguda (3 dias); Cefaleia intensa, mialgia, artralgia; Gestação de 32 semanas; Procedente da zona centro-sul; idas ao Tarumã. Investigação: - Malária é uma hipótese diagnóstica; - Infecções em gestante: investigar trato urinário primariamente, rastreio de infecção por zika, infecção aguda por toxoplasma. - Não apresenta sintomas urinários; *Infecção do trato baixo, em geral, cursa sem febre. Quando há febre, deve-se pensar em infecção do trato alto. - Pré-natal sendo feito; - Não possui comorbidades; - Sem sinais de alarme; - Cefaleia intensa: investigar comprometimento neurológico, sinal de irritação meníngea,alteração do nível de consciência, cursa com o período da febre; - Vacinas atualizadas. - Questionar infecções urinárias prévias e se já houve tratamento recente (com que medicação) Resumo do caso: doença febril aguda com 3 dias de evolução, estado geral bom, exame físico sem alterações significativas, gestação entra no grupo das comorbidades, não tem sinal de gravidade. Exames: - Pesquisa de plasmódio: negativa (2 amostras); *Paciente tem história de descolamento para área de transmissão de malária, 3 dias de doença – limite entre excluir ou repetir exame de malária. Talvez ainda não se tenha condições de descartar malária, principalmente com o hematócrito baixo. - Hemograma: WBC: 8500 – 80%NE; neutrofilia. Hb: 11,2; Hto: 34%; - aceitável. PLT: 247.000; *Hemograma sem característica de arbovirose. A zika não altera hemograma. - EAS: 25 piócitos/campo; nitrito + (bactérias gram - degradando amônia no trato urinário); - Urocultura: Proteus sp. (>100.000 UFC/mL). - Hemocultura. Paciente com boas condições sociais e intelectuais pode-se prescrever antimicrobiano, hidratação e orientações com tratamento em casa. Paciente que possivelmente não fará as medicações nos horários adequados: melhor internar. A paciente possui uma piúria significativa, com febre (sintoma de infecção bacteriana sistêmica), a falha no antimicrobiano denota risco à mãe e ao bebê, além de piora rápida. Opções para tratamento parenteral, no caso de internação: ceftriaxona. Opções para tratamento oral: nitrofurantoína (cobre Proteus), sulfa, fosfomicina trometamol (se for alta não fazer dose única – mínimo dois dias via oral). o A nitrofurantoína não deve ser usada para ITU alta; hoje em dia é usada quase que exclusivamente para profilaxia de ITU de repetição. o Opções gestante no caso de ITU alta: cefalosporina de 2ª (cefaclor), fosfomicina com trometamol, internar e fazer medicação parenteral, ou intramuscular (a gestante vai todos os dias tomar a injeção). Infecção de repetição por Proteus: pensar em resistência, cálculo. Resolução do caso: Diagnóstico clínico: SÍNDROME FEBRIL AGUDA INDIFERENCIADA. Diagnóstico laboratorial: INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO; Desfecho: ALTA APÓS 10 DIAS DE SEGUIMENTO AMBULATORIAL E TRATAMENTO COM AMOXACILINA (07 DIAS). o Seria mais seguro se fosse amoxi+clavulanato. CRITÉRIOS DE OBSERVAÇÃO Critérios de internação/observação/gravidade. Servem para as doenças infecciosas em geral. Dor abdominal intensa e persistente; Vômitos numerosos; Irritabilidade, sonolência ou ambos; Manifestações hemorrágicas, independentemente da contagem de plaquetas; Hemoconcentração, ascite ou derrame torácico; o Derrame cavitário de maneira geral. Sudorese intensa, lipotimia ou debilidade (prostração) durante a defervescência; Hipotensão arterial, frieza nas extremidades; Dor torácica, dificuldade respiratória, diminuição do murmúrio vesicular, ou qualquer sinal que indique alterações da ventilação; Cianose. Icterícia DESTAQUES IMPORTANTES História epidemiológica e vacinal; o Importante para entender o contexto da doença febril. Tempo de doença; o Vai definir se pensa-se mais em determinados agentes etiológicos ou em outros (viral, bacteriano). Sinais e sintomas (sinais de alerta); Investigação sistemática de malária; o SEMPRE pesquisar Plasmodium em área endêmica de malária. Uso racional dos exames complementares; Uso empírico de antimicrobianos; Notificação caso suspeitos; Orientação do paciente e acompanhantes. Existe uma “nova lenda urbana” que diz que, dentro das arboviroses, a dengue é a que dá mais febre, depois vem Chikungunya, e zika geralmente dá pouca febre, e assim por diante seguindo a tabela. A realidade não é simples assim. Tudo o que se sabe sobre zika no Brasil está praticamente relacionado a mulheres grávidas, não se investigou pessoas não-gestantes. Por isso não se pode dizer que zika não faz febre, no geral, apenas que, entre as grávidas com exantema, a febre era pouco frequente. Ao lado, quadros de zika descritos em uma coorte de gestantes no Rio de Janeiro. Quadros iguais a um quadro de dengue, a diferença é que possuíam menos febre e não faz extravasamento capilar, como fazem os pacientes com dengue grave. Essencialmente, essa é a diferença. Por outro lado, essas mulheres começaram a gerar filhos com várias malformações, incluindo (e não apenas) a microcefalia. As que não tem microcefalia, têm alteração auditiva, oftalmológica, fala. Hoje se fala em síndrome da infecção congênita por zika. Reintrodução do sarampo no Brasil por Boa Vista, pela imigração de venezuelanos. Política de vacinação ruim. – estudar sarampo. Atenção: Não se prender à característica da febre, a maioria dos casos de malária, no início (até 3-4 dias), não seguem o padrão descrito na literatura, são desordenados. Mas na endocardite bacteriana subaguda, geralmente o paciente faz a bacteremia em um determinado período. Em casos de investigação mais prolongada, vale a pena fazer a curva térmica. Na filariose, o paciente geralmente faz a filaremia à noite, inclusive a gota espessa deve ser feita à noite, após as 18 h, é uma característica das microfilárias. No geral, não é assim organizado, não se fixar tanto nessas informações. Ao se dizer que a hepatite aguda não faz febre alta, isso é o que se espera, pois não há uma viremia importante a ponto de desencadear febre, mas isso é muito relativo, uma criança pode ter hepatite aguda e febre alta.
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