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Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Teoria Geral Do Direito Civil II (Resumos: Menezes Cordeiro) 1. Institutos civis Normas – proposição que associa a certos acontecimentos (a previsão) determinados efeitos jurídicos (estatuição); é essencialmente analítica, e tem um âmbito de aplicação muito restrito (qualquer disciplina jurídica, a ser descrita na base de normas, implicaria toda uma antecipação do seu regime regulativo). Princípios – proposição que se limita a imprimir uma certa direção de modelos de decisão jurídica que, com ele, tenham determinado contacto; aplicação lata, mas muito abstrato (apenas utilizando conjunções múltiplas é possível exprimir um mínimo de conteúdo prescritivo). Ao conjunto concatenado de normas e princípios que permite a formação típica de modelos de decisão, dá-se o nome de instituto jurídico. O instituto jurídico: • Não é um modelo de decisão (realidade demasiado abstrata para acompanhar os problemas concretos, com precisão mínima) • Não equivale ao somatório de normas e princípios que, eventualmente, o componham e que possam ser apurados • Não implica a definição ou consciência de todos os seus componentes • Não é uma instituição ou, pelo menos, não depende do destino ou do sentido que se quer atribuir a realidade A ideia de instituto foi utilizada por Savigny: ela exprimiria uma ordenação jurídica pensada e formada de relações da vida, apresentada como realidade orgânica. Esta construção savignyana perde-se na evolução conceptualista que lhe seguiu, em que o instituto jurídico foi tratado como um conceito geral-abstrato (para a sua elaboração retira-se, de uma realidade, um certo numero de características tidas por comuns a uma serie de outras realidades). Atualmente, o instituto jurídico deve ser apreendido como um conjunto geral- concreto (não é formado pelo estudioso antes existindo, como principio ou ideia objetiva, imanente às realidades, limitando-se o estudioso a apreendê-lo por meio da razão; em termos práticos não se apresenta através de uma definição abstrata, mas com recurso a uma serie marcante de aspetos que brotam da mesma realidade e a ela são reconduzidos). Institutos civis: ➢ Personalidade e tutela ➢ Autonomia Privada ➢ Boa-fé ➢ Imputação de danos ➢ Propriedade e transmissão 1.1. Autonomia privada Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL A autonomia privada conhece, em Direito, uma dupla utilização: em termos amplos, equivale ao espaço de liberdade reconhecido a cada um dentro da ordem jurídica (engloba tudo quanto as pessoas podem fazer, um prisma material ou num prisma jurídico), e corresponde a um dado imanente das pessoas, dotadas, por si mesmas, do poder de criar Direito; em ermos restritos, a autonomia privada corresponde ao espaço de liberdade jurígena, isto é, à área reservada na qual as pessoas podem desenvolver as atividades jurídicas que entenderem, e ocorre por concessão do Direito. A autonomia privada deixa a liberdade humana a pratica de factos jurídicos, portanto de ocorrências que, por integrarem previsões normativas, desencadeiam efeitos de direito. O facto voluntario (facto cuja ocorrência depende da vontade de pessoas e cujos efeitos se produzem porquanto queridos por essa vontade e na medida em que o sejam), pode enquadrar- se perante duas situações permissivas distintas: • Liberdade de celebração – a autonomia privada permite praticar ou não praticar o ato e, portanto, optar pela presença ou pela ausência de determinados efeitos de Direito, a ele associados (atos jurídicos em sentido estrito) • Liberdade de estipulação – a autonomia privada permite optar pela pratica do ato e, ainda, selecionar, para alem da sua presença, o tipo de efeitos que se irão produzir. Ela pode atuar em diversos planos, assumindo significados distintos: em termos formais, corresponde à impossibilidade em que se encontrão Direito de prever todos os significados concretos; em termos materiais, liga-se a certas liberdades económicas fundamentais, como sejam a de trabalho e de empresa. Áreas de incidência (a autonomia privada é um instituto geral de todo o Direito privado; pode ser apresentada como liberdade ou autonomia contratual, ou como liberdade ou autonomia negocial, quando tenha em vista a celebração de contratos ou negócios): a) Direito das obrigações (domínio por excelência): do art.450º surgem, caras, a liberdade de estipulação e a liberdade de celebração, em termos que abrangem toda a matéria, salvo disposição em contrario; deste modo, as regras do Direito das obrigações tendem a ser supletivas, ou seja, aplicam-se apenas quando não sejam afastadas pela vontade das partes b) Direito da personalidade: as situações nestes direitos podem ser livremente utilizadas, mas com dois limites, o da ordem publica (art.81º/1) e o da revogação das limitações voluntarias (art.81º/2) c) Direitos reais: há também limitações – para alem de proliferarem as hipóteses de atos jurídicos em sentido estrito (sem liberdade de estipulação, como no apossamento, art.1263º, a), na ocupação, art.1318º, no achamento, art.1323º, ou na acessão, art.1325º), verifica-se que as diversas figuras reais estão sujeitas a uma regra de tipicidade (art.1306º/1), e só são possíveis quando previstas, de modo expresso, por lei d) Direito da família: a autonomia domina com algumas limitações - os atos familiares pessoais implicam apenas liberdade de celebração, e quando praticados, os efeitos desencadeados são os previstos por lei (ex.: casamento, art.1577º, perfilhação, art.1849º, e o consentimento para adoção, art.1981º); os atos familiares patrimoniais apresentam já alguma liberdade de estipulação, pautada embora por numerosas limitações legais (ex.: art.1698º) Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL e) Direito das sucessões: a autonomia privada controla o importante negocio do testamento (art.2179º) que, no entanto, é sempre revogável; a matéria dos pactos sucessórios está fortemente limitada (art.1699º/1, 1700º e ss.) 1.2. Boa-fé A boa-fé surge referida no CC vigente em 70 artigos, dispersos pelos seus 5 livros. Evolução e sentido: 1) O direito romano assentava em ações, e o protótipo da situação jurídica ativa era protagonizado por uma actio (a pessoa que pretendesse uma tutela jurídica dirigia-se ao pretor e solicitava uma ação; este, quando entendesse o pedido juridicamente justificado, concedia a actio, expressa numa formula, dirigida ao juiz, segundo a qual, se se provassem determinados factos alegrados pelo autor interessado, o réu deveria ser condenado; no caso negativo, seguir-se-ia a absolvição). Esta actiones dadas pelo pretor baseavam-se em leis expressas, até se chegar a um esquema formal, bastante rígido, incapaz de se adaptar e de enquadrar situações económico-sociais inteiramente novas; o pretor interveio, e em casos particulares, ele veio a conceder ações sem base legal, assentes, simplesmente na bona fides/boa fé. Tornou-se necessário, em determinado momento da evolução, aperfeiçoar institutos nos quais uma pessoa, por exercer certos poderes, se tornava titular da posição jurídica correspondente, passando a boa fé a exprimir um estado do próprio sujeito. 2) No Direito canónico, a boa-fé não implicava só ignorância, mas também a ausência de censura, já que o canonismo conferia à boa-fé, tonalidades éticas que se podem exprimir equiparando-se à ausência de pecado. 3) No Direito germânico, a ideia de boa-fé partiu das ideias de crença, confiança, honra e lealdade à palavra dada; posteriormente, veio a objetivar-se, exprimindo valores ligados ao ritual, ao padrão social e à exterioridade do comportamento, de modo a ajuizar do seu acordo com bitolas socioculturais de atuação, com intervenção da ciência do direito. A boa-fé traduz a tutela da aparência. 4) No Código Napoleão, a boa-fé é consagrada com duas aceções: a subjetiva (corresponde a um estadode ignorância do sujeito, que merece, do Direito, a concessão de um regime mais favorável) e a objetiva (cariz jusracionalista, em cujos termos a boa-fé reforça o vinculo contratual) 5) O Código alemão, assim como o Napoleão, de uma dupla dimensão à boa-fé: em sentido subjetivo, exprime a não consciência de prejudicar outrem; em sentido objetivo, ela corporiza-se numa regra de conduta, a observar pelas pessoas no cumprimento das suas obrigações. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Qual das conceções acerca da boa-fé subjetiva, é mais relevante? • Wachter: opta por uma conceção psicológica • Bruns: opta por uma conceção ética; esta posição veio a prevalecer, estando hoje consagrada nos ordenamentos alemão e italiano. Os argumentos decisivos que amparam essa opção são: i) Juridicidade do sistema (o Direito não associa consequências a puras casualidades como o ter ou não conhecimento de certas ocorrências, ele pretende intervir nas relações sociais; ora, ao lidar com uma boa-fé subjetiva ética e está, de modo implícito, a incentivar o acatamento de deveres de cuidado e de diligencia) ii) Adequação do sistema (uma conceção puramente psicológica de boa-fé equivale a premiar os ignorantes, os distraídos e os egoístas, que desconheçam mesmo o mais evidente; paralelamente, ir-se-ia penalizar os diligentes, os dedicados e os argutos, que se aperceberiam do que escapa ao cidadão comum) iii) Praticabilidade do sistema (nunca se pode mostrar se alguém conhecia ou não certo facto; apenas se poderá constatar que o sujeito considerado, dados os factos disponíveis, ou sabia ou devia saber) • Menezes Cordeiro: a boa-fé subjetiva é, entre nós, sempre ética: só pode invocar boa- fé quem, sem culpa, desconheça outra ocorrência. A boa-fé objetiva concretiza-se em cinco institutos, todos de filiação germânica (nenhum deles deriva da boa-fé, em termos conceptuais): • Culpa in contrahendo (art.227º/1): corresponde à descoberta de Jhering; diz-nos que antes da formação do contrato, as partes já têm diversos deveres a respeitar e, designadamente, deveres de proteção, de lealdade e de informação; tais deveres visam prevenir que, nessa fase pré-contratual, alguma das partes possa atingir a confiança da outra, provocando-lhe danos (embora seja livre, a negociação contratual não deve ser usada para fins danosos, alheios à finalidade em jogo, a de procurar a eventual celebração de um contrato) Boa-fé Objetiva: remete para princípios, regras, ditames ou limites por ela comunicados ou, simplesmente, para um modo de atuação dito “de boa-fé”; atua como uma regra imposta do exterior e que as pessoas podem observar; art.3º/1, 227º/1, 239º, 272º, 334º, 437º/1 e 762º/2 Subjetiva: está em causa o estado do sujeito, caracterizado, pela lei civil, ora como um mero desconhecimento ou ignorância de certos factos (sentido psicológico) – art.119º/3, 243º/2, 1260º/1 e 1340º/4 -, ora como um seu desconhecimento sem culpa ou uma ignorância desculpável (sentido ético) – art.291º/3 e 1648º/1 – ora pela consciência de determinados fatores – art.612º/2 Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL • Integração de negócios (art.239º): desenvolveu-se a partir das regras de interpretação negocial e, designadamente, quando elas tiveram de enfrentar uma especial escassez de material expressamente subscrito pelas partes, devendo o interprete-aplicador ter em conta a lógica imanente ao negocio e as exigências substanciais do sistema, de acordo com as expectativas que as partes tenham, legitimamente depositado no processo. • Abuso do direito (art.334º): teve origem na jurisprudência francesa de meados do século XIX, embora tenha sido retomado, em termos muito diversos pelo pensamento jurídico alemão; hoje, ele agrupa distintas figuras, a analisar em sede própria. • Modificação dos contratos por alteração das circunstâncias (art.437º/1): este instituto permite, em certas condições, modificar ou resolver contratos que, mercê de alterações registadas apos a conclusão, venham a assumir feições injustas para alguma das partes; instituto do Direito das obrigações, que recorda a materialidade do sistema e a defesa das expetativas justificadas das partes. • Complexidade das obrigações (art.762º/2):advém da junção de dois institutos (violação positiva do contrato + ideia de obrigação como uma estrutura complexa); promove um conjunto de deveres de proteção, de lealdade e de informação que asseguram, nesse nível, a tutela da confiança das partes e do principio de que, em qualquer caso, prevalecem os interesses reais protegidos do credor; pertence ao Direito das obrigações . Princípios mediadores da boa-fé e do instituto considerado: a) Tutela da confiança – a proteção da confiança efetiva-se por duas vias: • Através de disposições legais especificas: surgem quando o Direito retrate situações típicas nas quais uma pessoa que, legitimamente, acredite em certo estado de coisas, ou o desconheça, receba uma vantagem que, de outro modo, não lhe seria reconhecida (ex.: posição do sujeito perante cetos atos de associações e sociedades civis puras, art.179º, 184º/2 e 1009º; procuração, art.266º; anulação ou declaração de nulidade dos atos jurídicos, art.291º; aquisição de coisa a comerciante, art.1301º; herdeiro aparente, art.2076º) • Através de institutos gerais: aparecem ligados aos valores fundamentais da ordem jurídica e surgem associados, por forte tradição românica, a uma regra objetiva de boa-fé. Os pressupostos da tutela da confiança são: • Situação de confiança (própria da pessoa que, sem violar os deveres de cuidado que ao caso caibam, ignore estará a lesar posições alheias; traduzida na boa-fé subjetiva e ética) • Justificação da confiança (expressa na presença de certos elementos objetivos capazes de, em abstrato, provocarem uma crença plausível) • Investimento de confiança (consiste em, da parte do sujeito, ter havido um assentar efetivo de atividades jurídicas sobre a crença consubstanciada) • Imputação da confiança (a pessoa que vai ser atingida pela proteção dada ao confiante terá dado lugar à entrega do confiante em causa ou ao fator objetivo que a anto conduziu, por ação ou omissão) Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Estes quatro pressupostos devem ser entendidos e aplicados com duas precisões importantes: as previsões especificas de confiança dispensam, por vezes, algum(ns) dos pressupostos referidos, ou seja, não é necessária a imputação dessa confiança à pessoa que vai ser prejudicada pela aquisição tabular; os requisitos para a proteção da confiança articulam-se entre si nos termos de um sistema móvel, isto é, não há entre eles uma hierarquia e não são, em absoluto, indispensáveis (a falta de algum deles pode ser compensada pela intensidade especial que assumam alguns, ou algum, dos restantes). A confiança, genericamente dispensada pela boa-fé, tem uma teleologia relevante para se determinar o âmbito da proteção; podemos considerar a confiança como um elemento imprescindível na manutenção do grupo social. b) Primazia da materialidade subjacente – o Direito visa, através dos seus preceitos, a obtenção de certas soluções efetivas; torna-se, assim, insuficiente a adoção de condutas que apenas na forma correspondem aos objetivos jurídicos, descurando-os, na realidade, num plano material. Este principio realiza-se por três vias: • Conformidade material das condutas: exige que no exercício das posições jurídicas, se realizem, com efetividade, os valores pretendidos pelo ordenamento; será, pois, contraria à boa-fé qualquer conduta que apenas na forma dê corpo ao que o Direito determine • Idoneidade valorativa: não admite que alguém utilize a própria situação jurídica que tenha violado para, em função do ilícito, tirar partido de outrem; será contrario à boa-fé provocar um dano e exigir,a outrem, a sua reparação • Equilíbrio no exercício das posições: recorda a necessidade de sindicar, à luz da globalidade do sistema, as diversas condutas, mesmo permitidas; temos, por isso, dois tipos de posturas vedadas pela boa-fé: o ato emulativo (atuação gratuitamente danosa para outrem), e a atuação gravemente desequilibrada (conduta que, para conseguir uma vantagem mínima para o próprio gere um dano máximo para outrem). A primazia da materialidade subjacente não tem, à partida, o potencial inovatório da tutelada confiança; no fundo, ela conduz a uma melhor articulação do sistema com a periferia, permitindo ma interpretação e uma aplicação melhoradas das mais diversas mensagens normativas. À medida que as sociedades se aperfeiçoem, o sistema torna- se mais exigente. A boa-fé pode ser chamada para enquadrar questões novas, que podem ser: a questão das clausulas gerais, a defesa do consumidor, o levantamento da personalidade coletiva, ou a procuração aparente. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL 2. Negócio jurídico 2.1. Dogmática geral do negocio jurídico Diferença entre ato, facto e negocio Facto jurídico – acontecimento com relevância jurídica a que o direito atribui consequências jurídicas; temos como exemplo de facto jurídico um relâmpago que destrói uma casa (leva a que seja ativado o seguro), o nascimento (consequência no art.66º CC), a morte, etc.; ao corresponder à previsão da norma, é integrado com a norma, e dá lugar à consequência jurídico. Os factos jurídicos são suscetíveis de múltiplas classificações: • Facto jurídico em geral ou lato sensu (considerados eventos naturais) • Facto jurídico em sentido estrito ou stricto sensu (manifestações de vontade humana) Ato jurídico – comportamentos voluntários juridicamente relevantes de pessoas singulares ou coletivas, aos quais o direito reconhece relevância como comportamentos voluntários e livres (há, então liberdade de celebração); diferem dos factos jurídicos por serem atos voluntários da autoria de pessoas (singulares ou coletivas), e não ocorrências juridicamente relevantes. Todavia, os atos jurídicos têm em algo em comum com os factos e os negócios jurídicos: em comum com os factos negócios, têm o ser objeto de valoração jurídica, ou seja, têm um papel quase passivo na determinação da consequência jurídica, embora o Direito exija que sejam voluntários (a intencionalidade e a finalidade com que sejam praticados não é relevante para a determinação da consequência jurídica); em comum com o negocio jurídico, têm a relevância da voluntariedade. Podem classificar-se em: • Atos declarativos (ou declarações): atos dirigidos a outros e que têm um conteúdo comunicativo, podendo ter um ou mais destinatários, determinados (declarações recipiendas ou recetícias) ou indeterminados (declarações não recetícias ou não recipiendas); estas podem ainda classificar-se em: i) Declarações de vontade (exprime uma intenção, em que o seu conteúdo comunicativo exprime uma intenção. Ex.: proposta de contrato, a sua aceitação ou repudio, a declaração de resolução do contrato) ii) Declarações de ciência (comunica-se a outrem uma asserção sobre a verdade ou falsidade de algo ou, mais corretamente, isto é, exprime um juízo de realidade. Ex.: confissões de facto, as informações prestadas no cumprimento do dever de informar consagrado no art.573º CC, ou o depoimento de uma testemunha) • Atos reais (ou operações): comportamentos voluntários de pessoas em relação aos quais o direito atende à voluntariedade da sua pratica, mas que não têm conteúdo comunicativo Negócio jurídico: é um ato do principio da Autonomia Privada e também a principal manifestação deste principio, logo, podemos concluir que estão associadas ao negocio a liberdade de celebração (postula uma livre decisão por parte do autor de celebrar ou não o negocio) e a liberdade de estipulação (poder do autor, de determinar em que termos se quer vincular ao negocio, qual o conteúdo da relação com o negocio que vai por em vigor , quais os moldes em que o seu negocio vai produzir modificações na sua esfera jurídica). Podem ser: Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Negócios unilaterais – há apenas uma parte, constituída por uma ou mais pessoas, que tenham uma legitimação comum ou que prossigam um interesse comum. O CC dedica a este tipo de negócios os art.457º a 463º (estes artigos não esgotam, porem, a matéria dos negócios unilaterais). Confinam- se a uma só declaração negocial Ex.: Procuração (art.262º a 269º CC), o testamento (art.2179º a 2317º CC), ou os negócios cambiários Negócios multilaterais (ou contratos) – há duas ou mais partes; são os contratos, que na maior parte dos casos são bilaterais, porque têm apenas duas partes. Implicam uma declaração negocial para cada uma das suas partes. Os contratos podem ainda ser: • Sinalagmáticos ou não sinalagmáticos, consoante deem lugar a obrigações reciprocas, ficando as partes, em simultâneo, na condição de credores e devedores ou, pelo contrario, apenas facultam uma prestação • Monovinculantes ou bivinculantes, conforme apenas uma das partes fique vinculada ou ambas sejam colocadas nessa situação O exemplo paradigmático de um negocio multilateral é a compra e venda, que tem um aparte compradora e uma parte vendedora Negócios conjuntos – várias pessoas são titulares de posições jurídicas que só podem ser atuadas em bloco, por todas elas. Pode implicar vontades manifestadas em simultâneo, ou sucessivamente, mas todas regidas pelas mesmas normas jurídicas, de modo a conseguir um determinado efeito Deliberações – várias pessoas são titulares de posições jurídicas confluentes que podem, no entanto, ser atuadas em sentido divergente, prevalecendo, então, a posição da maioria Negócio inter vivos – destinam-se a produzir efeitos em vida dos seus celebrantes; porém, a morte de uma das partes ou de um qualquer interessado não tem consequências jurídicas na seu a eficácia e no seu regime Negócios mortis causa – concebido pelo Direito para reger situações jurídicas desencadeadas com a morte de uma pessoa; é regulado, em regra, pelo Direito das sucessões. Ex.: Testamento e os pactos sucessórios Negócios formais – negócios para cuja conclusão a lei exija determinado ritual, na exteorização da vontade, ou seja, aqueles para cuja celebração ou titulação a lei exija uma forma especial; as exigências legais de forma são excecionais, mas, em consequência da sua violação é, em principio, a nulidade (art.220ºCC) Negócios consensuais – negócios que, por não caírem na estatuição de normas cominadoras de forma especial, sejam suscetíveis de conclusão por simples consenso, ou seja, aqueles para cuja celebração é suficiente o consenso das partes, não sendo necessária uma forma especial de expressão da declaração negocial ou de documentação do negocio, nem a pratica de uma especial formalidade como a entrega, real ou simbólica, da coisa que é objeto do negocio; de acordo com o art.219º CC, a validade da declaração negocial não Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL depende da observância de forma especial, salvo quando a lei o exigir Negócios reais quod effectum – têm eficácia real. Ex.: Compra e venda, em que é o contrato que opera a transmissão da propriedade em consequência da simples celebração do contrato, ainda que não haja tradição da coisa (entrega da coisa) Negócios reais quod constitutionem – contratos que se não fecham sem que ocorra tradição da coisa, ou seja, aqueles que se materializam com a entrega da coisa que constitui o seu objeto. Ex.: mútuo (art.1142º CC), penhor (art.669º/1 CC), comodato (art.1129º) e deposito (art.1185º CC) Negócios pessoais – o seu conteúdo não é avaliável em dinheiro e tem relevância na esfera jurídica pessoaldas partes; são instituídos ou modificados estados pessoais das partes. Ex.: casamento, adoção e perfilhação Negócios patrimoniais – o seu conteúdo é avaliável em dinheiro; aqueles pelos quais as partes regem sobre bens avaliáveis em dinheiro. Ex.: compra e venda, doação e sociedade Negócio típico – a sua regulação consta da lei, podendo compreender elementos injuntivos (cessa, assim, a liberdade de estipulação) Negócio atípico – a regulação e engendrada pelas partes Negócios onerosos – implica esforços económicos para ambas as partes, em simultâneo e com vantagens correlativas. Ex.: Compra e venda (art.874º e ss.) Negócios gratuitos – cada uma das partes retira do negocio vantagens ou sacrifícios. A vontade livre do sacrificado determina-se pela intenção de dar (animus donandi), sendo apensa na presença deste fator, que são aplicadas as regras próprias das liberalidades Ex.: Doação (art.940º e ss.) Negócio de administração – implica modificações secundarias ou periféricas no seu conteúdo; não atingem uma esfera jurídica Negócios de disposição – poe em causa a própria subsistência da situação; atingem, em profundidade, uma esfera jurídica, e só podem ser livremente praticados pelo próprio titular da esfera jurídica afetada e desde que tenha capacidade para tal Negócios parciários – implica a participação dos celebrantes em determinados resultados. Ex.: contrato de sociedade (art.980º) Negócios de organização – visa montar uma estrutura que faculte a cooperação permanente, em certo quadro, de pessoas Negócio de distribuição – contrapõem-se aos de consumo, pois neste negocio visa- se percorre o circuito económico, na parte Negócio aleatório – no momento de celebração, são desconhecidas as vantagens patrimoniais que dele derivem para as partes. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Art.295º CC O art.295º CC recorre a uma analogia para exigir um juízo de semelhança e de diferença entre o ato jurídico concreto e o negocio jurídico. A aplicação aos simples atos jurídicos dos preceitos legais relativos aos negócios jurídicos deverá ser feita mutatis mutandis; a adaptação será tanto mais profunda quanto menos negocial for o ato. Numa interpretação literal deste preceito, ser-se-ia levado a entender que a analogia, na concretização do regime dos atos jurídicos, seria limitada às “disposições do capitulo precedente”, isto é, aos preceitos dos art.217º a 294º CC; todavia, este artigo não exclui a aplicação do art.10º CC, que permite alargar o âmbito da analogia a outros preceitos, para alem dos referidos. Com este artigo, o CC centrou todo o tratamento da matéria sobre o paradigma do negocio jurídico, cujo regime deve ser aplicado ao ato jurídico analogicamente. Teoria da vontade e Teoria da declaração Teoria da vontade – parte da conceção do negocio como um ato de liberdade e de vontade do declarante; a vontade do declarante é, nesta conceção, fonte de juridicidade e dos efeitos jurídicos do contrato e este, como autovinculação, não pode valer sem ou contra essa vontade. A posição do declaratário fica desprotegido perante a do declarante, porque o declaratário corre o risco de ficar vinculado a um negocio com um conteúdo que não é afinal aquele com que ele o entendeu, por ver invalidado um negócio por vicio ou deficiência da vontade do declarante, sem que os seus interesses sejam suficientemente protegidos. Existe na ética neoestóica da liberdade e da igualdade originaria de cada pessoa, ou seja, parte ontologicamente de cada pessoa para a sociedade e para o Estado Teoria da declaração – encara o negocio como uma declaração negocial objetivada que deve valer, não necessariamente com o sentido querido pelo declarante, mas com o sentido objetivo que dela resulta ou com que o declaratário a entender. Emitida uma declaração de que liga a produção ao vendedor final Ex.: contrato de jogo ou aposta (art.1245º) Negócios causais – aqueles em que a causa é relevante para o respetivo regime e, como tal, pode ser invocado como fundamento de pretensões ou exceções de direito material; é permitido às partes que, na controvérsia suscitadas pelo negocio, invocar como fundamento argumentos ligados ou emergentes da causa Negócios abstratos – aqueles em que a causa é irrelevante, não podendo ser atendida nem constituir o fundamento de pretensões ou exceções; isto não significa que nestes negócios, não haja uma causa, mas sim que a causa é abstraída. Ex.: Negócios cambiários típicos das letras, livranças e cheques Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL vontade, o seu autor corre o risco de que ela seja interpretada de modo diferente do que ele lhe quis imprimir. Existe na ética-filosófica, e tem uma matriz platónico-aristotélica; parte da Sociedade e do Estado para a pessoa. Elementos negociais ➢ Doutrina tradicional (Manuel de Andrade) i) Elementos essenciais: elementos necessariamente presentes em cada negocio jurídico, podendo, por seu turno, abranger elementos gerais (que devem surgir em todos os negócios) e elementos específicos (imprescindíveis para caracterizar um determinado tipo negocial, distinguindo-os dos demais); são elementos essenciais gerais a capacidade das partes, a declaração ou declarações de vontade e o objeto possível, e elementos essenciais específicos, por exemplo, o preço no contrato de compra e venda ii) Elementos naturais: efeitos que, por sua natureza, os diversos negócios produzem, mas que as partes podem, ao abrigo da autonomia privada, validamente afastar; correspondem, em termos deônticos, a normas supletivas (normas cuja aplicação fica na disponibilidade das pessoas) iii) Elementos acidentais: correspondem a estipulações que não são necessárias para a consistência de um negocio e que o direito não preconiza, ainda que a título supletivo, para o tipo negocial considerado; as partes podem, ao abrigo da autonomia privada, inclui-las nos negócios que celebrem ➢ Orientações tradicionais (surgem de modo a resolver o problema aberto com as incongruências e a insuficiência da tripartição clássica dos elementos negociais) • Paulo Cunha i) Elementos necessários: aqueles que a lei exija para a validade de todo e qualquer ato jurídico, que se subdividem em elementos essenciais (sem os quais não haveria negocio) e em elementos habilitantes (requeridos para a sua validade) ii) Elementos específicos: correspondem aos requeridos para cada tipo de ato (ex.: preço na compra e venda; renda, no arrendamento) iii) Elementos naturais: derivam da lei, que os estabelece para servirem os diversos tipos negociais, de acordo com a sua natureza iv) Elementos acidentais: abrangem os introduzidos pela vontade das partes, podendo ser típicos (já se encontram conceitualizados pela lei) ou variáveis (derivam da vontade das partes) • Dias Marques i) Pressupostos: elementos extrínsecos, perante o próprio negocio, abrangendo fatores atinentes ao autor do negocio (capacidade), ao objeto do negocio (idoneidade) e à posição do autor do negocio em relação ao objeto (legitimidade) ii) Estrutura: elementos intrínsecos ao próprio ato do negocio, abrangendo elementos objetivos (forma e conteúdo) e subjetivos (vontade, consciência) iii) Função: objetivo socialmente relevante procurado através do negocio • Galvão Telles Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL i) Elementos ii) Acordo de formação iii) Acordo de conteúdo iv) Causa ou motivo v) Requisitos de validade vi) Requisitos de eficácia • Menezes Cordeiro: os pressupostos dos NJ só podem ser considerados como seus elementos se, destes, se fizer uso em sentido amplo; os pressupostos do NJ implicam regras relativas às pessoas, aos bens, ou às relações que, entre ambos, se estabeleçam, e os elementos têm a ver com normas e princípiosliados, desde logo, à temática negocial. 2.2. Formação do negocio jurídico O negócio não se confunde com a declaração: declaração é um pressuposto, dependente de uma opção humana comunicada ao exterior, e negocio é a eficácia resultante da declaração, desde que esta seja reconhecida, pelo sistema, como apta a modificar o universo jurídico. O BGB utiliza as duas noções, de negocio e declaração, sem distinção; o CC, diretamente influenciado pelo BGB, mantem essa mesma ambiguidade linguística, usando, preferencialmente, declaração negocial. Declaração negocial – comportamento voluntario que se traduz numa manifestação de vontade com conteúdo negocial, feita no âmbito do negocio. No negocio unilateral, a declaração negocial preenche a totalidade do ato jurídico e esgota a sua materialidade; o mesmo não acontece no NJ multilateral, em que há uma pluralidade de declarações negociais. Declaração (elementos) Vontade humana Declaração Relação de concordância (Savigny) Vontade do comportamento Vontade da declaração Vontade do negocio Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL A natureza da declaração é explicada pela teoria da vontade, que via nela uma decorrência da opção do declarante, e pela teoria da declaração, que validava a exteorização dessa opção; estas teorias vieram a evoluir para a teoria da comunicação e para a teoria da confiança. Tipos de declarações 1) Declaração expressa VS. Declaração tácita (distinção art.217ºCC) • Declaração expressa – declarações que usam linguagem (critério objetivo); porem, segundo um critério subjetivo, não têm necessariamente de ser verbais e podem ser simplesmente gestuais, já que expressa o comportamento finalisticamente dirigido a exprimir ou a comunicar algo, podendo resultar implicitamente uma outra declaração, esta agora tacita, desde que dela se deduza com toda a probabilidade (art.217º/1 CC). • Declaração tacita – de acordo com um critério objetivo, tem-se como declaração tacita as que consistem num comportamento concludente (em sentido amplo, são comportamentos que não sejam uma linguagem e que tenham um sentido relevante, abrangendo as declarações expressas não verbais e que não sejam feitas com o uso de uma linguagem; em sentido estrito, são os comportamentos que não são diretamente dirigidos a significar ou comunicar um conteúdo negocial, correspondendo às declarações tacitas); seguindo um critério subjetivo, a declaração tacita é o comportamento do qual se deduz com toda a probabilidade a expressão ou comunicação de algo, embora esse comportamento não tenha sido finalisticamente dirigido à expressão ou à comunicação daquele conteúdo. A interpretação destas declarações resulta do apuramento do sentido da concludência (determinação de qual o sentido negocial, ou não negocial, que deve ser tido como deduzindo-se com toda a probabilidade do comportamento concludente, que pode resultar de pressuposição ou de implicação); à interpretação das declarações tacitas aplicam-se as regras dos art.236º e ss. CC. • Art.234º CC: é dispensável uma declaração expressa de aceitação, que na letra deste artigo se traduz numa conduta que mostre a intenção de aceitar a proposta, ou seja, sempre que aquele a quem foi feita a proposta contratual dá inicio à execução do contrato proposto, sem que tenha declarado expressamente aceitá-la, deduz-se desse comportamento com toda a probabilidade, que aceitou a proposta (aceitação tacita). • Art.217º/2 CC: a natureza formal de uma declaração não impede que ela seja tacitamente emitida; requer-se, então, que a forma prescrita tenha sido observada quanto aos factos de que se deduza a declaração em causa. Este artigo determina que a forma da declaração tacita é aquela de que se reveste o comportamento do qual ela, com toda a probabilidade, se deduz. • A doutrina alemã distingue as declarações negociais propriamente ditas e os comportamentos concludentes, que estão próximos das declarações negociais. • O silencio difere da declaração tácita, por ser uma ausência de declaração; segundo o art.218º CC, o silencio só tem valor jurídico quando lhe for atribuído por: i) Lei: sucede no art.923º/2 e no 1163º CC Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL ii) Uso: o silencio só vale como declaração negocial quando um uso, devidamente juspositivado por uma lei, o determine iii) Convenção: exercício da autonomia privada; o declarante pode, voluntariamente, inserir-se em ambiências que permitam, do seu silencio, inferir uma vontade negocial. 2) Declaração presumida VS. Declaração fictas • Declaração presumida: a lei associa, a certo comportamento, o significado de determinada declaração negocial, admitindo, contudo, prova em contrario, ou seja, advertindo que o interessado demonstre, afinal, que outra haveria sido a sua vontade (presunção ilidível _ art.350º/2 CC) • Declaração ficta: a lei veda a prova e contrario, sendo, então, a presunção inilidível. 3) Declaração recipienda VS. Declaração não recipienda • Teorias: i) T. exteorização – o negocio fica concluído quando a vontade tivesse obtido a sua forma exterior/quando se manifeste (Critica: a vontade pode manifestar-se sem que o destinatário a tenha conhecido, não podendo, neste caso, emprestar-lhe qualquer significado) ii) T. expedição ou do envio – a declaração torna-se eficaz quando seja remetida ao destinatário (Critica: a declaração pode ser enviada e não chegar ao poder do declaratário) iii) T. receção – a eficácia da declaração depende de o destinatário a receber com efetividade (critica: o destinatário pode receber a declaração e não ter conhecimento dela) iv) T. acolhimento – os efeitos da declaração surgem logo que a declaração chegue ao poder do declaratário (critica: o “poder” não assegura que o destinatário dela tenha ou possa ter consciência) v) T. conhecimento – confere eficácia a declaração que chegue ao conhecimento do declaratário • Declaração recipienda: declaração negocial com um declaratário especifico; a sua eficácia esta condicionada pela ligação particular que visam estabelecer com o seu destinatário. Segundo o art.224º/1, 1ªparte CC, é eficaz quando chega ao poder do declaratário (teoria da receção), ou seja dele reconhecida (teoria do conhecimento); quando seja remetida, e só por culpa do destinatário não tenha sido oportunamente recebida (teoria da expedição) _ art.224º/2. • Declaração não recipienda: declaração negocial com um numero de destinatário indeterminado. Torna-se eficaz logo que a vontade do declarante se manifeste na forma adequada (teoria da expedição) _ art.224º/1, 2ªparte 4) Declaração subsequente VS. Contradeclaração • Declarações subsequentes: aquelas que recaem sobre declarações previas, eventualmente já consubstanciadas em NJ; distinguem-se dois grupos: i) Declarações típicas – visam modificar ou extinguir a eficácia de declarações anteriores (na base de atos ou NJ unilaterais); o declarante tem margem para poder fazê-las, mas não pode estipular quanto aos seus efeitos, que estão prefixados na lei, de modo a proteger a confiança que a primeira declaração haja suscitado. ii) Declarações atípicas – acordadas pelas partes ou facultadas pela situação existente; postulam um novo negócio, entre as partes Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL • Contradeclarações: declarações subsequentes reportadas a uma primeira declaração, no sentido de suprimir ou de reduzir os efeitos que, dela, deveriam resultar. Ex.: revogação de proposta (art.230º/1 CC), protesto (declaração subsequente pela qual se pretende pôr em causa eficácia de uma declaração anterior ou de uma situação que seja, a qualquer título, imputável ao declarante) 5) Declaração não negocial: declarações que não comportam liberdade de estipulação. Ex.: ratificação, confirmação, validação, reductio ad equitatem (validaçãoespecialmente adaptada aos negócios usurários), rejeição ou adesão ao contrato a favor de terceiros, convalidação (declaração que impede o seu autor, nas nulidades relativas, de as invocar), convalescença, perdão, anulação, invocação da nulidade e, em regra, o exercício de direitos potestativos. O CC e o BGB regem a formação do negocio na modalidade do contrato, tendo em vista o modelo do contrato entre ausentes, em que o declarante remete a sua declaração ao declaratário, de tal modo que, entre a proposta e a eventual aceitação, medeie um espaço de tempo relevante _ modelo básico, que opera a atividade jurídico-cientifica, cujo resultado é o quadro normativo do surgimento do negocio. É no estudo deste modelo básico, eu a doutrina vem a recuperar a ideia de processo, que existe, em Direito, quando diversos atos jurídicos se encadeiem, de modo a proporcionar um objeto final. Modelos de formação do negocio que dispensam qualquer processo: ➢ NJ unilaterais, que ficam completos apenas com a declaração de vontade do seu autor, exteorizada pela forma legal, não sendo necessário procurar um consenso, necessidade essa que dita o essencial da complexidade processual negocial ➢ Negócio por minuta, isto é, os negócios que se concluem por adesão ou subscrição, por ambas as partes, de um documento (minuta), que comporta o teor negocial Negócio comum – formam-se entre presentes, por simples adesão a formulas apresentadas a todos os interessados. Existem vários tipos sociais de negociação: a) Aquisição por apreensão ou indicação seguidas de pagamento, habitual nos negócios correntes de consumo, em que o negocio se conclui com o pagamento, e há um acordo de facto, fruto da declaração feitas na base de condutas concludentes, das quais, por abstração, induzimos um consenso negocial jurídico, sendo que, em termos analíticos, consenso entre as partes antecipa as declarações, caso as haja b) Contratação por escolha em lista, seguida pela utilização ou pelo consumo (em sentido material), com subsequente pagamento, que é corrente nos restaurantes, em que o interessado manifesta os seus desejos, perante um menú. Estamos perante propostas contratuais de aquisição de bens ou de serviços, favoravelmente acolhidas através da prestação de serviços e do fornecimento dos bens acordados c) Contratação por adesão a clausulas contratuais gerais: formula comum de fechar negócios, nos setores da banca, dos seguros e dos transportes, cabendo ao Direito assegurar o equilíbrio de tais clausulas. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Forma da declaração – modo utilizado para exteorizar a vontade, desde que esta seja acompanhada de sinais exteriores sensíveis pelas pessoas que presenciem a declaração ou que, posteriormente, dela tenha conhecimento, cuja falta tem como consequência a nulidade, regulada no art.220º CC. Difere das formalidades, que são atos ou factos complementares cuja satisfação ou verificação são exigidas para a pratica do ato ou para a celebração do negocio, podendo ser anteriores, concomitantes ou posteriores à celebração do negócio; a falta de formalidades injuntivamente exigidas por lei é ilegal e, em principio, nulo, por força do art.294º CC. Os negócios formais diferem dos negócios consensuais: enquanto os negócios formais têm forma solene, os negócios consensuais produzem efeitos por pura manifestação ou pelo mero consenso das partes, independentemente do modo como surjam. Tipos de forma: 1) Forma interna e forma externa • Forma interna: participa do ser e da existência do ato; é algo que faz parte dele e sem ela o ato, ou não é qualificável como tal, ou é mesmo juridicamente inexistente. Ex.: forma exigida para a letra, livrança ou cheque; a falta de forma tem como consequência que aqueles documentos ao são havidos como letras, livranças ou cheques • Forma externa: forma de que o ato se reveste; algo que se acresce ao ato, mas não participa na sua essência; a falta de forma externa não afeta a sua qualificação ou existência, mas sim a validade ou prova. Ex.: escritura publica no contrato de compra e venda de imóvel, que pode ser celebrado de varias formas • Manuel de Andrade: a forma interna é a forma que constituí elemento do próprio conceito de um tipo negocial, por maneira que a sua falta produza a inexistência do próprio negocio; forma externa é a forma necessária para av alidade ou prova do negócio. A distinção entre forma interna e forma externa do negocio é importante no que diz respeito à problemática da validade formal do negocio dissimulado • Art.219º e ss. CC: construído na perspetiva da forma externa 2) Forma ad substantiam e forma ad probationem • Forma ad substantiam: exigida pelo Direito para a própria consubstanciação do negocio em si, sendo que a falta desta forma tem como consequência a nulidade; em regra, as exigências legais da forma são ad substantiam, conclusão que se retira do art.220º CC que comina, em principio, com nulidade o desrespeito pela forma exigida por lei, admitindo, porem, que outro regime seja fixado em preceito especial • Forma ad probationem: requerida para demonstrar a existência do negócio, e a sua falta tem como consequência a impossibilidade de prova; do art.334º CC resulta que a forma pode ser exigida por lei apenas para prova de declaração, logo, nesse caso, a sua falta não é caso de nulidade, mas apenas a dificuldade de prova. O regime da forma ad probationem exige que seja sindicada, através Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL da interpretação, a finalidade da exigência legal de forma e que se conclua que a lei a exige apenas para prova. 3) Forma legal, forma convencional e forma voluntaria • Forma legal é aquela que é exigida por lei, sendo a regra, nos termos do art.219º, a liberdade de forma; todavia, a lei exige com alguma frequência que os atos e NJ adotem uma forma especial, o que significa que as exigências legais de forma, contrapostas à regra do art.219º CC, são geralmente consideradas excecionais. MC considera que as normas sobre a forma têm natureza plena, insuscetível de redução teleológica e que as normas relativas à forma dos NJ são plenas, ou seja, não tendo objetivos relevantes e percetíveis, não comportam redução teleológica; Oliveira Ascensão admite como fundamento das exigências legais de forma a necessidade de levar as partes a refletir antes de praticarem atos consideravelmente graves, o reforço da segurança do negócio (por permitir a intervenção de terceiros), a facilitação da prova dos atos, e o propósito inconfessado da lei de dificultar certos negócios a que é desfavorável, mas que não vai até ao ponto de proibir. A forma legal opera, apenas, perante o cerne negocial (ou núcleo contratual fundamental); as estipulações acessórias, quando pertençam ao negocio considerado, devem, à partida, seguir a forma prescrita para ele. Porém, sucede que estas estipulações surgem, por vezes, em separado, podendo ser, ainda, anteriores à própria declaração principal, ou dela contemporâneas. Segundo o art.221º/1, 2ªparte CC, as estipulações em causa só valem se se provar que correspondem à vontade do autor da declaração, devido à relação que se estabelece entre o tem suplementar da sua efetiva correspondência com a autonomia privada, nos casos em que assumam uma forma menos solene do que a exigida para o cerne negocial • Forma convencional: implica um pacto prévio pelo qual as partes combinaram emitir as suas declarações por certo modo, ao abrigo da autonomia privada. O art.223º CC é o regime legal da forma convencional; esta forma não poderá, contudo, ser de solenidade inferior à norma legal, uma vez que a convenção das partes não poderá valer contra preceito injuntivo da lei. Se as partes agirem sob uma forma que não respeite a forma convencionada, deve entender-se que esse agir não é ainda para eles vinculativo. Se aspartes acordem uma forma convencional e estipulem, de modo expresso, que tal forma só por ser dispensada oralmente, dá-se dignidade ao Direito e tem de se divulgar uma cultura de respeito pela palavra dada, podendo a convenção de forma ser nula, a menos que especiais circunstancias, assentes na boa-fé, permitam outra saída. Pode acontecer que a convenção quanto à forma surja apenas apos o negócio estar concluído ou no momento da sua conclusão. Em tal caso, distingue-se o caso em que há fundamento para concluir que as partes se quiseram vincular desde o momento em que celebraram o ato, presumindo-se aí que a convenção teve em vista apenas a consolidação do negócio ou de qualquer outro efeito, mas não a sua substituição, e o caso contrario, onde se deve ser entendido que com a nova convenção sobre a forma, o negocio foi substituído ou renovado. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Culpa in contrahendo Regras pré-contratuais Jhering: demonstra que, na presença de contratos nulos por anomalias verificadas na sua formação, podem ocorrer danos cujo não-ressarcimento seja injusto; perante tal situação, o responsável, por via das regras gerais sobre danos e culpa, deveria indemnizar pelo interesse contratual negativo, colocando o prejudicado na situação em que ele se encontraria se nunca tivesse havido negociações e contrato nulo. Esta descoberta permite exemplificar o modo de funcionamento da terceira sistemática, quando confrontada com novas necessidades para as quais, num momento inicial, não haja, ainda, resposta. A relação jurídica pré-contratual tem como conteúdo as vinculações interpessoais decorrentes do dever de BF objetiva, isto é, a BF como regra de conduta. Como os padrões de comportamento determinantes do juízo de BF não se encontram enunciados na lei, é necessária uma referência aos padrões de comportamento aceitáveis e exigíveis vigentes na sociedade, no circulo de pessoas e de atividades em que o contrato se insere, ou nos usos próprios ou típicos da negociação ou típicos da negociação e da celebração daquele contrato. Deveres de BF: • Deveres de proteção: vinculam as partes em negociação a fazer o que razoavelmente estiver a seu alcance para evitar ou reduzir danos ou custos da outra parte. Só os custos e os danos incorridos no âmbito do próprio negociação devem ser tidos em consideração em temas de deveres pré-contratuais de proteção; outros danos ou custos que, ocorrendo embora concomitantemente com a negociação ou com a contratação, se não insiram funcionalmente no processo negocial ou com a contratação, não devem ser qualificados como de culpa in contrahendo • Deveres de esclarecimento: vinculam as partes em negociação a partilhar os dados e informações com relevância para a apreciação correta das circunstancias do contrato e das qualidades das pessoas envolventes, para a avaliação tanto quanto possível real dos bens com relevância na equação económica do contrato, e a prestar espontaneamente ou a solicitação de outra parte as informações que razoavelmente lhes sejam exigíveis em BF. Contratual (na medida em que as partes hajam decidido concluir pactos preparatórios perante os quais as partes ficam vinculadas) Legais especificas (Lei sobre Cláusulas Contratuais Gerais, e Lei da Defesa do Consumidor) Legais genéricas (devem seguir as regras da BF, estando inseridas no art.227º CC) Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL • Deveres de lealdade: vinculam as partes em negociação a comportar-se na interação pré-contratual com honestidade e correção. Compreendem toda a matéria dos deveres de proteção e esclarecimento. Há violação do dever pré- contratual de lealdade sempre que alguma das partes entre em negociações sem a intenção de as concluir, ou quando uma das partes faça incluir no contrato uma cláusula que sabe ser invalida ou impossível, ou feche o contrato com consciência de dissenso ou de erro por parte da outra. Os deveres de segurança, de informação e de lealdade pré-negociais tendem a concretizar-se em torno de constelações de casos: i) Vulnerabilidade pré-negocial: situações em que uma das partes depende da outra ou, pelo menos, se coloca numa situação de fraqueza, dependendo de deveres de segurança, de informação ou de lealdade, a cargo dessa outra. ii) Interrupção injustificada de negociações: este tipo de situações anima o confronto entre a autonomia privada e a BF. A conclusão de um contrato é, até ao ultimo momento, totalmente livre, logo, qualquer uma das partes pode desistir do contrato sem dar justificações; porem, caso a parte desistente tiver, com a sua conduta, originado, na contraparte, uma confiança justificada de que, com segurança, se iria concluir um contrato, a interrupção injustificada leva à cic. iii) Contratação ineficaz: quando se origina um contrato nulo ou um contrato anulável, que pode originar responsabilidade pré-negocial. iv) Tutela da parte fraca: concretiza-se, predominantemente, através de deveres de informação v) Responsabilidade por atos de terceiros: podem estar na situação de terceiros o representante, o gerente da sociedade, o consultor, o agente, o administrador da insolvência ou fiduciário – qualquer um deles responderá por cic, a titulo pessoal, na hipótese de quebra de deveres preliminares que lhes sejam dirigidos. A proteção do contraente débil é assegurada através de diversos dispositivos, fundamentalmente virados para deveres de informação e alojados na LCCG ou nos diversos diplomas de defesa do consumidor. Quando surja um contrato que patenteie desequilíbrios não queridos por alguma das partes, algo terá corrido mal nos preliminares; a parte que conheça ou deva conhecer o desequilíbrio em causa tem o dever de dar conhecimento à contraparte. Chega-se, assim, à ideia de proteção da parte fraca num contrato: ao contraente que, por razoes económicas ou de conhecimento, se deva considerar inferiorizado, são devidos, na fase preliminar, um esclarecimento e uma lealdade acrescidos; caso esses deveres não sejam acatados, pode haver responsabilidade, por inobservância da BF. O papel da cic na correção de contratos injustos, através da BF e do dever de informar, não levantando duvidas, embora não possa ser levado ao ponto de pôr em causa a autonomia privada. A parte fraca carecida de proteção equivale a um cidadão consumidor isolado, e por isso o tema deve ser visto em ligação com os direitos dos consumidores, e no direito civil, em articulação com as clausulas contratuais gerais. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Podemos então concluir que, verificadas condições ponderosas, a parte habilitada que não informe, suficientemente, a parte débil, pode ser conformada com cic, cabendo-lhe os danos assim causados. Obrigação de contratar – situação jurídica pela qual um sujeito fica adstrito à celebração de um contrato, isto é, à emissão da declaração de vontade que, em conjunto com a da outra parte, dá azo a um NJ bilateral. Exige uma forte situação de confiança, imputável à contraparte, de que o contrato em jogo iria ser celebrado e isso ao ponto de o interessado ter realizado um considerável investimento de confiança. Nessa eventualidade, o dever de contratar impõe-se, tendo como contraface a ilicitude da interrupção injustificada das negociações, sendo que a indemnização que daí decorra será calculada de acordo com o interesse positivo. A aproximação entra BF e a cic veio a ganhar um relevo substancial: os vetores comunicados pela BF não deixavam de se revelar, ainda em adaptações, nos preliminares contratuais. Assim: • Tutela da confiança – na fase de preparação dos contratos, as partes não devem suscitar situações de confiança que, depois, venham a frustrar • Primazia da materialidade subjacente – a autonomia privada faculta, às partes, negociar livremente os seus contratos, interrompendoas negociações quando o entenderem Construção da cic • Teorias contratuais • Soluções negociais – procuram reconduzir a cic e os deveres que, com ela, se conexionem, a NJ • Franz Leonhard: a cic reconduz-se ao contrato posteriormente celebrado. O efetivo cumprimento de um contrato exige o acatamento de deveres que se desenham já antes da sua celebração (a parte que venda um objeto, previamente à venda, deve providenciar para que ele esteja em bom estado); há, por isso, uma pré-eficácia – celebrado um negocio, certos deveres retroatuariam até ao inicio das negociações. Criticas: ilogismo (assenta na ideia de pré-eficácia, contraditória em si mesma; antes de um contrato não se podem retirar deveres a observar, e depois deve estar celebrado, não se está numa fase pré-negocial que habilite ao acatamento de deveres pré-contratuais); excessiva restrição (só contempla a hipótese de haver um contrato valido que, não obstante, tivesse provocado danos na sua celebração, excluindo as negociações prévias, injustificadamente, sem que se tenha chegado à formação de qualquer contrato, e as negociações inválidas) • Heinrich Siber: os deveres pré-contratuais na celebração de um contrato preparatório, aquando do inicio das negociações, estão filiados. Ao aceitar negociar a eventual procura de um consenso negocial, as partes estariam, desde logo, a aceitar, pelo menos, algumas regras de jogo. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Critica: ficciosa (nas negociações comuns, não se descobrem quaisquer declarações destinadas a originar um consenso contratual, que permita retirar deveres de comportamento minimamente consistentes). • Teorias legais • Soluções legais – remetem a base da figura da cic para a lei • Teoria da relação de facto: as partes conseguem, no trafego social, através de puras condutas materiais, originar situações semelhantes a contratos, mas sem qualquer declaração a tanto destinada, estando entre estas situações, as negociações preliminares; daí adviria uma relação contratual de facto à qual, por analogia, se aplicaria o regime dos contratos • Teoria dos deveres extralegais: em situações de acrescida proximidade, surgiria uma especial confiança, entre as partes, que não poderia ser desemparada. No silencio da lei, haveria que construir um principio de onde resultaria uma proteção extralegal, impondo-se também deveres e informação e de comunicação, que poderiam ser apoiados na BF ou numa interpretação alargada da vontade das partes. • Teoria da confiança: na presença de negociações, assistir-se-ia à criação de uma situação de confiança e ao aproveitamento da situação criada. Daí adviria uma particular forma de negocio jurídico • Teoria da autovinculaçao sem contrato: os agentes, através de condutas comunicativas, criaram, um nos outros, expetativas de conduta futuras, que iria ser conduzido à ideia de autovinculaçao, perfeitamente conhecida através da vinculatividade da promessa • Teoria dos deveres unitários: ao analisar as diversas situações nas quais, por exigência ético-jurídica, se procede à tutela da confiança e preconizar a existência de um dever unitário de proteção, de base legal, e que, surgindo in contrahendo, se mantêm na vigência do negocio e da sua própria nulidade. A cic também pode ser tomada como uma fonte de responsabilidade. Essa responsabilidade pode ser contratual ou obrigacional (caso exista, entre as partes, uma obrigação especifica), ou também pode ser aquiliana (quando se opta por um dever de ordem geral, eventualmente concretizado em deveres de tráfego). Podemos considerar que, na base da jurisprudência alemã, da cic a possibilidade de a reconduzir ao instituto da responsabilidade contratual ou obrigacional. O prejuízo da parte lesada, numa situação de cic, pode ser estimado de duas formas: a) Interesse negativo – prevalece a ideia de que as próprias negociações foram ilícitas; o lesado irá receber uma indemnização que permita coloca-lo na situação em que estaria se não tivessem ocorrido as negociações. b) Interesse positivo - a interrupção das negociações ou a incapacidade de, por eles, se chegar a um contrato válido e eficaz; a indemnização procurará colocar o lesado na situação em que estaria se o contrato fosse válido e eficaz. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Terceira via da responsabilidade civil – adveio da preocupação de ordenar a cic, em conjunto com outros institutos derivados da BF e que poderiam envolver responsabilidade, entre a responsabilidade contratual e a responsabilidade aquiliana. Art.227º Atos preparatórios – todos os atos que, inserindo-se, pelo seu objetivo, no processo de formação de um contrato, não possuam reconduzir-se à proposta, á aceitação ou à rejeição, relativamente ao contrario definitivamente pretendido. Podem ser materiais ou jurídicos, consoante se analisem em simples modificações do mundo material ou antes impliquem de puro significado jurídico. As regras da cic funcionam perante qualquer negocio, atendendo ao espirito da lei “Negociar” deve ser tomada em sentido mais amplo; a simples proximidade negocial permite que a cic se manifeste Estão fixadas duas fases na preparação do contrato “preliminares, que pressupõe toda a troca de informações necessárias, para se alcançar um acordo “formação”, que exprimiria a formalização do acordo, designadamente quando estivessem um jogo uma forma solene, que requeria atividade de redocumentação A BF referida neste artigo é objetiva, que equivale a uma remissão para os valores fundamentais do sistema, presentes nas situações consideradas O preceito não delimita nem exclui quaisquer danos: são todos os que sejam “culposamente causados (representa um juízo de culpa, abrangendo, nos termos gerais, quer o dolo, quer a mera negligencia); o advérbio culposamente visa delimitar os danos a indemnizar O nº2 remete, no tocante à prescrição, para o art.498º. Trata-se de uma previsão de prescrição subjetiva, uma vez que começa a correr não a partir do momento em que o direito possa ser exercido, mas apenas quando o titular dele tenha conhecimento, ainda que ignorando a identidade do responsável ou a extensão dos danos. Consequentemente, o prazo é curto: 3 anos. Paralelamente, corre a prescrição ordinária, objetiva e de 20 anos Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Podem ser: • Materiais, falando-se neste caso em contratos preliminares, em que as partes procuram conhecer-se e indagar a possível negociação dos sus interesses, onde se mantém a liberdade de contratar, devendo respeitar a BF • Jurídicos, em que se fala de contratos vinculativos, que obrigam as partes a práticas ulteriores (ex.: contrato-promessa), e contratos não-vinculativos Atos típicos: ➢ Tipos sociais • Minuta (ou punctação): documento no qual as partes vão exarando os diversos pontos a inserir no futuro contrato, à medida que sejam acordados. Os pontos sectoriais acordados, mesmo quando lançados num papel não vinculam os contraentes antes da aprovação global final, já que o contrato é aprovado no seu todo ➢ Tipos legais • Contratos instrumentos (contratos que não visam regular, de modo direto, o conteúdo que integrará o convénio definitivo mas, tão-só, aspetos que, a ele irão conduzir): art.223º, 218º, 228º/1, al.a), 410º e ss., 414º e ss. CC, contrato de opção (diferente preferência), concurso para celebração de um contrato. Concurso para a celebração de um contrato – um ou mais atos jurídicos destinados a promover o aparecimento de uma pluralidade de interessados na conclusão de um contrato e, depois, a facultar por escolha, a seleção de um deles, para a celebração em causa. Os elementos essenciais são a existência de pluralidade de interessados e a escolha. Independentemente do objetivo, o concursopara a celebração de um contrato comporta várias modalidades. Essas modalidades podem ser consoante o contrato em jogo e os funcionários. Negócios mitigados (categoria de negócios típicos, mas não necessariamente preparatórios): i) Acordo de cortesia – convenção relativa à matéria não-patrimonial com relevância do mero trato social. Pode recair sobre a hora e o local de um encontro, sobre questões protocolares ou sobre ajustes convenientes por um convívio agradável, dentro e fora da contratação jurídica, ou seja, sobre uma matéria que não tem conteúdo patrimonial. Ele origina uma obrigação legal de proteção, o que leva a que o acordo de cortesia que seja subtraído apenas para provocar danos pode dar azo a situações comuns de responsabilidade civil. ii) Acordo de cavalheiros – convenção que as partes pretenderam colocar fora do campo do Direito. É mais adstringente do que qualquer vinculo jurídico, porque o cavalheiro honrará sempre a palavra dada, quaisquer que sejam as circunstancias e o preço. O acordo de cavalheiros deixará de o ser se os interessados não se comportarem como tal iii) Contratos mitigados stricto sensu – durante o espaço entre a completa ausência de compromissos e o contrato-definitivo, as partes podem estabelecer vínculos mais Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL lassos, de conteúdo variável e que teriam em vista uma futura composição de interesses. Processo de formação dos contratos O modelo básico de formação do negocio jurídico, consagrado no CC, assento num processo de formação do contrato, processo esse que postula uma situação na qual, entre as declarações de vontade dos dois intervenientes, medeia um lapso de tempo juridicamente relevante. Tecnicamente, trata-se de um contrato entre ausentes, porém, apenas está em causa uma proposta cuja aceitação não é dada de imediato, o que significa que o Direito deve caracterizar as duas declarações que existem (papel dos art.224º e 228º a 235º CC). Desvios perante a realidade do esquema de formação do contrato entre ausentes previsto no CC: i) Limita-se ao contrato com duas partes ou bilateral ii) Ignora os contratos entre presentes, em particular os concluídos por comportamentos concludentes ou por simples adesão de uma oferta ao publico, os fechados por telefone ou meio equivalente e os convénios formalizados perante notário ou agente dotado de poderes similares Proposta – declaração feita por uma das partes e que, uma vez aceite pelas outras, dá lugar ao aparecimento de um contrato. Deve reunir três requisitos: a) Completude: tem de abranger todos os pontos a integrar no futuro contrato; faltando algum elemento e ainda que a outra parte o viesse a completar, não haveria, sobre ele, o consenso necessário b) Firmeza: a proposta deve ser firme, não existindo quando a declaração do “proponente” seja feita em termos dubitativos ou hipotéticos, uma vez que a simples aceitação da proposta leva ao aparecimento do contrato, sem que, ao declarante, seja dada nova oportunidade de exteorizar a vontade c) A forma requerida para o negocio – a forma do contrato é a forma das declarações em que ele assente. Nas hipóteses em que não seja possível distinguir uma proposta e uma aceitação, fica claro que os requisitos para que haja proposta, se devam reportar ao objeto que mereça o assentimento dos contraentes ou que ambos façam o seu. Convite a contratar – declaração pela qual uma pessoa se manifesta disposta a iniciar um processo de negociação com vista à futura eventual conclusão de um contrato, mas sem se vincular, nem à sua conclusão, nem a um seu conteúdo já completamente determinado. Ou seja, é um ato finalisticamente orientado à abertura de uma negociação. O seu autor mantem uma liberdade que não tem na proposta de contrato, pois pode modificar o conteúdo do projeto contratual inicialmente formulado e pode, no final, desistir de contratar. O seu autor não se constitui numa sujeição, nem investe a pessoa a quem foi dirigido num poder Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL potestativo de aceitar, provocando a conclusão de um contrato; a aceitação de um convite a contratar tem como consequência o iniciar de uma negociação com vista à celebração de um contrato, e vincula as pessoas envolvidas apenas ao dever de BF (art.227ºCC). Pode ser dirigido ao publico ou a pessoas concretamente identificadas, ou ainda a certas classes de pessoas ou a pessoas determinadas segundo critérios gerais. A eficácia contratual consiste em promover, na esfera do destinatário, o direito potestativo de, pela aceitação, fazer nascer o contrato proposto. Duração da proposta contratual // Art.228ºCC Regimes de duração da vinculação do proponente: • Se, na proposta, for estipulado um prazo para aceitação, o proponente fica vinculado até ao termo desse prazo (art.228º/1, al.a) CC) • Se, na proposta, for pedida resposta imediata, a vinculação do proponente mantém-se durante o tempo que, em condições normais, demorem a proposta e a respetiva aceitação a chegar aos respetivos destinatários (art.228º/, al.b) CC) • Se, na proposta, não for estipulado qualquer prazo, e esta for feita a pessoa ausente ou for feita por escrito a pessoa presente, a vinculação do proponente manter-se-á até cinco dias após o tempo que, em condições normais, demorem a proposta e a respetiva aceitação aos respetivos destinatários (art.228º/1, al.c) CC) O período de duração das propostas contratuais deve ser determinado em abstrato e tendo em conta o meio utilizado pelo proponente para enviar a sua declaração: se for utilizado um meio de comunicação rápido (ex.: telegrama, fax ou mail), a duração será inferior do que a duração caso seja utilizado o correio, havendo, neste caso, que se distinguir o tipo de correio e a distância. Segundo Menezes Cordeiro, para a determinação do tempo de demora normal da comunicação da proposta e da aceitação, tem de ser ao sistema das notificações postais judiciais dirigidas a advogados, instituído pelo DL 121/76, 11 de fevereiro, hoje contido no art.254º CPCiv. De acordo com o sistema, a receção presume-se ocorrida no terceiro dia posterior ao do registo da carta, ou no primeiro dia útil seguinte, quando aquele seja um domingo ou feriado. Esta presunção pode ser ilidida pelo recetor, se a receção ocorrer em data posterior, mas não o pode ser pelo expedir se decorrer em data anterior. MC defende ainda que essemesmo prazo pode ser transposto para as propostas contratuais remetidas pelo correio. Modos que conduzem à extinção da proposta i) Decurso do prazo – extingue, por caducidade, a proposta atingida. Os prazos comuns aplicáveis resultam do art.228º/1 CC. Caso o proponente declare que a sua proposta se mantem indefinidamente, propõe-se, analogicamente, a aplicação do art.411ºCC, em que o proponente pode solicitar ao tribunal a fixação de um prazo para que o destinatário aceite ou rejeite; passado tal prazo, segue-se a caducidade da proposta, nos termos gerais ii) Revogação – ato unilateral, praticado pelo proponente, que tem por conteúdo a extinção da proposta previamente emitida, e só é possível enquanto não houver Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL contrato. A revogação, segundo o art.230ºCC, é viável em duas hipóteses: quando o proponente se tenha reservado a faculdade de revogar, ou quando a revogação se dê em moldes tais que seja, pelo destinatário, recebida antes da proposta, ou ao mesmo tempo com esta iii) Aceitação ou rejeição – a aceitação faz desaparecer a proposta, promovendo a integração no contrato. A rejeição conduz ao mesmo resultado, desta feita por renuncia, do destinatário, ao direito potestativo de aceitar a proposta em jogo; a morte ou incapacidade do proponente, havendo fundamento para presumir ser essa a sua vontade ou se tal resultar da própria declaração, a morte ou incapacidade do destinatário, ou a ilegitimidadesuperveniente do proponente, desde que anterior à receção da proposta, são também formas de extinção da proposta contratual iv) Anulação ou impossibilidade absoluta superveniente Oferta ao publico • Modalidade particular da proposta contratual caracterizada por ser dirigida a uma generalidade de pessoas. • Requisitos: i) Completude ii) Intenção inequívoca de contratar/firmeza iii) Apresentar-se da forma requerida para o contrato a celebrar • Distingue-se: a) Convite a contratar (as entidades interessadas podem incitar pessoas indeterminadas a contratar; não há oferta ao publico quando o “convite” não compreenda todos os elementos para que, da sua simples aceitação, surja o contrato b) Proposta feita a uma pessoa desconhecida ou de paradeiro ignorado (proposta comum, com destinatário especifico, de quem se desconhece a identidade ou paradeiro, procedendo-se, neste caso, a um anuncio publico nos termos do art.225ºCC) c) Clausulas contratuais gerais (não surgem como proposta e implicam uma rigidez que não enforma, de modo necessário, a oferta ao publico) • Surge como modo idóneo de proporcionar muitos contratos com um mínimo de esforço e de custos, por parte dos celebrantes. Pode ser formulado através de qualquer meio suscetível de demonstrar uma intenção de contratar, completa e efetiva (ex.: catálogos, tabuletas, anúncios, …), e perante uma eventual aceitação, resulta logo um contrato. • O CC não se ocupou, de modo expresso, da oferta ao publico, exceto para regular a sua extinção, referido no art.230º/3CC Convite à oferta – o “proponente” declara-se pronto a receber propostas que, depois, poderá aceitar. Pode dizer-se que nesta modalidade mais delimitada do convite a contratar, falta a firmeza, portadora da vontade de vinculação. São particularmente frequentes na net, em que as “aceitações” dos interessados devem ser (re)confirmadas pelos oferentes: mesmo quando existam “propostas” completas, a sua efetivação depende de haver merecedoras em stock, de ser viável o envio ou de ser obtida licença bancária para o pagamento. Apesar de não ser Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL vinculativo, o convite à oferta insere-se numa lógica pré-negocial, por vezes muito precisa, ao solicitar, em grau variável, mas sempre efetivo, o principio da BF Aceitação • Declaração recipienda, formulada pelo destinatário da proposta negocial ou por qualquer interessado; quando haja uma oferta ao publico, cujo conteúdo exprima uma total concordância com o teor da declaração do proponente • Características: - Concordância total e inequívoca - Revestir a forma exigida para o contrato • Requisitos i) Conformidade ii) Tempestividade iii) Suficiência formal • Pode ser expressão ou tácita (art.217º/1CC) • Receção tardia (art.229ºCC): ocorre quando a aceitação comece a produzir efeitos apenas quando a proposta já não tenha eficácia; quando acontece, não há, de imediato, qualquer contrato, já que a conclusão de um negocio contratual exige que a proposta e a aceitação se encontrem em plena eficácia. • Art.235º/2CC: pode ser revogada, devendo a declaração revogatória chegar ao poder do proponente, ou ser dele conhecida, em simultâneo com a aceitação ou antes dela • Quando se torna eficaz, nos termos do art.224ºCC, o contrato tem-se por celebrado (a conclusão do contrato pode fixar o momento do inicio dos seus efeitos) • A aceitação com “…aditamentos, limitações ou outras modificações” implica a sua rejeição, porque esta deve traduzir uma total aquiescência quanto à proposta; qualquer alteração introduzida nesta pelo destinatário bloqueia a imediata formação do contrato, já que não houve o consenso de ambas as partes Rejeição • Ato unilateral pelo qual o declaratário recusa a proposta contratual, renunciando ao direito a que dera lugar • Pode ser expressa ou tácita • Pode ser revogada, sendo, por consequência, substituída pela aceitação, desde que a competente declaração chegue ao poder do proponente, ou dele seja conhecida, ao mesmo tempo que a rejeição (art.235º/1CC) Contraproposta – proposta contratual que tem apenas como particularidade o implicar a rejeição de uma primeira proposta, de sinal contrário. Deve ser completa, firme e assumir a forma requerida para o contrato. Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL Uma aceitação parcial não dá resultado nem ao contrato nem a uma contraproposta, porque a aceitação parcial diz-nos que não há acordo sobre toda a matéria da proposta e que, no remanescente, nada de concreto é contraposto. Art.234º (dispensa de declaração de aceitação): • Teve como fonte o §151 do BGB • A formação de um contrato “sem declaração de aceitação” pode traduzir-se materialmente em: a) Atos de apropriação (ex.: abertura de paginas de um livro, escrever o nome, também num livro, ou a colocação de pão num cesto) b) Atos de cumprimento (ex.: reserva de um hotel, colocação de dinheiro num autómato ou execução de um negocio) c) Atos concludentes (ex.: trafego de massas) • São especificadas três hipóteses: i. Proposta: o proponente pode dispensar a declaração de aceitação, mas nunca a eventual aceitação; nessa eventualidade, que deve passar pelo crivo da tutela do consumidor e pela BF, indicará qualquer outra via de aquiescência ii. Circunstancias do negocio: abertura a comportamentos concludentes e aos atos de apropriação e atos de cumprimento iii. Usos: o CC admite-os apenas quando há remissão legal e não sejam contrários ao sistema • Levanta problemas de construção e de explicação dogmáticas, surgindo duas teorias: a teoria do exercício da vontade, segundo a qual o preceito não visaria qualquer manifestação de vontade, para a conclusão do negocio; a teoria da dispensa de comunicação ou do destinatário, defendendo que existiria uma declaração de vontade, exteorizada de alguma forma, mas sem necessidade de enio ao proponente • A dispensa de declaração de aceitação consiste numa autodeterminação sem comunicação ao proponente • São inaplicáveis, nestas condições, os art.234º, 235º, 240º a 243º, 258º a 269º e, em geral, as diversas clausulas que extravasem o núcleo simples do contrato. São aplicáveis os 236º a 239º e os 245º a 257º. Em compensação , ganham peso as regra sobre o ónus da prova: na falta de declaração, cabe à parte que queira invocar ou prevalecer-se do negocio, alegar e demonstrar as competentes atuações. O tema da natureza das declarações contratuais leva a uma discussão doutrinaria, devido à existência de múltiplas teorias sobre negócios e atos jurídicos, com influxo direto nas soluções preconizadas. Menezes Cordeiro defende que a proposta contratual é um negocio jurídico unilateral, pelo menos sempre que o contrato visualizado pelo proponente tenha natureza negocial. Quando tal não suceda, a proposta será um ato jurídico stricto sensu. ➢ A proposta é eficaz: produz efeitos de direito e, designadamente, faz surgir, na esfera do destinatário, o direito potestativo à aceitação; é um facto jurídico lacto sensu Márcia Cabral Barroso, 1º ano FDUL ➢ A proposta é livre: o proponente formula-a se quiser, atuando ao abrigo da sua autonomia privada; há liberdade de celebração, pelo que a proposta se articula como um ato jurídico lato sensu ➢ O conteúdo da proposta é livre: o proponente pode inserir na proposta as clausulas que entender; há liberdade de celebração, surgindo, límpido, um NJ MC defende ainda que a aceitação é, em conjunto com a rejeição e a contraproposta, um negocio unilateral. Contratação automática e eletrónica A contratação por autómato ultrapassou o Direito, por ter sido construído um modelo contratual que dispensasse a presença de um dos atuantes. Surgem, encarado o problema, duas teorias: I. Teoria da oferta automática: a simples presença de um autómato pronto a funcionar, mediante adequada solicitação feita por