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<p>TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ</p><p>3ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS</p><p>Autos nº. 0010289-14.2023.8.16.0018</p><p>RECURSO INOMINADO Nº 0010289-14.2023.8.16.0018 DO 1° JUIZADO</p><p>ESPECIAL CÍVEL DE MARINGÁ</p><p>RECORRENTE: JOSUE RIBEIRO CAMPOS</p><p>RECORRIDO: IRMAOS MUFFATO S.A</p><p>RELATORA: JUÍZA TITULAR DA 3ª TURMA RECURSAL DENISE</p><p>HAMMERSCHMIDT</p><p>RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS</p><p>MORAIS. INTERRUPÇÃO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA EM</p><p>DECORRÊNCIA DE OBRA REALIZADA PELA PESSOA JURÍDICA</p><p>DEMANDADA (SUPER MUFFATO). SENTENÇA DE</p><p>IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA RECURSAL. INAPLICABILIDADE</p><p>DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA AO PRESENTE CASO.</p><p>INAPLICABILIDADE DA TESE FIXADA NO IRDR 1.676.846-4/TJPR,</p><p>EIS QUE DIRECIONADA À CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO</p><p>PÚBLICO. RESPONSABILIDADE CIVIL CARACTERIZADA.</p><p>PRIVAÇÃO DE SERVIÇOS ESSENCIAIS DURANTE A PANDEMIA DE</p><p>COVID-19. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM</p><p>INDENIZATÓRIO QUE DEVE SER FIXADO DE ACORDO COM OS</p><p>PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE.</p><p>OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO.</p><p>MONTANTE FIXADO EM R$ 4.000,00 (QUATRO MIL REAIS).</p><p>SENTENÇA REFORMADA. SEM CUSTAS PROCESSUAIS E</p><p>HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.</p><p>Dispensado o relatório, nos termos do enunciado 92 do FONAJE.</p><p>I – VOTO</p><p>Deferidos os benefícios da gratuidade de justiça, nos termos do art. 98 do Código de Processo Civil</p><p>(mov. 14.1).</p><p>Ressalto a existência de dispositivo legal que prevê a presunção de veracidade da insuficiência deduzida</p><p>exclusivamente por pessoa natural (art. 99, § 3º, do Código de Processo Civil), inexistindo elementos que</p><p>evidenciem a falta dos pressupostos legais nestes autos.</p><p>Conheço do recurso interposto, uma vez que presentes os pressupostos de admissibilidade.</p><p>Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada em face de IRMAOS MUFFATO S.A,</p><p>fundada nas seguintes alegações: que a parte demandada realizou a instalação de uma galeria de água</p><p>pluvial próxima de uma adutora da empresa SANEPAR e, por conta de falha na execução da obra,</p><p>provocou o seu rompimento e o consequente desabastecimento de água na residência do demandante por</p><p>alguns dias (11, 12, 13, 14, 15, 16, 23, 24 e 25/09/2020).</p><p>Sobreveio sentença julgando a ação improcedente, assim consignando o juízo de origem:</p><p>[...] Apesar de a parte requerida ter concorrido diretamente para a ocorrência do</p><p>evento danoso, eis que foi por conta de sua conduta que houve a interrupção do</p><p>fornecimento de água à parte requerente, destaco que, no caso em debate, o tempo</p><p>que a parte requerente restou privada do uso deste serviço, ainda que de natureza</p><p>essencial, não foi excessivo a ponto restar configurado o abalo aos direitos de</p><p>e, por consequência, não prospera o pedido de indenização por danos personalidade</p><p>morais. Não se questiona que o episódio gerou desconforto a parte autora, mas não a</p><p>ponto de configurar situação lesiva aos seus direitos de personalidade. (Grifou-se)</p><p>Irresignado, o recorrente interpôs recurso inominado pleiteando a procedência do pedido inicial.</p><p>Pois bem. Inicialmente, destaco que não há como se falar em julgamento monocrático do recurso</p><p>interposto, mormente diante da alegação genérica da parte recorrente de entendimento consolidado a</p><p>respeito do tema ora discutido, sendo imperiosa a análise do caso pelo órgão colegiado.</p><p>Ainda, entendo que inaplicável a legislação consumerista ao presente caso, pois o evento danoso que</p><p>fundamenta o pedido indenizatório não advém de relação negocial entre as partes, mas de instalação de</p><p>galeria pluvial pela recorrida que, em decorrência de falhas na execução da obra, danificou uma das</p><p>adutoras da rede Sanepar, comprometendo, assim, o fornecimento de água no imóvel do autor.</p><p>Logo, tratando-se de relação cível, inviável a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em</p><p>apreço, tal como constou em sentença.</p><p>Todavia, verifico ser inaplicável ao caso a tese firmada no IRDR 1.676.846-4/TJPR, uma vez que a</p><p>presente demanda é dirigida a terceiro, que causou gravíssimos danos nas estruturas da concessionária e a</p><p>quem não cumpre efetuar manutenção, conserto ou reparo e restabelecimento dos serviços. Destaca-se,</p><p>pois, que referida tese é direcionada à concessionária de serviço público.</p><p>Dito isso, cumpre mencionar que restou devidamente comprovado nos autos que a interrupção dos</p><p>serviços essenciais decorreu de conduta praticada pela parte recorrida, conforme laudo técnico pericial</p><p>apresentado ao mov. 1.7. A esse respeito, inclusive, consignou o juízo de origem:</p><p>[...]Restou demonstrado nos autos que houve o serviço de fornecimento de água foi</p><p>interrompido de forma momentânea na região em que a parte requerente reside, em</p><p>especial o laudo técnico que foi produzido na Ação de Produção Antecipada de</p><p>Provas sob nº 0005634-70.2020.8.16.0190, da 2ª Vara da Fazenda Pública de</p><p>.Maringá-PR</p><p>Embora a parte requerida busque desconstituir o referido laudo técnico, destaco que as</p><p>razões apresentadas na contestação são insuficientes para infirmar o laudo pericial e</p><p>todos os demais esclarecimentos apresentados pelo Perito quando da confecção do laudo</p><p>e manifestações nos autos nº 0005634- 70.2020.8.16.0190, da 2ª Vara da Fazenda Pública</p><p>de Maringá-PR.</p><p>A prova técnica em destaque é robusta e reflete de forma induvidosa que a parte ré</p><p>executou com diversas falhas sua obra na região, inexistindo, aos olhos do presente</p><p>Juízo, razão para se infirmar o trabalho pericial em referência, e, em especial, suas</p><p>conclusões. Pondera-se, ainda, que a prova em referência restou obtida sob o crivo</p><p>do contraditório, com participação direta da parte ré, sendo imperioso o seu</p><p>acolhimento por este Juízo.</p><p>Assim, resta satisfatoriamente demonstrado que a requerida concorreu de forma direta</p><p>para o episódio e que responde por eventuais danos causados à parte autora. [...] (Grifou-</p><p>se)</p><p>Logo, e tendo em vista a comprovação de moradia no local à época dos fatos (movs. 1.2 e 1.4), entendo</p><p>que o pleito de indenização pelos danos morais suportados prospera, uma vez que a situação vivenciada</p><p>ultrapassa a esfera do mero dissabor cotidiano, sendo inegável os transtornos advindos da interrupção dos</p><p>serviços de água e esgoto na residência do demandante, não havendo como se desconsiderar, ainda, as</p><p>altas temperaturas registradas no período e a pandemia de Covid-19.</p><p>Nesse sentido, já julgou esta Egrégia Turma Recursal:</p><p>RECURSOS INOMINADOS. CONEXÃO ENTRE OS PRESENTES AUTOS E OS</p><p>AUTOS N. 19166-74.2022.8.16.0018 E N. 18987-43.2022.8.16.0018. JULGAMENTO</p><p>SIMULTÂNEO. CABIMENTO. PRETENSÕES DE INDENIZAÇÃO POR DANO</p><p>MORAL ORIUNDAS DO MESMO VÍNCULO JURÍDICO. INSURGÊNCIAS</p><p>RECURSAIS IDÊNTICAS PELOS RECLAMANTES NAS LIDES CONEXAS.</p><p>RESPONSABILIDADE CIVIL. INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE</p><p>ÁGUA. LAUDO PERICIAL QUE CONCLUIU PELA RESPONSABILIDADE DO</p><p>RECLAMADO PELO INCIDENTE. ROMPIMENTO DA ADUTORA QUE</p><p>CAUSOU A INTERRUPÇÃO DO ABASTECIMENTO DE ÁGUA. MÁ</p><p>EXECUÇÃO DE OBRA PELO RECLAMADO, A QUAL INSTALOU GALERIA</p><p>PLUVIAL SOBRE ADUTORA DA SANEPAR, SEM CONHECIMENTO DESTA,</p><p>SEM OBSERVÂNCIA DAS NORMAS TÉCNICAS E AO ARREPIO DAS</p><p>NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A MEDIDAS DE CAUTELA E PROTEÇÃO.</p><p>CONDUTA DO RECLAMADO E O DANO SUPORTADO PELOS RECLAMANTES</p><p>QUE TORNA INAFASTÁVEL O PLEITO INDENIZATÓRIO, MORMENTE SE</p><p>COMPROVADA A MORADIA DELES NO LOCAL DOS FATOS À ÉPOCA DA</p><p>INTERRUPÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL CARACTERIZADA.</p><p>RECLAMANTES RESIDENTES NO CONJUNTO HABITACIONAL REQUIÃO.</p><p>LOCALIDADE MAIS AFETADA PELA INTERRUPÇÃO. QUANTUM</p><p>INDENIZATÓRIO DE R$ 4.000,00 (QUATRO MIL REAIS) A CADA</p><p>RECLAMANTE ADOTADO EM RESPEITO AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE.</p><p>SENTENÇA REFORMADA. RECURSOS CONHECIDOS E PROVIDOS.</p><p>(TJPR - 3ª Turma Recursal - 0019166-74.2022.8.16.0018 - Maringá - Rel.: JUIZ DE</p><p>DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS JUAN DANIEL</p><p>PEREIRA SOBREIRO - J. 18.09.2023). (Grifou-se)</p><p>RECURSO INOMINADO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.</p><p>RESPONSABILIDADE CIVIL. RUPTURA DE ADUTORA DA SANEPAR.</p><p>INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTO.</p><p>INTERRUPÇÃO OCASIONADA POR FALHA EM OBRA REALIZADA PELA</p><p>INAPLICABILIDADE DO EMPRESA ORA RECORRIDA (CAUSA PRIMÁRIA).</p><p>CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE PELO EVENTO</p><p>DANOSO. PRIVAÇÃO DE BEM ESSENCIAL. VIOLAÇÃO DA DIGNIDADE DA</p><p>PESSOA HUMANA. RECORRENTE QUE É TITULAR DA UNIDADE</p><p>CONSUMIDORA. QUANTUM ABALO MORAL CONFIGURADO.</p><p>INDENIZATÓRIO QUE DEVE SER FIXADO EM R$4.000,00 (QUATRO MIL</p><p>REAIS), CONSIDERANDO OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E</p><p>PROPORCIONALIDADE, BEM COMO DIANTE DAS PECULIARIDADES DO</p><p>CASO CONCRETO. SENTENÇA REFORMADA. Recurso da Reclamante conhecido e</p><p>provido.</p><p>(TJPR - 3ª Turma Recursal - 0007823-81.2022.8.16.0018 - Maringá - Rel.: JUÍZA DE</p><p>DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUÍZAADOS ESPECIAIS ADRIANA DE</p><p>LOURDES SIMETTE - J. 21.08.2023). (Grifou-se)</p><p>RECURSO INOMINADO. INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE</p><p>SERVIÇOS DE ÁGUA E ESGOTO. ROMPIMENTO DE ADUTORA DA</p><p>SANEPAR OCASIONADO POR UMA INSTALAÇÃO IRREGULAR DA</p><p>PRIVAÇÃO DOS SERVIÇOS QUE PERDUROU MAIS DE 72H. EMPRESA RÉ.</p><p>DANO MORAL CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO</p><p>CONHECIDO E PROVIDO.</p><p>(TJPR - 3ª Turma Recursal - 0012202-65.2022.8.16.0018 - Maringá - Rel.: JUIZ DE</p><p>DIREITO SUBSTITUTO JOSÉ DANIEL TOALDO - Rel.Desig. p/ o Acórdão: JUIZ DE</p><p>DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FERNANDO</p><p>SWAIN GANEM - J. 14.08.2023). (Grifou-se)</p><p>No tocante ao valor da indenização por danos morais, resta consolidado, tanto na doutrina como na</p><p>jurisprudência, o entendimento que a fixação deve ser feita com razoabilidade, levando-se em conta</p><p>determinados critérios, como a situação econômica da parte autora, o porte econômico da parte ré, o grau</p><p>de culpa, visando sempre a atenuação da ofensa, a atribuição do efeito sancionatório e a estimulação de</p><p>maior zelo na condução das relações. Deve-se levar em consideração, ainda, não só os incômodos</p><p>trazidos à vítima do ilícito, mas também a prevenção de novas ocorrências.</p><p>No caso em comento, entendo que o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de danos morais,</p><p>contempla os critérios acima mencionados, com correção monetária pelo IPCA desde a data do presente</p><p>julgamento, mais juros de mora pela SELIC, descontado o IPCA, a contar mensalmente desde o evento</p><p>danoso, pois, a responsabilidade é extracontratual. Atente-se que os consectários legais adotados para</p><p>atualização da dívida obedecem ao disposto nos artigos 389, parágrafo único e 406, § 1º, ambos do</p><p>Código Civil, com a redação dada pela Lei n. 14905/2024.</p><p>Sobreleva-se que o montante arbitrado se mostra adequado às peculiaridades do caso, visto não se tratar</p><p>de valor que proporcione o enriquecimento ilícito da parte autora em detrimento da pessoa jurídica ré, e</p><p>que tampouco banalize a situação que ensejou a reparação moral.</p><p>Desse modo, pelo juízo de primeiro grau, para o fim de voto em reformar a sentença proferida</p><p>condenar a parte demandada IRMAOS MUFFATO S.A ao pagamento de indenização por danos morais,</p><p>na importância de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), conforme fundamentação supra.</p><p>Tendo em vista o êxito recursal, deixo de fixar condenação ao pagamento de custas processuais e</p><p>, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95.honorários advocatícios</p><p>Pelo exposto, voto por conhecer e dar provimento ao recurso inominado.</p><p>É como voto.</p><p>tfb</p><p>Ante o exposto, esta 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais resolve,</p><p>por unanimidade dos votos, em relação ao recurso de JOSUE RIBEIRO CAMPOS, julgar pelo(a) Com</p><p>Resolução do Mérito - Provimento nos exatos termos do voto.</p><p>O julgamento foi presidido pelo (a) Juiz(a) Adriana De Lourdes Simette,</p><p>com voto, e dele participaram os Juízes Desembargadora Substituta Denise Hammerschmidt (relator) e</p><p>Juan Daniel Pereira Sobreiro.</p><p>30 de agosto de 2024</p><p>Denise Hammerschmidt</p><p>Juiz (a) relator (a)</p>