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1 LUIZ GONZAGA PIRES CONTEÚDOS E METODOLOGIA DA MATEMÁTICA PARA O ENSINO FUNDAMENTAL (6º AO 9º ANO) E MÉDIO Módulo “IV” TERESINA/ 2010 2 PRESIDENTE DA REPÚBLICA Luis Inácio Lula da Silva MINISTRO DA EDUCAÇÃO Fernando Haddad GOVERNADOR DO ESTADO DO PIAUÍ Wilson Martins REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ Luiz Sousa Santos Junior SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DOPIAUÍ Antonio José Medeiros SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃOA DISTÂNCIA DO MEC Carlos Eduardo Bielschowsky DIRETOR DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EaD Hélio Chaves COORDENADOR GERAL DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL Celso Costa COORDENADOR GERAL DO CENTRO DE EDUCAÇÃO ABERTO A DISTÂNCIA DA UFPI Gildásio Guedes Feranandes SUPERINTENDENTE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO ESTADO Eliane Mendonça DIRETOR DO CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO José Augusto de Carvalho Mendes Sobrinho COORDENADORA DO CURSO DE MATEMATICA NA MODALIDADE EAD João Benicio de Melo Neto COORDENADORA DO MATERIAL DIDÁTICO DO CEAD/UFPI Cleidinalva Maria Barbosa de Oliveira 3 Pires, Luiz Gonzaga CONTEÚDOS E METODOLOGIA DA MATEMÁTICA / Luiz Gonzaga Pires. – Teresina: UFPI/CEAD, 2010. _____ p. 1. Educação –. 2. Educação Básica – 3. Ensino Infantil e ensino fundamental nos anos iniciais – 4 Raciocínio lógico matemático. I título 4 APRESENTAÇÃO O presente texto destina-se aos estudantes do Programa de Educação à Distância da Universidade Aberta do Piauí – UAPI, vinculados ao consórcio formado pela Universidade Federal do Piauí – UFPI, Universidade Estadual do Piauí – UESPI e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí – IFET, com apoio do Governo do Estado do Piauí, através da Secretaria de Educação. O Texto está estruturado em três unidades. Na primeira unidade adotamos uma lógica para situar o ensino da matemática, situando-o historicamente e localizando-o dentro das correntes pedagógicas da educação brasileira as tendências atuais do ensino da matemática. Tratamos também do projeto pedagógico/currículo em ação, complementando com a formação dos professores e caracterização dos alunos que, de posse do saberes, vão influenciar a sociedade para enfrentar os desafios relativos ao ensino da matemática, considerando sua contribuição no avanço das tecnologias e interligação do mundo através das redes de comunicação. A unidade II apresenta um estudo sobre os parâmetros curriculares nacionais para matemática (anos finais do ensino fundamental e ensino médio), seguido de um texto sobre a formação do pensamento pelo caminho da simbolização. Na unidade III, Esperamos que este material possa ser útil para professores e alunos que fazem parte do processo de formação continuada na modalidade de educação à distância. Paz e Luz. Luiz Gonzaga Pires 5 SUMÁRIO 6 UNIDADE 1 - FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA RESUMO Nesta unidade adotamos uma lógica para situar o ensino da matemática, situando-o historicamente e localizando-o dentro das correntes pedagógicas da educação brasileira as tendências atuais do ensino da matemática. Tratamos também do projeto pedagógico/currículo em ação, complementando com a formação dos professores e caracterização dos alunos que, de posse do saberes, vão influenciar a sociedade para enfrentar os desafios relativos ao ensino da matemática, considerando sua contribuição no avanço das tecnologias e interligação do mundo através das redes de comunicão. 7 I - CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA 1.1 - Breve histórico do ensino da Matemática A história da matemática nos indica que, no Brasil, a formação do matemático voltada para pesquisa tem seu marco na década de 30, conforme comenta D’Ambrósio (2007, p. 56). (...) Em 1933 foi criada a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo e logo em seguida a Universidade do Distrito Federal, transformada em Universidade do Brasil em 1937. Nessas instituições inicia-se a formação dos primeiros pesquisadores modernos de matemática no Brasil. (...) Reconhece-se também que foram através da criação das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras que surgiram os primeiros cursos de licenciatura para professores de matemática do antigo ginásio correspondente ao 6° e 9° ano na estrutura do ensino atual. Nesta época as séries iniciais eram de responsabilidade de professores normalistas oriundos do curso normal equivalente ao ensino médio atual, com a disciplina matemática nas três séries. Enquanto o modelo adotado para licenciatura era de três anos dedicados ao estudo da matemática onde o formando recebia o título de bacharel. Com mais um ano de matérias pedagógicas como didática geral, didática especial da matemática e psicologia da criança e do adolescente o mesmo adquiria o grau de licenciado para ensinar matemática. Nesta época, a literatura utilizada para o estudo da matemática era de origem francesa mesclada com algumas produções didáticas brasileiras, dentre elas destaca-se a de Julio Cesar de Melo e Souza que, inspirado na literatura árabe, passou a escrever com o pseudônimo de Malba Tahan. Outros livros de importância para história da matemática no Brasil são as coleções de Jácomo Stávale, Ary Quintella e Algacyr Munhoz Maeder. Com base na organização dos conteúdos destes livros, o ensino da matemática processou-se por três décadas, no Brasil, nos moldes tradicionais sem propostas metodológicas de inovação. Somente na década de 60, surgiu o primeiro grupo de educação matemática, sob a liderança de Osvaldo 8 Sangiorgi no Estado de São Paulo. Em seguida surgiram também outros grupos precisamente no estado do Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, justamente no momento em que diferentes países do mundo passaram a discutir questões relativas à educação matemática, influenciada pelo movimento da Matemática Moderna. Segundo D’ Ambrosio(2007), o movimento da Matemática Moderna serviu para mudar, sem dúvida para melhor, o estilo das aulas e das avaliações além de introduzir a linguagem moderna de conjuntos para trabalhar os princípios da lógica matemática com alunos em diferentes níveis de ensino. Assim, o movimento da Matemática Moderna marcou o início de mudanças na metodologia do ensino da matemática. Estas eram compatíveis as exigências da política de modernização econômica que exigia nas décadas de 60/70, um avanço das ciências exatas com o fim de disseminar o pensamento científico e tecnológico dos países centrais e periféricos em desenvolvimento. Desse modo, a Matemática a ser ensinada passou a conceber uma lógica de organização das operações realizadas dentro do universo de conjuntos numéricos em consonância com teoremas, fórmulas, axiomas e demonstrações peculiares ao conhecimento matemático. Como conseqüência, os currículos de matemática dessa época passaram a ser construídos com intenções de responder à necessidade de uma reforma pedagógica, incluindo a pesquisa de materiais e métodos de ensino apropriados. Este fato desencadeou a preocupação com a Didática da Matemática, intensificando estudos e pesquisa nessa área. Neste contexto de preocupação com a educação matemática, em 1980, o National Council of Teachers of Mathematics( Comselho Nacional de Professores de Matemática), NCTM, dos Estados Unidos, apresentourecomendações para o ensino de Matemática no documento “Agenda para Ação”. Nesta o maior destaque era colocado na resolução de problemas com situações matemáticas. Ela também enfatizava a relevância dos aspectos sociais, antropológicos e lingüísticos no aprendizado da Matemática. 9 As idéias oriundas das discussões em torno da educação matemática influenciaram as reformas que ocorreram no mundo, a partir de então. As propostas elaboradas no período 1980/1995, apresentam pontos de convergência, como, por exemplo: • Direcionamento do ensino fundamental para a aquisição de competências básicas necessárias ao cidadão e não apenas voltadas para a preparação de estudos posteriores; • Importância do desempenho de um papel ativo do aluno na construção do seu conhecimento; • Ênfase na resolução de problemas, na exploração da Matemática a partir dos problemas vividos no cotidiano e encontrados nas várias disciplinas; • Importância de se trabalhar com um amplo espectro de conteúdos, incluindo-se, já no ensino fundamental, elementos de estatística, probabilidade e combinatória, para atender à demanda social que indica a necessidade de abordar esses assuntos; • Necessidade de levar os alunos a compreenderem a importância do uso da tecnologia e a acompanharem sua permanente renovação. (Brasil, 1997, p.22 ) Essas pontos passaram a fazer parte da preocupação dos professores de matemática e especialistas de educação que vinham discutindo em nosso país as propostas curriculares das Secretarias dos Estados e dos Municípios brasileiros. Neste contexto, é possível verificar mudanças que ocorreram e continuam ocorrendo nas propostas curriculares no sentido de introduzir concepções matemáticas, metodologias e forma de avaliação na prática pedagógica dos professores. Essas têm chegado aos envolvidos com o processo ensino-aprendizagem de matemática através de cursos de capacitação, ciclos de estudos, congressos e outros. 10 Atualmente do Professor de Matemática das séries iniciais é formado pelos cursos de Licenciatura Plena em Pedagogia, enquanto os de 6º ao 9º ano do ensino fundamental e médio são oriundos da Licenciatura Plena em Matemática. Os estudos e pesquisas sobre educação matemática continuam apresentando resultados relevantes para concretizar novas alternativas e tendências pedagógicas relacionadas com o ensino e aprendizagem deste campo do saber. Dentre várias se destaca a etnomatemática, modelagem matemática, história da matemática, uso de recursos tecnológicos e jogos matemáticos. Estes tópicos serão tratados no próximo item. 1.2 - Tendências atuais do ensino da matemática As tendências pedagógicas que se referem às concepções teóricas dos modelos pedagógicos com base nas concepções teóricas e modelos pedagógicos, são estruturadas para qualquer tipo de saber inclusive o matemático. As mesmas foram elaboradas por Dermeval Saviani (1991), que desenvolveu um esquema lógico fundamentado na criticidade. Assim, classificou-as em dois grupos denominados de “teorias não-críticas” e “teorias críticas”. Tomando como base as idéias de Dermerval Saviani (1991), vários autores expressaram de forma literal ou sintética conforme o quadro abaixo. 11 Classificação das Teorias Concepções Teóricas Modelos Pedagógicos Não –Críticas (liberais) Pedagogia Tradicional Ensino Tradicional Concepção Humanista Moderna Escola Nova (Pedagogia Renovada) Concepção Humanista Moderna Tecnicismo Crítico Reprodutivistas Violência Simbólica Não apresentam propostas pedagógicas, visto que entendem a escola como instrumento de reprodução das condições sociais impostas pela organização capitalista. Aparelhos Ideológicos de Estado Escola Dualista Dialéticas (Progressistas) Pedagogia Histórico-Crítica (Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos) Em sua proposta trabalha com os conteúdos culturais universais que são incorporados pela humanidade frente à realidade social. O método parte de uma relação direta da experiência do aluno como participador e do professor como mediador entre o saber e o aluno. Seus representantes são: Makarenko; B. Charlot; Demerval Saviani; Suchodoski; Manacorda e G. Snyders Pedagogia Libertadora Tem sido empregada com êxito em vários setores dos movimentos sociais (sindicatos, associações de bairro, comunidades religiosas e alfabetização de adultos). Autor desconhecido. Diante dos conhecimentos sobre as tendências pedagógicas, os educadores responsáveis pelo ensino da matemática, ao tomar consciência de que o mesmo não poderia mais continuar nos moldes tradicionais, partiram para busca de alternativa que colocasse a prática pedagógica do processo ensino-aprendizagem de matemática em sintonia com as propostas modernas de educação. Assim, existem atualmente cinco tendências para o ensino da Matemática, denominadas de Etnomatemática, História da Matemática, Matemática Crítica, Modelagem Matemática e Resolução de Problemas. 12 Neste item será abordada, de forma sintética, cada uma dessas tendências. • Etnomatemática Etnomatemática é uma tendência denominada de Programa Etinomatemática que, segundo D’Ambrósio (1993, p. 1), “teve sua origem na busca de entender o fazer e o saber matemático de culturas periféricas e marginalizadas, tais como colonizados, indígenas e classe trabalhadora”(...) e (...) também o conhecimento da cultura dominante” (...). Partindo da etimologia da palavra etnomatemática, etno (ambiente natural e cultural) + matema ( explicar, entender, lidar com o ambiente) + tica (artes, técnicas,modos e maneiras de), D’Ambrósio (1993) conceitua o termo como um corpo de artes, técnicas, modo de conhecer, explicar e entender em ambientes com diferentes culturas as competências e habilidades de comparar, classificar, ordenar, medir, contar, inferir e transcender através do saber matemático e outros que fluem do ambiente natural e cultural dos seres humanos. A proposta do Programa Etnomatemática rompe com os parâmetros do ensino tradicional quando propõe adequação sócio cultural através de metodologias que estejam alinhadas com o cotidiano das mais diferentes espaços naturais de sobrevivência humana. O Programa Etnomatemática tem importantes implicações pedagógicas. Educação é, em geral, um exercício de criatividade. Muito mais de transmitir ao aprendente teorias e conceitos feitos, para que ele as memorize e repita quando solicitado em exames e testes, a educação deve fornecer ao aprendente os instrumentos comunicativos, analíticos e tecnológicos necessários para sua sobrevivência e transcendência. Esses instrumentos só farão sentido se referidos à cultura do aprendente ou explicitados como tendo sido adquiridos de outra cultura ou inserido num discurso crítico. O programa Etnomatemática destaca a dinâmica e a crítica dessa aquisição. (D’Ambrósio, 1993, p.3) 13 O Programa Etnomatemática é um campo de pesquisa com aplicação na prática pedagógica do ensino da matemática que foge dos moldes tradicionais quando abre espaço para metodologias que utilizam tecnologia de informação e comunicação, enquadrando-se nas exigências de aplicação dos saberes matemáticos no contexto sócio cultural dos espaços naturais dos seres humanos. • História da Matemática A História da Matemática, é uma tendência da Educação Matemática que visa colocar a construção histórica do conhecimento matemático como instrumento de compreensão da evolução dos conceitos, dando ênfase às dificuldades epistemológicas inerentes à sua evolução. A metodologia que utiliza a História da Matemática na sala de aula ou pesquisas, conduz alunos ou pesquisadores a perceber que as teorias apresentadas como acabadas resultaram sempre de desafios da sociedade para os matemáticos enfrentarem com grande esforçoe, quase sempre, numa ordem bem diferente da que os resultados são apresentadas após o processo de descoberta. Neste contexto, o conhecimento matemático apresenta-se como uma criação humana em diferentes culturas e momentos históricos da evolução humana no planeta terra. Este fato poderá ser usado pelos professores para desenvolver junto aos alunos atitudes e valores propensos ao desenvolvimento do interesse pelos estudos matemáticos. Ao revelar a matemática como uma criação humana, ao mostrar necessidades e preocupações de diferentes culturas, em diferentes momentos históricos, ao estabelecer comparações entre os conceitos e processos matemáticos do passado e do presente, o professor tem a possibilidade de desenvolver atitudes e valores mais favoráveis do aluno diante do conhecimento matemático. BRASIL (1997, p.45) 14 Um dos valores a ser desenvolvimento é o de conceber a Matemática como um conhecimento em construção, com passado, presente, erros. E acertos, sem ser considerada verdade absoluta de forma acabada. Assim, a tendência História da Matemática por um lado permite a contextualização do saber, mostrando que seus conceitos e algoritmos surgiram numa época histórica, dentro de um contexto cultural, social e político, por outro, pode proporcionar um ensino motivador e mais agradável aos alunos, proporcionando uma visão crítica e reflexiva do conhecimento Matemático. Em termos metodológicos a tendência história da matemática deve chegar às salas de aulas onde os professores adotem uma conduta de orientador das atividades, permitindo ao educando a construção do próprio conhecimento de forma ativa e crítica, em consonância com as necessidades históricas, sociais e culturais do contexto onde o processo educativo se desenvolve. Em síntese, a tendência História da Matemática possibilita o aluno a perceber que a Matemática é um conjunto de conhecimentos em contínua evolução que desempenha um importante papel na sua formação. Neste sentido permite também a interdisciplinaridade com outros conhecimentos, apresentando-se como parte da cultura universal indispensável sobrevivência humana. • Matemática Crítica No século vinte, o mundo foi abalado pela Segunda Guerra Mundial e continuou em conflito diante das ameaças alimentadas pelas armas nucleares, domínio ideológico e econômico. Esse processo teve influência do socialismo marxista, que fundamentou a teoria histórico-crítica. Esta teoria influenciou os mais diferentes setores da sociedade. Um delas foi a educação nas diferentes áreas do saber. Com relação ao ensino de matemática surge a vertente denominada de “Educação Matemática Crítica. 15 Esta vertente trouxe novas coordenadas ao currículo de Matemática do então ensino primário e secundário. Ela tinha como principal ideal à reestruturação do ensino de Matemática frente às grandes e rápidas transformações da ciência e da sociedade. Elevar o nível científico da população escolarizada era uma das intenções dessa vertente que foi atropelado por um movimento internacional comandado pelos Estados Unidos da América, denominado de Matemática Moderna que contribuiu com a organização dos conteúdos através da tepria dos conjuntos, mas ao mesmo tempo introduziu uma linguagem lógica em todos níveis de ensino que gerou problemas de aprendizagem principalmente no nível elementar. Este fato desencadeou críticas que fizeram surgir novas idéias para o ensino da matemática dentre eles o que teve maior impacto, inclusive repercussão internacional, foi a Etnomatemática liderado por Ubiratan D’Ambrósio. Neste contexto, ressurge também a Educação Matemática Crítica. Esta vertente tem como base as relações estabelecidas entre progresso e tecnologia, em coerência com as idéias difundidas pela teoria dialética ou histórico-crítica. O professor dinamarquês Ole Skovsmose é um dos principais responsáveis por divulgar o movimento da “educação matemática crítica” ao redor do mundo. Com mestrado em Filosofia e Matemática pela Universidade de Copenhague e doutorado em Educação Matemática pela Royal Danish School of Education Studies, Skovsmose defende em seus trabalhos o direito à democracia e o ensino de matemática a partir de trabalho com projetos. 16 Para ele, a Educação Matemática crítica possui um importante papel no mundo Skovsmose questiona as práticas tradicionais, muitas vezes realizadas sem reflexão, como a ênfase excessiva na realização de listas de exercícios, que pode comprometer a qualidade da aula de matemática, e acredita que “mai s importante atual, sobretudo em função do avanço tecnológico. Skovsmose sempre se preocupou com os países localizados fora dos centros de poder, o que o levou a viajar pelo mundo orientando e desenvolvendo pesquisas. Está sempre em contato com professores e pesquisadores da África do Sul, Colômbia e Brasil. Em nosso país, ele visita anualmente o programa de Pós -Graduação da UNESP, em Rio Claro, São Paulo. Atualmente, Skovsmose é professor do Departam ento de Educação, Aprendizagem e Filosofia da Universidade de Aalborg, na Dinamarca. Tem livros publicados em português, como Educação matemática crítica: a questão da democracia (2001) e Desafios da reflexão em educação matemática crítica (2008), ambos publicados pela editora Papirus, Educação Crítica – incerteza, matemática, responsabilidade (2007) pela editora Cortez e Diálogo e aprendizagem em educação matemática (2006) em parceria com Helle Alroe publicado pela editora Autêntica. Recentemente, em uma d e suas visitas ao Brasil, falou para um grupo de professores na Universidade Federal de Minas Gerais, ocasião em que conversou ele visita anualmente o programa de Pós -Graduação da UNESP, em Rio Claro, São Paulo. (Este texto é a introdução de uma entrevista concedida a JULIANA ÂNGELO GONÇALVES, JUSSARA LOIOLA ARAÚJO e SAMIRA ZAIDAN. A mesma foi 17 publicada na íntegra na revista PresençaPedagógica nº83, volume 14, setembro/outubro de 2008.) Em síntese, a Educação Matemática Crítica requer uma prática pedagógica de sala de aula baseada em um cenário para investigação que convida os alunos a formular questões e a procurar explicações. Dessa forma, os alunos se envolvem no processo de exploração expresso através de desafios que buscam explicações. • Modelagem Matemática A Modelagem Matemática é uma metodologia alternativa para o ensino da Matemática que pode ser utilizada em qualquer nível de ensino, tendo como objetivo interpretar e compreender os mais diversos fenômenos do nosso cotidiano. Ela consiste em construir um modelo (matemático) da realidade que queremos estudar e interpretar os resultados obtidos no sentido de responder as questões ou problemas inicialmente apresentados em função das hipóteses levantadas. Vamos aprender com maquetes? Como exemplo: Existem formas geométricas na maqueta de uma casa? Levar os alunos a construir a maquete identificando as formas geométricas é realizar atividades de Modelagem Matemática para trabalhar os conceitos geométricos tendo como suporte a construção de maquetes, de plantas baixas, 18 etc. Dependendo do nível, o aluno pode calcular áreas das figuras geométricas, termos desconhecidos através da resolução de equações e outros. No final da atividade a aluno deve ser levado à reflexão com o fim de responder a questão inicialmente formulada. Através deste exemplo percebe-se a existência do procedimento de modelagem matemática que compreende etapas fundamentais expressas através da escolha do tema, seleção de variáveis e validação. Primeiramente, devemos escolher um tema central para ser desenvolvido pelos alunos, e recolher dados gerais e quantitativos que possam ajudar a levantar hipóteses com objetivo de elaborar questões ouproblemas conforme interesse dos grupos de alunos. A etapa seguinte consiste em selecionar as variáveis essenciais envolvidas nas questões ou problemas e formular as hipóteses. Neste torna-se necessário à sistematização dos conceitos que serão usados na resolução dos modelos e a interpretação da solução (analítica, e se possível, graficamente). Para finalizar, dependendo do objetivo, fazer a validação dos modelos, confrontando os resultados obtidos com os dados coletados. Em síntese, a modelagem matemática constitui-se em ferramenta para enfrentar o desafio de fazer o aluno compreender a importância do raciocínio matemático no dia-a-dia da sua formação de cidadão crítico da sociedade. • Resolução de Problemas A resolução de problemas em matemática é um recurso metodológico em que o professor propõe ao aluno situações direcionadas para interpretação, esquematização, investigação, aplicação e exploração de conceitos matemáticos direcionados para solução de determinada situaçã 19 A resolução de problemas faz parte das buscas que levaram a espécie humana a originar a matemática e ampliar seus conhecimentos em busca de melhores condições para garantia da sobrevivência. Assim, desde as épocas mais remotas, em todo e qualquer nível de sua atuação, o conhecimento matemático apresenta-se ligado à resolução de problemas que, na maioria das vezes, envolve outras áreas do conhecimento. Nesse sentido, a Matemática tem um papel significativo no desenvolvimento da ciência, da tecnologia e da sociedade. O Ser humano comumente depara-se com situações problemas em seu dia a dia, desde problemas simples aos elaborados com rigor científico. Este pressuposto faz como a metodologia de resolução de problemas seja colocada sempre como eixo organizador do processo ensino aprendizagem. Por isto que esta atividade tem que ser bem planejada e executada com rigor para render resultados positivos em termos de aprendizagem. Neste sentido, pode ser colocado em prática os princípios sugeridos pelos PCN de Matemática 5ª a 8ª série, com o seguinte teor: A situação problema é o ponto de partida da atividade matemática e não a definição. No processo ensino aprendizagem, conceitos, idéias e métodos matemáticos devem ser abordados mediante a exploração de problemas, ou seja, de situações em que os alunos precisem desenvolver algum tipo de estratégia para resolvê-las; O problema certamente não é um exercício em que o aluno aplica, de forma quase mecânica, uma fórmula ou um processo operatório. Só há problema se o aluno for levado a interpretar o enunciado da questão que lhe é apresentada; Aproximações sucessivas de um conceito são construídas para resolver certo tipo de problemas: num outro momento, o aluno utiliza o que aprendeu para resolver outros, o que exige transferência, retificações, rupturas, segundo um processo análogo ao que se pode observar na História da Matemática; Um conceito matemático se constrói articulando com outros conceitos, por meio de uma série de retificações e generalizações. Assim, pode-se afirmar que o aluno constrói um campo de conceitos que toma sentido num campo de problemas, e não um conceito isolado em resposta a um problema particular; A resolução de problemas não é uma atividade para ser desenvolvida em paralelo ou como aplicação da aprendizagem, mas uma orientação para aprendizagem, pois proporciona o contexto em que 20 se podem aprender conceitos, procedimentos e atitudes matemáticas. ( BRASIL, 1998, p. 40 e 41) Com base nestes princípios a metodologia de Resolução de Problemas no ensino da Matemática, propicia o desenvolvimento do pensamento criador do aluno necessário para enfrentar as exigências do mundo contemporâneo, tendo em vista que as transformações da sociedade se dão de maneira surpreendente e imprevisível, exigindo cada vez mais do ser humano a capacidade de criar diante das situações problemas do cotidiano. A resolução de problemas no ensino-aprendizagem de matemática segue princípios e etapas. Para caracterizar as etapas retiramos do trabalho dos alunos RAMOS, Agnelo Pires e outros, do Instituto de Matemática e estatística da Universidade de são Paulo, orientandos do Prof. Antonio Luiz Pereira, as sugestões das etapas de reolução de problemas matemático proposta por George Polya. A heurística de resolução de problrmas de George Polya. “Resolver problemas é uma habilidade prática, como nadar, esquiar ou tocar piano: você pode aprendê-la por meio de imitação e prática. (...) se você quer aprender a nadar você tem de ir à água e se você quer se tornar um bom ‘resolvedor de problemas’, tem que resolver problemas”.9 George Polya (1897 – 1985), filósofo e matemático húngaro. _____________________________ 8 Fonte: site http://www.pbs.org/wgbh/aso/databank/entries/bhskin.html 9 POLYA, George. Mathematical Discovery: on Understanding, Learning, and Teaching Problem Solving. 2 vols. John Wiley,1962-65, p. ix. 21 Biografia de Polya George Polya (1897 – 1985) foi um dos matemáticos mais importantes do século XX. Nascido na Hungria, ele passou a maior parte do seu tempo pesquisando na universidade de Stanford nos Estados Unidos devido à situação política da Europa na época da Segunda Guerra Mundial. Pesquisou em vários ramos da matemática, como probabilidade e equações diferenciais parciais; sua maior contribuição, no entanto, está relacionada à heurística de resolução de problemas matemáticos com várias publicações relacionadas ao assunto, em especial How To Solve It – que vendeu mais de um milhão de cópias - em 1957. Polya é um dos matemáticos do nosso século que considera a Matemática uma “ciência observacional” na qual a observação e a analogia desempenham um papel fundamental; afirma também a semelhança do processo criativo na Matemática e nas ciências naturais. Polya foi o primeiro matemático a apresentar uma heurística de resolução de problemas específica para a matemática. Por isso, Polya representa uma referência no assunto, uma vez que suas idéias representam uma grande inovação em relação às idéias de resolução de problemas existentes até então (vide Descartes, Wallas, Skinner). Muitas de suas idéias são razoáveis até os dias atuais, servindo de alicerce para trabalhos de outros pesquisadores contemporâneos a Polya na área nesta área como Schoenfeld e Thompson. Etapas de resolução de problemas, segundo Polya Procurando organizar um pouco o processo de resolução de problemas, Polya o dividiu em quatroetapas. É importante ressaltar que Polya nunca pretendeu que a sua divisão correspondesse a uma seqüência de etapas a serem percorridas uma depois da outra sem que nunca seja conveniente ou 22 necessário voltar atrás ou que a sua divisão funcionasse como uma ‘poção mágica’ para resolver problemas matemáticos. As quatro etapas de resolução de problemas segundo Polya são: 1ª etapa: compreensão do problema O primeiro passo é entender o problema. É importante fazer perguntas. Qual é a incógnita? Quais são os dados? Quais são as condições? É possível satisfazer as condições? Elas são suficientes ou não para determinar a incógnita? Existem condições redundantes ou contraditórias? Construir figuras para esquematizar a situação proposta no exercício pode ser muito útil, sobretudo introduzindo-se notação adequada. Sempre que possível, procurar separar as condições em partes. 2ª etapa: construção de uma estratégia de resolução Encontrar conexões entre os dados e a incógnita. Talvez seja conveniente considerar problemas auxiliares ou particulares caso uma conexão não seja encontrada em tempo razoável. É importante fazer perguntas. Você já encontrou este problema ou um parecido? Você conhece um problema semelhante?Você conhece teoremas ou fórmulas que possam ajudar? Olhe para a incógnita e tente achar um problema familiar e que tenha uma incógnita semelhante. Caso você encontre um problema relacionado ao seu e que você sabe resolver, tente aproveitá-lo. Você pode usar seu resultado ou método? É necessário introduzir algum elemento auxiliar de modo a viabilizar esses objetivos? 23 Você consegue enunciar o problema de uma outra maneira? Caso você não consiga resolver o problema dado, tente resolver um problema parecido! Você consegue imaginar um caso particular mais acessível? E um caso mais geral e/ou mais acessível? Você consegue resolver alguma parte do problema? Mantenha apenas parte das condições do problema e observe o que ocorre com a incógnita: como ela varia agora? Você consegue obter alguma coisa desde os dados? Você consegue imaginar outros dados capazes de produzir a incógnita? Você consegue alterar a incógnita ou os lados, ou ambos, de modo que a nova incógnita e os novos dados fiquem mais próximos? Não se esqueça de levar em conta todos os dados e todas as condições. 3ª etapa: executando a estratégia Freqüentemente, esta é a etapa mais fácil do processo de resolução de um problema. Contudo, a maioria dos principiantes tende a pular esta etapa prematuramente e acabam se dando mal. Outros elaboram estratégias inadequadas e acabam se enredando terrivelmente na execução (e, deste modo, acabam sendo obrigados a voltar para a etapa anterior e elaborar uma nova estratégia). Ao executar a estratégia, verifique cada passo. Você consegue mostrar que cada um deles está correto? 4ª etapa: revisando a solução Você deve examinar a solução obtida, verificando os resultados e os argumentos utilizados. Você pode obter a solução de algum outro modo? 24 Qual a essência do problema e do método de resolução aplicado? Em particular, você consegue usar o resultado – ou o método – em algum outro problema? Qual a utilidade deste resultado? A importância de revisar a solução Conforme vimos anteriormente, Polya dividiu o processo de resolução de problemas matemáticos em quatro etapas: entendimento do problema, invenção de estratégia de resolução, execução e revisão. A revisão da solução é a etapa mais importante segundo Polya, pois esta etapa propicia uma depuração e uma abstração da solução do problema: - Depuração: o objetivo é verificar a argumentação usada, procurando simplificá-la; pode-se chegar ao extremo de buscar outras maneiras de resolver o problema, possivelmente mais simples, mas menos intuitivas e só agora acessíveis ao resolvedor. Há uma crítica generalizada aos matemáticos pesquisadores por publicarem demonstrações muito artificiais ou abstratas e que certamente não representam a maneira como o resultado em demonstração foi descoberto. Contudo, é inegável que a revisão de depuração é muito proveitosa. - Abstração: agora, o objetivo é refletir no processo de resolução procurando descobrir a essência do problema e do método de resolução empregado; tendo-se sucesso nessa empreitada, poder-se-á resolver outros problemas mais gerais ou de aparência bastante diferente. Ela representa a possibilidade de aumento do ‘poder de fogo’ do resolvedor. Feito por um matemático talentoso, esse trabalho de abstração representa a possibilidade de fertilização da Matemática. 25 Em síntese, a Resolução de problemas, como tendência da Educação Matemática, considera os alunos como participantes ativos do processo de aprendizagem com potencial para construção do conhecimento. 1.3 - O projeto pedagógico / o currículo em ação na área de matemática O projeto político-pedagógico mostra a visão macro do que a instituição escola pretende ou idealiza fazer, seus objetivos, metas, estratégias permanentes e processos avaliativos, tanto no que se refere às suas atividades pedagógicas, como às administrativas na âmbito das políticas implementadas. Assim, compete ao projeto político-pedagógico a operacionalização do planejamento escolar, em um movimento constante de avaliação. Neste sentido o projeto político-pedagógico passa a ser uma direção, um rumo para as ações da escola, através de uma ação intencional que deve ser construída coletivamente. Ele é denominado de político porque reflete as opções e escolhas de caminhos e prioridades na formação do cidadão, como membro ativo e transformador da sociedade em que vive. Pedagógico porque direciona as atividades pedagógicas e didáticas da escola. A separação entre o político e pedagógico é apenas formal, na realidade as ações apresentam-se formando uma totalidade. Assim, o projeto político pedagógico é um instrumento de fundamental importância para definição do currículo da escola e neste a parte referente à área de matemática da educação infantil e séries iniciais, tendo em vista que trata-se de um ramo do saber caracterizado pela abstração, precisão, rigor lógico nos seus resultados e conclusões. Desta forma, é na parte do currículo referente ao ensino de matemática onde delimita-se as competências e habilidades, conteúdos, metodologias e critérios de avaliação da ação pedagógica, bem como o encaminhamento para discussão de temas voltados para contribuir com a formação de uma cultura que reflita as necessidades e os anseios do cidadão. Competência, segundo 26 Guiomar Namo de Mello (2003), “é a capacidade de mobilizar conhecimentos, valores e decisões para agir de modo pertinente numa determinada situação”. É também através do currículo que se caracteriza a clientela que vai estudar matemática entendida como ciência que estuda todas possíveis ralações e interdependências quantitativas entre grandezas, comportando um vasto campo de teorias, modelos e procedimentos de análise. Finalmente, é seguindo o rumo dado pelo Projeto Político Pedagógico e as diretrizes curriculares da escola na sua totalidade e do ensino da matemática na sua especificidade destinado a desenvolver competências e habilidades intelectuais necessárias a agilização do raciocínio para resolver problemas do cotidiano dos alunos. 1.4 – Formação do professor para o ensino de matemática A formação do docente para o ensino de matemática na educação infantil e as séries iniciais do ensino fundamental tem sido discutida em função das propostas de formação inicial trabalhadas pelas agências formadores de profissionais para este ramo do saber. Para D’Ambrósio (2007), as qualidades de um Professor de Matemática está sintetizada em três categorias: 1. Emocional/afetiva; 2. Política; 3. Conhecimento. Neste sentido, várias questões são evidenciadas no processo de formação do educador para trabalhar o ensino de matemática. Dentre vários, o de indagar sobre o domínio do saber matemático que possui caráter abstrato, onde seus conceitos e resultados tem origem no mundo real, destinado a muitas aplicações em outras ciências e inúmeras aplicações práticas do cotidiano. Ainda com relação à formação do professor de matemática, a racionalidade formativa aponta para competências e habilidades capaz de responder as exigências e à multiplicidade de situações que permeiam o exercício da docência na sociedade do conhecimento, da informação, ciência e tecnologia. 27 Essas competências e habilidades devem ainda responder também as exigências para formação do professor reflexivo de matemática relativa à necessidade do enfoque interdisciplinar, investigação do cotidiano da prática pedagógica pela pesquisa e o domínio dos saberes intrínsecos à profissão docente. Pensar a formação de professores implica, portanto, pensar que o exercício da docência, conforme Tardif (1991), requer a mobilização de vários tipos de saberes: saberes pedagógicos (reflexão sobre a prática educativa mais ampla), saberes dasdisciplinas (envolvem vários campos do conhecimento e concretizam-se pela operacionalização dos programas), saberes curriculares (selecionados no contexto da cultura erudita) e os saberes da experiência (constituem-se saberes específicos no exercício da atividade profissional.(BRITO, 2006, p.45) Em síntese, fica claro que, em uma sociedade complexa, onde a velocidade das informações e as mudanças proporcionadas pelo avanço das ciências e tecnologias são constantes, a formação do Professor de Matemática requer reflexões e ações dinâmicas destinadas a construir e reconstruir saberes necessários à gerência de uma prática pedagógica reflexiva. 1.5 – O aluno de matemática e o processo ensino-aprendizagem Geralmente os Professores concentram parte de suas energias com questões relacionadas ao planejamento da aula, procurando elaborar bem as competências e habilidade, selecionar conteúdos, escolher métodos e técnicas de ensino, montar estratégias para desenvolver as aulas e avaliar a aprendizagem, mas nem sempre procuram saber quem são seus alunos. No desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem é importante que os Professores vejam o aluno como sujeito da aprendizagem, é ele quem realiza a ação de aprender. Não existem meios de ensinar alguém que não 28 tenha tomado a decisão de aprender, tendo em vista que a aprendizagem é um processo interno que depende da vontade de cada pessoa. Ainda nesta linha de pensamento faz-se necessário entender que a aprendizagem é resultado de ações interativas do sujeito com seu meio social e natural circundante. Este referencial requer o reconhecimento do aluno como centro do processo ensino-aprendizagem onde o Professor tem a função de auxiliar o desenvolvimento do aluno percebendo em que zona proximal se encontra para oferecer subsidio necessário ao alcance de outra mais avançada. Para tanto, os alunos de matemática devem ser reconhecidos pelas características internas e externas que apresentam com maiores evidências. Assim, são classificados como crianças, adolescentes e jovens, das mais diferentes origens sociais, que vivem do ponto de vista da prática simbolizadora, construindo explicações sobre o mundo natural e social no qual está inserido. São geralmente possuidores de uma inteligência essencialmente prática, que permite reconhecer problemas, buscar e selecionar informações e tomar decisões diante de situações que exigem raciocínio matemático. Assim, é de fundamental importância para o Professor manter-se informado sobre a cultura primeira1 dos alunos, tradição cultural étnica e religiosa, grupos sociais que pertence e rede de comunicação social da qual faz parte, para facilitar o seu trabalho e conseqüentemente a aprendizagem do conhecimento matemático. Desta forma, saber as características do aluno de matemática e confrontar com quem realmente ele é constitui-se no primeiro passo para o Professor tornar-se um facilitador da aprendizagem do saber matemático. O segundo é entender que este aluno está inserido em um universo simbólico, mediado por interações que podem ser aproveitadas no aprimoramento dos conceitos, procedimentos e atitudes que contribuem para aprendizagem do aluno. 1 A denominação cultura prevalente ou primeira está incluindo, portanto: palavras que são resultado de sensações orgânicas, de experiências de ações diretas sobre os objetos, artefatos e fenômenos; explicações aprendidas em relações diretas com outras pessoas e/ou com os meios de comunicação social e outras produções culturais, como explicações de origem religiosa, da tradição oral étnica ou de uso específico de um grupo social particular. 29 1.6 - Desafios para o ensino de matemática Os desafios do mundo contemporâneo, principalmente os gerados pelas transformações advindas do avanço das ciências e tecnologias, são transferidos para escola em formas de saberes a serem discutidos, avaliados e aperfeiçoado pela reflexão sobre suas origens, causas e conseqüências. Nesse contexto situamos o ensino de matemática, com uma boa parte da parcela de contribuição referente à formação humana no sentido orientar para o enfrentamento dos desafios relativos às transformações requisitadas para sobrevivência no planeta terra. Na dimensão do ensino de matemática, necessitamos superar o desafios de fazer chegar os conhecimentos matemáticos a todos, através da superação do estigma de ciência lógica comunicativa complexa, de difícil acesso e restrita apenas a uma pequena parcela privilegiada da humanidade. Assim, os desafios do ensino de matemática serão desenvolvidos com base nos questionamentos a seguir: • Como fazer chegar a o saber matemático a todos os indivíduos do planeta terra? • Como formar os Professores de Matemática para enfrentar o desafio de levar o conhecimento matemático a todos? • Como aplicar os resultados das pesquisas em educação matemática na prática pedagógica dos Professores? a) Matemática para todos. Enquanto os habitantes do Brasil eram “pacificados” e “alfabetizados” segundo os princípios e costumes europeus, a matemática era apropriada por 30 uma pequena elite que compreendia o valor do seu aprendizado para o desenvolvimento e progresso da humanidade. Este fato gerou um distanciamento entre a elite, principalmente os militares e o “povo brasileiro” e os “portugueses” menos esclarecidos que acompanhavam a corte para realização de serviços domésticos ou braçais. Assim, foi instalado o ensino de matemática no Brasil destinado para poucos que despertavam interesse por esta área do saber. Com base nos informes históricos do ensino de matemática no Brasil, este teve inicio com os cursinhos preparatórios para o ingresso nas academias militares e cursos superiores. Este teve novo impulso na década de trinta com a criação das primeiras faculdades de filosofia destinada à formação de Professores. Neste sentido destaca-se o esforço de Euclides Roxo que fundiu as disciplinas aritmética, álgebra e geometria em uma denominada de matemática, mas mesmo assim continuou com acesso a uma pequena fatia da população. Diante deste quadro o desafio para educação é colocar o saber matemático ao alcance de todos através da escola e outros meios de comunicação de massa que possam levar a maior parcela da sociedade. No que diz respeito à educação escolar, cabe aos Professores e Professoras de matemática desencadear uma campanha de popularização dos conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais através de incentivos como: olimpíadas, clubes de matemática, exposições e outros. b) Como formar Professores de Matemática para enfrentar o desafio de levar o conhecimento matemático a todos? É unânime nos discursos sobre a formação de professores matemática a idéia de que eles precisam ter o domínio dos saberes matemático, mas tem ficado também muito claro a necessidade de serem desenvolvidas competências e habilidades do fazer pedagógico, comprometido com a proposta que conduza os alunos ao desenvolvimento do raciocínio lógico- 31 matemático associado à crítica e criatividade desta área do saber, bem como sua aplicação no cotidiano da sociedade. Dentre as competências e habilidades do fazer pedagógico destaca-se como um dos principais desafios na formação dos professores de matemática, a utilização das novas tecnologias de comunicação e informação que circulam no cotidiano da sociedade atual. Esta lacuna pode ser gerada tanto pela falta de equipamentos e materiais didáticos nas instituições formadoras, como pela influência da prática pedagógica de Professores que rejeitam a aplicação de novas técnicas para discussão dos conceitos e resoluções de problemas que envolvam a realidade social e continuam trabalhando de forma tradicional, utilizando métodosobsoletos que tornam difícil despertar interesse dos alunos pelo procura de novas alternativas para o ensino da matemática. Outro desafio encontra-se na relação professor e aluno no processo de formação. Assim, os alunos, futuros Professores de matemática, devem ser formados com a orientação de que o saber matemático é algo para ser assimilado, discutido, compreendido, reconstruído e construído junto com os alunos visando a aplicação no contexto social do qual faz parte. Na superação deste desafio centra-se os mecanismos melhoria do processo ensino-aprendizagem e o compromisso de levar a todos o conhecimento matemático. c) Como aplicar os resultados das pesquisas em educação matemática na prática pedagógica dos Professores? O processo ensino-aprendizagem de matemática tem sido, principalmente após a década de 60, alvo de muitas pesquisas na área pedagógica relativa à produção de materiais áudio visual com utilização das novas tecnologias, métodos e técnicas do fazer pedagógico. A intensificação do interesse para esta área de estudo teve como ponto de partida o momento em que o mundo foi surpreendido com conquista do universo através da ida do homem a lua. Esse fato deu-se em meio a uma disputa de forças ideológicas 32 entre o bloco dos países socialistas liderados pela União das Repúblicas Socialistas (URSS) e os capitalistas sob a liderança dos Estados Unidos da América (USA). Foi justamente os Estados Unidos quem sentiu necessidade de mudança na área do ensino, onde o marco principal foi a proposta denominada de “matemática moderna” com a introdução da teoria dos conjuntos e aplicação do método de resolução de problemas. Esta influenciou diretamente o Brasil que, neste período, importava conhecimento e tecnologia dos norte-americanos. As pesquisas na área da educação matemática continuam sendo realizadas pelos alunos da graduação através dos trabalhos de conclusão de curso TCC e especialização lato e stricto senso com monografias, dissertações, teses e ainda livros publicados por pesquisadores de renome desta área. Neste sentido, o desafio é trazer para sala de aula os estudos acumulados sobre a educação matemática, com o fim ser de colocado a disposição dos Professores para serem aplicados no cotidiano da prática pedagógica. No desafio de aproximar o ensino de matemática dos resultados das pesquisas pedagógicas, qualquer mecanismo é valido, mas um dos mais eficientes encontra-se nas salas de aulas dos cursos de formação de Professores e sua extensão na prática pedagógica dos docentes das escolas de ensino fundamental e médio, tende em vista que é nelas onde se encontram os principais agentes de articulação deste processo. Neste cenário são de fundamental importância os cursos de formação continuada em nível de graduação e pós-graduação, tendo em vista que os mesmos se constituem em canais de comunicação e troca de experiências entre as escolas de ensino fundamental ou médio e as instituições de ensino superior, pesquisa e extensão, permitindo atingir outros professores, alunos e pais com idéias ou práticas inovadoras relativas ao ensino da matemática. 33 ATIVIDADES DA UNIDADE “I” TEMA: CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA a) Atividade “1” – obrigatória – fórum de participação. Os conteúdos para o ensino da matemática, no Brasil, foram trabalhados nos moldes tradicionais, sem propostas metodológicas de inovação por muito tempo. Somente na década de 60, surgiu o primeiro grupo de educação matemática, sob a liderança de Osvaldo Sangiorgi no Estado de São Paulo. Em seguida surgiram também outros grupos precisamente no estado do Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, justamente no momento em que diferentes países do mundo passaram a discutir questões relativas à educação matemática, influenciada pelo movimento da Matemática Moderna. Com base no parágrafo acima podemos concluir que a preocupação com a metodologia do ensino da matemática é recente. Este fato pode ter contribuído para impedir o avanço de propostas metodológicas nesta área de ensino e aprendizagem? Faça a leitura do texto na íntegra, forme sua opinião e poste no fórum de participação. Leia a opinião de colega e faça seus comentários. CONHECIMENTOS Atividade “2” – obrigatória – correio eletrônico. Diante dos conhecimentos sobre as tendências pedagógicas, os educadores responsáveis pelo ensino da matemática, ao tomar consciência de que o mesmo não poderia mais continuar nos moldes tradicionais, partiram para busca de alternativa que colocasse a prática pedagógica do processo ensino-aprendizagem de matemática em sintonia com as propostas modernas de educação. 34 Assim, existem atualmente cinco tendências para o ensino da Matemática, denominadas de Etnomatemática, História da Matemática, Matemática Crítica, Modelagem Matemática e Resolução de Problemas. Destas tendências qual você acha mais apropriada para trabalhar matemática na atualidade? Justifique. Escreva um pequeno texto colocando sua posição e envie pelo correio eletrônico ou entregue para o monitor presencial. Atividade “3” – obrigatória - fórum de discussão Para D’Ambrósio (2007), as qualidades de um Professor de Matemática está sintetizada em três categorias: 1. Emocional/afetiva; 2. Política; 3. Conhecimento. Dentre estas categorias, com base nas suas observações, qual a mais presente na prática pedagógica do Professor de matemática? Em sua opinião, o Professor de matemática pode ser um excelente profissional possuindo apenas uma destas categorias? Atividade “4” – obrigatória – correio eletrônico. Dos desafios apresentados no texto, qual,na sua opinião, o mais difícil de ser enfrentado? Justifique sua resposta. Elabore um pequeno e poste no correio eletrônico ou entregue para monitor(a) presencial. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA BRASIL, Ministério de Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental, Parâmetros Curriculares Nacionais; MATEMÁTICA.Brasilia: MEC, 1997. 35 BRASIL. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília: MEC, 1999. BRASIL. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. PCN+: Ensino Médio – orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC, 2006. D’AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação Matemática: da teoria à prática. Campinas: Papirus, 2007. KAMII, Constance. A criança e o número.Campinas: Papirus, 2004 MELO, Guiomar Namo de. Afinal, o que é competência ?.Brasilia: Nova Escola, v.18, n. 160, p. 14, março de 2003 SAVIANI, D. Escola e Democracia. 2ª edição. São Paulo: Cortez editora e Editora Autores Associados, 1984. SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 2ª edição. São Paulo: Cortez editora e Editora Autores Associados, 1991. 36 UNIDADE 2 - PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA MATEMÁTICA (ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E ENSINO MÉDIO) E A FORMAÇÃO DO PENSAMENTO PELO CAMINHO DA SIMBOLIZAÇÃO. RESUMO A unidade II apresenta um estudo sobre os parâmetros curriculares nacionais para matemática (anos finais do ensino fundamental e ensino médio), seguido de um texto sobre a formação do pensamento pelo caminho da simbolização. 37 II - PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA MATEMÁTICA (ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E ENSINO MÉDIO) E A FORMAÇÃO DO PENSAMENTO PELO CAMINHO DA SIMBOLIZAÇÃO. . Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s, tem se constituído em instrumento norteador de reformas e inovações metodológicas para áreas dos diversos conhecimentos curriculares do ensino fundamental e médio, constituindo-se em carta de intenções oficiais para sociedade brasileira. No campo da matemática estas intençõessão expressas nos PCN através de sua finalidade, objetivo e, como decorrência, orientação para formação inicial de professores. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática têm como finalidade fornecer elementos para ampliar o debate nacional sobre o ensino dessa área do conhecimento, socializar informações e resultados de pesquisas, levando-as ao conjunto dos professores brasileiros. Visam à construção de um referencial que oriente a prática escolar de forma a contribuir para que toda criança e jovem brasileiros tenham acesso a um conhecimento matemático que lhes possibilite de fato sua inserção, como cidadãos, no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura. Como decorrência poderá nortear a formação inicial e continuada de professores, pois à medida que os fundamentos do currículo se tornam claros fica implícito o tipo de formação que se pretende para o professor, como também orientar a produção de livros e de outros materiais didáticos, contribuindo dessa forma para a configuração de uma política voltada à melhoria do ensino fundamental. (BRASIL, 1998, p.15) Muitos são os motivos que justificam a preocupação com o ensino da matemática no nível fundamental, dentre vários se encontram no contexto da convivência humana, as mudanças sociais aceleradas, a globalização, os 38 impactos tecnológicos e o compromisso da educação diante das exigências do povo brasileiro Essas razões e outras mais específicas, associadas às condições econômicas, culturais e científicas do país, neste início de século XXI, justificam a implementação de reforma curricular nos sistemas de ensino fundamental e médio, em especial no currículo de matemática por se tratar de um saber indispensável à sustentação das transformações tecnológicas aceleradas que afetam o mundo do trabalho, das comunicações, das informações e das ciências. A presença dos PCN de matemática ao longo de sua existência trouxe à tona a discussão sobre o currículo de matemática para o ensino fundamental e médio, rompendo com a idéia de que o mesmo se constituía apenas de uma lista de tópicos e objetivos a serem alcançados a qualquer custo. Ao contrário, ele ofereceu uma proposta centrada em objetivos acompanhados com o tratamento das informações, bem como orientações em torno das abordagens metodológicas e modo de avaliar o desempenho da aprendizagem dos alunos. Como documento oficial norteador da prática pedagógica do ensino de matemática, os Parâmetros Curriculares Nacionais, embora mantenha a seqüência de saber sistematizado, apresentam indicação de propostas diferenciadas para o ensino fundamental e médio em função da suas peculiaridades. Isto fez com que, neste trabalho, sejam comentadas de forma separada as proposições referentes a cada nível de ensino. 2.1 - PCN DE MATEMÁTICA PARA O ENSINO FUNDAMENTAL A proposta do ensino fundamental dos PCN de matemática, apresenta na sua primeira parte uma breve análise dos mais recentes movimentos de reforma curricular do ensino de Matemática no Brasil, apoiada na necessidade de reverter o quadro em que a Matemática se configura como um filtro de seleção social dos alunos que ingressam neste nível de ensino, bem como a necessidade de oferecer um ensino de Matemática de qualidade capaz de 39 contribuir com o desenvolvimento do raciocínio lógico matemática indispensável à formação do cidadão brasileiro. Para tanto, os PCN de matemática do ensino fundamental traz como ponto inovador de seu conteúdo as principais características do conhecimento matemático e seu papel na construção da cidadania. Para reforçar esta intenção, apresenta uma proposta de trabalho interdisciplinar com base nos temas transversais que aborda como sugestão, a ética, orientação sexual, meio ambiente, saúde, pluralidade cultural, trabalho, consumo e outros que venham surgir de acordo com as necessidades do meio onde se processo a formação do cidadão brasileiro. Essa análise abre uma discussão sobre o papel da Matemática na construção da cidadania - eixo orientador dos Parâmetros Curriculares Nacionais-, enfatizando a participação crítica e a autonomia do aluno. Sinaliza a importância do estabelecimento de conexões da Matemática com os conteúdos relacionados aos Temas Transversais - Ética, Pluralidade Cultural, Orientação Sexual, Meio Ambiente, Saúde, Trabalho e Consumo -, uma das marcas destes parâmetros.(BRASIL, 1998, p. 15) Este processo de formação realiza-se na escola com a participação das áreas de conhecimento que proporcionam meios para o desenvolvimento das competências e habilidades especificas de cada uma delas. Com relação à de matemática, os PCN do ensino fundamental oferece informações sobre o professor e o saber matemático, o aluno e o saber matemático, as relações professor-aluno e aluno-aluno e alguns caminhos para “fazer matemática” na sala de aula através da resolução de problemas, recursos à história da matemática, recursos às tecnologias da comunicação e recursos aos jogos. Com base no eixo norteador de formação do aluno para construção da cidadania, os PCN do ensino fundamental apresentam como os componentes não pessoais do processo ensino aprendizagem os objetivos, seguidos dos conteúdos selecionados, orientações didáticas e formas de avaliação. Desta forma, os objetivos para o ensino fundamental de matemática ficaram assim delineados: 40 • Identificar os conhecimentos matemáticos como meios para compreender e transformar o mundo à sua volta e perceber o caráter de jogo intelectual, característico da Matemática, como aspecto que estimula o interesse, a curiosidade, o espírito de investigação e o desenvolvimento da capacidade para resolver problemas; • Fazer observações sistemáticas de aspectos quantitativos e qualitativos do ponto de vista do conhecimento e estabelecer o maior número possível de relações entre eles, utilizando para isso o conhecimento matemático (aritmético, geométrico, métrico, algébrico, estatístico, combinatório, probabilístico); selecionar, organizar e produzir informações relevantes, para interpretá-las e avaliá-las criticamente; • Resolver situações-problema, sabendo validar estratégias e resultados, desenvolvendo formas de raciocínio e processos, como dedução, indução, intuição, analogia, estimativa, e utilizando conceitos e procedimentos matemáticos, bem como instrumentos tecnológicos disponíveis; • Comunicar-se matematicamente, ou seja, descrever, representar e apresentar resultados com precisão e argumentar sobre suas conjecturas, fazendo uso da linguagem oral e estabelecendo relações entre ela e diferentes representações matemáticas; • Estabelecer conexões entre temas matemáticos de diferentes campos e entre esses temas e conhecimentos de outras áreas curriculares; • Sentir-se seguro da própria capacidade de construir conhecimentos matemáticos, desenvolvendo a auto-estima e a perseverança na busca de soluções; • Interagir com seus pares de forma cooperativa, trabalhando coletivamente na busca de soluções para problemas propostos, identificando aspectos consensuais ou não na discussão de um assunto, respeitando o modo de pensar dos colegas e aprendendo com eles. (BRASIL, 1998, p. 47 e 48) Com base nos objetivos educacionais para o ensino fundamental de matemática foram selecionados os conteúdos e organizados em blocos alinhados com base no caráter de essencialidade ao desempenho das funções básicas do cidadão brasileiro. Segundo os PCN de matemática para o ensino fundamental (1998): Há um razoável consenso no sentido de que os currículos de Matemática para o ensino fundamental devam contemplar o estudo dos números e das operações (no campo da Aritmética e da Álgebra), o estudo do espaço e das formas (no campo da Geometria) e o estudo das grandezas e das medidas (que permite interligações entre os camposda Aritmética, da Álgebra e da Geometria). O desafio que se apresenta é o de identificar, dentro de cada um desses vastos campos, de um lado, quais conhecimentos, competências, hábitos e valores são socialmente relevantes; de outro, em que medida contribui para o desenvolvimento intelectual do aluno, ou seja, na construção e coordenação do pensamento lógico- matemático, da criatividade, da intuição, da capacidade de análise e 41 de crítica, que constituem esquemas lógicos de referência para interpretar fatos e fenômenos. Um olhar mais atento para nossa sociedade mostra a necessidade de acrescentar a esses conteúdos aqueles que permitam ao cidadão "tratar" as informações que recebe cotidianamente, aprendendo a lidar com dados estatísticos, tabelas e gráficos, a raciocinar utilizando idéias relativas à probabilidade e à combinatória. Embora nestes Parâmetros a Lógica não se constitua como bloco de conteúdo a ser abordado de forma sistemática no ensino fundamental, alguns de seus princípios podem ser tratados de forma integrada aos demais conteúdos, desde as séries iniciais. Tais elementos, construídos através de exemplos relativos a situações- problema, ao serem explicitados, podem ajudar a compreender melhor as próprias situações. Assim, por exemplo, ao estudarem números, os alunos podem perceber e verbalizar relações de inclusão, como a de que todo número par é natural; mas, observarão que a recíproca dessa afirmação não é verdadeira, pois nem todo número natural é par. No estudo das formas, mediante a observação de diferentes figuras triangulares, podem perceber que o fato de um triângulo ter ângulos com medidas idênticas às medidas dos ângulos de um outro triângulo é uma condição necessária, embora não suficiente, para que os dois triângulos sejam congruentes.(BRASIL, 1998, p. 49 e 50 ) Os conteúdos são organizados nos blocos “números e operações” “espaço e forma” e “grandezas e medidas”, para serem trabalhados ao longo do ano letivo, levando em consideração as conexões que podem ser estabelecidas entre os diferentes blocos, as possibilidades de seqüenciar os conteúdos e as oportunidades de aprofundamento em função das condições apresentadas pelos alunos. A título de exemplo será apresentado o item “espaço e forma” e os demais procurem ler no PCN de matemática para o ensino fundamental. • Espaço e Forma Os conceitos geométricos constituem parte importante do currículo de Matemática no ensino fundamental, porque, através deles, o aluno desenvolve um tipo especial de pensamento que lhe permite compreender, descrever e representar, de forma organizada, o mundo em que vive. 42 A Geometria é um campo fértil para se trabalhar com situações- problema e é um tema pelo qual os alunos costumam se interessar naturalmente. O trabalho com noções geométricas contribui para a aprendizagem de números e medidas, pois estimula a criança a observar, perceber semelhanças e diferenças, identificar regularidades e vice-versa. Além disso, se esse trabalho for feito a partir da exploração dos objetos do mundo físico, de obras de arte, pinturas, desenhos, esculturas e artesanato, ele permitirá ao aluno estabelecer conexões entre a Matemática e outras áreas do conhecimento. As sugestões de atividades encontram-se sempre embutidas nas orientações destinadas ao desenvolvimento de cada bloco, conforme o exemplo abaixo, com tópicos do PCN de matemática para o ensino fundamental (1998) Finalmente, a avaliação proposta pelos PCN do ensino fundamental recomenda que seja parte integrante do processo ensino-aprendizagem, realizada de forma continua com base em dados coletados através de observações das situações de aprendizagem, como resolução de problema coleta de informações sobre o desempenho dos alunos. 2.2 - PCN DE MATEMÁTICA PARA O ENSINO O MÉDIO Enquanto o PCN do ensino fundamental apresenta com uma abertura para interdisciplinaridade com outras áreas do conhecimento, o ensino médio apresenta uma proposta interdisciplinar que envolve ciências, desmembrado em Física, Química, Biologia, Matemática e suas tecnologias. No sentido desses referenciais, este documento procura apresentar, na secção sobre o sentido do aprendizado na área, uma proposta para o Ensino Médio que, ser profissionalizante, efetivamente propicie um aprendizado útil à vida e ao trabalho, no qual as informações, o conhecimento, as competências, as habilidades e os valores desenvolvidos sejam instrumentos reais da percepção, satisfação, interpretação, julgamento, atuação, desenvolvimento pessoal ou de aprendizado permanente, evitando tópicos cujos sentidos só possam ser compreendidos em outra etapa de escolaridade.(BASIL, 1999, p.203) 43 Nesta proposta, a matemática é reconhecida como uma ciência, linguagem, bem como instrumento para informação e comunicação social que ocupa uma posição singular nesta área do saber. A matemática, por sua universidades de quantificação e expressão, como linguagem portanto, ocupa uma posição singular. No ensino médio, quando nas ciências torna-se essencial uma construção abstrata mais elaborada, os instrumentos matemáticos são especialmente importantes. Mas não é só nesse sentido que a matemática é fundamental. Possivelmente não existe nenhuma atividade da vida contemporânea, da música à informática, do comércio a meteorologia, da medicina à cartografia, das engenharias às comunicações, em que a matemática não compareça de maneira insubstituível para codificar, ordenar, quantificar e interpretar compassos, taxas, dosagens, coordenadas, tensões, freqüências e quantas outras variáveis houver.(...) (BRASIL, 1999, p. 211) A matemática do ensino médio tem o papel de formar os alunos através da estruturação do pensamento, desenvolvimento lógico e se constitui em instrumento para as tarefas específicas das atividades humanas. Assim a matemática apresenta-se com um caráter formativo e instrumental. Em seu papel formativo a Matemática contribui para o desenvolvimento de processos de pensamento e a aquisição de atitudes, cuja utilidade e alcance transcendem o âmbito da própria Matemática, podendo formar no aluno capacidade de resolver problemas genuínos, gerando hábitos de investigação, proporcionando confiança e desprendimento para analisar e enfrentar situações novas, propiciando a formação de uma visão ampla e científica da realidade, a percepção da beleza e da harmonia, o desenvolvimento da criatividade e outras capacidades pessoais. No que diz respeito ao caráter instrumental da matemática no ensino médio, ela deve ser vista pelo aluno como um conjunto de técnicas e estratégias para serem aplicadas a outras áreas do conhecimento, assim como para a atividade profissional. Não se trata de os alunos possuírem muitas e sofisticadas estratégias, mas sim de desenvolverem a iniciativa e a segurança para adaptá-las a diferentes contextos, usando-as adequadamente no momento oportuno. (BRASIL, 1999, p.251) O caráter formativo e instrumental não se processa de forma separada, eles acontecem ao mesmo tempo através de uma simbologia própria, um sistema de códigos, regras que dão corpo a linguagem destinada a possibilitar informações e comunicação de idéias, conceitos e relações estruturadas em consonância com a lógica matemática. 44 Neste processo de aprendizagem da ciência lógica matemática destinada a se constituir em ferramenta informação e comunicação sempre foi lançada mão da tecnologia, iniciando com ábaco que transferiu idéias para invenção das calculadoras e computadores. Neste sentido, vale salientar que a contribuição da matemática vai além do uso das máquinas, tendo em vista que contribui com a formação de competências e habilidades indispensáveis ao raciocínio exigido para sobrevivência no mundo das tecnologias de informação e comunicação exigida pela sociedade informática. Esse impacto datecnologia, cujo instrumento mais relevante é hoje o computador, exigirá do ensino da matemática um redirecionamento sob uma perspectiva curricular que favoreça o desenvolvimento sob uma perspectiva curricular que favoreça o desenvolvimento o desenvolvimento de habilidades e procedimentos com os quis o indivíduo possa se reconhecer e se orientar nesse mundo do conhecimento em constante movimento. Para isso, habilidades como selecionar informações obtidas e, a partir disso, tomar decisões exigirão linguagem, procedimentos e formas de pensar matemáticos que devem ser desenvolvidos ao longo do Ensino Médio, bem como a capacidade de avaliar limites, possibilidades e adequação das tecnológicas em diferentes situações.(BRASIL, 1999, p.252) Assim, os PCN de matemática para o ensino médio estabelece objetivos gerais para aprendizagem significativa neste nível, ao tempo que alerta para revisão das metodologias e seleção de conteúdos, conforme citação abaixo. De fato não basta revermos a forma ou metodologia de ensino, se mantivermos o conhecimento matemático restrito à informação, com as definições e os exemplos, assim como a exercitação, ou seja, exercícios de aplicação ou fixação. Pois, se os conceitos são apresentados de forma fragmentada, mesmo que de forma completa e aprofundada, nada garante que o aluno estabeleça alguma significação para as idéias isoladas e desconectadas umas das outras. Acredita-se que o aluno sozinho seja capaz de construir as múltiplas relações entre os conceitos e formas de raciocínio envolvidas nos diversos conteúdos; no entanto, o fracasso escolar e as dificuldades dos alunos frente à Matemática mostram claramente que isso não é verdade. ( BRASIL, 1999, p. 255) Fica bem claro no texto dos PCN de matemática que o critério central para organização do currículo é a contextualização e interdisciplinaridade, tanto de forma interna com os diferentes temas do saber matemático como em relação a outras áreas do conhecimento. 45 O critério central é o da contextualização e da interdisciplinaridade, ou seja, é o potencial de um tema permitir conexões entre diversos conceitos matemáticos e entre diferentes formas de pensamento matemático, ou ainda, a relevância cultural do tema, tanto no que diz respeito às suas aplicações dentro ou fora da matemática, como sua importância histórica no desenvolvimento da própria ciência. (BRASIL, 1999, p.255) Desta forma, associado aos conceitos trabalhados nas aulas de matemática do ensino médio deve ser levado em conta os procedimentos e as atitudes indispensáveis para o aluno aprender a aprender os conteúdos necessários ao enfrentamento do mundo do conhecimento e trabalho na era das novas tecnologias de informação e comunicação. A seleção dos conteúdos deve ser criteriosa, levando em consideração uma seqüencia lógica que propicie ao “fazer matemático” possibilidades para investigação e outros meios que auxilie na apropriação de conhecimento. A título de sugestão, os conteúdos básicos para o ensino médio devem ser organizados em quatro blocos: Números e operações; Funções; Geometria; Análise de dados e probabilidade. Segundo os PCN+ de matemáticas, estes conteúdos devem ser trabalhados de forma articulada e formativa, descartando a memorização, dicas e regras desprovidas de explicações e resolução de exercícios mecânicos sem mecanismo lógico matemático. Isso não significa que os conteúdos desses blocos devam ser trabalhados de forma estanque, mas, ao contrário, deve-se buscar constantemente a articulação entre eles. Algumas vezes, de forma intencional, são retomados assuntos já tratados no ensino fundamental – é o momento de consolidar certos conceitos e idéias da matemática escolar que dependem de explicações cuja compreensão exige uma maior maturidade. Sugestões quanto à forma de trabalhar os conteúdos acompanham o detalhamento sempre que possível, destacando-se o valor formativo agregado e descartando-se as exigências de memorização, as apresentações de “regras” desprovidas de explicações, a resolução de exercícios repetitivos de “fi-xação” ou a aplicação direta de fórmulas. (BRASIL, P. 70, 2006) Maiores informações sobre questão de conteúdo, de metodologia, uso de tecnologia, organização curriculares e projeto político pedagógico, poderão ser encontradas nos “orientações curriculares para o ensino médio, volume 2: 46 Ciências da Natureza, Matemática e suas tecnologias: Conhecimento de Matemática, capítulo 3, no texto em anexo. 2.3 - A FORMAÇÃO DO PENSAMENTO PELO CAMINHO DA SIMBOLIZAÇÃO. Com relação à formação do pensamento pelo caminho da simbolização deve iniciar na educação infantil com a introdução dos símbolos associados as idéias de maior, menor, igual e diferente. A medida que a criança se aprimora passando para séries iniciais, quando é introduzido a resolução de problemas matemática passam a lidar com os termos desconhecidos que inicialmente é apresentado com uma simbolização familiar, quadrado ou triângulo, para posteriormente serem substituídos pelos símbolos denominados de incógnitas “x”, “y” e “z”, para trabalhar com cálculo de áreas e perímetros. Os símbolos em matemática representam idéias, conceitos e relações. Como exemplo o símbolo “+” da adição representa a idéia de juntar enquanto o símbolo “-“ da subtração representa a idéia de retirar; os símbolos menor que, igual, maior que, menor igual e maior igual, expressam o conceito de objetos ou valores nestas condições “<” “=” “>” “≤” “≥”. Como pode ser constatado o símbolo que surgiu historicamente com a humanidade expressando a sua forma de pensar, sendo aprimorado para comunicar resultados ou bens materiais que ao adotar uma lógica originou a matemática como ciência que utiliza os símbolos para indicar o raciocínio lógico necessário ao cálculo, análise, síntese e emitir parecer avaliativo sobre situações concretas ou abstratas do cotidiano. 47 ATIVIDADES DA UNIDADE “II” TEMA: PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA MATEMÁTICA (ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E ENSINO MÉDIO) E A FORMAÇÃO DO PENSAMENTO PELO CAMINHO DA SIMBOLIZAÇÃO. Atividade “1” – obrigatória – correio eletrônico “Muitos são os motivos que justificam a preocupação com o ensino da matemática no nível fundamental, dentre vários se encontram no contexto da convivência humana, as mudanças sociais aceleradas, a globalização, os impactos tecnológicos e o compromisso da educação diante das exigências do povo brasileiro”. Com base no parágrafo acima, escreva um pequeno texto contextualizando a situação do seu compromisso e envie através do correio eletrônico ou monitor(a) presencial. Para realização deste estudo sugerimos a leitura do texto introdutório do assunto, o texto em anexo “Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias”. CONHECIMENTOS Atividade “2” – obrigatória – fórum de participação Os conteúdos são organizados nos blocos “números e operações” “espaço e forma” e “grandezas e medidas”. Excluindo o “espaço e forma”, procure tecer comentário sobre os demais blocos e coloque sua opinião em um texto para ser depositado no fórum de participação ou entregue à monitora presencial. Atividade “3” – obrigatória – fórum de discussão “Segundo os PCN+ de matemáticas, estes conteúdos devem ser trabalhados de forma articulada e formativa, descartando a memorização, dicas e regras desprovidas de explicações e resolução de exercícios mecânicos sem mecanismo lógico matemático.” 48 Com base neste parágrafo procure expressar em um pequeno texto sua opinião sobre esta questão e em seguida deposito no fórum de discussão ou entregue ao monitor(a) presencial. Atividade “4” – obrigatória. Descreva sua experiência sobre a formação do pensamento pelo caminho da simbolização no seu processo de formação para docência em matemática. Produzaum pequeno texto e deposite no correio eletrônico ou entregue para monior(a) presencial. BIBLIOGRAFIA DA UNIDADE ‘II’ BRASIL. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Brasília: MEC, 1998. BRASIL. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília: MEC, 1999. BRASIL. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. PCN+: Ensino Médio – orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC, 2006. CÂMARA, Marcelo. Algumas concepções sobre o ensino-aprendizagem em Matemática. Educação Matemática em Revista, n. 12, São Paulo, SBEM, 2002. D’AMBROSIO, Ubiratan. Educação matemática: da teoria à prática. Campinas: Papirus, 1996. GRAVINA, Maria Alice. A aprendizagem da Matemática em ambientes informatizados. IV Congresso Ibero-Americano de Informática na Educação. Brasília, 1998. Disponível em http://www.edumatec.mat.ufrgs.br. 49 KUENZER, Acácia Z. (Org.). Ensino Médio: construindo uma proposta para os que vivem do trabalho. São Paulo: Cortez, 2000. LIMA, Elon; CARVALHO, Paulo Cezar; WAGNER, Eduardo; MORGADO, Augusto. A Matemática do Ensino Médio, volumes 1, 2, 3. Coleção do Professor de Matemática, SBEM, 2000. 50 Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias CONHECIMENTOS ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO Obs. Esta formatação foi realizada por Luiz Gonzaga Pires, autor deste trabalho. INTRODUÇÃO De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), o ensino médio tem como finalidades centrais não apenas a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos durante o nível fundamental, no intuito de garantir a continuidade de estudos, mas também a preparação para o trabalho e para o exercício da cidadania, a formação ética, o desenvolvimento da autonomia intelectual e a compreensão dos processos produtivos. Nessa definição de propósitos, percebe-se que a escola de hoje não pode mais ficar restrita ao ensino disciplinar de natureza enciclopédica. De acordo com as Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio, deve-se considerar um amplo espectro de competências e habilidades a serem desenvolvidas no conjunto das disciplinas. O trabalho disciplinar pode e deve contribuir para esse desenvolvimento. Conforme destacam os PCNEM (2002) e os PCN+ (2002), o ensino da Matemática pode contribuir para que os alunos desenvolvam habilidades relacionadas à representação, compreensão, comunicação, investigação e, também, à contextualização sociocultural. Visando à contribuição ao debate sobre as orientações curriculares, este documento trata de três aspectos: a escolha de conteúdos; a forma de trabalhar os conteúdos; o projeto pedagógico e a organização curricular. Para a escolha de conteúdos, é importante que se levem em consideração os diferentes propósitos da formação matemática na educação básica. Ao final do ensino médio, espera-se que os alunos saibam usar a Matemática para resolver problemas práticos do quotidiano; para modelar 51 fenômenos em outras áreas do conhecimento; compreendam que a Matemática é uma ciência com características próprias, que se organiza via teoremas e demonstrações; percebam a Matemática como um conhecimento social e historicamente construído; saibam apreciar a importância da Matemática no desenvolvimento científico e tecnológico. A forma de trabalhar os conteúdos deve sempre agregar um valor formativo no que diz respeito ao desenvolvimento do pensamento matemático. Isso significa colocar os alunos em um processo de aprendizagem que valorize o raciocínio matemático – nos aspectos de formular questões, perguntar-se sobre a existência de solução, estabelecer hipóteses e tirar conclusões, apresentar exemplos e contra-exemplos, generalizar situações, abstrair regularidades, criar modelos, argumentar com fundamentação lógico-dedutiva. Também significa um processo de ensino que valorize tanto a apresentação de propriedades matemáticas acompanhadas de explicação quanto a de fórmulas acompanhadas de dedução, e que valorize o uso da Matemática para a resolução de problemas interessantes, quer sejam de aplicação ou de natureza simplesmente teórica. 1 QUESTÕES DE CONTEÚDO No que se segue, partimos do princípio de que toda situação de ensino e aprendizagem deve agregar o desenvolvimento de habilidades que caracterizem o “pensar matematicamente”. Nesse sentido, é preciso dar prioridade à qualidade do processo e não à quantidade de conteúdos a serem trabalhados. A escolha de conteúdos deve ser cuidadosa e criteriosa, propiciando ao aluno um “fazer matemático” por meio de um processo investigativo que o auxilie na apropriação de conhecimento. Neste documento, os conteúdos básicos estão organizados em quatro blocos: Números e operações; Funções; Geometria; Análise de dados e probabilidade. Isso não significa que os conteúdos desses blocos devam ser trabalhados de forma estanque, mas, ao contrário, deve-se buscar constantemente a articulação entre eles. 52 Algumas vezes, de forma intencional, são retomados assuntos já tratados no ensino fundamental – é o momento de consolidar certos conceitos e idéias da matemática escolar que dependem de explicações cuja compreensão exige uma maior maturidade. Sugestões quanto à forma de trabalhar os conteúdos acompanham o detalhamento sempre que possível, destacando-se o valor formativo agregado e descartando-se as exigências de memorização, as apresentações de “regras” desprovidas de explicações, a resolução de exercícios repetitivos de “fixação” ou a aplicação direta de fórmulas. No trabalho com Números e operações deve-se proporcionar aos alunos uma diversidade de situações, de forma a capacitá-los a resolver problemas do quotidiano, tais como: operar com números inteiros e decimais finitos; operar com frações, em especial com porcentagens; fazer cálculo mental e saber estimar ordem de grandezas de números; usar calculadora e números em notação científica; resolver problemas de proporcionalidade direta e inversa; interpretar gráficos, tabelas e dados numéricos veiculados nas diferentes mídias; ler faturas de contas de consumo de água, luz e telefone; interpretar informação dada em artefatos tecnológicos (termômetro, relógio, velocímetro). Por exemplo, o trabalho com esse bloco de conteúdos deve tornar o aluno, ao final do ensino médio, capaz de decidir sobre as vantagens/desvantagens de uma compra à vista ou a prazo; avaliar o custo de um produto em função da quantidade; conferir se estão corretas informações em embalagens de produtos quanto ao volume; calcular impostos e contribuições previdenciárias; avaliar modalidades de juros bancários. Também é preciso proporcionar aos alunos uma diversidade de problemas geradores da necessidade de ampliação dos campos numéricos e suas operações, dos números naturais para contar aos números reais para medir. Os números irracionais devem ser entendidos como uma necessidade matemática que resolve a relação de medidas entre dois segmentos incomensuráveis, sendo apropriado tomar o caso dos segmentos lado e diagonal de um quadrado como ponto de partida. Alguns números irracionais 53 devem ser colocados em destaque: as raízes quadradas de números naturais que não são quadrados perfeitos e o número , por exemplo. É pertinente, nesse nível de escolaridade, caracterizar os números racionais/irracionais por meio de suas expansões decimais e localizar alguns desses números na reta numérica. As propriedades relativas às operações com números reais devem ser trabalhadas de modo que permitam ao aluno a compreensão das estruturasdos algoritmos, prevenindo recorrentes erros na resolução de problemas que envolvam manipulações algébricas. Por exemplo, os alunos devem entender o que acontece com uma desigualdade quando ambos os lados são multiplicados por um mesmo número negativo, ou por que o quadrado de um número nem sempre é maior que o próprio número, ou como resolver inequações que envolvam quocientes. É recomendável que o professor retome, nesse momento, as “regras de sinais” para multiplicação de números inteiros acompanhadas de justificativas; as definições de multiplicação e divisão de frações; as explicações que fundamentam os algoritmos da multiplicação e da divisão de números inteiros e decimais. Mesmo que as operações e os algoritmos já tenham sido estudados no ensino fundamental, é importante retomar esses pontos, aproveitando a maior maturidade dos alunos para entender os pontos delicados dos argumentos que explicam essas operações e algoritmos. Os números complexos devem ser apresentados como uma histórica necessidade de ampliação do conjunto de soluções de uma equação, tomando- se, para isso, uma equação bem simples, a saber, 2x +1 = 0. “...é preciso dar prioridade à qualidade do processo e não à quantidade de conteúdos a serem trabalhados.” O estudo de Funções pode ser iniciado com uma exploração qualitativa das relações entre duas grandezas em diferentes situações: idade e altura; área do círculo e raio; tempo e distância percorrida; tempo e crescimento populacional; tempo e amplitude de movimento de um pêndulo, entre outras. 54 Também é interessante provocar os alunos para que apresentem outras tantas relações funcionais e que, de início, esbocem qualitativamente os gráficos que representam essas relações, registrando os tipos de crescimento e decrescimento (mais ou menos rápido). É conveniente solicitar aos alunos que expressem em palavras uma função dada de forma algébrica, por exemplo, f(x) = 2 x + 3, como a função que associa a um dado valor real o seu dobro, acrescido de três unidades; isso pode facilitar a identificação, por parte do aluno, da idéia de função em outras situações, como, por exemplo, no estudo da cinemática, em Física. É importante destacar o significado da representação gráfica das funções, quando alteramos seus parâmetros, ou seja, identificar os movimentos realizados pelo gráfico de uma função quando alteramos seus coeficientes. O estudo de Funções pode prosseguir com os diferentes modelos que devem ser objeto de estudo na escola – modelos linear, quadrático e exponencial. O modelo periódico será discutido no tópico referente às funções trigonométricas, mais adiante. É recomendável que o aluno seja apresentado a diferentes modelos, tomados em diferentes áreas do conhecimento (queda livre de um corpo, movimento uniforme e uniformemente acelerado, crescimento de uma colônia de bactérias, quantidade de medicamento na corrente sangüínea, rendimentos financeiros, consumo doméstico de energia elétrica, etc.). Sempre que possível, os gráficos das funções devem ser traçados a partir de um entendimento global da relação de crescimento/decrescimento entre as variáveis. A elaboração de um gráfico por meio da simples transcrição de dados tomados em uma tabela numérica não permite avançar na compreensão do comportamento das funções. As idéias de crescimento, modelo linear (f(x) = a.x) e proporcionalidade direta devem ser colocadas em estreita relação, evidenciando-se que a proporcionalidade direta é um particular e importante modelo de crescimento. Nesse momento, também é interessante discutir o modelo de decrescimento com proporcionalidade inversa (f(x) = a/x). O professor deve estar atento ao fato de que os alunos identificam sistematicamente, de forma equivocada, crescimento com proporcionalidade direta e decrescimento com 55 proporcionalidade inversa, e aqui é interessante trazer situações do quotidiano para ilustrar diferentes tipos de crescimento/decrescimento de grandezas em relação. Situações em que se faz necessária a função afim (f(x) = a.x + b) também devem ser trabalhadas. “O estudo de Funções pode ser iniciado com uma exploração qualitativa das relações entre duas grandezas em diferentes situações: idade e altura” O estudo da função quadrática pode ser motivado via problemas de aplicação, em que é preciso encontrar um certo ponto de máximo (clássicos problemas de determinação de área máxima). O estudo dessa função – posição do gráfico, coordenadas do ponto de máximo/mínimo, zeros da função – deve ser realizado de forma que o aluno consiga estabelecer as relações entre o “aspecto” do gráfico e os coeficientes de sua expressão algébrica, evitando-se a memorização de regras. O trabalho com a forma fatorada (f(x) = a. (x - m)2 + n) pode ser um auxiliar importante nessa compreensão. Nesse estudo, também é pertinente deduzir a fórmula que calcula os zeros da função quadrática (a fórmula de Baskara) e a identificação do gráfico da função quadrática com a curva parábola, entendida esta como o lugar geométrico dos pontos do plano que são eqüidistantes de um ponto fixo (o foco) e de uma reta (a diretriz). No que se refere ao estudo das funções trigonométricas, destaca-se um trabalho com a trigonometria, o qual deve anteceder a abordagem das funções seno, co-seno e tangente, priorizando as relações métricas no triângulo retângulo e as leis do seno e do co-seno como ferramentas essenciais a serem adquiridas pelos alunos no ensino médio. Na introdução das razões trigonométricas seno e co-seno, inicialmente para ângulos com medida entre 00 e 900, deve-se ressaltar que são as propriedades de semelhança de triângulos que dão sentido a essas definições; segue-se, então, com a definição das razões para ângulos de medida entre 900 e 1800. A partir das definições e de propriedades básicas de triângulos, devem ser justificados os valores de seno e co-seno relativos aos ângulos de medida 300, 450 e 600. 56 A apresentação das leis dos senos e dos co-senos pode ser motivada com questões relativas à determinação das medidas de elementos de um triângulo. Por exemplo: conhecendo-se a medida de dois lados de um triângulo e a medida do ângulo formado por esses lados, sabe-se que esse triângulo é único e, portanto, é possível calcular a medida dos demais elementos do triângulo. Também é recomendável o estudo da razão trigonométrica tangente pela sua importância a resolução de diversos tipos de problemas. Problemas de cálculos de distâncias inacessíveis são interessantes aplicações da trigonometria, e esse é um assunto que merece ser priorizado na escola. Por exemplo, como calcular a largura de um rio? Que referências (árvore, pedra) são necessárias para que se possa fazer esse cálculo em diferentes condições – com régua e transferidor ou com calculadora? “... é recomendável o estudo da razão trigonométrica tangente pela sua importância na resolução de diversos tipos de problemas.” Alguns tópicos usualmente presentes no estudo da trigonometria podem ser dispensados, como, por exemplo, as outras três razões trigonométricas, as fórmulas para sen (a+b) e cos (a+b), que tanto exigem dos alunos para serem memorizadas. É preciso atenção à transição do seno e do co-seno no triângulo retângulo (em que a medida do ângulo é dada em graus), para o seno e o co- seno, definidos como as coordenadas de um ponto que percorre um arco do círculo de raio unitário com medida em radianos. As funções trigonométricas devem ser entendidas como extensões das razões trigonométricas então defi nidas para ângulos com medida entre 0º e 180º. Os alunos devem ter a oportunidade de traçar gráficos referentes às funções trigonométricas, aqui se entendendo que, quando se escreve f (x) = seno (x), usualmente a variável x corresponde à medida de arco de círculotomada em radianos. As funções trigonométricas seno e co-seno também devem ser associadas aos fenômenos que apresentam comportamento periódico. O estudo das demais funções trigonométricas pode e deve ser colocado em segundo plano. 57 As funções polinomiais (para além das funções afim e quadrática), ainda que de forma bastante sucinta, podem estar presentes no estudo de funções. Funções do tipo f (x) = xn podem ter gráficos esboçados por meio de uma análise qualitativa da posição do ponto (x, xn) em relação à reta y = x, para isso comparando-se x e xn nos casos 0 < x < 1 ou x > 1 e usando-se simetria em relação ao eixo x ou em relação à origem para completar o gráfico. Funções polinomiais mais gerais de grau superior a 2 podem ilustrar as dificuldades que se apresentam nos traçados de gráficos, quando não se conhecem os “zeros” da função. Casos em que a função polinomial se decompõe em um produto de funções polinomiais de grau 1 merecem ser trabalhados. Esses casos evidenciam a propriedade notável de que, uma vez se tendo identificado que o número c é um dos zeros da função polinomial y = P(x), esta pode ser expressa como o produto do fator (x - c) por outro polinômio de grau menor, por meio da divisão de P por (x - c). É pertinente discutir o alcance do modelo linear na descrição de fenômenos de crescimento, para então introduzir o modelo de crescimento/decrescimento exponencial (f(x) = a x). É interessante discutirem as características desses dois modelos, pois enquanto o primeiro garante um crescimento à taxa constante, o segundo apresenta uma taxa de variação que depende do valor da função em cada instante. Situações reais de crescimento populacional podem bem ilustrar o modelo exponencial. Dentre as aplicações da Matemática, tem se o interessante tópico de Matemática Financeira como um assunto a ser tratado quando do estudo da função exponencial – juros e correção monetária fazem uso desse modelo. Nos problemas de aplicação em geral, é preciso resolver uma equação exponencial, e isso pede o uso da função inversa – a função logaritmo. O trabalho de resolver equações exponenciais é pertinente quando associado a algum problema de aplicação em outras áreas de conhecimento, como Química, Biologia, Matemática Financeira, etc. Procedimentos de resolução de equações sem que haja um propósito maior devem ser evitados. Não se recomenda neste nível de ensino um estudo exaustivo dos logaritmos. 58 As progressões aritmética e geométrica podem ser definidas como, respectivamente, funções afim e exponencial, em que o domínio é o conjunto dos números naturais. Não devem ser tratadas como um tópico independente, em que o aluno não as reconhece como funções já estudadas. Devem-se evitar as exaustivas coletâneas de cálculos que fazem simples uso de fórmulas (“determine a soma...”, “calcule o quinto termo...”). O estudo da Geometria deve possibilitar aos alunos o desenvolvimento da capacidade de resolver problemas práticos do quotidiano, como, por exemplo, orientar-se no espaço, ler mapas, estimar e comparar distâncias percorridas, reconhecer propriedades de formas geométricas básicas, saber usar diferentes unidades de medida. Também é um estudo em que os alunos podem ter uma oportunidade especial, com certeza não a única, de apreciar a faceta da Matemática que trata de teoremas e argumentações dedutivas. Esse estudo apresenta dois aspectos – a geometria que leva à trigonometria e a geometria para o cálculo de comprimentos, áreas e volumes. O trabalho de representar as diferentes figuras planas e espaciais, presentes na natureza ou imaginadas, deve ser aprofundado e sistematizado nesta etapa de escolarização. Alguns conceitos estudados no ensino fundamental devem ser consolidados, como, por exemplo, as idéias de congruência, semelhança e proporcionalidade, o Teorema de Tales e suas aplicações, as relações métricas e trigonométricas nos triângulos (retângulos e quaisquer) e o Teorema de Pitágoras. “O estudo da Geometria deve possibilitar aos alunos o desenvolvimento da capacidade de resolver problemas práticos do quotidiano.” Durante o ensino médio, o trabalho do aluno em outras disciplinas, como a Física e a Química, por exemplo, pode servir como motivação para a consolidação da idéia de grandezas, particularmente aquelas formadas por relações entre outras grandezas (densidade, aceleração, etc.). 59 Em relação às grandezas geométricas, as atividades propostas deverão proporcionar a consolidação dos conceitos aprendidos nas etapas anteriores, como área, perímetro e volumes. Nessa fase, o aluno já apresenta as condições necessárias para a compreensão de certas demonstrações que resultem em algumas fórmulas, por exemplo, a área do círculo. Quanto ao trabalho com comprimentos, áreas e volumes, considera-se importante que o aluno consiga perceber os processos que levam ao estabelecimento das fórmulas, evitando-se a sua simples apresentação. Um conteúdo a ser trabalhado com cuidado são as fórmulas de comprimento e de área do círculo: se representa a razão constante entre comprimento e diâmetro do círculo, deve-se explicar como esse número aparece na fórmula da área do círculo; ou se é introduzido via a área do círculo, deve- se explicar como aparece na expressão de seu comprimento. O Princípio de Cavalieri deve ser tomado como ponto de partida para o estudo de volumes de sólidos (cilindro, prisma, pirâmide, cone e esfera), permitindo ao aluno compreender o significado das fórmulas. No trabalho com as áreas das superfícies de sólidos, é importante recuperar os procedimentos para determinar a medida da área de alguns polígonos, facilitando a compreensão das áreas das superfícies de prismas e pirâmides. As expressões que permitem determinar a medida da área das superfícies do cilindro e do cone podem ser estabelecidas facilmente a partir de suas planificações. A geometria analítica tem origem em uma idéia muito simples, introduzida por Descartes no século XVII, mas extremamente original: a criação de um sistema de coordenadas que identifica um ponto P do plano com um par de números reais (x, y). Partindo-se disso, podemos caracterizá-la como: a) o estudo das propriedades geométricas de uma figura com base em uma equação (nesse caso, são as figuras geométricas que estão sob o olhar da álgebra); b) o estudo dos pares ordenados de números (x, y) que são soluções de uma equação, por meio das propriedades de uma figura geométrica (nesse caso, é a álgebra que está sob o olhar da geometria). Esses dois aspectos merecem ser trabalhados na escola. 60 “A geometria analítica tem origem em uma idéia muito simples, introduzida por Descartes no século XVII ...” O trabalho com a geometria analítica permite a articulação entre geometria e álgebra. Para que essa articulação seja significativa para o aluno, o professor deve trabalhar as duas vias: o entendimento de figuras geométricas via equações, e o entendimento de equações, via figuras geométricas. A simples apresentação de equações sem explicações fundadas em raciocínios lógicos deve ser abandonada pelo professor. Memorizações excessivas devem ser evitadas; não vale a pena o aluno memorizar a fórmula da distância de um ponto a uma reta, já que esse cálculo, quando necessário, pode ser feito com conhecimento básico de geometria analítica (retas perpendiculares e distância entre dois pontos). Uma vez definido o sistema de coordenadas cartesiano, é importante trabalhar com os alunos o significado de uma equação. Por exemplo: fazê-los entender que a equação x = 3 corresponde a uma reta paralela ao eixo y ou que qualquer ponto que tenha segunda coordenada negativa não pode estar na curva y = x2. O entendimento do significado de uma equação e de seu conjunto de soluções não é imediato, e isso é natural,pois esse significado não é explícito quando simplesmente se escreve uma equação. Entendido o significado de uma equação, deve-se iniciar o estudo das equações da reta e do círculo. Essas equações devem ser deduzidas, e não simplesmente apresentadas aos alunos, para que, então, se tornem significativas, em especial quanto ao sentido geométrico de seus parâmetros. As relações entre os coeficientes de pares de retas paralelas ou coeficientes de pares de retas perpendiculares devem ser construídas pelos alunos. Posições relativas de retas e círculos devem ser interpretadas sob o ponto de vista algébrico, o que significa discutir a resolução de sistemas de equações. Aqui estamos tratando do entendimento de formas geométricas via álgebra. 61 É desejável, também, que o professor de Matemática aborde com seus alunos o conceito de vetor, tanto do ponto de vista geométrico (coleção dos segmentos orientados de mesmo comprimento, direção e sentido) quanto algébrico (caracterizado pelas suas coordenadas). Em particular, é importante relacionar as operações executadas com as coordenadas (soma, multiplicação por escalar) com seu significado geométrico. A inclusão da noção de vetor nos temas abordados nas aulas de Matemática viria a corrigir a distorção causada pelo fato de que é um tópico matemático importante, mas que está presente no ensino médio somente nas aulas de Física. No estudo de sistemas de equações, além de trabalhar a técnica de resolução de sistemas, é recomendável colocar a álgebra sob o olhar da geometria. A resolução de um sistema 2 X 2 de duas equações e duas variáveis pode ser associada ao estudo da posição relativa de duas retas no plano. Com operações elementares simples, pode-se determinar a existência ou não de soluções desse sistema, o que significa geometricamente os casos de intersecção/coincidência de retas ou paralelismo de retas. A resolução de sistemas 2 X 3 ou 3 X 3 também deve ser feita via operações elementares (o processo de escalonamento), com discussão das diferentes situações (sistemas com uma única solução, com infinitas soluções e sem solução). Quanto à resolução de sistemas de equação 3 X 3, a regra de Cramer deve ser abandonada, pois é um procedimento custoso (no geral, apresentado sem demonstração, e, portanto de pouco significado para o aluno), que só permite resolver os sistemas quadrados com solução única. Dessa forma, fica também dispensado o estudo de determinantes. Os conteúdos do bloco Análise de dados e probabilidade têm sido recomendados para todos os níveis da educação básica, em especial para o ensino médio. Uma das razões desse ponto de vista reside na importância das idéias de incerteza e de probabilidade, associadas aos chamados fenômenos aleatórios, presentes de forma essencial nos mundos natural e social. O estudo desse bloco de conteúdo possibilita aos alunos ampliarem e formalizarem seus conhecimentos sobre o raciocínio combinatório, probabilístico e estatístico. Para dar aos alunos uma visão apropriada da importância dos modelos 62 probabilísticos no mundo de hoje, é importante que os alunos tenham oportunidade de ver esses modelos em ação. Por exemplo, é possível simular o que ocorre em certa pesquisa de opinião estimando, com base em uma amostra, a fração de balas de determinada cor em uma caixa. O estudo da estatística viabiliza a aprendizagem da formulação de perguntas que podem ser respondidas com uma coleta de dados, organização e representação. Durante o ensino médio, os alunos devem aprimorar as habilidades adquiridas no ensino fundamental no que se refere à coleta, à organização e à representação de dados. Recomenda-se um trabalho com ênfase na construção e na representação de tabelas e gráficos mais elaborados, analisando sua conveniência e utilizando tecnologias, quando possível. Problemas estatísticos realísticos usualmente começam com uma questão e culminam com uma apresentação de resultados que se apóiam em inferências tomadas em uma população amostral. “Durante o ensino médio, os alunos precisam adquirir entendimento sobre o propósito e a lógica das investigações estatísticas ...” Durante o ensino médio, os alunos precisam adquirir entendimento sobre o propósito e a lógica das investigações estatísticas, bem como sobre o processo de investigação. Deve-se possibilitar aos estudantes o entendimento intuitivo e formal das principais idéias matemáticas implícitas em representações estatísticas, procedimentos ou conceitos. Isso inclui entender a relação entre síntese estatística, representação gráfica e dados primitivos. Por exemplo, os estudantes precisam ser capazes de explicar como o ponto médio é influenciado por valores extremos num intervalo de dados, e o que acontece com o ponto médio e a mediana em relação a esses valores. Vale destacar a necessidade de se intensificar a compreensão sobre as medidas de posição (média, moda e mediana) e as medidas de dispersão (desvio médio, variância e desvio padrão), abordadas de forma mais intuitiva no ensino fundamental. 63 Os alunos devem exercitar a crítica na discussão de resultados de investigações estatísticas ou na avaliação de argumentos probabilísticos que se dizem baseados em alguma informação. A construção de argumentos racionais baseadas em informações e observações, veiculando resultados convincentes, exige o apropriado uso de terminologia estatística e probabilística. É também com a aquisição de conhecimento em estatística que os alunos se capacitam para questionar a validade das interpretações de dados e das representações gráficas, veiculadas em diferentes mídias, ou para questionar as generalizações feitas com base em um único estudo ou em uma pequena amostra. O estudo da combinatória e da probabilidade é essencial nesse bloco de conteúdo, pois os alunos precisam adquirir conhecimentos sobre o levantamento de possibilidades e a medida da chance de cada uma delas. A combinatória não tem apenas a função de auxiliar o cálculo das probabilidades, mas tem inter-relação estreita entre as idéias de experimento composto a partir de um espaço amostral discreto e as operações combinatórias. Por exemplo, ao extrair aleatoriamente três bolas de uma urna com quatro possibilidades, esse experimento aleatório tem três fases, que podem ser interpretadas signifi cativamente no espaço amostral das variações. A utilização do diagrama de árvores é importante para clarear a conexão entre os experimentos compostos e a combinatória, pois permite que visualizemos a estrutura dos múltiplos passos do experimento. Ao estudar probabilidade e chance, os alunos precisam entender conceitos e palavras relacionadas à chance, incerteza e probabilidade, que aparecem na nossa vida diariamente, particularmente na mídia. Outras idéias importantes incluem a compreensão de que a probabilidade é uma medida de incerteza, que os modelos são úteis para simular eventos, para estimar probabilidades, e que algumas vezes nossas intuições são incorretas e podem nos levar a uma conclusão equivocada no que se refere à probabilidade e à chance. 64 Nas situações e nas experiências aleatórias, os estudantes precisam aprender a descrevê-las em termos de eventualidades, associá-las a um conjunto de eventos elementares e representá-las de forma esquemática. Os alunos necessitam também dominar a linguagem de eventos, levantar hipóteses de eqüiprobabilidade, associar a estatística dos resultados observados e as freqüências dos eventos correspondentes, e utilizar a estatística de tais freqüências para estimar a probabilidade de um evento dado. 2 QUESTÕES DE METODOLOGIA Falar de ensino e aprendizagem implica a compreensão de certas relações entre alguém que ensina, alguém que aprende e algo que é o objeto de estudo – no caso, o saber matemático.Nessa tríade, professor-aluno-saber, tem-se presente a subjetividade do professor e dos alunos, que em parte é condicionadora do processo de ensino e aprendizagem. Para o entendimento da complexidade que permeia uma situação didática2, iniciamos falando, de forma resumida, de duas destacadas concepções sobre o processo de ensino e aprendizagem de Matemática e prosseguimos com a introdução de alguns conceitos, tais como contrato didático, contrato pedagógico, transposição didática, contextualização, que tratam de explicitar alguns dos fenômenos que fazem parte da situação didática. Sobre o processo de ensino e aprendizagem, uma primeira corrente, historicamente a mais presente nas nossas salas de aula de Matemática, identifica ensino como transmissão de conhecimento, e aprendizagem com mera recepção de conteúdos. Nessa concepção, a aprendizagem é vista como um acúmulo de conhecimentos, e o ensino baseia-se essencialmente na “verbalização” do conhecimento por parte do professor. Se por um lado essa concepção teórica apresenta a vantagem de se atingir um grande número de 2 Uma situação didática pode ser compreendida como o estabelecimento de relações entre um professor, alunos e um certo objeto de conhecimento, em que aparece, de forma explícita, a intenção desse professor em fazer com que os alunos se apropriem daquele objeto de conhecimento. 65 alunos ao mesmo tempo, visto que a atividade estaria a cargo do professor, por outro lado demanda alunos bastante motivados e atentos à palavra do professor, o que não parece ser o caso para grande parte de nossos alunos, que estão imersos em uma sociedade que oferece uma gama de outras motivações. Uma segunda corrente, ainda pouco explorada em nossos sistemas de ensino, transfere para o aluno, em grande parte, a responsabilidade pela sua própria aprendizagem, na medida em que o coloca como ator principal desse processo. As idéias socioconstrutivistas da aprendizagem partem do princípio de que a aprendizagem se realiza pela construção dos conceitos pelo próprio aluno, quando ele é colocado em situação de resolução de problemas. Essa idéia tem como premissa que a aprendizagem se realiza quando o aluno, ao confrontar suas concepções, constrói os conceitos pretendidos pelo professor. Dessa forma, caberia a este o papel de mediador, ou seja, de elemento gerador de situações que propiciem esse confronto de concepções, cabendo ao aluno o papel de construtor de seu próprio conhecimento matemático. A primeira concepção dá origem ao padrão de ensino “definição exemplos exercícios”, ou seja, a introdução de um novo conceito dar-se-ia pela sua apresentação direta, seguida de certo número de exemplos, que serviriam como padrão, e aos quais os alunos iriam se referir em momentos posteriores; a cadeia seria fechada com a apresentação de um grande número de exercícios, bastante conhecidos como “exercícios de fixação”. Já na segunda concepção, tem-se o caminho inverso, ou seja, a aprendizagem de um novo conceito matemático dar-se-ia pela apresentação de uma situação-problema ao aluno, ficando a formalização do conceito como a última etapa do processo de aprendizagem. Nesse caso, caberia ao aluno a construção do conhecimento matemático que permite resolver o problema, tendo o professor como um mediador e orientador do processo ensino- aprendizagem, responsável pela sistematização do novo conhecimento. 66 Essas concepções, de certa maneira, estão na base de diferentes metodologias que permeiam a sala de aula de matemática. Uma dessas metodologias é a de contrato didático. Antes de tudo, é preciso diferenciar contrato didático de contrato pedagógico. O contrato pedagógico baseia-se essencialmente na relação professor–aluno, e suas “cláusulas” são, na sua maioria, explicitáveis. No geral, são negociadas entre o professor e os alunos, e se mantêm relativamente estáveis no tempo. Nesse contrato, fica determinado o papel de cada um dos elementos humanos da situação didática (professor e alunos); não existem articulações com o saber objeto de ensino e aprendizagem. Por exemplo, o contrato pedagógico estabelece a forma de acompanhamento das atividades, a organização do espaço da classe, a distribuição do tempo em sala de aula, os momentos de trabalho em grupo, etc. “... a aprendizagem de um novo conceito matemático dar-se-ia pela apresentação de uma situação-problema ao aluno ...” É em relação ao terceiro elemento da tríade – o saber matemático – que se tem o conceito de contrato didático. Esse contrato, que representa o “motor” para a aprendizagem de certo conceito matemático, tem suas “cláusulas” bastante implícitas. Elas se tornam explícitas somente quando ocorre o rompimento do contrato por uma das partes (professor ou alunos). Nesse contrato está a subjetividade e a expectativa dos componentes humanos, portanto ele precisa ser renegociado continuamente em função dos objetos matemáticos que estão em jogo no processo de aprendizagem. A ruptura desses contratos de forma unilateral provoca efeitos diferentes. No caso do contrato pedagógico, aparecem mudanças e confl itos na relação estabelecida entre o professor e os alunos. No caso do contrato didático, a ruptura unilateral pode levar à criação de verdadeiros obstáculos à aprendizagem. Por exemplo: na passagem da aritmética à álgebra é preciso renegociar as “cláusulas”, pois agora a letra não é mais uma simples incógnita, mas passa a representar uma variável. Se no início da passagem da aritmética 67 para a álgebra a letra representa um elemento desconhecido que se quer descobrir, aos poucos ela vai assumindo diferentes status, como, por exemplo, o de variável no trabalho com as funções, o de elemento genérico de determinado conjunto numérico, o de parâmetro no caso de identidades trigonométricas, etc. Um outro exemplo: na mudança de campos numéricos, dos naturais para os reais, agora faz parte do contrato que “multiplicar não significa mais somente um aumento de valor numérico”. Ancorada nas concepções de aprendizagem, e fortemente articulada com o conceito de contrato didático, surge a idéia de transposição didática, que vem freqüentemente dividida em dois grandes momentos: a transposição didática externa e a transposição didática interna. A primeira toma como referência as transformações, as inclusões e as exclusões sofridas pelos objetos de conhecimento matemático, desde o momento de sua produção até o momento em que eles chegam à porta das escolas. Atuando, de certa forma, em uma esfera exterior à escola (mas sempre como resposta às suas demandas), o produto dessa transposição didática externa se materializa, em sua maior parte, pelos livros didáticos e pelas orientações curriculares, como o presente documento. “No caso do contrato didático, a ruptura unilateral pode levar à criação de verdadeiros obstáculos à aprendizagem.” A transposição didática interna apresenta-se, por sua própria natureza, no interior da escola e, mais particularmente, em cada uma de nossas salas de aula. É o momento em que cada professor vai transformar os conteúdos que lhe foram designados em conhecimentos a serem efetivamente ensinados. Nesse momento,as escolhas feitas pelo professor é que vão determinar, de certa maneira, a qualidade da aprendizagem dos alunos. A discussão de conteúdos da seção anterior enfoca a transposição didática ao dar ênfase ao ensino-aprendizagem que valoriza o raciocínio matemático e ao desaconselhar a simples aplicação de regras e fórmulas à 68 lista repetitiva de exercícios, freqüentemente presente em boa parte dos livros didáticos. O conceito de transposição didática também aparece intimamente ligado à idéia de contextualização, e ajuda a compreender a dinâmica de produçãoe circulação dos saberes que chegarão à escola e entrarão em nossas salas de aula. É na dinâmica de contextualização/descontextualização que o aluno constrói conhecimento com significado, nisso se identificando com as situações que lhe são apresentadas, seja em seu contexto escolar, seja no exercício de sua plena cidadania. A contextualização não pode ser feita de maneira ingênua, visto que ela será fundamental para as aprendizagens a serem realizadas – o professor precisa antecipar os conteúdos que são objetos de aprendizagem. Em outras palavras, a contextualização aparece não como uma forma de “ilustrar” o enunciado de um problema, mas como uma maneira de dar sentido ao conhecimento matemático na escola. A contextualização pode ser feita por meio da resolução de problemas, mas aqui é preciso estar atento aos problemas “fechados”, porque esses pouco incentivam o desenvolvimento de habilidades. Nesse tipo de problema, já de antemão o aluno identifica o conteúdo a ser utilizado, sem que haja maiores provocações quanto à construção de conhecimento e quanto à utilização de raciocínio matemático. O uso exclusivo desse tipo de problema consegue mascarar a efetiva aprendizagem, pois o aluno, ao antecipar o conteúdo que está sendo trabalhado, procede de forma um tanto mecânica na resolução do problema. Isso provoca a cristalização de certo contrato didático, que tem como uma das regras implícitas que o aluno não deve se preocupar com o enunciado do problema, basta operar com os números que estão presentes, sem que haja qualquer reflexão sobre o resultado final, mesmo que eventualmente absurdo. Vale aqui ressaltar o quanto é importante, para o exercício da cidadania, a competência de analisar um problema e tomar as decisões necessárias à sua resolução, competência que fica prejudicada quando se trabalha só com problemas “fechados”. 69 “... o quanto é importante, para o exercício da cidadania, a competência de analisar um problema e tomar as decisões ...” Com o desenvolvimento de novos paradigmas educacionais, especialmente daquele que toma a aprendizagem sob a concepção socioconstrutivista, e diante das limitações dos problemas “fechados”, surgem as propostas de “problema aberto” e de “situação-problema”. Apesar de apresentarem objetivos diferentes, esses dois tipos de problemas colocam o aluno, guardando-se as devidas proporções, em situação análoga àquela do matemático no exercício da profissão. O aluno deve, diante desses problemas, realizar tentativas, estabelecer hipóteses, testar essas hipóteses e validar seus resultados. O problema do tipo “aberto” procura levar o aluno à aquisição de procedimentos para resolução de problemas. A prática em sala de aula desse tipo de problema acaba por transformar a própria relação entre o professor e os alunos e entre os alunos e o conhecimento matemático. O conhecimento passa a ser entendido como uma importante ferramenta para resolver problemas, e não mais como algo que deve ser memorizado para ser aplicado em momentos de “provas escritas”. Enquanto o “problema aberto” visa a levar o aluno a certa postura em relação ao conhecimento matemático, a situação-problema apresenta um objetivo distinto, porque leva o aluno à construção de um novo conhecimento matemático. De maneira bastante sintética, podemos caracterizar uma situação-problema como uma situação geradora de um problema cujo conceito, necessário à sua resolução, é aquele que queremos que o aluno construa. Se por um lado a idéia de situação-problema pode parecer paradoxal, pois como o aluno pode resolver um problema se ele não aprendeu o conteúdo necessário à sua resolução? Por outro lado, a história da construção do conhecimento matemático mostra-nos que esse mesmo conhecimento foi construído a partir de problemas a serem resolvidos. 70 Em anos recentes, os estudos em educação matemática também têm posto em evidência, como um caminho para se trabalhar a Matemática na escola, a idéia de modelagem matemática, que pode ser entendida como a habilidade de transformar problemas da realidade em problemas matemáticos e resolvê-los interpretando suas soluções na linguagem do mundo real. A modelagem matemática, percebida como estratégia de ensino, apresenta fortes conexões com a idéia de resolução de problemas apresentada anteriormente. Ante uma situação-problema ligada ao “mundo real”, com sua inerente complexidade, o aluno precisa mobilizar um leque variado de competências: selecionar variáveis que serão relevantes para o modelo a construir; problematizar, ou seja, formular o problema teórico na linguagem do campo matemático envolvido; formular hipóteses explicativas do fenômeno em causa; recorrer ao conhecimento matemático acumulado para a resolução do problema formulado, o que, muitas vezes, requer um trabalho de simplificação quando o modelo originalmente pensado é matematicamente muito complexo; validar, isto é, confrontar as conclusões teóricas com os dados empíricos existentes; e eventualmente ainda, quando surge a necessidade, modificar o modelo para que esse melhor corresponda à situação real, aqui se revelando o aspecto dinâmico da construção do conhecimento. Articulada com a idéia de modelagem matemática, tem-se a alternativa de trabalho com projetos. Um projeto pode favorecer a criação de estratégias de organização dos conhecimentos escolares, ao integrar os diferentes saberes disciplinares. Ele pode iniciar a partir de um problema bem particular ou de algo mais geral, de uma temática ou de um conjunto de questões inter- relacionadas. Mas, antes de tudo, deve ter como prioridade o estudo de um tema que seja de interesse dos alunos, de forma que se promova a interação social e a reflexão sobre problemas que fazem parte da sua realidade. São situações a serem trabalhadas sob uma visão interdisciplinar, procurando-se relacionar conteúdos escolares com assuntos do quotidiano dos estudantes e enfatizar aspectos da comunidade, da escola, do meio ambiente, da família, da etnia, pluriculturais, etc. 71 Para desenvolver o trabalho com projetos, o professor deve estabelecer os objetivos educativos e de aprendizagem, selecionar os conteúdos conceituais e procedimentais a serem trabalhados, preestabelecer atividades, provocar reflexões, facilitar recursos, materiais e informações, e analisar o desenvolvimento individual de cada aluno. Essa modalidade de trabalho pode ser muito educativa ao dar espaço para os alunos construírem e socializarem conhecimentos relacionados a situações problemáticas significativas, considerando suas vivências, observações, experiências, inferências e interpretações. Adotar a metodologia do trabalho com projetos pode possibilitar aos professores colocar em ação aulas investigativas, as quais permitem aos alunos o rompimento do estudo baseado em um currículo linear. Eles terão uma maior chance de ampliar seu raciocínio, rever suas concepções e superar suas dificuldades. Passarão a perceber a Matemática como uma construção sócio-histórica, impregnada de valores que influenciam a vida humana, aprenderão a valorizar o processo de criação do saber. “Articulada com a idéia de modelagem matemática, tem se a alternativa de trabalho com projetos.” A utilização da História da Matemática em sala de aula também pode ser vista como um elemento importante no processo de atribuição de significados aos conceitos matemáticos. É importante, porém, que esse recurso não fique limitado à descrição de fatos ocorridos no passado ou à apresentação de biografias de matemáticos famosos. A recuperação do processo histórico de construção do conhecimento matemático pode se tornar um importante elemento de contextualização dos objetos de conhecimento que vão entrar na relação didática. A História da Matemática pode contribuir também paraque o próprio professor compreenda algumas dificuldades dos alunos, que, de certa maneira, podem refletir históricas dificuldades presentes também na construção do conhecimento matemático. Por exemplo, reconhecer as dificuldades históricas da chamada “regra de sinais”, relativa à multiplicação de 72 números negativos, ou da construção dos números irracionais pode contribuir bastante para o ensino desses temas. Outra questão importante refere-se à discussão sobre o papel do livro didático nas salas de aula de Matemática, particularmente em função da atual conjuntura, em que diferentes programas de avaliação e distribuição de livros didáticos têm se efetivado. O texto didático traz para a sala de aula mais um personagem, seu autor, que passa a estabelecer um diálogo com o professor e seus alunos, refletindo seus pontos de vista sobre o que é importante ser estudado e sobre a forma mais efi caz de se trabalharem os conceitos matemáticos. Na ausência de orientações curriculares mais consolidadas, sistematizadas e acessíveis a todos os professores, o livro didático vem assumindo, há algum tempo, o papel de única referência sobre o saber a ser ensinado, gerando, muitas vezes, a concepção de que “o mais importante no ensino da matemática na escola é trabalhar o livro de capa a capa”. Nesse processo, o professor termina perdendo sua autonomia como responsável pelo processo de transposição didática interna. É importante, pois, que o livro didático de Matemática seja visto não como um substituto de orientações curriculares, mas como um recurso a mais. “A utilização da História da Matemática em sala de aula também pode ser vista como um elemento importante no processo de atribuição de significados aos conceitos matemáticos.” 3 O USO DE TECNOLOGIA Não se pode negar o impacto provocado pela tecnologia de informação e comunicação na configuração da sociedade atual. Por um lado, tem-se a inserção dessa tecnologia no dia-a-dia da sociedade, a exigir indivíduos com capacitação para bem usá-la; por outro lado, tem-se nessa mesma tecnologia um recurso que pode subsidiar o processo de aprendizagem da Matemática. É importante contemplar uma formação escolar nesses dois sentidos, ou seja, a 73 Matemática como ferramenta para entender a tecnologia, e a tecnologia como ferramenta para entender a Matemática. Considerando a Matemática para a Tecnologia, deve-se pensar na formação que capacita para o uso de calculadoras e planilhas eletrônicas, dois instrumentos de trabalho bastante corriqueiros nos dias de hoje. No trabalho com calculadoras, é preciso saber informar, via teclado, as instruções de execução de operações e funções, e isso exige conhecimentos de Matemática. Por exemplo: é a habilidade em estimar mentalmente resultados de operações que identifica, de imediato, um erro de digitação, quando se obtém 0,354 como resultado da multiplicação “35,4 * 0,1”; é o conhecimento sobre porcentagem que habilita para o uso da tecla “%”; é o conhecimento sobre funções que explica por que na calculadora tem-se sen (30) = - 0,99, ou que explica a mensagem “valor inválido para a função” recebida, após aplicar- se a tecla “sqrt” (raiz quadrada) ao número (-5). Em calculadoras gráficas, é o conhecimento sobre funções que permite analisar a pertinência ou não de certos gráficos que são desenhados na tela. Como as calculadoras trabalham com expansões decimais finitas, às vezes essas aproximações afetam a qualidade da informação gráfica. As planilhas eletrônicas são programas de computador que servem para manipular tabelas cujas células podem ser relacionadas por expressões matemáticas. Para operar com uma planilha, em um nível básico, é preciso conhecimento matemático similar àquele necessário ao uso de calculadora, mas com maiores exigências quanto à notação de trabalho, já que as operações e as funções são definidas sobre as células de uma tabela em que se faz uso de notação para matrizes. Assim, é importante conhecer bem a notação matemática usada para expressar diferentes conceitos, em particular o conceito de função. Além disso, a elaboração de planilhas mais complexas requer raciocínio típico dos problemas que exigem um processo de solução em diferentes etapas. “... a Matemática como ferramenta para entender a tecnologia, e a tecnologia como ferramenta para entender a Matemática.” 74 Já se pensando na Tecnologia para a Matemática, há programas de computador (softwares) nos quais os alunos podem explorar e construir diferentes conceitos matemáticos, referidos a seguir como programas de expressão3 Os programas de expressão apresentam recursos que provocam, de forma muito natural, o processo que caracteriza o “pensar matematicamente”, ou seja, os alunos fazem experimentos, testam hipóteses, esboçam conjecturas, criam estratégias para resolver problemas. São características desses programas: a) conter um certo domínio de saber matemático – a sua base de conhecimento; b) oferecer diferentes representações para um mesmo objeto matemático – numérica, algébrica, geométrica; c) possibilitar a expansão de sua base de conhecimento por meio de macroconstruções; d) permitir a manipulação dos objetos que estão na tela. Para o aprendizado da geometria, há programas que dispõem de régua e compasso virtuais e com menu de construção em linguagem clássica da geometria – reta perpendicular, ponto médio, mediatriz, bissetriz, etc. Feita uma construção, pode-se aplicar movimento a seus elementos, sendo preservadas as relações geométricas impostas à figura – daí serem denominados programas de geometria dinâmica. Esses também enriquecem as imagens mentais associadas às propriedades geométricas. Por exemplo: para o Teorema de Pitágoras, partindo do triângulo retângulo e dos quadrados construídos sobre seus lados, podemos construir uma família de “paralelogramos em movimento” que, conservando a área, explica por que a área do quadrado construído sobre a hipotenusa é igual à soma das áreas construídas sobre os catetos. Com a geometria dinâmica também se pode fazer modelação geométrica. Isso significa captar, com a linguagem geométrica, o movimento de 3 Uma coletânea desses programas está disponível no site Educação matemática e tecnologia informática, em http://www. edumatec.mat.ufrgs.br. 75 certos mecanismos (uma porta pantográfi ca, um ventilador, um pistão) ou os movimentos corporais (o caminhar, o remar, o pedalar). Identifi car o elemento que desencadeia o movimento e, a partir dele, prosseguir com uma construção sincronizada, em que se preserva a proporção entre os elementos, exige, além de conhecimento em geometria, uma escolha de estratégia de resolução do problema, com a elaboração de um cronograma de ataque aos diferentes subproblemas que compõem o problema maior. É uma atividade que coloca em funcionamento diferentes habilidades cognitivas – o pensar geométrico, o pensar estratégico, o pensar hierárquico. Para o estudo das funções, das equações e das desigualdades da geometria analítica (retas, círculos, cônicas, superfícies), tem-se uma grande variedade de programa de expressão. Em muitos desses programas, pode-se trabalhar tanto com coordenadas cartesianas como com coordenadas polares. Os recursos neles disponibilizados facilitam a exploração algébrica e gráfica, de forma simultânea, e isso ajuda o aluno a entender o conceito de função, e o significado geométrico do conjunto-solução de uma equação – inequação. Para trabalhar com poliedros, existem também programas interessantes. Neles, há poliedros em movimento, sob diferentes vistas, acompanhados de planificação. São programas apropriados para o desenvolvimento da visualização espacial. As planilhas eletrônicas, mesmo sendo ferramentasque não foram pensadas para propósitos educativos, também podem ser utilizadas como recursos tecnológicos úteis à aprendizagem matemática. Planilhas oferecem um ambiente adequado para experimentar seqüências numéricas e explorar algumas de suas propriedades, por exemplo, comparar o comportamento de uma seqüência de pagamentos sob juros simples e juros compostos. Também oferecem um ambiente apropriado para trabalhar com análises de dados extraídos de situações reais. É possível organizar atividades em que os alunos têm a oportunidade de lidar com as diversas etapas do trabalho de análise de dados reais: tabular, manipular, classificar, obter medidas como média e desvio padrão e obter representações gráficas variadas. 76 As planilhas eletrônicas também são muito apropriadas para introduzir a noção de simulação probabilística, importante em diversos campos de aplicação. Ao se usar a função “ALEATÓRIO( )”, podem-se simular experimentos aleatórios de variados níveis de complexidade, contribuindo, assim, para que o aluno atribua um significado intuitivo à noção de probabilidade como freqüência relativa observada em uma infinidade de repetições. No uso de tecnologia para o aprendizado da Matemática, a escolha de um programa torna-se um fator que determina a qualidade do aprendizado. É com a utilização de programas que oferecem recursos para a exploração de conceitos e idéias matemáticas que está se fazendo um interessante uso de tecnologia para o ensino da Matemática. Nessa situação, o professor deve estar preparado para interessantes surpresas: é a variedade de soluções que podem ser dadas para um mesmo problema, indicando que as formas de pensar dos alunos podem ser bem distintas; a detecção da capacidade criativa de seus alunos, ao ser o professor surpreendido com soluções que nem imaginava, quando pensou no problema proposto; o entusiástico engajamento dos alunos nos trabalhos, produzindo discussões e trocas de idéias que revelam uma intensa atividade intelectual. “As planilhas eletrônicas (...) também podem ser utilizadas como recursos tecnológicos úteis à aprendizagem matemática.” 4 ORGANIZAÇÃO CURRICULAR E PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO A instituição escolar precisa organizar seu trabalho pedagógico de acordo com seus alunos. Para tanto, deve considerar o projeto político- pedagógico como um processo constante de reflexão e discussão sobre os problemas escolares, tendo como intenção a busca de soluções, por meio de ações colaborativas entre os membros que constituem a escola. 77 Para que a escola possa concretizar a construção de um projeto político- pedagógico significativo que seja fruto do cotidiano escolar, ela precisa de um corpo docente comprometido com a ação educativa, que seja responsável por ela e assuma o trabalho colaborativo como sustentação para a formação de estudantes capacitados para o exercício da cidadania. O projeto político-pedagógico refere-se tanto ao trabalho mais amplo de organização da escola como ao trabalho mais específico de organização da sala de aula, levadas em conta as relações com o contexto social imediato e a visão de totalidade. Nesse sentido, tem-se no currículo um elemento essencial na definição do projeto político-pedagógico quando a ele se incorpora o processo social de produção de conhecimento, considerando-se os conhecimentos historicamente produzidos e as formas de viabilizar sua construção por parte dos alunos. O currículo do ensino médio deve buscar a integração dos conhecimentos, especialmente pelo trabalho interdisciplinar. Neste, fazem-se necessários a cooperação e o compartilhamento de tarefas, atitudes ainda pouco presentes nos trabalhos escolares. O desenvolvimento dessas atitudes pode ser um desafio para os educadores, mas, como resultado, vai propiciar aos alunos o desenvolvimento da aptidão para contextualizar e integrar os saberes. Para isso, a escola deve buscar novas formas de se organizar, considerando que os conteúdos disciplinares não se esgotam em si mesmos, mas significam o acesso ao saber cultural e à aquisição de ferramentas para o entendimento da sociedade em que vivemos, destacando-se as que capacitam os indivíduos para viverem em um mundo tecnológico e informatizado. Nesse sentido, pode ser interessante propiciar momentos de trabalho em duplas e em pequenos grupos, que possibilitam a participação ativa dos alunos, o confronto de idéias e a adoção de consensos. 78 As formas de organização das atividades de ensino devem contemplar a diversidade, considerando as interações sociais como essenciais na construção coletiva de conhecimento. Dar atenção à diversidade significa vincular o conteúdo selecionado para estudo aos conhecimentos prévios dos alunos, respeitando, também, os seus centros de interesse e suas individualidades. As orientações curriculares apresentadas neste texto, em relação à disciplina Matemática, têm o intuito de suscitar discussões e fornecer subsídios para opções de ênfase no conhecimento matemático, essencial à formação do aluno no ensino médio. Mas as opções também devem adequar-se ao projeto político-pedagógico de cada escola. Sabe-se que na organização curricular deverá haver equilíbrio na distribuição da carga horária das diferentes disciplinas. É importante que se destaque a necessidade de um trabalho contínuo com a Matemática durante os três anos do ensino médio, sendo difícil propiciar uma aprendizagem significativa dos conceitos matemáticos sem uma carga horária adequada de aulas semanais, em cada ano desse nível de ensino. Ao se definir a ênfase curricular a ser dada à Matemática em cada unidade escolar, recomenda-se um estudo cuidadoso das orientações curriculares expressas nos vários documentos produzidos que visam a subsidiar a definição do projeto político-pedagógico. É interessante ter conhecimento das propostas curriculares que estão sendo produzidas nos diferentes estados brasileiros, o que ajuda a perceber a necessidade de adaptar os currículos às particularidades de cada região. Os documentos curriculares produzidos no âmbito das redes públicas do país servem como subsídios para a construção dos projetos pedagógicos das escolas. Mas documentos são simples referências para discussão. A educação é um processo essencialmente social e político que se concretiza e avança com as necessárias mudanças no diálogo e nas ações de atores, em diferentes 79 instâncias: alunos, professores, coordenadores e diretores de escolas; professores formadores e gestores nas universidades; gestores nas Secretárias de Educação e no MEC. “O currículo do ensino médio deve buscar a integração dos conhecimentos, especialmente pelo trabalho interdisciplinar.” 5 TEMAS COMPLEMENTARES Nas questões de conteúdo apresentadas anteriormente, foram discutidos os tópicos considerados essenciais à formação matemática dos estudantes durante o ensino médio, considerando-se a diversidade de carga horária existente nas escolas brasileiras. Acredita-se que, ao levar em conta o projeto político-pedagógico de cada unidade escolar, os professores possam analisar a pertinência de um trabalho complementar em relação ao conhecimento matemático. Apresentam-se a seguir algumas idéias, mas com a recomendação de que os professores de cada escola definam, de acordo com seu contexto escolar, a adequação de um projeto que envolva temas complementares. São apresentados, a seguir, tópicos que podem servir muito bem aos propósitos das feiras e dos clubes de ciências, ou para atividades em laboratórios de Matemática, ou ainda para compor, de forma interdisciplinar, a parte diversificada do currículo. Alguns desses tópicos também servem para trabalhar as aplicações matemáticas. Em outros tópicos, tem-se o aspecto artístico e lúdico no trabalho deconstrução de modelos concretos ilustrativos. Por exemplo, o estudo das curvas cônicas como lugar geométrico de pontos (elipse, parábola e hipérbole), acompanhado de suas equações. As mais simples, se bem escolhida a posição do sistema de coordenadas, geram um tópico interessante, pois trata-se de curvas que podem ser a solução de uma equação geral de grau dois em duas variáveis (vale lembrar que até então esse estudo estava restrito à reta, círculo e parábola). Podem-se, com isso, explicar 80 os princípios de funcionamento de uma antena parabólica, dos espelhos hiperbólicos usados em telescópios e dos espelhos elípticos. No estudo da geometria, também se podem provocar os alunos com a pergunta: “Como funcionam certos mecanismos do nosso quotidiano ou certos instrumentos de trabalho?”. São propriedades geométricas que explicam o funcionamento de um macaco de carro, dos brinquedos de uma praça infantil, do teodolito, do periscópio, da máquina fotográfi ca, do projetor de imagens. Também perguntas simples, como “Por que o parafuso é sextavado?” ou “Por que os prismas triangulares, junto com o movimento de rotação, são usados para veicular propagandas?”, são respondidas com conhecimento bastante elementar de geometria, que também possibilita inúmeras atividades de natureza interdisciplinar: os poliedros e os cristais, as simetrias nos seres vivos, a concha de Nautilus e a espiral de Arquimedes. O estudo de poliedros, o Teorema de Euler e a classificação dos poliedros platônicos compõem um interessante tópico, em que a construção dos poliedros, via planificações feitas com régua e compasso, pode ser uma atividade de grande satisfação estética. Na direção de valorização da Matemática, no seu aspecto estético, existem alguns vídeos que podem servir como ponto de partida de discussão de assuntos tais como simetrias, fractais, o número de ouro, etc. Outro tópico de natureza interdisciplinar que pode ser interessante é o estudo de fenômenos que têm registro em escala logarítmica: idade fóssil, intensidade de um abalo sísmico, intensidade de um som. Pode ser bastante interessante levar para a sala da aula a discussão de brilhantes idéias geométricas que resolveram certos problemas na Antiguidade. Alguns desses problemas clássicos: o cálculo do raio da Terra, feito por Eratóstenes no século III a.C.; a solução de Eupalinos na construção de um túnel, 2.500 anos atrás; os diferentes cálculos astronômicos na Grécia antiga, tais como as distâncias relativas entre Terra, Lua e Sol. 81 O estudo de diferentes sistemas de coordenadas para o plano e o espaço (cartesianas, polares, esféricas), e de construção de algumas curvas e superfícies, provoca um pensamento matemático generalizador ao ir além do até então restrito universo de retas, círculos e curvas, que são gráficos de funções reais, de variável real. Espirais, cilindros, cones, esferas, parabolóides, hiperbolóides são formas geométricas que passam a ser descritas em sistemas de coordenadas, via curvas parametrizadas, superfícies de revolução, gráficos de funções de duas variáveis. Nesse tópico, tem-se também a possibilidade de um interessante trabalho de natureza interdisciplinar: as características geométricas dos diferentes tipos de mapa-múndi, que são dadas via transformações entre espaços de dimensão três e dois. Uma introdução à geometria vetorial e às transformações geométricas no plano e no espaço – isometria e homotetia – é também mais uma oportunidade de trabalhar conceitos matemáticos sob os pontos de vista algébrico e geométrico. Outro tópico que pode ser tratado como tema complementar é o estudo mais aprofundado dos números complexos. Por um lado, podem-se explorar os aspectos históricos da introdução dos números complexos e de seu papel fundamental no desenvolvimento da álgebra. Por outro lado, podem-se explorar as conexões entre as operações com números complexos e as transformações geométricas no plano. “Pode ser bastante interessante levar para a sala da aula a discussão de brilhantes idéias geométricas que resolveram certos problemas na Antiguidade.” A maior parte dos conteúdos de Matemática do ensino médio está vinculada a modelos matemáticos de natureza contínua: os números reais e os espaços geométricos (reta, plano e espaço tridimensional). Os estudos da geometria e das funções de variável real inserem-se nesse contexto, refletindo o papel fundamental do Cálculo (esse assunto é objeto de estudo na universidade) no desenvolvimento das aplicações da Matemática nas Ciências. No entanto, no decorrer do século XX, novas necessidades tecnológicas advindas da introdução dos computadores – que têm uma Matemática Discreta 82 no seu funcionamento – provocaram um grande desenvolvimento dos modelos matemáticos discretos. Desse processo decorre um desenvolvimento significativo da área de combinatória, que é a Matemática dos conjuntos finitos. No ensino médio, o termo “combinatória” está usualmente restrito ao estudo de problemas de contagem, mas esse é apenas um de seus aspectos. Outros tipos de problemas poderiam ser trabalhados na escola – são aqueles relativos a conjuntos finitos e com enunciados de simples entendimento relativo, mas não necessariamente fáceis de resolver. Um exemplo clássico é o problema das pontes de Könisberg, tratado por Euler: dado um conjunto de sete ilhas interligadas por pontes, a pergunta que se coloca é: “Partindo-se de uma das ilhas, é possível passar pelas demais ilhas e voltar ao ponto de partida, nisso cruzando-se cada uma das pontes uma única vez?” Problemas dessa natureza podem ser utilizados para desenvolver uma série de habilidades importantes: modelar o problema, via estrutura de grafo – no exemplo, um diagrama em que cada ilha é representada por um ponto e cada ponte é um segmento conectando dois pontos; explorar o problema, identificando situações em que há ou não solução; convergir para a descoberta da condição geral de existência de uma tal solução (ainda no exemplo, o caso em que cada ilha tem um número par de pontes). Muitos outros exemplos de problemas combinatórios podem ser tratados de modo semelhante, tais como determinar a rota mais curta em uma rede de transportes ou determinar um eficiente trajeto para coleta de lixo em uma cidade. “A articulação da Matemática ensinada no ensino médio com temas atuais da ciência e da tecnologia é possível e necessária.” 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ressalta-se a intenção deste documento em subsidiar as discussões sobre as orientações curriculares para o ensino médio no que se refere à Matemática. Contudo, cada professor, junto com seus pares e seus alunos, 83 deve definir o currículo de Matemática a ser colocado em ação, sempre buscando uma formação matemática que privilegie o essencial e o significativo. No tratamento desses conteúdos, deve-se buscar o equilíbrio na atenção aos diversos ramos da Matemática. Deve-se, igualmente, afastar-se da compartimentalização e procurar ampliar as ocasiões de articulação entre os diferentes temas, atendendo a requisitos de diversidade, e lembrar-se de que um mesmo conceito matemático pode ser abordado em mais de um dos blocos de conteúdo. É preciso lembrar que a contextualização deve ser vista como um dos instrumentos para a concretização da idéia de interdisciplinaridade e para favorecer a atribuição de significados pelo aluno no processo de ensino e aprendizagem. A articulação da Matemática ensinada no ensino médio com temas atuais da ciência e da tecnologia é possível e necessária. Deve-se observar que as articulações com as práticas sociais não são as únicas maneiras de se favorecer a atribuição de significados a conceitos e a procedimentos matemáticos, pois isso igualmente é possível, em muitos casos, com o estabelecimento de suas conexõescom outros conceitos e procedimentos matemáticos importantes. Vale uma ressalva sobre as ineficazes contextualizações artificiais, em que a situação evocada nada tem de essencialmente ligada ao conceito ou ao procedimento visado, como também não são educativas as contextualizações pretensamente baseadas na realidade, mas com aspectos totalmente fantasiosos. A história da Matemática oferece oportunidades de contextualização importantes do conhecimento matemático, em que a articulação com a história pode ser feita nessa perspectiva, tais como a crise dos irracionais no desenvolvimento da ciência grega, que tem conexão com obstáculos até hoje presentes na aprendizagem desse conceito. 84 A ampliação e o aprofundamento da explicitação da estruturação lógica da Matemática são necessários ao aluno do ensino médio, devendo-se valorizar os vários recursos do pensamento matemático, como a imaginação, a intuição, o raciocínio indutivo e o raciocínio lógico-dedutivo, a distinção entre validação matemática e validação empírica, e favorecer a construção progressiva do método dedutivo em Matemática. Cabe ainda uma recomendação especial no que se refere à implementação de políticas públicas que priorizem a formação contínua de professores de Matemática que atuam no ensino médio visando à construção de uma autonomia docente. Outra recomendação é a criação de fóruns permanentes de discussão sobre o currículo de Matemática, particularmente para o ensino médio. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARTE E MATEMÁTICA – Uma série de 13 programas para a TV Cultura - Fundação Padre Anchieta & TV Escola, em http: // www. videocultura.com. ABRANTES, Paulo. O trabalho de projecto e a relação dos alunos com a Matemática: a experiência do Projecto Mat789. Tese de Doutoramento. Lisboa: APM, 1994. BASSAMEZI, Rodney C. Ensino-aprendizagem com modelagem matemática. São Paulo: Contexto, 2002. BRASIL. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio – Matemática (PNLEM). Brasília: MEC, 2005. BRASIL. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília: MEC, 2002. 85 BRASIL. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. PCN+: Ensino Médio – orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. 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Campinas:Papirus, 2003. 88 UNIDADE III - PROPOSTAS PEDAGÓGICAS VOLTADAS PARA A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, COTEJAMENTO DOS PRINCIPAIS CONTEÚDOS ESPECÍFICOS DE MATEMÁTICA DOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E DO ENSINO MÉDIO E ACOMPANHAMENTO DO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM. 3.1 - Propostas pedagógicas voltadas para a educação matemática; 3.2 - Cotejamento dos principais conteúdos específicos de matemática dos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio. • Teoria dos números; • Medidas; • Conjuntos e funções; • Álgebra; • Geometria e trigonometria; • Formação dos principais conceitos matemáticos: quantidade, correspondência biunívoca, área, volume, espaço. 3.3 - Acompanhamento do processo ensino-aprendizagem. 89 LIVRO DE EAD DE METODOLOGIA DO ENSINO NA MATEMÁTICA EMENTA DE METODOLOGIA DO ENSINO NA MATEMATICA DISCIPLINA: Metodologia do Ensino da Matemática CÓDIGO: 402.xx2 DEPARTAMENTO: Métodos e Técnicas de Ensino CH: 60h CRÉDITOS: 4.0.0 PRÉ-REQUISITO: 402.xx1 EMENTA: Contribuições teóricas para o ensino da Matemática. Tendências da Educação Matemática. A Matemática como componente curricular. Parâmetros Curriculares Nacionais para Matemática (Anos Finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio). A formação do pensamento pelo caminho da simbolização. Propostas pedagógicas voltadas para a Educação Matemática. Cotejamento dos principais conteúdos específicos de Matemática dos Anos Finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio com metodologias adequadas: teoria dos números, medidas, conjuntos e funções,álgebra, geometria, trigonometria. Formação dos principais conceitos matemáticos: quantidade, correspondência biunívoca, área, volume, espaço. Acompanhamento do processo ensino-aprendizagem. BIBLIOGRAFIA BÁSICA: BRASIL. Secretaria do Ensino Fundamental. Brasília/DF: MEC/SEF. CARVALHO, Dione Luchesi de. Metodologia do Ensino de Matemática. São Paulo: Cortez, 1990. CARRAHER, Terezinha et al. Na vida dez, na escola zero. São Paulo: Cortez, 1988. D’AUGUSTINE, Charles H. Métodos modernos para o ensino da matemática. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico S/A, 1970. 90 KAMIL, Constance. A criança e o número. Campinas: Papirus, 1987. MACHADO, Nilson José. Matemática e realidade. São Paulo: Cortez, 1989. MIGUEL, Antonio; MIORIM, M. Ângela. O ensino da matemática no 1. Grau. Projeto Magistério. São Paulo: Atual, 1986.