Prévia do material em texto
Tópico 1 - Estado Sólido Nome: Gabriel Henrique Batista RA:FFA200042 Tema: Modelagem clássica da condutividade elétrica, condutividade térmica e Termoeletricidade em materiais condutores - Modelo de Drude. Prof. Giovani Fornereto Gozzi Universidade Estadual Paulista - UNESP Campus Rio Claro IGCE - Instituto de Geociências e Ciências Exatas Departamento de F́ısica Parte I Demonstre a razoabilidade da aproximação de que os ı́ons (núcleos atômicos e elétrons fortemente ligados) são imóveis. Antes de começarmos de fato a discutir sobre o modelo de Drude, é importante entendermos o contexto em que ele estava inserido, dessa forma teremos uma noção dos motivos que o levaram a formular as hipóteses de seu modelo, destacando principalmente nesse problema, a aproximação de que os ı́ons são imóveis. Em 1897, Joseph John Thomson (J.J. Thomson) descobriu que raios catódicos eram compostos de part́ıculas as quais possúıam cargas negativas, o que antes não era conhecido. Thomson mostrou por meio de cálculos que o tamanho dessas part́ıculas deveriam ser muito menor em relação a um átomo de Hidrogênio (cerca de 1000 vezes menor). [1]. Alguns anos a frente (1900) a comunidade cient́ıfica enfrentava o ińıcio de uma nova fase na história da f́ısica, o desenvolvimento da teoria quântica. Assim, ainda não se tinha a completa propriedade em suposições e teorias utilizando como base esse novo artif́ıcio. Em paralelo a esta linha de pesquisa, o estudo do estado sólido da matéria e a busca por explicações dos fenômenos em materiais (como a lei de Ohm), se mostrava promissor. O f́ısico alemão Paul Drude propôs, com os recursos e conhecimentos de sua época, uma construção teórica para estudar a condução elétrica e térmica dos metais aplicando a teoria cinética dos gases ao metal, considerado como um gás de elétrons [2]. Após esse breve contexto histórico, é despertado uma primeira pergunta: � Mas o que diz a teoria cinética dos gases? Na sua forma mais simples, a teoria cinética trata as moléculas de um gás como esferas sólidas idênticas, que se movem em linha reta até colidirem com uma outra. Admite-se que o tempo de duração de uma única colisão seja despreźıvel, e, se considera que nenhuma outra força atue entre as part́ıculas, com exceção das forças que agem momentaneamente durante cada colisão. Com essa definição, vemos uma necessidade de adaptação do modelo de gás ideal, onde há somente um tipo part́ıcula, para o metal. No metal deve haver pelo menos dois tipos de part́ıculas, pois os elétrons são carregados negativamente, mas o metal é eletricamente neutro. Drude considerou que a carga positiva compensadora estava associada a part́ıculas muito mais pesadas, que ele considerou serem imóveis. 1 � Mas qual a origem desses dois tipos de part́ıculas? Admitiremos que, quando os átomos isolados de um elemento metálico são reunidos para formar um metal, os elétrons de valência são desprendidos dos átomos e vagam livremente pelo metal, enquanto que os elétrons de caroço(elétrons restantes fortemente ligados ao núcleo) permanecem ligados ao núcleo para formar o ı́on metálico , que permanecem intactos e fazem o papel das part́ıculas positivas imóveis na teoria de Drude. Figura 1: a) Figura esquemática de um átomo isolado. b) Em um metal, o elétrons de caroço e o núcleo do átomo mantém sua configuração, mas os elétrons de valência se desprendem do átomo e formam o gás de elétrons. Retirado de [3] Após a discussão realizada previamente, podemos mostrar o quão razoável é a suposição que Drude fez quanto a imobilidade dos ı́ons metálicos. Para tal, adotaremos o modelo clássico de colisão tridimensional, onde o elétron e o ı́on serão tratados matematicamente por duas bolas de massas distintas. Para sabermos se o ı́on permanece imóvel, torna-se fundamental a determinação do módulo de seu vetor velocidade logo após o choque. Com este objetivo, partimos do teorema impulso-variação do momento linear, onde a grandeza “impulso” ~J é escrita como: ~J = ∆~p, (1) onde ~p = m~v é o momento linear de uma part́ıcula de massa m e velocidade ~v. Denotemos por ~PI = mI ~VI o momento inicial do ı́on e por ~pI = mI~vI seu momento posterior à uma colisão com o elétron. A partir deste teorema, podemos escrever a velocidade final ~v em termos da velocidade inicial ~V para as duas part́ıculas: ~vI = ~VI + 1 mI ~J, ~ve = ~Ve − 1 me ~J. (2) 2 Contudo, para que as Eqs. (2) sejam úteis para sabermos as velocidades das part́ıculas após um choque, devemos expressar ~J em termos das variáveis conhecidas antes da colisão, isto é, as velocidades ~VI e ~Ve e as massas mI e me. Para isso, vamos utilizar de uma suposição feita por Drude para seu modelo: No instante de colisão há total transferência de momento do elétron para o ı́on, o que faz com que a velocidade do elétron logo após uma colisão seja nula. Essa suposição faz com que ~pI = ~Pe, o momento final do ı́on é igual ao momento inicial do elétron, e ~PI = ~pe = 0. Assim, ~J = (~pI − ~PI) = (~pe − ~Pe) ~J = ~Pe = me~Ve. (3) Substituindo na equação correspondente ao ı́on em 2, temos ~vI = ~VI + me mI ~Ve. (4) A massa do elétron é aproximadamente 9.10× 10−28g e a massa de um átomo de cobre, por exemplo, é aproximadamente 1.05× 10−22g. Esses dados nos fazem perceber que a razão me/mI é um número próximo de zero, da ordem de 10 −6. Com isso, chegamos a conclusão de que, a partir da eq. 4, o módulo da velocidade do ı́on após uma colusão com o elétron é praticamente o mesmo do que o anterior a colisão, ou seja, zero. Com essas discussões, vemos que a aproximação dos ı́ons imóveis é algo razoável para esse modelo, já que a contribuição da transferência total do momento linear na velocidade do ı́on após uma colisão é muito pequena. 3 Parte II Demonstre a razoabilidade da suposição de que o tempo entre colisões dos elétrons livres com os ı́ons depende predominantemente da energia térmica mesmo na condição em que um campo elétrico é aplicado ao material. Para começar o racioćınio, nomearemos o tempo médio que separa duas colisões de um dado elétron livre com os ı́ons imóveis de τ . Antes de tentarmos entender como esse tempo dependerá fortemente da energia térmica, vamos ver como o campo elétrico age em τ . Para começarmos esse racioćınio, vamos partir de um modelo de uma barra metálica que é composta por vários cristais metálicos. Esse cristal consiste em um arranjo periódico de ı́ons positivos, imerso num “gás” de elétrons. O modelo de Drude que estudamos atualmente consiste na descrição clássica desse gás de elétrons livres que podem sofrer colisões com os ı́ons que formam o cristal e estão em equiĺıbrio termodinâmico com o ambiente. Analisando apenas um elétron, a sua velocidade logo após a colisão com um ı́on é nula. O que faz com que o elétron não permaneça sempre parado é o movimento caótico de agitação térmica, dada pelo teorema de equipartição da energia de Boltzmann. A partir dele, a energia cinética média do elétrons tem o valor de � = 3 2 kBT . Dessa forma, a média dos módulos das velocidades, dos elétrons é 〈vini〉 = √ 3kBT me (5) Vale ressaltar, a titulo de curiosidade, que o sentido do movimento de cada elétron é totalmente aleatório, e por isso a média vetorial das velocidades é nula. Assim, esse movimento de agitação térmica não significa corrente elétrica, pois o metal é eletricamente neutro. Além das suposições anteriores, vamos supor também que o modelo obedece a lei de Ohm. Tomemos então, para fins de definição, já que usaremos as propriedades elétricas posteriormente, um fio de metal condutor de comprimento l e seção transversal de área S, percorrido por uma corrente i. 4 Figura 2: Modelo proposto para o problema2. A lei de Ohm dada por ∆V = Ri, (6) onde ∆V é a diferença de potencial entre as extremidades do condutor e R a resistência do condutor, pode ser reorganizada de modo que, definindo o campo elétrico como ~E = ∆V/L, a densidade de corrente como j = i/S e multiplicando ambos os membros da eq. 6 por 1/(lS) obtemos ~j = σ ~E, (7) onde σ = l SR é a condutividade do material. Aproveitando que definimos o campo elétrico, vamos ver como o elétron se comporta (qual sua velocidade) em sua presença. Cada elétron passa a sentir uma força ~Fe = −e ~E (definição de campo elétrico), na mesma direção, mas de sentido oposto ao campo, e portanto adquire um movimento uniformemente acelerado (com a = −eE/me), isso apenas entre duas colisões sucessivas, já que a velocidade se anula no momento da colisão com o ı́on. A partir disso, podemos escrever a velocidade média dos elétrons por v = at, em termos do modelo: 〈~v〉 = 〈~v0〉+ −e ~E me τ. onde 〈~v0〉 é a velocidade inicial (imediatamente após uma colisão) média. Vejamos que estamos partindo do ponto que a velocidade é nula logo após a colisão, assim 〈~v0〉 = 0. Nos resta então: 〈~v〉 = −e ~E me τ. (8) Utilizando outra definição conhecida da densidade de corrente, ~j = ρl · 〈~v〉, onde ρl = −ne é a densidade de carga de condução (n é a densidade dos elétrons livres): ~j = ne2τ me ~E. (9) E, comparando as equações 7 e 9, obtemos algo bem útil para calcularmos o tempo de colisão: σ = ne2τ me , (10) 5 já que σ, n, e e me são valores conhecidos e tabelados para alguns materiais, como podemos consultar abaixo[4]: O tempo de colisão nos metais é, como podemos verificar, extremamente curto. Durante um intervalo de tempo tão pequeno, a variação no módulo da velocidade dos elétrons provocada pela ação de campos elétricos comuns (de alguns volts por metro) é, certamente pequena. Podemos então considerar que o valor do módulo da velocidade dos elétrons é, em média, o calculado a partir do prinćıpio de equipartição da energia, equação 5. Por curiosidade, vejamos qual a distância média que os elétrons percorrem entre as colisões. À temperatura ambiente, T ≈ 300K, 〈vini〉 ≈ 105m/s. Durante um intervalo de tempo τ ≈ 10−14 s, os elétrons percorrem uma distância de cerca 10−9m = 10A, que é da ordem de grandeza das distâncias interatômicas. Vemos então que este resultado apoia a suposição do de Drude de que os elétrons sofrem colisões com os ı́ons da rede. Sabendo como o campo elétrico age em τ , tentaremos apontar os motivos pelos quais o tempo entre colisões depende fortemente da temperatura. De acordo com a equação 5, o valor médio do módulo da velocidade de agitação térmica diminui com a temperatura. Supondo agora que o livre caminho médio 〈λ〉, não depende fortemente da temperatura, o tempo entre colisões será, de acordo com a definição de livre caminho médio, τ = 〈λ〉 〈vini〉 . (11) Vemos então que, como 〈vini〉 é proporcional à temperatura, então τ é fortemente influenciado por ela, ou seja, τ cresce quando a temperatura é diminúıda. Uma pergunta que fazemos é a seguinte: como verificar isso experimentalmente? o tempo de colisões não é algo que pode ser medido com clareza, ainda mais na época em que Drude viveu. Uma sáıda é partirmos para uma grandeza que podemos medir e está relacionada com τ : A condutividade elétrica. Ao substitúımos o valor de τ na equação 10: σ = ne2λ√ 3mekBT , (12) ou seja, a condutividade elétrica dos metais é maior a baixas temperaturas, o que é verificado experimentalmente, com exceção de materiais semi-condutores. Se observarmos experimentalmente a dependência de σ com T , conclúımos que os resultados acima são apenas quantitativos, pois na maioria dos metais essa dependência é quantitativamente mais forte do que o enunciado pela equação 12. 6 Parte III Verifique a possibilidade de representar a relação de Wiedemann-Franz com o modelo de Drude. A lei emṕırica de Wiedemann-Franz afirma que a razão entre as condutividades térmica e elétrica, κ/σ,de um grande número de metais é diretamente proporcional à temperatura, onde a constante de proporcionalidade, é aproximadamente a mesma para todos os metais. Podemos ver essa relação na tabela abaixo, presente em [5], onde vemos a condutividade térmica medida experimentalmente para vários metais a 273K e 373K, juntamente com a razão κ/σ (conhecida como número de Lorentz) para as duas temperaturas. Com a noção do que se trata a relação de Wiedemann-Franz, podemos tentar calcular os ingredientes necessários (condutividade elétrica e térmica) para sua representação através do modelo de Drude que estamos estudando. Já calculamos o σ no problema anterior através do modelo de um fio condutor submetido a uma diferença de potencial em suas extremidades. Para o cálculo de κ utilizaremos um análogo térmico, ou seja, um fio metálico com uma de suas extremidades submetidas a um banho gelado e outra aquecida com uma chama. 7 Figura 3: Esquema de um gradiente de temperatura num metal (esquerda) e o campo elétrico, ~ET , resultante desse gradiente. Podemos utilizar esse modelo pelo fato de que o modelo proposto por Drude admite que os elétrons livres são os principais responsáveis pelo fenômeno da condução térmica observado nos metais. Mas por que isso? Por que os resultados experimentais mostram que os metais conduzem muito melhor o calor do que os isolantes. Mas qual a diferença entre eles? Os elétrons livres. Assim, a condução térmica pelos ı́ons (presentes em metais e isolantes) poderia ser considerada como menos importante que a condutividade térmica pelos elétrons livres (presentes somente nos metais). Após um determinado tempo t, observa-se que a temperatura da barra varia ao longo do seu comprimento, ou seja, a energia térmica (calor) flui através da barra do seu extremo quente para o frio pois vimos que o módulo da velocidade do elétron após uma colisão é proporcional à temperatura local, T , onde ocorreu o choque. Sendo x a coordenada medida ao longo do fio, definimos a variação de temperatura por unidade de comprimento por gradiente de temperatura (dT/dx). Após um tempo, atingimos um estado estacionário, caracterizado pela existência de um gradiente de temperatura e um fluxo térmico uniforme. Com posse de tais conhecimentos matemáticos, nos é lembrado o modelo proposto no problema passado, onde vimos pela eq. 7 que a densidade de corrente elétrica é igual a uma constante (σ) vezes o campo elétrico. Logo, como fizemos o modelo análogo para o gradiente de temperatura, somos tentados a acreditar que a densidade de corrente térmica seria uma constante (κ) multiplicada pelo gradiente de temperatura. De fato, se definirmos a densidade de corrente térmica ~jq como um vetor paralelo ao fluxo de calor, experimentalmente observa-se que para valores de (dT/dx) muito pequenos, é válida a relação(Lei de Fourier): ~jq = −κ∇T, (13) onde o sinal negativo justifica o fato de que a corrente elétrica flui para a região de menor temperatura. Nesse momento ficamos tentados a buscar outro modo de definir~jq, para que possamos descobrir κ em variáveis conhecidas. Uma forma de conseguirmos isso é partindo da definição do termo “densidade de corrente”: corrente/area. Somos levados então a outra pergunta, o que seria a corrente térmica? Tentemos defini-la quantitativamente nos próximos parágrafos. O modelo de Drude admite que a velocidade após a colisão é proporcional à tempe- 8 ratura local (eq. 5), dessa forma, os elétrons que chegam a certo local do fio provindos de uma localização que tem uma temperatura maior possuem maior velocidade, e consequentemente maior energia cinética, do que algum outro elétron que chega ao mesmo destino vindo de uma parte do fio com menor temperatura. Nessa situação vemos que há um fluxoĺıquido de energia térmica da região de maior temperatura para o outro extremo de menor temperatura. Esse fluxo é nosso objeto momentâneo de estudo, a corrente térmica. Iremos nesse momento simplificar nosso modelo (para depois tentarmos generalizar) em apenas uma dimensão. Fazendo os elétrons se movimentarem na direção horizontal, podemos supor que metade dos elétrons que chegam a um certo ponto x do fio vêm do lado de maior temperatura e outra metade do lado oposto. Sendo ε(T [x]) o valor da energia térmica média por elétron nesse ponto x, então os elétrons que se colidiram pela ultima vez no ponto x ′ terão energia térmica ε(T [x ′ ]). O ponto de ultima colisão, em média, pode ser colocado em termos do ponto atual através do livre caminho médio, x ′ = x− λ. Assim, ε(T [x′ ]) = ε(T [x− λ]). Desse modo, para fazermos a contrição desses elétrons à densidade de corrente térmica utilizamos novamente o análogo elétrico (eq. 9), e obtemos ~jq1 = n 2 〈~v〉 ε(T [x− λ]). Analogamente, para os elétrons que vem da região de menor temperatura: ~jq2 = n 2 〈~v〉 ε(T [x+ λ]). Assim, conseguirmos outra expressão para ~jq, uma vez que ~jq1 é oposto a ~jq2: ~jq = n 2 〈~v〉 ε(T [x− λ])− n 2 〈~v〉 ε(T [x+ λ]). ~jq = n 2 〈~v〉 ( ε(T [x− λ])− ε(T [x+ λ]) ) (14) Admitindo que a variação de temperatura é muito pequena ao longo do livre caminho médio é posśıvel expandir ~jq em torno do ponto x usando uma série de Taylor, obtendo-se ~jq = n 2 〈~v〉 ( ε ( T [x]− λ [ dT dx ]) − ε ( T [x] + λ [ dT dx ])) ~jq = n 2 〈~v〉 ( �� ��ε(T [x])− λ [ dT dx ][ dε dT ] −����ε(T [x])− λ [ dT dx ][ dε dT ]) ~jq = n 〈v〉2 τ [ dε dT ][ −dT dx ] , (15) onde na última linha substitúımos λ por 〈~v〉 · τ . Fazendo ligeiras substituições na equação acima, é posśıvel passar da solução unidi- 9 mensional para solução geral em três dimensões: ~jq = 1 3 〈v〉2 τcv(−∇T ), (16) onde já é sabido que cv = [ dε dT ] é o calor espećıfico e (−∇T ) = [ −dT dx ] . Assim, finalmente podemos comparar as eqs. 16 e 13: κ(−∇T ) = 1 3 〈v〉2 τcv(−∇T ). (17) Logo de cara vemos que nosso objetivo momentâneo é cumprido, a definição de κ: κ = 1 3 〈v〉2 τcv. (18) Com os dois ingredientes necessários obtidos, façamos agora a relação κ/σ utilizando as equações 10 e 18 κ σ = 〈v〉2 cvme 3ne2 . (19) Para obtermos o resultado desejado, a relação de Wiedemann-Franz, podemos substituir cv e 〈v〉2 pelo valores encontrados na teoria cinética dos gases: cv = 3 2 nkB 1 2 me 〈v〉2 = 3 2 kBT −→ κ/σ = 3 2 (kB/e) 2 T O modelo de Drude nos diz, portanto, que a razão entre a condutividade térmica e a condutividade elétrica é proporcional à temperatura absoluta e a constante de proporcionalidade é a mesma para todos os metais, 3 2 (kB/e) 2 T . Este resultado fornece uma explicação muito boa para a lei emṕırica enunciada em 1853 por Wiedemann e Franz, pois, ao compararmos os resultados experimentais da tabela no começo de nossa discussão com o valor de 3 2 (kB/e) 2, obtemos resultados da mesma ordem de grandeza,10−8. Dessa forma é posśıvel representar a relação Wiedemann-Franz através do Modelo de Drude. 10 Parte IV Utilizando o modelo de Drude, demonstre a possibilidade de geração de energia elétrica a partir de energia térmica utilizando materiais condutores. Para a discussão desse problema, utilizaremos o mesmo modelo do caso anterior, um fio submetido a um gradiente de temperatura. Não foi por acaso que inserirmos um campo elétrico ~ET na figura, se pensarmos um pouco, somos levados a conclusão de que uma vez que os elétrons livres da extremidade quente têm maior energia cinética do que os da extremidade fria, será verificado, durante alguns instantes, um fluxo ĺıquido de elétrons daquela extremidade para esta. O acúmulo dos elétrons, que possuem carga definida, na extremidade fria define no interior do metal um campo elétrico que contraria a continuação indefinida deste processo. Nesse ponto podemos dizer que é atingido um estado de equiĺıbrio dinâmico, em que no interior do metal está definido um campo elétrico que se manifesta como uma diferença de potencial entre as duas extremidades, sendo a mais quente a de potencial mais elevado. Realizando vária pesquisas sobre o tema, vemos que esse efeito é realmente conhecido, na verdade antes mesmo de Drude formular sua teoria. Este fenômeno tem o nome de efeito de Seebeck. Com esse racioćınio, vemos que é posśıvel gerar eletricidade através da diferença de temperaturas. Discutiremos a partir de então como o modelo de Drude trata esse fato. O campo elétrico, ou termoelétrico, pode ser escrito por ~ET = S∇T, (20) em que S é termopotência (ou coeficiente de Seebeck). Como S é um valor que pode ser medido 11 experimentalmente é interessante vermos qual se valor teórico de acordo com as suposições de Drude. Para tal, consideremos novamente nosso modelo unidimensional. A velocidade eletrônica média em um ponto x provindo do gradiente de temperatura é (pelos mesmos motivos dos discutidos no problema anterior quando definimos a expressão de ~jq): 〈vT 〉 = 1 2 [ vx(x− vxτ)− vx(x+ vxτ) ] . (21) Podemos realizar a mesma expansão em série de Taylor feita anteriormente, ficamos então com: 〈vT 〉 = 1 2 [ � ��vx(x)− vxτ ( dvx dx ) −�� �vx(x)− vxτ ( dvx dx )] = −τvx dvx dx = −τ d dx ( v2x 2 ) (22) Generalizando para três dimensões, com v2x = 〈v2x〉 = 〈 v2y 〉 = 〈v2z〉 = 13v 2, temos 〈vT 〉 = − τ 6 dv2 dT (∇T ) (23) Por outro lado, a contribuição do campo elétrico para a velocidade média já foi calculada na equação 8: 〈 ~vE〉 = −e ~E me τ. No equiĺıbrio, como supomos, 〈vT 〉+ 〈vE〉 = 0, Assim: −τ 6 dv2 dT (∇T )− e ~E me τ = 0 �� ��−∇Tτ ( 1 6 d dT v2 + eS me ) = 0 eS me = − d dT v2 6 S = −mev 2 2 1 3e d dT . (24) Nesse momento inclúımos as hipóteses do modelo de Drude ao modelo matemático desenvolvido até então, atribuindo o valor da energia cinética, mev 2 2 , o valor clássico de 3 2 kBT : S = − ( 3 2 kBT )( 1 3e ) d dT S = −kB 2e (25) 12 Ou, se também colocarmos a expressão clássica do calor espećıfico, obtemos: S = − cv 3ne . (26) Chegamos então ao ponto desejado: a comparação do experimental com o modelo teórico de Drude. Por meio da equação 25 obtemos S = −0.43× 10−4 V/K , em quanto os resultados experimentais podem ser observados abaixo(retirado de [6]): Figura 4: Coeficientes de Seebeck à temperatura ambiente para alguns materiais, medidos em relação à platina. O coeficiente de Seebeck da platina em si é de aproximadamente −5µV/K em temperatura ambiente, [7] e, portanto, os valores listados abaixo devem ser compensados de acordo. Por exemplo, os coeficientes de Seebeck de Cu, Ag, Au são 1.5µV/K e de Al −1.5µV/K. Vemos então que o modelo de Drude não representa tão bem o fenômeno da ter- moeletricidade, pois há uma discrepância no valor de S em duas ordens de grandeza, o valor experimental é cerca de cem vezes menor do que o encontrado. Esse mesmo erro, de duas ordens de grandeza, pode ser encontrado também na de- rivação da lei de Wiedemann-Franz, mas naquele momento o erro foi compensado acidentalmente pela divisão da condutividade térmica pela elétrica, onde os erros se cancelaram. Conclúımos então que o modelo de Drude foi um pontapé inicial para que ideias mais avançadas, e mais condizentes aos valores experimentais, fossem constrúıdas. Os erros não desmerecem a teoria, como muitos livros e outros materiais dão a entender, muito pelo contrário, eles servem para mostrar que as propriedades microscópicas de um metal devem ser tratadas de modo diferente de um modelo clássico de gás ideal. A ideia de Drude de tratar o modelo como um gás de elétrons foi muito ousada e criativa, como acreditamos que deveria ser no ambiente cient́ıfico. 13 Referências [1]I. Falconer (2001), Corpuscles to Electrons in J Buchwald and A Warwick(eds) Histories of the Electron (Cambridge, Mass: MIT Press) pp77-100. [2] P. Drude (1900), Zur Elektronentheorie der Metalle. Annalen der Physik. 306 (3): 566. [3] N. Ashcroft; D. Mermin (1976), Solid State Physics. Saunders College. pp. 67. [4] http://www.dfisica.ubi.pt/ amoreira/lectnotes/fesnts.pdf, pag.82. [5] G.W.C. Kaye; T.H. Laby(1966), Table of Physical and Chemical constants, Longmans Green, London. [6] The Seebeck Coefficient, Electronics Cooling.com (acessado em 17/12/2020) [7] J.P. Moore (1973), Absolute Seebeck coefficient of platinum from 80 to 340 K and the thermal and electrical conductivities of lead from 80 to 400 K. Journal of Applied Physics . 44 (3): 1174–1178. Bibcode : 1973JAP .... 44.1174M . doi : 10.1063 / 1.1662324 14 http://www.dfisica.ubi.pt/~amoreira/lectnotes/fesnts.pdf http://www.electronics-cooling.com/2006/11/the-seebeck-coefficient/