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DESCRIÇÃO A produção do conhecimento e o desenvolvimento científico nas áreas de saber do profissional de Educação Física. PROPÓSITO Compreender as múltiplas áreas científicas em que o profissional de Educação Física pode atuar de modo a facilitar a escolha e ampliar as possibilidades de atuação profissional. OBJETIVOS MÓDULO 1 Reconhecer a evolução histórica de construção do conhecimento da Educação Física MÓDULO 2 Identificar a produção científica da aprendizagem, do controle motor e da psicologia do esporte MÓDULO 3 Reconhecer as pesquisas das ciências biológicas aplicadas desde a fisiologia humana até às respostas metabólicas ao exercício INTRODUÇÃO Os três pilares de uma Universidade são o ensino, a extensão e a pesquisa, e estes devem caminhar sempre juntos. A célebre frase do Dr. Carlos Chagas Filho (1910 – 2000), expoente da ciência brasileira, ressalta a importância da pesquisa científica para a transferência de conhecimento através das estratégias pedagógicas de ensino e aprendizagem: “Na Universidade se ensina porque se pesquisa!” Imagem: Shutterstock.com Pilares universitários. A produção do conhecimento por meio das diferentes linhas de pesquisa na Educação Física é fundamental para o seu crescimento individual e profissional, permitindo a construção da capacidade de reflexão sobre diversos desafios. Um olhar crítico favorece a proposição de soluções e avanços que podem beneficiar toda a comunidade que nos cerca e a sociedade como um todo. A pesquisa gera conhecimento e desenvolvimento intelectual, profissional e tecnológico. NESTE CONTEÚDO, DISCUTIREMOS O PAPEL DO PROFISSIONAL NA PRODUÇÃO CIENTÍFICA DAS DIFERENTES LINHAS DE PESQUISA DA EDUCAÇÃO FÍSICA. ESTUDAREMOS AS MÚLTIPLAS POSSIBILIDADES, PASSANDO PELAS CIÊNCIAS APLICADAS AO MOVIMENTO HUMANO E PELA COMPREENSÃO DO COMPORTAMENTO MOTOR HUMANO E DAS RESPOSTAS FISIOLÓGICAS, BIOQUÍMICAS E METABÓLICAS FRENTE AO EXERCÍCIO. MÓDULO 1 Reconhecer a evolução histórica de construção do conhecimento da Educação Física O contexto histórico das primeiras escolas de Educação Física no Brasil teve grande influência nas linhas de estudo e pesquisa nessa área, especialmente até a década de 1980. As primeiras escolas destinadas à formação de profissionais de Educação Física surgiram no final da década de 1930, com a fundação da Escola Nacional de Educação Física e Desportos − integrada à Universidade do Brasil, com gestão federal − e da Escola de Educação Física do Estado de São Paulo, com gestão estadual. A partir da década de 1980, os conhecimentos da Educação Física, especialmente nas áreas das ciências humanas e sociais, se ampliaram. A regulamentação da profissão, em 1998, representa um marco, colocando a Educação Física como um meio de promoção de cultura, inclusão social, desenvolvimento humano e sinônimo de vida saudável. 1930 O cenário político-cultural da época estava permeado pelos pensamentos higienistas e militaristas, que foram determinantes para a produção de conhecimento nessa área durante as décadas seguintes. javascript:void(0) Foto: Patricia Figueira / Wikimedia Commons / CC BY-SA 2.0 Universidade do Brasil. O envolvimento dos profissionais de Educação Física na produção científica, principalmente nas áreas das ciências biológicas, vem ganhando cada vez mais relevância. A Educação Física é uma ciência que não só promove saúde, mas também é uma importante estratégia na prevenção de doenças, tendo fundamental participação no desenvolvimento humano e nas manifestações culturais e desportivas que envolvem o movimento corporal. A HISTÓRIA DA ATIVIDADE FÍSICA SE CONFUNDE COM A HISTÓRIA DO HOMEM As atividades humanas na Pré-história dependiam do uso do corpo. Nas culturas primitivas, as sociedades eram nômades, caçadoras e coletoras, por isso os humanos dependiam de capacidades físicas como força, velocidade e resistência para sobreviver. Dentre as características que nos tornaram melhor adaptados ao ambiente, podemos destacar a capacidade de preensão manual em função do polegar opositor, o que representou uma vantagem psicomotora ao permitir a manipulação dos objetos através da motricidade refinada. Imagem: Shutterstock.com Homem pré-histórico. COMO NÓS SABEMOS DISSO TUDO? RESPOSTA Podemos dizer que a base de todo conhecimento da nossa história é fundamentado arqueologicamente em evidências. O que se sabe decerto é fragmentado e representa recortes da realidade, que provavelmente foi mais complexa, mas é o esforço racional, criterioso e metodológico da ciência que permite a produção de conhecimento. IMPORTÂNCIA DE SE CONHECER A HISTÓRIA É fundamental conhecer a própria história, de modo a não repetir os erros do passado e consultar as experiências anteriores para solucionar novos problemas a partir de soluções conhecidas. Foto: Shutterstock.com Exercícios educativos. A evolução das metodologias de ensino da natação, por exemplo, pode ser usada para demonstrar a importância de se conhecer a história. Dentre as concepções pedagógicas do ensino, a concepção analítica se caracteriza pela sistematização de métodos e pela organização das estratégias por meio do uso de exercícios como forma de aprendizagem, incluindo a figura do professor como mediador do processo − fatores que representam pontos positivos dessa concepção. Essa concepção, no entanto, pode ser excessivamente mecanizada, reduzindo toda a natação e adaptação ao meio líquido a movimentos isolados, inclusive separando o próprio aprendiz do meio líquido. Dentre as abordagens utilizadas no final do século XVIII e início do século XIX, incluiu-se o uso de “engenhocas” para ensinar movimentos da natação fora da água, a chamada “natação a seco”. Atualmente, sabemos que tais estratégias são pouco eficazes para ensinar um iniciante a nadar ou se adaptar ao meio aquático. COMENTÁRIO Caso você tenha a ideia “revolucionária” de construir um equipamento para ensinar pessoas que têm medo de água a nadar fora dela, saiba que isso já foi tentado antes, sem muito sucesso. Assim, o conhecimento da história garante que você não perca tempo repetindo um erro do passado. CONSTRUÇÃO DA HISTÓRIA A produção de conhecimento sobre qualquer aspecto da história envolve um esforço documental. É um trabalho de levantamento de dados e documentos históricos e visitas a bancos de informações públicas e privadas. Para isso, você precisa utilizar outros campos de conhecimento, incluindo o estudo das práticas corporais nas perspectivas da sociologia, da antropologia ou da filosofia. É NECESSÁRIO ESTUDAR OS CONTEXTOS DE CADA ÉPOCA − ASPECTOS CULTURAIS, MORAIS E COMPORTAMENTAIS − PARA GARANTIR A FIDELIDADE DAS INFORMAÇÕES. Foto: Shutterstock.com História do futebol. Cabe ao historiador reunir elementos que permitam recontar, recriar cenários e revelar novas informações da nossa história. Para isso, é preciso se despir dos valores e conhecimentos contemporâneos; o passado não pode ser julgado com a cabeça do presente. Ao mesmo tempo, enquanto campo de pesquisa, a história busca narrar os mais importantes fatos e acontecimentos passados na sociedade humana e debater as relações existentes entre eles. Assim, a História, como ciência, é um campo de pesquisa e produção de conhecimento legítimo e necessário, pois quanto melhor conhecermos nosso passado, mais bem preparados estaremos para os desafios futuros. HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA Os cursos de Educação Física no Brasil oferecem, em seus currículos, a disciplina História da Educação Física, que aborda um conteúdo normalmente dividido em cinco grandes períodos: O primeiro período aborda a Pré-história, desde o aparecimento do homem até a antiguidade oriental. O segundo período, denominado Clássico, recebe grande ênfase em função das influências ainda presentes nos dias atuais, e inclui os relatos da cultura do esporte e do movimento da Grécia antiga até o Império Romano. O período que abrange a Idade Média é chamadode período Medieval, época em que o uso do corpo e as manifestações culturais associadas ao movimento são desvalorizados. O quarto período compreende do Renascimento até o século XIX. O quinto e último período corresponde à história contemporânea, que retrata desde o século XX até os dias atuais. Jogos na Grécia Antiga. A oferta dessa disciplina nos cursos ressalta a relevância desse conhecimento e, consequentemente, a necessidade da contínua produção de informações para documentar a história da Educação Física. DICOTOMIA ENTRE A TEORIA E A PRÁTICA No Brasil, os médicos e militares foram os atores principais da construção histórica da Educação Física e da organização e produção de conhecimentos que fundamentam essa atuação profissional. Coube aos médicos a produção e organização do conhecimento teórico através de estudos científicos. Os militares produziram manuais para a prática da ginástica, compondo, assim, as primeiras orientações sobre as práticas na Educação Física. Foto: Shutterstock.com Cabo de guerra. INFLUÊNCIA MILITAR NA CONSTRUÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA A chegada da família real, em 1808, marcou o início da sistematização do conhecimento em várias áreas do saber no Brasil, especialmente em função da criação de muitas instituições públicas, como a Biblioteca Nacional, a Escola de Medicina e a Academia Militar Real. O início da sistematização da ginástica se deu na Academia Militar Real, sob a influência dos métodos ginásticos alemães e com a contratação de instrutores alemães para o treinamento de militares brasileiros. VOCÊ SABIA No antigo Ginásio Nacional − atual Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro − ocorreu, em 1837, a inclusão da ginástica no currículo escolar, com a aplicação do método alemão por instrutores de origem militar. Posteriormente, em 1854, a ginástica se tornou obrigatória no ensino primário e a dança, no ensino secundário. PRODUÇÃO TEÓRICO-CIENTÍFICA NO BERÇO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRASIL As primeiras pesquisas publicadas no Brasil se deram por meio do esforço de médicos e estudantes da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, que em 1845 produziram uma das primeiras teses destacando a importância da atividade física: Algumas considerações sobre a Educação Física. Os estudos dessa época já reconheciam a importância da atividade física e defendiam que sua prática pode promover o aprimoramento físico, a saúde e um maior controle do uso do corpo e seus movimentos. TAMBÉM ERA DEFENDIDA A IDEIA DE QUE A ATIVIDADE FÍSICA PODERIA AUXILIAR NO EQUILÍBRIO DAS EMOÇÕES, ESPECIALMENTE COM O INTUITO DE CONTROLAR OS VÍCIOS E INSTINTOS DESTRUTIVOS, DE ACORDO COM OS CONCEITOS CULTURAIS EXISTENTES. FORMAÇÃO DOS PRIMEIROS INSTRUTORES Para atender à obrigatoriedade, os primeiros instrutores foram formados pela Academia Real Militar e pela Escola Normal da Corte. Dentre esses instrutores, Arthur Higgins ganhou destaque com a publicação de um compêndio de ginástica escolar, publicado em 1896, que se tornou referência na época. Foto: Shutterstock.com A obra de Higgins está alinhada ao discurso cultural do Brasil do final do século XIX, que traz uma concepção higienista para a Educação Física, na qual as atividades físicas são creditadas como ações para a regeneração da sociedade da época. Apesar de Higgins ser civil, suas ideias eram alinhadas ao militarismo e, de fato, até os anos 1930, eram os militares que compunham a maioria dos instrutores de ginástica no Brasil. No início do século XX, porém, o método alemão foi gradualmente substituído pelo método francês − em função da influência de militares franceses −, cujo princípio está orientado pela fisiologia. AO COMPREENDER A EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRASIL, É POSSÍVEL PERCEBER QUE MUITAS DESSAS INFLUÊNCIAS AINDA PODEM SER OBSERVADAS ATUALMENTE, EM VÁRIOS CONTEXTOS CULTURAIS E SOCIAIS. ESSE EMBASAMENTO É FUNDAMENTAL PARA O FUTURO DA ATUAÇÃO PROFISSIONAL, POIS CERTAMENTE PODE INFLUENCIAR A PRODUÇÃO DE NOVOS CONHECIMENTOS E A CONTÍNUA EVOLUÇÃO. EUGENIA ATRAVÉS DA EDUCAÇÃO FÍSICA Como vimos, a influência militar no início do século XX disseminou e sistematizou nacionalmente a prática de atividades físicas. Por meio de várias instituições públicas militares recém-criadas − como o Centro Militar de Educação Física do Exército na Vila Militar, no Rio de Janeiro, e outros centros regionais em São Paulo e Minas Gerais −, fundamentou-se na prática da ginástica não só para atingir objetivos na promoção da saúde, mas também para alcançar ideais de eugenia. SAIBA MAIS Os ideais de eugenia são parte dos objetivos higienistas da Educação Física no começo do século, e marcam um período triste na história da profissão. São construídos a partir de conceitos morais intuindo a melhoria e a regeneração da raça branca, restringindo a proliferação de homens considerados inferiores. Segundo a teoria, a prática de atividades físicas promoveria a higiene do corpo e do espírito, produzindo indivíduos fortes, equilibrados, inteligentes e bonitos, com mais capacidade de ter filhos e, assim, conquistar gradualmente uma predominância na sociedade. PIONEIROS DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRASIL Já no século XIX, a Educação Física figurava como matéria dentre as propostas de programas para a reformulação do ensino da época. Essa discussão ocorreu na esfera política, tendo Rui Barbosa (1849-1923) como o relator de pareceres elaborados para fins de diagnóstico da educação brasileira, apresentados à câmara de deputados em 1882 e 1883. Durante o período do Estado Novo, entre os anos 1930 e 1940, as obras de Rui Barbosa são retomadas para fundamentar a importância da Educação Física no currículo escolar, e a prática de Educação Física tornou-se obrigatória na Constituição de 1937. Sendo assim, o Ministério da Educação, então gerido por Gustavo Capanema, junto a um grupo autodenominado Pioneiros da Educação Física no Brasil, criou a Divisão de Educação Física, órgão vinculado ao ministério e dirigido pelo Major João Barbosa Leite. Foto: Fitz Gerald / Wikimedia Commons / Domínio Público Rui Barbosa. Em 1943, esse órgão reconheceu Rui Barbosa e Jorge de Morais − médico, professor e político brasileiro − como os vanguardistas da Educação Física no Brasil, ressaltando a importância de sua produção para a compreensão das práticas desportivas, os exercícios físicos e o conhecimento do movimento e do corpo como práticas higienistas e moralizantes. A prática da ginástica foi inserida, então, nos currículos escolares e equiparada às outras disciplinas, cuja fiscalização coube à Divisão de Educação Física. Além disso, o órgão ainda procurou normatizar metodologicamente o ensino, com ascensão e influência do método francês de ginástica. CURSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA Rui Barbosa (no final do século XIX), Jorge de Morais (no início do século XX) e Fernando de Azevedo defenderam a criação de cursos de formação de professores de Educação Física, o que se concretizou no final dos anos 1930. COMENTÁRIO Apesar disso, a formação de professores permaneceu por muitos anos pouco normatizada pelo Estado e carente de legitimação de um campo disciplinar. Fernando de Azevedo se apoiou na obra de Rui Barbosa para se tornar um dos maiores defensores da Educação Física baseada na ciência e na pedagogia. Preocupado com a formação dos professores que atuavam nas escolas brasileiras na época, ajudou a promover, desde os anos 1920, o debate sobre a necessidade da formação de professores de Educação Física. COMO PODEMOS PERCEBER, NOSSA PROFISSÃO TEM UMA HISTÓRIA RECENTE E SUA ESTRUTURAÇÃO É ESTIMULADA POR INTELECTUAIS, POLÍTICOS, MÉDICOS E MILITARES RESPONSÁVEIS PELA ORGANIZAÇÃO INICIAL DA PROFISSÃO. ATIVIDADE FÍSICA PARA A SOCIEDADE CIVIL Durante o governo de Getúlio Vargas, em 1933, o Centro Militar de Educação Física foi transformado em Escola de Educação Física do Exército, e representou a base da formação de profissionais civis. Nessa escola, foram formados osprimeiros professores que compuseram o corpo docente da Escola Nacional de Educação Física e Desportos da Universidade do Brasil. No entanto, foram ainda os médicos e militares os principais gestores dessa escola e, consequentemente, os norteadores das concepções acerca da nossa profissão à época. Foto: esefex.eb.mil.br Escola de Educação Física do Exército. ESPORTE COMO CONTEÚDO HEGEMÔNICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA Após a Segunda Guerra Mundial, o esporte tomou gradualmente o papel hegemônico na Educação Física escolar, com a intenção de iniciar os alunos em diferentes esportes. Nesse cenário, a aptidão física era vista como referência da orientação pedagógica, influenciando a produção de conhecimento até o final do regime da ditadura militar no Brasil. OS MÉTODOS EDUCATIVOS PASSARAM A TER CARÁTER COMPETITIVO, PARTINDO-SE DO PRESSUPOSTO QUE A SOBREVIVÊNCIA E O SUCESSO INDIVIDUAL REQUEREM COMPETITIVIDADE. Esses aspectos influenciaram a produção de conhecimento, negligenciando a cultura corporal do movimento e impedindo a valorização do esporte como manifestação cultural e sem viés competitivo. Foto: Shutterstock.com Jogo de capoeira. As lutas, por exemplo, podem ser ensinadas com a ideia de que luta-se com o outro, não contra o outro. Essa reflexão é especialmente clara na capoeira, que é considerada uma manifestação cultural e não uma luta e, assim como na dança, exige expressões corporais além de habilidades desportivas. TRANSFORMAÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA Na década de 1970, a Educação Física inicia um movimento em busca de uma identidade e independência profissional, ampliando a produção de conhecimento e se aproximando das áreas da educação, iniciando a redução da abordagem tecnicista. A partir da década de 1980, a Educação Física começa a ganhar uma perspectiva de prática social. A produção intelectual, a partir dessa época, passou a valorizar outras possibilidades de trabalho do profissional de Educação Física, negando a competitividade exagerada e o reducionismo biológico referente ao uso do corpo. SAIBA MAIS Nesse período, muitas pesquisas aprofundaram discussões sobre a cultura corporal e os aspectos pedagógicos, socioantropológicos e de promoção de saúde, consolidando essas pautas como linhas de pesquisa e produção de conhecimento na Educação Física. Essas perspectivas para a atuação levaram à reformulação dos currículos escolares e da formação profissional. Esse debate iniciou um processo de mudanças, que incluiu a valorização da formação de um profissional capaz de atuar em um ambiente interdisciplinar. Para isso, foi necessária uma maior organização curricular, que dialogasse com os vários departamentos, institutos e setores nas universidades, estreitando as relações entre ensino e pesquisa. Essas mudanças influenciam ainda nos dias atuais, na formação e na adesão a programas de pós-graduação e na produção de conhecimento em várias áreas do saber. Imagem: Shutterstock.com Ambiente interdisciplinar. MATRIZ PEDAGÓGICA Pedagogia é uma atividade, um conjunto de estratégias e ferramentas a respeito do que fazer com a educação e, nesse sentido, as práticas pedagógicas representam os meios para a formação educacional. Imagem: Shutterstock.com A pedagogia é um conjunto de estratégias. A literatura divide a atuação do profissional de Educação Física em dois grandes grupos: MATRIZ CIENTÍFICA Que reconhece a Educação Física como área de conhecimento científico. MATRIZ PEDAGÓGICA Que reconhece a atuação como prática de intervenção pedagógica. javascript:void(0) javascript:void(0) EM CONJUNTO, A EDUCAÇÃO FÍSICA PODE SER CONCEBIDA COMO UM CAMPO DINÂMICO DE PESQUISA E REFLEXÃO. Na Educação Física escolar, as práticas pedagógicas são fundamentais para a formação sociocultural dos alunos, além dos aspectos relacionados ao movimento corporal. Entretanto, para além da escola, a partir do reconhecimento da sociedade, da valorização das diferentes manifestações culturais desportivas e da sua importância na promoção da saúde, as práticas pedagógicas também se tornam uma ciência relevante. Ciência essa que pode intervir para maximizar os resultados e o rendimento desportivo de atletas profissionais e amadores. Anatomia muscular na ciência do esporte. Surge, assim, a ciência do esporte, cuja preocupação passa por investigar, identificar e propor métodos pedagógicos mais eficazes para o ensino dos esportes, desde a iniciação até a especialização e o refinamento de atletas. ATENÇÃO Quanto melhor for o seu conhecimento sobre as estratégias pedagógicas de ensino dos esportes em que estiver envolvido na sua atuação profissional, melhores serão os resultados obtidos pelos seus alunos, clientes e atletas. CULTURA CORPORAL DE MOVIMENTO Nas últimas décadas, ocorreu uma ascensão da cultura corporal esportiva. Atualmente, os esportes em suas diversas modalidades − como danças, ginásticas, artes marciais e jogos coletivos − são importantes produtos de consumo. Os múltiplos canais de mídia tornam as informações imediatamente disponíveis para todos, o que é uma vantagem, por tornar o acesso à cultura corporal do movimento amplamente disponível. No entanto, reforça a necessidade de aprimoramento contínuo dos métodos de ensino, por formar um público consumidor cada vez mais exigente. Imagem: Shutterstock.com Cultura corporal do movimento. COMENTÁRIO Um ponto aparentemente contraditório é o fato de o estilo de vida de boa parte da população ainda não valorizar ou permitir espaço para a cultura corporal de movimento. Apesar de as informações sobre a importância das práticas de esporte e lazer para a saúde estarem o tempo todo nas mídias, a urbanização precária e descontrolada, a ausência de espaços públicos para prática de esportes e lazer, a violência, a poluição e a alimentação inadequada, dentre outros fatores, levam grande parcela da população ao sedentarismo. O aumento do tempo de tela, por parte das crianças, com os múltiplos aparelhos eletrônicos atualmente disponíveis, favorece o abandono da cultura dos jogos infantis, substituindo a experiência da atividade física pelo consumo dos jogos eletrônicos ou apenas vídeos de esporte. Essas mudanças comportamentais reforçam a responsabilidade do profissional de Educação Física de perseguir continuamente a excelência, a adaptação e a produção de metodologias que promovam o engajamento da população na prática esportiva. FINALIDADES DA EDUCAÇÃO FÍSICA Tendo em vista esse novo contexto social, as finalidades da Educação Física e suas práticas pedagógicas devem ser repensadas. O papel do profissional de Educação Física, mesmo em sua atuação como bacharel fora do ambiente escolar, é de assumir a responsabilidade de formar um indivíduo capaz de se posicionar criticamente diante da cultura corporal do movimento. Imagem: Shutterstock.com Manifestações desportivas. Desse modo, o profissional pode colaborar com a integração do cidadão nas mais diversas manifestações culturais, desportivas e promotoras de aptidão física, saúde, bem-estar e qualidade de vida. RECOMENDAÇÃO Não cabe apenas ensinar, portanto, as habilidades motoras, os gestos esportivos e as capacidades técnico- táticas e físicas, mas também ensinar o indivíduo a se organizar socialmente para se tornar um sujeito fisicamente ativo. javascript:void(0) PARA ALÉM DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR Quando colocamos a Educação Física como prática pedagógica no âmbito da cultura corporal do movimento, a intervenção e o conhecimento profissional se tornam áreas pedagógicas para além da escola, objetivando a melhoria qualitativa das práticas desportivas e toda a motricidade humana. RECOMENDAÇÃO DE PROTOCOLOS E PRÁTICAS O papel dos profissionais de Educação Física fora da escola inclui auxiliar, por meio das interações professor-beneficiário, o desenvolvimento de todas as possibilidades da cultura corporal do movimento, desde os aspectos do progresso motor até o domínio e a especialização daspráticas desportivas. Para que fique claro que as práticas pedagógicas permeiam a nossa atuação para além da escola, imagine a cinesiologia como conhecimento teórico e prático. Essa ciência estuda e explica o controle do movimento corporal humano, e o objeto “movimento humano” assume formas culturais concretas, como em um estilo ou ritmo musical, que podem ser aprendidos fora de ambientes educacionais escolares. AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS PERMEIAM A EDUCAÇÃO FÍSICA COMO UM TODO. METODOLOGIAS E ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS As metodologias e estratégias pedagógicas representam as ferramentas e os meios utilizados nos processos de ensino e aprendizagem, cujo objetivo sempre deve ser perseguir o desenvolvimento dos alunos e praticantes. As principais estratégias se dão por meio da prática dos esportes com a utilização de: Jogos recreativos, competitivos e cooperativos. Sequências pedagógicas por meio da demonstração, do descobrimento guiado, da resolução de problemas. Jogos de mímica, simbólicos e rítmicos com música. Exercícios em circuito. Deve-se considerar, ainda, o avanço tecnológico e o surgimento de novas formas de comunicação como possibilidades de meios de transformação, incentivo e educação para a prática desportiva. Essas novas ferramentas − como o uso de aplicativos e o atendimento virtual − representam mudanças disruptivas nas relações pessoais e profissionais, permitindo ampliar os campos de atuação, a abrangência e a repercussão da atuação profissional através da orientação, da prescrição de exercícios e da produção de conteúdo. Foto: Shutterstock.com Novas tecnologias de comunicação? METODOLOGIA DE BASE LÚDICA O componente de ludicidade na prática desportiva favorece a iniciação esportiva em qualquer idade, especialmente para crianças e adolescentes. De fato, a escolha de objetivos e estratégias específicas cabe ao professor, e talvez você reconheça de forma mais clara o uso de metodologias lúdicas nas atividades da Educação Física direcionadas às crianças. É comum, no entanto, observarmos em vários clubes, academias ou centro de treinamento a organização de aulas temáticas, eventualmente em datas festivas, colaborando para a socialização, as relações afetivas e a fidelização dos alunos. Foto: Shutterstock.com Metodologias lúdicas. NA SUA ATUAÇÃO PROFISSIONAL, NÃO HAVERÁ LIMITES OU REGRAS ESPECÍFICAS QUANTO À ESCOLHA E AO DESENVOLVIMENTO DE ATIVIDADES LÚDICAS DE ENSINO E AO CONTEXTO CULTURAL. O GRUPO COM QUE VOCÊ TRABALHA E SUA CRIATIVIDADE PODEM PERFEITAMENTE SERVIR DE BASE PARA A PROPOSIÇÃO DE ESTRATÉGIAS E METODOLOGIAS PEDAGÓGICAS DE BASE LÚDICA EFICAZES. PRINCÍPIOS METODOLÓGICOS Qualquer que seja a escolha de estratégias, os conteúdos específicos ou a produção de novas abordagens no processo de ensino e aprendizagem, eles devem respeitar os princípios metodológicos. Foto: Shutterstock.com Inclusão e diversidade. Os conteúdos ou as estratégias devem garantir e privilegiar a inclusão de todos, além de estarem fundamentados na diversidade, sempre que possível. Uma estratégia visando ao ensino e ao aprimoramento deve seguir: PRINCÍPIO DA COMPLEXIDADE CRESCENTE Quanto aos aspectos motores, iniciando a partir dos movimentos fundamentais até a especialização. Sob o ponto de vista cognitivo, deve começar por informações simplificadas até chegar às reflexões críticas. PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO Deve ter como base as características, as capacidades e os interesses individuais. AVALIAÇÃO DAS ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS Qualquer estratégia pedagógica deve ter como fim a promoção do ensino. Dessa forma, é fundamental o acompanhamento das transformações vivenciadas pelos alunos durante todo o processo. Dentre as características fundamentais das atribuições de uma avaliação, deve: Considerar uma avaliação continuada desde o início e ao longo do processo, que englobe vários domínios, além das capacidades físicas e da qualidade dos movimentos. Ser fundamentada em conhecimento científico, permitindo, assim, a elaboração clara de diagnósticos para a orientação da atuação profissional e para a produção de novas estratégias pedagógicas de ensino e métodos de avaliação. INOVAÇÃO DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS O termo “inovação” está associado à experimentação de novas estratégias e metodologias para a contribuição da prática desportiva, da cultura do movimento corporal e da Educação Física na formação de uma sociedade cada vez mais engajada e consciente da importância de um estilo de vida ativo para promoção da saúde em todos os seus aspectos: físico, mental, social, cultural e econômico. ATENÇÃO As inovações pedagógicas em Educação Física podem partir do ambiente escolar, mas podem repercutir na atuação do bacharel em suas atribuições profissionais. No entanto, não é possível definir tecnicamente o que seriam as inovações pedagógicas, devido às multiplicidades de práticas inovadoras e à liberdade que os profissionais devem ter para utilizar novas estratégias. A inovação das práticas pedagógicas em Educação Física cabe aos profissionais dessa área, sendo influenciadas pela história e cultura de cada um. É importante destacar, porém, que estas devem ser centradas nas realidades dos alunos e dos ambientes de intervenção, e direcionadas de acordo com as necessidades, os interesses, as possibilidades e as limitações dos alunos. A PARTIR DE TEORIAS PEDAGÓGICAS CONHECIDAS, A ATUAÇÃO PROFISSIONAL PODE SER RESSIGNIFICADA, ROMPENDO AS IDEIAS TRADICIONAIS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO FÍSICA. A EVOLUÇÃO DA CIÊNCIA APLICADA À EDUCAÇÃO FÍSICA O especialista Wagner Santos Coelho faz um resumo do conteúdo deste módulo. Assista! VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. AO LONGO DA HISTÓRIA, A EDUCAÇÃO FÍSICA FOI DEFENDIDA POR DIFERENTES SETORES DA SOCIEDADE, E SUA IMPORTÂNCIA ESTEVE ASSOCIADA A DIVERSOS FATORES, COMO A PROMOÇÃO DE UMA VIDA SAUDÁVEL E EQUILIBRADA E A VALORIZAÇÃO DO MOVIMENTO E DA CULTURA DO CORPO. ATUALMENTE, É RECONHECIDA COMO UMA ATIVIDADE PROFISSIONAL QUE DEVE DIALOGAR COM VÁRIAS OUTRAS ÁREAS DO CONHECIMENTO. AS MUDANÇAS OCORRIDAS AO LONGO DE TODO ESSE PERÍODO MOLDARAM AS RESPONSABILIDADES E AS EXIGÊNCIAS SOBRE A ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA QUANTO À PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO. SOBRE ESSE ASSUNTO, ESCOLHA A ALTERNATIVA VERDADEIRA: A) A produção de conhecimento no início do século XX foi feita principalmente por instrutores de Educação Física. B) Atualmente, o profissional de Educação Física pode transitar e produzir conhecimento em diversas áreas correlatas. C) Cabe exclusivamente ao profissional de Educação Física produzir todo o conhecimento sobre os benefícios do esporte. D) Os processos de ensino-aprendizagem são amplamente estabelecidos, e não há necessidade de inovações nas práticas pedagógicas. E) Já no final do século XIX, a produção de conhecimento priorizava a cultura do corpo e do movimento. 2. VÁRIOS FATORES QUE OCORRERAM NAS ÚLTIMAS DÉCADAS LEVARAM À VALORIZAÇÃO DA CULTURA CORPORAL DE MOVIMENTO. ATUALMENTE, AS MÍDIAS VIRTUAIS E AS REDES SOCIAIS REPRESENTAM IMPORTANTES MEIOS DE DIVULGAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO, CONSOLIDANDO ESSE MOVIMENTO COMO UM PRODUTO DE CONSUMO. APESAR DISSO, GRANDE PARCELA DA SOCIEDADE AINDA SE ENCONTRA SEDENTÁRIA OU INSUFICIENTEMENTE ATIVA. DENTRE AS ALTERNATIVAS A SEGUIR, ESCOLHA AQUELA QUE NÃO REPRESENTA UM FATOR QUE AINDA FAVORECE UM ESTILO DE VIDA SEDENTÁRIO: A) Alimentação inadequada. B) Ausência de espaços públicos para prática de esporte e lazer. C) Falta de informação. D) Poluição. E) Urbanização precária. GABARITO 1. Ao longo da história, a Educação Física foi defendida por diferentes setores da sociedade, e sua importância esteve associada a diversos fatores, como a promoção de uma vida saudável e equilibrada e a valorização do movimento e da cultura do corpo. Atualmente, é reconhecida como uma atividade profissional que deve dialogar com várias outras áreas do conhecimento. As mudanças ocorridas ao longo de todo esse período moldaram as responsabilidadese as exigências sobre a atuação do profissional de Educação Física quanto à produção de conhecimento. Sobre esse assunto, escolha a alternativa verdadeira: A alternativa "B " está correta. O debate sobre a importância do exercício não é recente, mas por muito tempo essa discussão coube somente a médicos, militares e políticos, que foram os principais responsáveis pela produção de conhecimento na área. À medida que a sociedade civil passou a compor a mão de obra de profissionais de Educação Física e outras questões foram sendo compreendidas, ficou claro que o profissional de Educação Física pode e deve ter uma formação ampla, que permita dialogar com outras áreas do conhecimento, especialmente na área da saúde. 2. Vários fatores que ocorreram nas últimas décadas levaram à valorização da cultura corporal de movimento. Atualmente, as mídias virtuais e as redes sociais representam importantes meios de divulgação e comercialização, consolidando esse movimento como um produto de consumo. Apesar disso, grande parcela da sociedade ainda se encontra sedentária ou insuficientemente ativa. Dentre as alternativas a seguir, escolha aquela que não representa um fator que ainda favorece um estilo de vida sedentário: A alternativa "C " está correta. Atualmente, a informação está amplamente disponível, de forma que a população em geral tem conhecimento sobre os benefícios da prática desportiva. MÓDULO 2 Identificar a produção científica da aprendizagem, do controle motor e da psicologia do esporte CIÊNCIAS BIOLÓGICAS O campo das ciências biológicas pode ser compreendido como uma ampla área de conhecimento que estuda a vida, em todos os seus tipos, formas, aspectos ecológicos e de funcionamento dos organismos. A produção de conhecimento nessas áreas remonta à Antiguidade, e os avanços tecnológicos e o esforço de cientistas produzem novas descobertas, revelando constantemente informações que criam linhas de investigação dentro do campo das ciências biológicas. Dentre esses ramos de investigação, podemos destacar: BIOMECÂNICA BIOQUÍMICA BIOLOGIA MOLECULAR GENÉTICA FISIOLOGIA HUMANA APRENDIZAGEM E O DESENVOLVIMENTO MOTOR FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO ATENÇÃO Você pode presumir que sua atuação profissional − principalmente nos ramos do treinamento físico, da promoção de saúde e da prescrição de exercícios − estará apoiada nos conhecimentos aplicados da fisiologia do exercício, mas existem muitos outros importantes campos de conhecimento, como a bioquímica, a biomecânica e a genética. O MÉTODO CIENTÍFICO A ciência moderna, especialmente nas ciências biológicas, é fundamentada no método científico moderno atribuído a René Descartes (1596- 1650), através da sua obra O discurso do método (1637), embora outros cientistas e filósofos já defendessem ideias semelhantes. A contribuição de Descartes para a produção de conhecimento se dá por meio: Da instrumentalização da natureza Do uso do pensamento lógico-matemático e racional para explicar os fenômenos Da experimentação e observação para testar hipóteses e o pensamento A RAZÃO É USADA PARA DEDUZIR CONCLUSÕES. Imagem: Shutterstock.com O método científico. Apesar de o método científico proposto por Descartes ter sido criticado e reformulado, principalmente a partir das descobertas sobre a relatividade de Albert Einstein (1879- 1955) e dos conceitos de física quântica de Niels Bohr (1885-1962), pode ser considerado como a base metodológica que permitiu o desenvolvimento científico e tecnológico. AS EXPERIÊNCIAS E OBSERVAÇÕES DEVEM SER REALIZADAS POR MEIO DE UM CONJUNTO DE REGRAS, A FIM DE PRODUZIR NOVOS CONHECIMENTOS OU SOLUÇÕES PARA PROBLEMAS. EXEMPLO Imagine que, ao chegar em casa depois de um dia cansativo, você decida ligar a televisão para assistir à sua série preferida. No entanto, ao acionar o controle remoto, nada acontece. Imediatamente, você tenta descobrir o que pode ter acontecido, ou seja, formula hipóteses. Pensa que não haja energia elétrica na sua residência, ou, como segunda alternativa, que o aparelho não esteja ligado à tomada. Primeiro você testa o interruptor e verifica que não há problemas com a eletricidade, em seguida, confirma que a televisão está ligada à tomada. Então, pensa mais um pouco e descobre que alguém retirou as pilhas do controle remoto. Resolvido! Você vai assistir ao seu seriado preferido após usar o método científico para resolver um problema. TEORIAS ANTIGAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO A explicação sobre como ocorre o desenvolvimento humano intrigou filósofos e cientistas há milhares de anos. Antes mesmo da organização racional do método científico, e em função da impossibilidade de testar hipóteses, muitas teorias foram postuladas para explicar a fecundação e o desenvolvimento embrionário, levando à formação de um indivíduo semelhante aos pais. PITÁGORAS O grego Pitágoras (570-495 a.C.) propôs que o sêmen masculino percorria o corpo do homem recolhendo vapores místicos de cada uma das partes, como os olhos, pelos e cabelos, formando uma biblioteca que passava para a formação dos filhos. Ele defendia a teoria do espermismo, amplamente aceita na época, segundo a qual o embrião derivava do espermatozoide, ou seja, o homem transmitia as informações para o útero materno, e o óvulo apenas oferecia nutrientes para o desenvolvimento do feto. ARISTÓTELES Mais tarde, Aristóteles (384-322 a.C.) rejeitou essa teoria com a simples observação de que os filhos podem ser parecidos com as mães e avós e de que não seria possível gerar mulheres a partir de informações advindas somente do homem. Aristóteles produziu um tratado intitulado Geração dos animais, que serviu como texto básico para a genética humana. Nele, propôs uma teoria alternativa, defendendo que homens e mulheres contribuíam com material para a formação e o desenvolvimento humano, uma ideia que, de forma abstrata, capta a ideia central da hereditariedade. PERCEBA QUE HAVIA A NOÇÃO DE QUE O DESENVOLVIMENTO HUMANO ERA TRANSMITIDO ATRAVÉS DE INFORMAÇÕES, MAS COMO ESSAS INFORMAÇÕES ERAM CODIFICADAS? RESPOSTA Nos anos 1520, o suíço Paracelso (1493-1541) propôs uma teoria chamada de pré-formação, que dispensava a necessidade de um código de informações. Ele sugeriu que no sêmen masculino havia um “ser humano em miniatura” já pronto, um minúsculo feto, que seria inflado até se desenvolver completamente e se transformar em um bebê, sugerindo que o desenvolvimento humano era só uma questão de adicionar água. Essas ideias sobre a embriogênese e o desenvolvimento humano só foram resolvidas com a descoberta do genoma em meados do século XX, mais de dois mil anos depois de Pitágoras e Aristóteles, graças a uma série de avanços tecnológicos que permitiu realizar experimentos e observações nunca sonhadas. Repare como a produção de conhecimento caminha lentamente e depende da observação, da experimentação e do avanço tecnológico. O que sabemos atualmente permite uma compreensão muito mais precisa sobre o desenvolvimento humano. CRESCIMENTO E MATURAÇÃO Não se pode considerar, de forma alguma, que um feto seja um adulto em miniatura. Ele possui características peculiares de fisiologia, biomecânica, metabolismo etc. Todos esses aspectos sofrerão mudanças rápidas em poucos anos, graças aos processos contínuos de crescimento e maturação. Imagem: Shutterstock.com Crescimento e maturação. O desenvolvimento do corpo apresenta padrões e ritmos bem definidos, e os dois primeiros anos representam o período em que ocorre a maior taxa de crescimento. Uma das coisas que nos diferencia dos demais animais é o crescimento do cérebro e da cabeça. De fato, nós, seres humanos, apresentamos a maior relação de tamanho do cérebro proporcionalmente ao corpo e, durante os dois primeiros anos, a cabeça é a estrutura que mais cresce na criança, refletindo o grande crescimento do cérebro. Esse crescimento está relacionado à habilidade do nosso organismo em processar informações e solucionar os desafios do ambiente. SAIBA MAIS As crianças, quando crescem durante a infância, melhoram significativamente o equilíbrio, a agilidade e a coordenação, que ocorrem à mesma medida que o sistema nervoso se desenvolve. Mas a relação proporcional da cabeça com o resto do corpo também impede que todo crescimento e amadurecimento ocorra durante a gestação. Ao nascimento, nós ainda estamos imaturos em vários aspectos e somos absolutamente dependentes. Dessa forma, após o nascimento é necessário que muitos sistemas fisiológicos, metabólicos e imunológicos sofram processos de maturação. Estágios do desenvolvimento. Perceba que um recém-nascido preserva principalmente movimentos reflexos e, à medida que cresce e se desenvolve, vai adquirindo a capacidade de sustentar o peso da cabeça, rolar, sentar, ficar em pé com apoio e, então, aprender a andar. Essas etapas levam, geralmente, de 10 a 15 meses, e são consequência de uma série de processos de maturação neurofisiológica que garantem o desenvolvimento e o controle motor, como a mielinização dos neurônios motores do sistema nervoso motor. Em virtude dos processos de crescimento e maturação, conseguimos adquirir possibilidades cada vez mais complexas de aprendizado e desempenho motor. Pode-se dizer que o objetivo do desenvolvimento humano até a puberdade seja levar um indivíduo a se tornar apto para a sobrevivência. EVOLUÇÃO DO NEOCÓRTEX HUMANO Graças aos esforços de muitos pesquisadores, compreendemos cada vez mais os processos evolutivos que nos tornaram o que somos atualmente. As descobertas arqueológicas nos permitem montar um quadro dessa evolução ao longo da história dos hominídeos e entender as mudanças extraordinárias que explicam nossas capacidades cognitivas. Imagem: Shutterstock.com Evolução do Homem. O tamanho do cérebro dos nossos ancestrais, como o Australopithecus afarensis (3,4 milhões de anos), era comparável aos atuais chimpanzés e menor do que o dos gorilas modernos. A partir de várias mudanças ocorridas no curso da evolução, o neocórtex desses primatas se desenvolveu e alcançou dimensões formidáveis. O Homo habilis − primeiro primata do gênero Homo − surgiu há 1,9 milhões de anos, com dimensões cerebrais maiores, atingindo um volume cerebral já comparável ao do Homo sapiens atual e aproximadamente duas vezes maior do que o volume cerebral dos gorilas modernos. ATENÇÃO O aumento de tamanho do cérebro é aceito como a principal característica que garantiu a sofisticação das nossas funções cognitivas, com o desenvolvimento da linguagem e o desenvolvimento motor do ser humano. Certamente, aprender a andar com a postura bípede é um desafio que só um cérebro complexo pode ser capaz de controlar. CONTROLE MOTOR O estudo do controle motor e a produção de conhecimento sobre esse tema é fundamental para a sua atuação profissional. Você deve reconhecer que o movimento é essencial à vida, e esse campo de investigação é direcionado ao estudo da natureza do movimento e como ele pode ser controlado. Foto: Shutterstock.com A intervenção do profissional de Educação Física deve promover a educação para o movimento, desde os movimentos fundamentais até os movimentos especializados na iniciação esportiva. É nosso papel, também, atuar em equipes multidisciplinares, visando à reeducação e à terapia psicomotora. As estratégias de intervenção podem ser projetadas para melhorar a qualidade e a quantidade de posturas e movimentos essenciais para diversas funções. A NEUROCIÊNCIA DO SISTEMA MOTOR Por mais de dois mil anos, desde a Antiguidade até a explosão do saber do século XX, o esforço de vários pensadores moldou o que sabemos acerca da integração do sistema nervoso sobre o desenvolvimento e controle do sistema motor. Graças à produção de conhecimento ao longo desse período, podemos compreender como o controle motor é exercido. Ou seja, como o sistema nervoso central organiza e integra os músculos e as articulações em movimentos funcionais e como as informações sensoriais do ambiente são decodificadas e usadas para selecionar e controlar o movimento. Imagem: Shutterstock.com Neurociência. Estudos conduzidos por Thomas Willis (1621-1675) em pacientes com problemas neurológicos dissecados após a morte levaram o pesquisador a postular as primeiras ideias de que os atributos psicológicos humanos são funcionalmente dependentes do córtex. Contudo, apenas em 1861, Paul Broca (1824-1880) apresentou a primeira evidência da especialização cortical. Ao realizar a autópsia de um paciente que havia perdido a capacidade de falar, ele identificou uma lesão na região esquerda do lobo frontal, sugerindo a existência de áreas especificas para controlar funções. APESAR DESSAS EVIDÊNCIAS, A EXISTÊNCIA DE UMA REGIÃO RESPONSÁVEL PARA O CONTROLE MOTOR ERA QUESTIONADA. Marie-Jean-Pierre Flourens (1794-1867) havia demonstrado, em 1858, que a ação motora envolvida na respiração podia ser controlada ao nível da medula e não envolvia o córtex, levando à proposição de que o cérebro controlava funções perceptivas e habilidades intelectuais, mas não exercia controle motor. No entanto, em 1870, Gustav Fritsch (1838-1891) e Eduard Hitzig (1838-1907) evidenciaram a existência do córtex motor, uma descoberta fundamental para o avanço sobre a compreensão de como o movimento é controlado e aprendido. Muitas outras descobertas se seguiram para que, nos dias atuais, tivéssemos a noção de que o controle dos movimentos voluntários pode ser dividido em três fases: PLANEJAMENTO INICIAÇÃO EXECUÇÃO Quando idealizamos uma ação motora voluntária: Áreas de associação cortical integradas ao cerebelo e os núcleos da base planejam o movimento, utilizando memórias de vivências anteriores e o contexto do momento. Em seguida, o córtex motor e o cerebelo iniciam o movimento através de impulsos nervosos que comunicam aos músculos que irão executar a ação motora. O movimento resultante é constantemente monitorado e, através do sistema nervoso sensorial, vias de retroalimentação informam as estruturas do sistema nervoso central, permitindo que o encéfalo corrija qualquer divergência entre o movimento planejado e o movimento real. Imagem: Shutterstock.com Sistema nervoso motor. ESSA NOÇÃO DE INTEGRAÇÃO NEUROMUSCULAR É FUNDAMENTAL PARA O PROFISSIONAL COMPREENDER A NATUREZA DO MOVIMENTO, COMO PODEMOS APRENDER NOVOS GESTOS MOTORES DESDE A INFÂNCIA ATÉ O ADULTO, FAVORECENDO A INTERVENÇÃO PROFISSIONAL. NEUROPSICOLOGIA A neurociência aliada à psicologia também se ocupa de investigar as capacidades cognitivas de memória, atenção, raciocínio e aprendizagem. Para os profissionais de Educação Física, o interesse maior é nas relações dessas capacidades cognitivas com o movimento. Os psicólogos Lev Vygotsky (1896-1934) e Alexander Luria (1902-1977) foram alguns dos pioneiros na explicação de como nós aprendemos. Imagem: Natata/Shutterstock.com Vygotsky defendia o conceito de aprendizagem mediada pelo professor, de demonstração e de vivências para a aprendizagem. Foto: Autor desconhecido / Wikimedia Commons / Domínio Público. Já Luria cunhou o termo “neuropsicologia” e defendeu a ideia de que as diversas partes anatômicas do encéfalo estão integradas por cooperações funcionais complexas. Luria propôs um modelo de sistema funcional dividindo o encéfalo em três unidades funcionais: 1ª javascript:void(0) A primeira unidade funcional é representada pelo tronco encefálico, e atua para regular o estado de vigília, o tônus muscular e os estados mentais. 2ª A segunda unidade funcional é compreendida pelo córtex posterior, que recebe, analisa e armazena informações provenientes do sistema sensorial. 3ª A terceira unidade funcional reúne as regiões do córtex anterior e é responsável por programar, regular e verificar a atividade. Esses e outros estudos da neuropsicologia trazem importantes contribuições para o desenvolvimento de metodologias de pesquisa sobre o desenvolvimento humano e para a compreensãodos processos de ensino e aprendizagem, incluindo a aprendizagem motora − aspecto fundamental à sua futura atuação profissional. javascript:void(0) javascript:void(0) Imagem: Shutterstock.com Integração neurológica. O ESTUDO DO MOVIMENTO HUMANO Imagem: Shutterstock.com Movimento humano. Como já mencionado, a cinesiologia é o campo de investigação que estuda o movimento humano, área tão importante para o profissional de Educação Física. Enquanto ciência, integra várias subdisciplinas, como: biomecânica, educação física adaptada, fisiologia do exercício, comportamento motor, treinamento desportivo, história, filosofia e arte do desporto, pedagogia e psicologia desportiva. Dessa forma, a biomecânica é considerada uma subdisciplina da cinesiologia. SAIBA MAIS Embora a preocupação com a análise do movimento humano nos remeta à Antiguidade, a consolidação da biomecânica como campo de estudo é recente. Apenas na década de 1970 a comunidade internacional adotou o termo biomecânica para descrever a ciência dedicada ao estudo dos sistemas biológicos por uma perspectiva mecânica. A produção de conhecimento por meio da biomecânica exige instrumentos da física mecânica, ramo de conhecimento que envolve a análise das ações das forças para estudar os aspectos anatômicos e funcionais do movimento. Assim, você precisará reunir vários conceitos para integrar esses campos de investigação, como: Imagem: Science Museum Group / Wikimedia Commons / CC BY 4.0 Mecânica dos planos e eixos de movimento. A ESTÁTICA Que estuda os sistemas que se encontram em movimento constante ou em repouso. A DINÂMICA Que estuda os sistemas no qual o movimento sofre uma aceleração. Outras subdivisões da biomecânica incluem a cinemática − que descreve o movimento, incluindo o padrão e a velocidade dos movimentos realizados pelos segmentos corporais − e a cinética, que representa o estudo das forças associadas ao movimento. ATENÇÃO Para melhor compreensão das questões relacionadas à biomecânica, a produção de conhecimento frequentemente envolve fatores antropométricos. A descrição do formato, do tamanho e do peso dos segmentos corporais possibilita a realização de análises cinéticas para compreensão do movimento humano. PROBLEMAS PERTINENTES À BIOMECÂNICA Os problemas estudados pela biomecânica são diversificados em virtude dos diferentes campos científicos. A análise da locomoção revelou que a maioria dos vertebrados, incluindo o ser humano, durante uma caminhada, adota um comprimento e ritmo de passada em particular para determinar a velocidade. Concluíram, então, que os padrões de marcha escolhidos otimizam a economia bioenergética para determinada velocidade, embora esses padrões sejam individuais e possam ser adequados a cada contexto, incluindo as modalidades desportivas. Contudo, na natação, os padrões mecânicos dos movimentos dos nados são utilizados para correlacionar diretamente a economia de energia com a eficiência e a capacidade técnica do nadador. QUANTO MENOR FOR O NÚMERO DE BRAÇADAS PARA PERCORRER DADA DISTÂNCIA, MAIOR É A ECONOMIA DE ENERGIA METABÓLICA E A EFICIÊNCIA MECÂNICA. A biomecânica é, portanto, um campo fundamental de investigação desportiva, pois serve para identificar os movimentos mais eficazes e potencializar as estratégias de treinamento. É possível, ainda, investigar essa questão por uma ótica inversa: em vez de propor a biomecânica mais eficiente, podemos investigar por que determinados atletas atingem a excelência desportiva. Em muitas modalidades, o estilo ou padrão de movimento pode variar entre os atletas de sucesso, e diferentes fatores podem explicar o êxito individual. Estudos biomecânicos demonstraram que para os corredores de elite o estilo da corrida é individual, o que representa um desafio para esse campo de pesquisa e para nossa atuação no cenário do treinamento. Foto: Shutterstock.com Uso de sensores para analisar os padrões de corrida. Ao melhorar a eficiência do movimento, a biomecânica pode, ainda, auxiliar na prevenção de lesões e a identificar fatores que limitam o desempenho humano. Contribuindo, assim, com o desenvolvimento de equipamentos, calçados, roupas e outros aspectos ergonômicos que favoreçam o movimento e reduzam os riscos da prática esportiva. A biomecânica é, portanto, um campo de investigação amplo e importante, que auxilia na resolução de muitas outras questões, entre elas: O porquê de os esportes aquáticos não serem os melhores estímulos para indivíduos com osteoporose. Qual deve ser a maneira mais segura de levantar um objeto pesado do chão. Quais estratégias um idoso pode adotar para aprimorar a estabilidade do movimento. BIOMECÂNICA OCUPACIONAL A biomecânica pode, ainda, tratar de questões ocupacionais e terapêuticas, auxiliando na reeducação da marcha em etapas de reabilitação psicomotora ao longo da recuperação de lesões traumato-ortopédicas ou neurológicas, promovendo a reorganização dos padrões de movimento e auxiliando na recuperação da amplitude articular. As pesquisas nessa área demonstraram que as dores lombares podem ser ocasionadas tanto pela manipulação de materiais muito pesados como por desvios posturais. Doenças osteoarticulares relacionadas ao trabalho podem ser reduzidas com adaptações ergonômicas e evitadas com exercícios direcionados ao condicionamento físico associado à atividade laboral. Esse ramo de atuação para o profissional de Educação Física − que ainda é pouco reconhecido, explorado e com muitas questões a serem resolvidas − é a ginástica laboral. Imagem: Shutterstock.com A biomecânica ocupacional é um tema tão relevante que a agência espacial americana (NASA) financia pesquisas destinadas a compreender os efeitos da microgravidade sobre o sistema muscular. Essa linha de investigação auxilia na compreensão de questões que podem repercutir em toda a sociedade. VOCÊ SABIA Uma das alterações relacionadas com as viagens espaciais é a perda de massa mineral óssea, devido à falta de gravidade, em um processo semelhante ao observado com o envelhecimento que leva a osteopenia, que pode progredir para a osteoporose. IMPORTÂNCIA DA EPIDEMIOLOGIA PARA O PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA A epidemiologia é, sem dúvida, um ramo de pesquisa que apoia a nossa compreensão de mundo. Estudos epidemiológicos permitiram a proposição de um conceito denominado transição epidemiológica, que é fundamentado nos padrões de mortalidade, morbidade e invalidez para determinada população ao longo do século XX. EXEMPLO No ano de 1930, as doenças infectocontagiosas eram responsáveis por 46% dos casos de óbito na população brasileira e, a partir de então, verificou-se uma redução progressiva na frequência de mortes decorrentes desse tipo de doença. No entanto, houve um aumento gradual na incidência e na taxa de mortalidade de doenças cardiovasculares, que representavam apenas 12% dos casos em 1930. Atualmente, as doenças infectocontagiosas e parasitárias representam menos de 10% das causas de morte, enquanto as doenças do sistema cardiovascular e metabólicas ultrapassam 30%. Esse fenômeno pode ser atribuído às mudanças socioeconômicas, ao avanço científico e tecnológico, à explosão de saber do século passado, e às mudanças das relações de trabalho, lazer e cultura. Passamos de um estilo de vida ativo para um estilo de vida sedentário, o que, aliado a um maior acesso a alimentos processados e ultraprocessados, favorece o ganho de peso. É POSSÍVEL PERCEBER QUE A ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA DEVE SER CADA VEZ MAIS VALORIZADA. A ESCOLHA DE UM ESTILO DE VIDA ATIVO É ESSENCIAL NA PREVENÇÃO DAS DOENÇAS QUE MAIS MATAM ATUALMENTE. Outra grande mudança ocorrida nos últimos anos foi o aumento sem precedentes da expectativa de vida, especialmente nos países desenvolvidos, mas também nos países em desenvolvimento, como o Brasil. O avanço da medicina, o desenvolvimento de vacinas e a descoberta dos antibióticos e de outros medicamentos favoreceramessa mudança, e o aumento da população idosa trouxe novos desafios para a ciência e para a nossa profissão. Imagem: Shutterstock.com Avanços da medicina. EPIDEMIOLOGIA DO ENVELHECIMENTO A população brasileira, por exemplo, está em processo de envelhecimento. Estima-se um aumento de 80% no número de idosos para 2040 e de cerca de 150% para 2060, em relação a 2020. Isso representa um desafio para os profissionais que atuam em ações que promovam a melhoria da qualidade de vida, da independência funcional, das capacidades cognitivas e de outros fatores para a saúde do idoso. Envelhecimento populacional. Compreender o processo de envelhecimento é fundamental para desenvolver estratégias eficazes de envelhecimento saudável, e muitos estudos nessa área ainda são necessários. AUTONOMIA FUNCIONAL DO IDOSO Graças à produção científica, atualmente compreendemos que o declínio da massa muscular é uma das condições associadas ao envelhecimento biológico que levam à deterioração das funções biomecânicas. Esse processo é potencializado pelo sedentarismo, que representa um importante fator para a redução das funções motoras, da autonomia funcional e da qualidade de vida dessa população. A autonomia funcional representa um dos parâmetros mais importantes de saúde, aptidão física e qualidade de vida da população idosa. Um indivíduo com autonomia é aquele que consegue executar de forma independente e satisfatória suas atividades do cotidiano, mantendo suas relações e atividades sociais, livre para exercer seus direitos e deveres como cidadão. A PERDA DA AUTONOMIA REPRESENTA UM ENORME PREJUÍZO PARA A SAÚDE E PARA A QUALIDADE DE VIDA. A combinação da perda progressiva de massa muscular e massa corporal leva à redução dos níveis de força e ao aumento dos níveis de fadiga e fragilidade, o que pode comprometer a autonomia funcional. Esse é um quadro patológico comum na população idosa, chamado de sarcopenia, que pode ser amenizado pelo estilo de vida ativo. É importante, então, que sejam realizadas investigações científicas para estabelecer estratégias eficazes na prevenção, no controle e na reversão desse quadro clínico. Foto: Shutterstock.com Perda de massa muscular aumenta o risco de queda. TREINAMENTO DESPORTIVO É um campo de pesquisa extremamente relevante, não apenas para apontar as melhores estratégias de treinamento para o esporte, mas para a população geral. A preocupação com o aprimoramento técnico e a melhoria do desempenho desportivo não é recente e, no século passado, sofreu uma explosão de novos conhecimentos. Com a realização das Olimpíadas a partir de 1896, em Atenas, na Grécia, aumentou o interesse dos pesquisadores em aprimorar o desempenho dos atletas. Nessa área, muitos cientistas russos se destacam, como: Lev Pavlovich Matveev (1922-2006), que, na década de 1960, publicou uma monografia intitulada O problema da periodização do treinamento desportivo e, em 1977, publicou o livro Fundamentos do treino desportivo. Yuri Verkhoshansky (1928-2010), que, também na década de 1960, criou o método de treinamento de choque, utilizando estímulos para aprimorar a potência muscular. ESSES AUTORES REPRESENTAM ALGUNS DOS PESQUISADORES MAIS CLÁSSICOS NO ESFORÇO DE SISTEMATIZAR O TREINAMENTO. Atualmente, especialistas em treinamento desportivo de todo o mundo reconhecem a necessidade da periodização e os princípios gerais do treinamento, como a individualidade biológica, a interdependência volume-intensidade e a imprescindibilidade de continuidade e dos períodos de descanso. Muitos estudos seguem criando estratégias de treinamento e são fundamentados nesses princípios. ATENÇÃO A ciência do treinamento desportivo é capaz de reunir abordagens a respeito da biomecânica do movimento, da fisiologia humana e do exercício, das respostas metabólicas e bioquímicas e da psicologia do esporte, bem como aspectos históricos e culturais do esporte. Dessa forma, é um campo de produção de conhecimento que integra muitas outras ciências. NOVAS METODOLOGIAS DE TREINAMENTO O High Intensity Interval Training (HIIT) − que, do inglês, significa “treinamento intervalado de alta intensidade” − é uma das mais recentes metodologias de treinamento, cada vez mais prescrito por treinadores. Esse crescimento se deve em grande parte aos resultados alcançados pelos praticantes e ao aumento do interesse científico, que reflete no número de publicações. Imagem: Shutterstock.com Treinamento intervalado de alta intensidade. A busca na plataforma Medline do termo HIIT, em fevereiro de 2021, resultou em 2.433 artigos relacionados, em comparação com o termo em inglês para “treinamento de força”, que resultou em 42.917 publicações. Isso sugere que, apesar de estar em crescimento, o HIIT ainda é uma metodologia nova para o campo de investigação do treinamento desportivo. Imagem: Shutterstock.com Programa de exercícios HIIT. Essa metodologia consiste em séries curtas, repetitivas, de exercícios com intensidade acima de 80% da frequência cardíaca máxima (FCmáx). As séries duram entre dez segundos a cinco minutos, e são separadas por períodos de recuperação ativa, ou seja, com atividades de intensidade leve ou recuperação passiva por meio do repouso. É considerado um método eficiente para a promoção de condicionamento cardiovascular, controle do peso corporal e condicionamento físico, promovendo resultados eficazes em curto prazo. javascript:void(0) PRODUÇÃO CIENTÍFICA DA APRENDIZAGEM, CONTROLE MOTOR E PSICOLOGIA DO ESPORTE O especialista Wagner Santos Coelho faz um resumo do conteúdo deste módulo. Assista! VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. O CONHECIMENTO DO CRESCIMENTO E DA MATURAÇÃO DO SER HUMANO É MUITO IMPORTANTE PARA A ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA, POIS PERMITE CRIAR ESTRATÉGIAS ADEQUADAS AO PERFIL DE CADA CRIANÇA. SOBRE ESSE ASSUNTO, OBSERVE AS AFIRMATIVAS A SEGUIR E ESCOLHA A ALTERNATIVA VERDADEIRA. I – O CRESCIMENTO HUMANO APRESENTA ETAPAS E RITMO BEM DEFINIDOS. II – O SER HUMANO É MAIS EVOLUÍDO QUE OS OUTROS ANIMAIS, POIS, AO NASCIMENTO, JÁ ESTÁ COMPLETAMENTE MADURO. III – A CABEÇA É UMA DAS ESTRUTURAS QUE MAIS CRESCE NOS PRIMEIROS ANOS DE VIDA. A) As afirmativas I, II e III são verdadeiras. B) As afirmativas I, II e III são falsas. C) As alternativas I e II são falsas. D) As alternativas I e III são verdadeiras. E) As alternativas II e III são verdadeiras. 2. A BIOMECÂNICA É UM CAMPO DAS CIÊNCIAS BIOLÓGICAS QUE INTEGRA A CINESIOLOGIA E SE OCUPA DE INÚMERAS INVESTIGAÇÕES, AUXILIANDO A RESOLUÇÃO DE VÁRIOS PROBLEMAS ASSOCIADOS ÀS ANÁLISES DO MOVIMENTO. IDENTIFIQUE A ALTERNATIVA A SEGUIR QUE NÃO REPRESENTA UM PROBLEMA PERTINENTE À BIOMECÂNICA: A) Determinar o estilo de movimento adequado para o sucesso desportivo dos atletas. B) Analisar a mecânica dos diversos movimentos. C) Criar estratégias para aprimorar os padrões de movimento para o desempenho. D) Desenvolver padrões de movimento para evitar lesões. E) Proporcionar aprimoramento ergonômico para as atividades laborais. GABARITO 1. O conhecimento do crescimento e da maturação do ser humano é muito importante para a atuação do profissional de Educação Física, pois permite criar estratégias adequadas ao perfil de cada criança. Sobre esse assunto, observe as afirmativas a seguir e escolha a alternativa verdadeira. I – O crescimento humano apresenta etapas e ritmo bem definidos. II – O ser humano é mais evoluído que os outros animais, pois, ao nascimento, já está completamente maduro. III – A cabeça é uma das estruturas que mais cresce nos primeiros anos de vida. A alternativa "D " está correta. As capacidades cognitivas representam uma grande vantagem para o ser humano em relação a outras espécies. Essa capacidade, atribuída ao crescimento e à maturação do sistema nervoso, precisa que este nasça imaturo e continue se desenvolvendo de forma extrauterina, para que possa atingir esse extraordinário progresso. 2. A biomecânica é um campo das ciências biológicasque integra a cinesiologia e se ocupa de inúmeras investigações, auxiliando a resolução de vários problemas associados às análises do movimento. Identifique a alternativa a seguir que não representa um problema pertinente à biomecânica: A alternativa "A " está correta. Embora a biomecânica possa aprimorar os padrões de movimento de um indivíduo, visando a melhoria do desempenho desportivo, muitos atletas obtêm sucesso com padrões de movimentos individuais, chamados de estilo. É o caso, por exemplo, de padrões de braçadas e pernadas de nadadores ou do estilo de corrida de maratonistas. A biomecânica pode compreender e explicar o sucesso, mas, se eventualmente tentar reeducar o atleta, pode acabar comprometendo o desempenho. MÓDULO 3 Reconhecer as pesquisas das ciências biológicas aplicadas desde a fisiologia humana até às respostas metabólicas ao exercício FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO NA ANTIGUIDADE NARRAR A HISTÓRIA DA FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO NÃO É SIMPLES, MAS A IDENTIFICAÇÃO DE MARCOS HISTÓRICOS E O CONHECIMENTO DE AVANÇOS IMPORTANTES CONTRIBUI PARA QUE VOCÊ RECONHEÇA SUA RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL. Na Antiguidade, havia o interesse em compreender o funcionamento do corpo durante o exercício e o uso de estratégias de treinamento e alimentação para melhorar o desempenho físico humano. Assim, a fisiologia do exercício surgiu nas civilizações antigas da Grécia e da Ásia Menor, embora existam referências a esporte, jogos e práticas de saúde em civilizações ainda mais antigas, como no Egito, na Síria, Pérsia, Índia e China. Imagem: Paulus Pontius / Wikimedia Commons / Domínio Público Hipócrates CONTRIBUIÇÕES DE GALENO O médico italiano Galeno (129-217 d.C.) despontou com o declínio do Império Romano. Suas contribuições para a fisiologia do exercício são muito relevantes. Durante toda a vida, ele ensinou e praticou o que denominava as “leis da saúde”, dentre elas a recomendação de exercitar- se constantemente. Sua produção de conhecimento incluiu estudos sobre: Anatomia Fisiologia e nutrição humana Crescimento e desenvolvimento Compreensão dos efeitos do exercício Prejuízos de um estilo de vida sedentário e suas relações com a obesidade Seu trabalho foi muito influenciado pela escola hipocrática de medicina, e Galeno endereçou o tratamento da obesidade através de práticas que são reconhecidamente eficazes até os dias atuais, como a prática de exercícios e a dieta. Além disso, fez recomendações de exercícios terapêuticos para reabilitação de lesões de gladiadores e militares. Imagem: Universitat Autònoma de Barcelona / Wikimedia Commons / Domínio Público Descobertas de Galeno sobre a circulação sanguínea. SAIBA MAIS As informações mais interessantes são provenientes das observações detalhadas sobre os tipos e as variedades de exercícios “ágeis” e vigorosos, incluindo a indicação do número e da duração adequada, apontando a ideia de que somente os movimentos intensos devem ser considerados como exercício. AVANÇO DA FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO DURANTE O RENASCIMENTO Durante o Renascimento, entre os séculos XV e XVI, várias descobertas romperam com o conhecimento da Antiguidade. Descobertas complexas no campo da anatomia permitiram revelar mecanismos circulatórios, respiratórios e excretórios. ATENÇÃO A profusão de informações nas áreas das ciências biológicas preparou o terreno para novas descobertas sobre o funcionamento do organismo em repouso e durante o exercício. Durante esse período, o conhecimento da anatomia humana − com as contribuições de Leonardo da Vinci (1452-1519), Michelangelo (1475- 1564) e Andreas Vesalius (1514-1564), através de dissecação de cadáveres − permitiu um avanço extraordinário do entendimento do corpo humano. Imagem: Shutterstock.com Esboços de desenho de anatomia de Leonardo da Vinci. William Harvey (1578-1657) descobriu que o sangue circula continuamente, dentro de um sistema circulatório fechado, em uma única direção. Giovanni Alfonso Borelli (1608-1679) desenvolveu modelos matemáticos para demonstrar que os músculos eram os tecidos responsáveis pelos movimentos humanos e dos outros animais. Realizou importantes descobertas sobre o papel do diafragma na ventilação pulmonar e descreveu a estrutura dos capilares em volta dos sacos alveolares. Robert Boyle (1627-1691), que, utilizando uma bomba a vácuo, demostrou que tanto a combustão de uma vela quanto a respiração de um animal exigiam ar. MUITAS OUTRAS DESCOBERTAS FORAM FEITAS DURANTE O SÉCULO XVI, INCLUINDO O GÁS OXIGÊNIO, O NITROGÊNIO E OS COMPONENTES DOS CARBOIDRATOS, DOS LIPÍDEOS E DAS PROTEÍNAS. COMENTÁRIO O avanço científico dessa época é extraordinário e, embora possa parecer que essas descobertas não se relacionam ao exercício físico, toda essa produção de conhecimento sustenta a base da fisiologia humana e da fisiologia do exercício. CONCEITO MODERNO DO METABOLISMO Dentre os notáveis cientistas da época, Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794) descreveu os conceitos modernos do metabolismo, da nutrição e da fisiologia do exercício. Ele demonstrou que os elementos químicos carbono, oxigênio, nitrogênio e hidrogênio envolvidos no metabolismo apareciam ou desapareciam misteriosamente. Ao estudar a influência do trabalho muscular no metabolismo, demonstrou que apenas o oxigênio participa da respiração animal. Imagem: Shutterstock.com Lavoisier em seu laboratório. Lavoisier foi capaz de demonstrar que o volume de oxigênio necessário para o corpo humano variava de acordo com a temperatura ambiente, o consumo de alimentos e a prática de exercícios físicos. Essas descobertas foram essenciais para o entendimento moderno sobre o equilíbrio energético e o metabolismo, e determinaram as leis da termodinâmica. A partir disso, o esforço de vários outros pesquisadores permitiu descobrir a composição química dos carboidratos, dos lipídeos e das proteínas, e esclareceu o que atualmente chamamos de equação do equilíbrio energético, sustentando o conceito de eficiência metabólica. SAIBA MAIS A descoberta de que a produção do dióxido de carbono (CO2) aumentava de acordo com a intensidade do exercício, até cair drasticamente no exercício extenuante, coube a William Prout (1785-1850). Foi ele quem revelou o moderno conceito de cinética de troca gasosa, embora não tenha sido possível determinar a quantidade exata de dióxido de carbono respirada por não existirem equipamentos capazes de medir a frequência ventilatória na época. Jean Baptiste Boussingault (1802-1884) foi capaz de calcular o efeito da ingestão de cálcio, ferro e nitrogênio sobre o metabolismo energético. Em paralelo a essas descobertas, o pesquisador Justus von Liebig (1803-1873) desenvolveu um equipamento em seu laboratório para analisar substâncias orgânicas e inorgânicas, e concluiu que o esforço muscular dependia principalmente das proteínas como fonte de energia, e não dos carboidratos e dos lipídeos. No entanto, apesar de influenciarem a sociedade científica da época, essas conclusões não foram embasadas em experiências fisiológicas. Foram, então, contestadas por estudos que mediram as mudanças no nitrogênio excretado na urina durante uma escalada em montanha, sugerindo que a proteína degradada não poderia ter fornecido toda a energia necessária para a longa caminhada. Foto: Shutterstock.com TAIS CONTROVÉRSIAS DEMONSTRAM O QUÃO IMPORTANTE É O CONHECIMENTO BASEADO EM EVIDÊNCIAS, A IMPORTÂNCIA DO DEBATE CIENTÍFICO E A NOÇÃO DE QUE AS IDEIAS PODEM SER SEMPRE CONTESTADAS, À MEDIDA QUE NOVAS INFORMAÇÕES E TECNOLOGIAS SE TORNAM DISPONÍVEIS. METABOLISMO ENERGÉTICO Por volta de 1850, Louis Pasteur (1822-1895) concluiu que a fermentação do açúcar por leveduras era fruto da ação do que ele denominou “fermentos”. Descreveu, ainda, que o consumo de glicose apresenta um aumento de mais de dez vezes quando uma cultura de leveduras é transferida de um ambiente aeróbio para um ambiente anaeróbio, relacionando o efeito reguladordo oxigênio sobre o metabolismo energético, o que foi denominado de Efeito Pasteur. Imagem: Albert Edelfelt / Wikimedia Commons / Domínio Público O laboratório de Pasteur. EXEMPLO Quando um corredor dispara próximo da linha de chegada, as suas células do músculo esquelético sofrem um efeito semelhante ao descrito por Pasteur, garantindo que as concentrações celulares de ATP não reduzam para sustentar o aumento da intensidade do exercício. Louis Pasteur acreditava que os fermentos eram inseparáveis das estruturas das células de leveduras vivas, um conceito chamado de força vital. Contudo, em 1897, Eduard Buchner (1860-1917) demonstrou que o processo de fermentação continuava mesmo com extratos de leveduras, quando as células já não estão mais vivas, dando início ao ramo das ciências biológicas que atualmente chamamos de bioquímica. Mais tarde, esses “fermentos” foram chamados de enzimas. Imagem: Shutterstock.com Estruturas secundárias de uma enzima. Imagem: Shutterstock.com Estrutura 3D de uma enzima. ATENÇÃO As reações químicas que ocorrem na fermentação catalisada pelas enzimas de uma levedura são praticamente as mesmas que ocorrem nos músculos esqueléticos. A glicose é chamada, no senso comum, de açúcar do sangue. A partir da glicose, o ATP (energia) é reciclado em um processo chamado glicólise. METABOLISMO ENERGÉTICO AERÓBIO A glicólise é apenas a primeira etapa bioenergética da quebra e oxidação da glicose na presença de oxigênio. O produto da glicólise é direcionado para o metabolismo mitocondrial, que, através de um conjunto de reações bioquímicas, termina de oxidar a glicose e outros substratos energéticos, transferindo a energia para a reciclagem do ATP. A PRIMEIRA ETAPA DESSE PROCESSO É CONHECIDA COM CICLO DO ÁCIDO CÍTRICO OU CICLO DE KREBS, EM HOMENAGEM A HANS KREBS (1900-1981), DESCOBRIDOR DO PROCESSO. Sob a ótica da fisiologia, em uma visão mais ampla, o termo “respiração” é associado à captação de O2 e eliminação de CO2 através da ventilação pulmonar. Já no sentido metabólico, a respiração é representada pela fase aeróbia do catabolismo, processo molecular no qual as células consomem O2 e produzem CO2. Mais especificamente, é denominada de respiração celular. Imagem: Shutterstock.com Respiração celular. TAXA METABÓLICA Os conceitos de taxa metabólica se referem ao consumo energético de um organismo. Foram estabelecidos pelos estudos de Henri Victor Regnault (1810-1878), que utilizou circuitos fechados de ergoespirometria em animais para estudar o quociente respiratório − ou seja, a relação de CO2 produzido dividido pela concentração de O2 consumida. Nesses estudos, foi possível observar que a privação de alimentos reduzia o quociente respiratório, e que os animais privados de alimentos consumiam os próprios tecidos. Foto: Shutterstock.com Análise de troca gasosa – Ergoespirometria. Regnault estabeleceu as relações entre as diferentes dimensões corporais e as taxas metabólicas, que auxiliaram a compreender a lei da área superficial usada em estudos de cinesiologia e fisiologia do exercício até os dias atuais. PRODUÇÃO HEPÁTICA DE GLICOGÊNIO javascript:void(0) O glicogênio é um carboidrato complexo produzido pelo fígado e pelos músculos esqueléticos, que serve como reserva de energia e pode ser utilizado quando necessário durante a atividade física. Até a metade do século XIX, os cientistas acreditavam que apenas os vegetais fossem capazes de sintetizar açúcares. Os estudos do fisiologista francês Claude Bernard (1813-1878), no entanto, contestaram essa ideia ao observar a presença de açúcar na veia hepática de animais privados de carboidrato na dieta. Essas observações permitiram determinar uma nova função para o fígado, com a secreção “interna” de açúcar. Imagem: Shutterstock.com Degradação hepática de glicogênio. SURGIMENTO DA FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO COMO CAMPO CIENTÍFICO CONTEMPORÂNEO Os interesses científicos sobre as respostas do organismo ao exercício são antigos, mas a fisiologia do exercício como ciência moderna resulta da explosão de conhecimento na segunda metade do século XIX. AUSTIN FLINT JR. (1836-1915) O fisiologista americano Austin Flint Jr. observou que a posição do corpo exercia forte influência sobre a circulação sanguínea em repouso e durante o exercício. Ele identificou que o esforço físico faz aumentar a frequência de pulsações do coração, e esse trabalho influenciou os primeiros professores de Educação Física com treinamento médico e orientação científica. EDWARD HITCHCOCK (1793-1864) E EDWARD HITCHCOCK JR. (1828-1911) Dois médicos, pai e filho, chamados Edward Hitchcock e Edward Hitchcock Jr., desbravaram o movimento americano da ciência do esporte e produziram um livro voltado para a Educação Física universitária, apresentando conceitos de anatomia e fisiologia. O trabalho do filho na universidade incluiu a Educação Física como disciplina obrigatória e, em suas palestras, ele ensinava que a boa condição do sistema muscular era fundamental para o estado geral de saúde do corpo. Apesar desses e de outros esforços, os estudos sobre as respostas fisiológicas ao exercício e ao treinamento físico só ganharam projeção na sociedade científica em meados do século XX, a partir das publicações de revistas que dedicavam espaço a esse tema. EXEMPLO É o caso da Journal of Applied Physiology, publicada pela primeira vez em 1948, e da Medicine and Science in Sports and Exercise, publicada a partir de 1969. Até hoje, essas revistas são fontes valiosas de conhecimento, comunicando as produções científicas, dentre as mais relevantes no campo da ciência do exercício, à sociedade científica. AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA DA ESTRUTURA CORPORAL Os principais pesquisadores das ciências do esporte no final do século XIX e início do século XX associavam ideais higienistas à prática de exercício físico. Alguns autores defendiam ainda que o acúmulo de saúde adquirido pela prática de esportes garantia a capacidade de suportar horas seguidas de trabalho. Essa influência foi um dos motivos que levou o Dr. Hitchcock Jr., professor do departamento de Educação Física e Higiene da Amherst College, a coletar medidas antropométricas de forma sistematizada de quase todos os estudantes universitários entre os anos 1861 e 1888. Isso gerou um grande volume de informações estatísticas − com mensurações de altura segmentar, circunferências, largura, comprimentos, medidas de força muscular, capacidade pulmonar e distribuição de pelos −, que fizeram parte de um compêndio contendo descrições detalhadas para fazer mensurações e testes. Imagem: Shutterstock.com Medida de dobras cutâneas. Esse trabalho, reconhecido como o primeiro manual dedicado à análise de informações antropométricas e de força com base em dados detalhados, foi fundamental para a organização e o aparelhamento dos ginásios universitários nos Estados Unidos nos anos seguintes. O objetivo era: Aumentar e fortalecer os segmentos corporais Aumentar o tamanho do tórax e a capacidade dos pulmões Fortalecer os músculos de todos os segmentos corporais e corrigir desvios posturais Simultaneamente a esse trabalho em âmbito acadêmico, as forças armadas, principalmente dos Estados Unidos e da Inglaterra, iniciavam estudos antropométricos em militares para determinar as dimensões corporais e os níveis de força, associados ao desempenho humano. COMENTÁRIO Os procedimentos utilizados nessa época são muito semelhantes às práticas e aos equipamentos presentes nos laboratórios de fisiologia de exercício atuais. EXPLOSÃO DE SABER NO SÉCULO XX Sem dúvida, o século XX representou uma explosão de conhecimentos na área da ciência do esporte. Pesquisadores de todas as partes do mundo deram importantes contribuições para esse fenômeno. A Dinamarca, primeiro país europeu a incluir o treinamento físico no currículo escolar, foi celeiro de muitos cientistas importantes: Os professores da Universidade de Copenhagen Johannes