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CENTRO UNIVERSITÁRIO LUTERANO DE JI-PARANÁ VERÔNICA DOS SANTOS GONÇALVES PROCESSO SÓCIOEDUCATIVO COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO ESPAÇO SOCIAL “SONHO MEU” NO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ /RO: A QUESTAO DOS DIREITOS Ji-Paraná 2012 VERÔNICA DOS SANTOS GONÇALVES PROCESSO SÒCIO EDUCATIVO COM CRIANÇAS E ADOLESCENTE S NO ESPAÇO SOCIAL “SONHO MEU” NO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ /RO: A QUESTAO DOS DIREITOS Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao curso de Serviço Social do Centro Universitário Luterano de Ji- Paraná, como requisito para obtenção do grau de bacharel em Serviço Social, sob orientação da Prof. Ms. Dulce Teresinha Heineck. Ji-Paraná 2012 VERÔNICA DOS SANTOS GONÇALVES PROCESSO SÒCIO EDUCATIVO COM CRIANÇAS E ADOLESCENTE S NO ESPAÇO SOCIAL “SONHO MEU” NO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ /RO: A QUESTAO DOS DIREITOS AVALIADORES _________________________________________________________ Prof. Ms. Orientadora Dulce Teresinha Heineck – CEULJI/ULBRA ____________________________________________ Profª. Especialista. Mara Adriane Dahmer Hillesheim/CEULJI/ULBRA ____________________________________________ Assistente Social Glória Maria Paula da Silva Mattara _____________________________________________ _______________________ Média Ji-Paraná 2012 “Se as riquezas da Nação fossem bem distribuídas Resolveria a questão das pessoas excluídas que enfrentam esse castigo de viver em desabrigo em marquise de calçada ou em mundos recantos vendo uns milhares com tantos e outros milhões sem ter nada”. Carlos Aires (2009) AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus, que me proporcionou conhecimento e esteve presente em todos os momentos e situações boas e ruins, me fazendo acreditar que tudo por mais difícil que seja é possível alcançar, basta ter fé e força de vontade para que o sonho se torne realidade. Obrigada por ter me conduzido com sua orientação divina. Aos meus pais Arveli e Elza que foram e são o meu maior incentivo, pais exemplares em quem eu me espelho, por todas as orações de proteção que fizeram por mim, agradeço ao apoio, amor e paciência que sempre tem comigo, agradeço por terem caminhado junto comigo nesta longa caminhada, chegamos ao fim da tão esperada conquista, mais isto só foi possível porque tenho vocês ao meu lado, meu maior presente de Deus. Obrigada amo vocês eternamente. Ao meu namorado Artur, que contribuiu muito para esta conquista, sempre estando ao meu lado me apoiando em todos os momentos, e sempre se dispondo a ajudar. Agradeço pela compreensão e amor que sempre me tratou, para que eu me sentisse mais confiante diante dos desafios. Obrigada amo você. Aos meus sobrinhos Alan e Regiane que somaram muito para realização deste sonho, agradeço muito pelo esforço que fizeram por mim. A todos meus irmãos que sempre estiveram presentes na minha vida, e sempre torcendo pelo meu sucesso. Amo vocês. Agradeço em especial a minha irmã Marilza e sua família que me acolheram em sua casa com muito amor e carinho. Obrigada. A todos meus sobrinhos e sobrinhas pessoas maravilhosas em minha vida que sempre torceram para que alcançasse este sonho. A minha grande companheira e amiga Eleksandra Fagundes Mendes (Sandrinha) que sempre esteve presente ao meu lado em todos os momentos dessa trajetória, pelas trocas de conhecimentos e experiências que contribuiu muito para a nossa profissão. Em especial a minha coordenadora orientadora e mestra Dulce Teresinha Heineck mulher apaixonada pela sua profissão, capaz de transmitir conhecimentos, com dedicação ética e amor, com apenas um objetivo formar seus alunos não só com conhecimentos, mas também pessoas capazes de reconhecer com sentimentos as limitações e falhas de cada ser humano. Aos meus mestres que com muita gratidão agradeço de coração pessoas essenciais para realização desta conquista, professora Dalva Felipe, Ivania Prosenewicz, Dulce Teresinha Heineck, José Carlos P. dos Santos, Mara A. Dahmer Hillesheim, e Odete Rigato Mioto, com sabedoria e conhecimento nos conduziram a buscar e acreditar que podemos sim mudar o mundo com dignidade, vocês são exemplos de dedicação, Juntos construímos uma profissão. Hoje, deixo de ser aluna, mas nunca esquecendo de que vocês sempre serão meu espelho. Obrigada se cheguei até aqui é porque deram o melhor de vocês. A minha patroa Darci que é uma grande mulher que me ajudou muito na conclusão dessa etapa da minha vida. Agradeço pela sua bondade e compreensão que soube entender todas as vezes que tive que sair do trabalho para ir ao estágio. Você é patroa, amiga e mãe, amo muito você. Ao amigo Junior que com seu coração imenso e bondoso várias vezes acalmou minhas aflições. A minha supervisora de campo Assistente Social Glória Maria Paula da Silva Mattara, que me acolheu com muito carinho, agradeço todo o profissionalismo e ética com que me recebeu. Agradeço a pedagoga Angelita do Espaço Social “Sonho Meu” especial, que me recebeu muito bem e uma grande amiga. A todas as crianças e adolescentes que comigo estiveram presente no decorrer do estágio, agradeço pelo carinho que me receberam, pela amizade, e a participação que foi essencial para realização do meu trabalho. RESUMO O trabalho é resultado do Estagio Curricular Supervisionado em Serviço Social realizado durante o ano de 2010/2 e 2011/1 no Espaço Social "Sonho Meu" localizado no bairro Jardim das Seringueiras, no município de Ji-Paraná/RO, este que atende crianças e adolescentes na idade de 08 a 17 anos de idade. O objetivo foi analisar o processo socioeducativo em questão aos direitos da criança e do adolescente com qualidade. Como método de procedimento utilizou-se o estudo de caso com as técnicas de coleta de dados, sendo a observação, visita domiciliar, entrevista com questionário, pesquisa bibliográfica e documental. Como método de análise recorreu-se ao método dialético por este permitir analisar a problemática com totalidade e de forma critica e dinâmica examinando as contradições que envolvem a temática. Através dessa metodologia foi possível visualizar a demanda das crianças e adolescentes inseridos no Espaço Social "Sonho Meu", e assim contribuir para melhoria em relação aos atendimentos das atividades socioeducativas oferecidas. Podendo perceber também que essas crianças e adolescentes estão ainda mais expostas às expressões da questão social. Dentro desse contexto o papel do assistente social se torna essencial no momento de oportunizar ações e atividades socioeducativas, e no acompanhamento da situação social das crianças e adolescentes juntamente com seus familiares, e assim buscar ações transformadoras na vida dessas. Palavras-chave: Crianças e Adolescentes, atividades socioeducativas Vulnerabilidade Social. ABSTRACT The work is a result of Supervised Internship Course in Social Service conducted during 2010/2 and 2011/1 in Social Space "My Dream" located in the neighborhood of Seringueiras Garden in the city of Ji-Paraná/RO this that helps children and adolescents age 08 to 17 years of age. The aim was to analyze the socio-educative process in question the rights of children and adolescents with quality. As a methodof procedure used the case study with the techniques of data collection, and observation, home visit, interview questionnaire, bibliographical and documentary research. As a method of analysis we used the dialectical method for this opportunity to analyze the problem with full and critically examining the dynamics and contradictions surrounding the issue. Through this methodology it was possible to visualize the demand of children and adolescents included in the Social Space "My Dream", and thus contribute to improving quality of care and socio-educational activities offered. May also realize that these children and adolescents are more exposed to the expressions of the social question. Within this context the role of social worker becomes essential at the time of socio oportunizar actions and activities, and monitoring the social situation of children and adolescents along with their families, and thus seek the lives of these transformative actions. Keywords: Children, adolescents, social and educational activities, social vulnerability LISTA DE SIGLAS ABNT- Associação Brasileira de Normas Técnicas CF - Constituição Federal CFESS – Conselho Federal de Serviço Social CONANDA - Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente CEULJI - Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente FEBEM - Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor FUNABEM - Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor LBA - Legião Brasileira de Assistência PNAS - Política Nacional de Assistência Social PROERD- Prevenção de drogas e violência SAM - Serviço de Assistência ao Menor SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SESI – Serviço Social de Indústria SENAC - Serviço Nacional de Aprendizado Comercial SESC - Serviço Social do Comércio UNICEF- Fundo das Nações Unidas para a Infância ULBRA- Universidade Luterana do Brasil SUMÁRIO INTRODUÇÃO.......................................................................................................14 CAPITULO I...........................................................................................................15 1. METODOLOGIA................................................................................................15 1.1. Conceitos de Pesquisa e de Metodologia......................................................15 1.2. Método de procedimento...............................................................................16 1.3. Técnicas de coleta de dados.........................................................................19 1.4. Pesquisa bibliográfica e Documental.............................................................22 1.5. Método de Análise.........................................................................................23 CAPITULO II..........................................................................................................26 2. DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO DECORRER DA HISTÓRIA..............................................................................................................26 2.1. Considerações iniciais a cerca da Infância.....................................................26 2.2 A História da Infância no Brasil........................................................................32 2.3 História e Direitos da criança na atualidade.....................................................37 2.3.1 Estatuto da Criança e do Adolescente..........................................................45 CAPITULO III.........................................................................................................49 3. PROCESSO SOCIOEDUCATIVO VOLTADO PARA AS CRIANÇAS E ADOLESCENTES..................................................................................................49 3.1 Caracterizando o Espaço Social Sonho Meu...................................................49 3.2 A questão da criança e do adolescente e o processo socioeducativo.......................................................................................................51 3.3 O Processo Sócio Educativo com as Crianças e Adolescentes do Espaço Social Sonho Meu..................................................................................................54 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................65 5. REFERÊNCIAS..................................................................................................67 14 INTRODUÇÃO No mundo conflituoso em que se vive, devido ao capitalismo em sua face neoliberal, falar de direitos exige tanto a apreensão do conjunto de processos econômicos, que se dá ao seu entorno, como a sociedade em que está inserido, bem como os interesses da classe dominante e dominada nas expressões da questão social. Na atual conjuntura tendo como modo vigente o capitalista em sua forma neoliberal que contribui para a concentração de renda, individualismo e exclusão social, elevando assim os índices de desigualdade social e em conseqüência a diminuição dos direitos sociais em que a emergência das expressões da questão social leva a buscar novas alternativas para efetivar ou validar os direitos sociais por meio de serviços de qualidade, e das políticas sociais. Assim, na relação entre o sistema capitalista e as classes sociais os problemas ligados aos direitos de forma geral vêm aumentando no tocante às reestruturações econômicas levando a seletividade e burocracia no que se refere ao acesso dos direitos. O primeiro capítulo discorre o processo metodológico para obtenção de dados, podendo perceber a problemática de forma critica em um contexto contraditório. O Segundo capítulo é realizado uma retrospectiva histórica, sobre a infância da criança e do adolescente, destacando as transformações societárias, tendo como objetivo analisar o processo de transformação. O terceiro e último capítulo relata a prática do Serviço Social no Espaço Social “Sonho Meu” na realidade, percebendo o Espaço Social, como instrumento de inclusão social para a criança e o adolescente e seu familiares. Relata-se também o trabalho desenvolvido e as experiências vivenciadas durante o período de Estágio Curricular em Serviço Social. 15 CAPÍTULO I METODOLOGIA 1.1. Conceitos de Pesquisa e de Metodologia A pesquisa para que tenha um bom desenvolvimento e seus resultados sejam satisfatórios necessita estar baseada em um planejamento cuidadoso, reflexões conceituais sólidas e alicerçada em conhecimentos já existentes, habilidades, métodos e técnicas. Segundo Gil, (1991, p.43) [...] “o objetivo fundamental da pesquisa é descobrir respostas para problemas mediante o emprego de procedimentos científicos”. Nessa sociedade permeada de conflitos e contradições, precisam-se buscar possibilidades concretas para tratar dessa realidade cheia de diferenciação. Conforme Minayo (1994, p.17), “é a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e a atualiza frente à realidade do mundo”. A pesquisa científica requer uma metodologia adequada ao objeto para se fazer uma análise da realidade em que o mesmo está inserido. Para isso, é importante optar por métodos e técnicas que permitam compreender a problemática em sua totalidade. Entende-se por metodologia um conjunto de procedimentos que servem como instrumento para alcançar os fins de uma investigação. Nesse trabalho, propõe-se demonstrar passo a passo o desenvolvimento da pesquisa, quais os instrumentos utilizados e todos os procedimentos usados para a construção da análise. Ao adentrar no mundo da investigaçãocientífica, o investigador busca na metodologia a ferramenta fundamental para a execução do desenvolvimento do seu trabalho. Sendo assim, o caminho para a estruturação da investigação foi escolhido de acordo com uma metodologia adequada ao trabalho proposto. Pode- 16 se definir método, segundo Gil (1999, p. 26), “como o caminho para se chegar a determinado fim. É o conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento.” No qual o investigador tem a contribuição de pensadores das ciências sociais que através de suas teorias buscam explicar ou compreender os fenômenos. Para Minayo (1994, p. 43), A metodologia não só contempla a fase de exploração de campo, (escolha do espaço da pesquisa, escolha do grupo de pesquisa, estabelecimento dos critérios de amostragem de construção de estratégias para entrada em campo) como a definição de instrumentos e procedimentos para a análise dos dados. A Metodologia tem como função “desvendar os caminhos mais misteriosos”, a pesquisa, ajuda na reflexão das teorias e ter um novo olhar sobre o mundo: um olhar curioso e criativo para poder assim desenvolver a prática como uma ação transformadora. 1.2. Método de Procedimento Estudo de Caso O método de procedimento utilizado foi o estudo de caso, o qual abrange a totalidade do objeto a ser investigado. O estudo de caso permite investigar de maneira mais ampla o contexto histórico e a sociedade na qual o indíviduo está inserido. O estudo de caso conforme aponta Yin (2005,p.32) É uma investigação empírica que investiga um fenômeno dentro de seu contexto da vida real, principalmente quando os limites entre o objeto de apreensão e o contexto não estão claramente definidos. Trata assim, da lógica de planejamento específico à análise da realidade investigada. O mesmo autor destaca que, como estratégia de pesquisa, o estudo de caso insere-se no conhecimento de muitas situações para contribuir com o aprofundamento do conhecimento no que se referem aos fenômenos organizacionais, sociais, políticos e de grupo, além de assuntos relacionados à compreensão das expressões da questão social complexa. A coleta de dados para um estudo de caso não se trata meramente de registrar os dados mecanicamente, como se faz em alguns outros tipos de pesquisa. É necessário interpretar as informações à medida que estão 17 sendo coletadas e saber imediatamente, por exemplo, se as diversas fontes de informação se contradizem e levam à necessidade de evidências adicionais como faz um bom detetive. (Yin, 2006, p. 86) Nesse sentido, cada informação adquirida precisa ser confrontada com os objetivos propostos para averiguar a sua aplicabilidade e ao mesmo tempo a necessidade de busca de novas informações. Esse caminho a ser percorrido passa, necessariamente, por uma investigação detalhada, observando todos os aspectos da temática para se chegar à totalidade dessa investigação. O estudo de caso é uma caracterização abrangente para designar uma diversidade de pesquisas que coletam e registram dados de um caso particular ou de vários casos a fim de organizar um relatório ordenado e crítico de uma experiência ou avaliá-la analiticamente, objetivando tomar decisões a seu respeito ou propor uma ação transformadora. (Chizzotti, 2001, p. 102). O estudo de caso é um método muito usado pelo pesquisador para examinar, observar e analisar todos os fatores que influenciaram ou influenciam uma determinada temática, tomando o devido cuidado para não fugir do objetivo proposto. Ao desenvolver o estudo de caso, o pesquisador tem várias opções de coletar dados de formas diferentes e em momentos diversos, esses dados irão facilitar a análise da problemática investigada, permitindo tomar decisões relevantes durante a pesquisa, propondo ao mesmo tempo novas ações que visem a transformações na realidade. O estudo de caso tem como ponto central determinar o foco da investigação. Por meio dele é potencializada a compreensão e a avaliação dos problemas que envolvem o processo socioeducativo de qualidade em relação aos direitos da criança e do adolescente no Espaço Social “Sonho Meu”. O estudo de caso é adequado para investigar tanto a vida de uma pessoa quanto a existência de uma entidade de ação coletiva, nos seus aspectos sociais e culturais. Sua importância também está no fato de não fazer do conhecimento descritivo o foco, mas de promover a ruptura do senso comum, através de um processo de compreensão dos elementos mais significativos, investigados profundamente. (Martinelli, 1999, p.46) 18 O estudo de caso na área de ciências sociais é bastatnte utilizado por permitir desvendar os fatos que envolvem a questão em estudo de forma direta. Segundo Gil (1999,p.73 ), “o estudo de caso é uma técnica mais profunda porque explora com mais precisão as situações que ainda não estão claras e consiste ainda em descrever todo o contexto para poder interpretar de forma rigorosa.” 1.3. Técnicas de coleta de dados 1.3.1 Observação A observação é uma técnica de investigação muito relevante, pois permite ao investigador estar atento a tudo o que ocorre e o que vai além das aparências. Portanto, define-se uma “observação participante como um processo pelo qual um pesquisador se coloca como observador de uma situação social, com a finalidade de realizar uma investigação científica”. (Minayo, 2007, p. 70) O pesquisador nesse contexto desempenha um papel ativo no processo da investigação captando as diversas formas de expressão que a realidade pode comportar e mesmo de estabelecer prejulgamentos quanto ao objeto. A importância dessa técnica reside no fato de poder captar uma variedade de situações ou fenômenos que não são obtidos por meio de perguntas, uma vez que é observada diretamente na própria realidade vivida pelos participantes do Espaço Social “Sonho Meu”. A observação nesse sentido, É o procedimento que garante maior confiabilidade, as informações obtidas, seu alcance, no entanto é limitado, pois não se aplica a tarefa complexa. No processo de observação demanda registro e reflexão sobre os fatos observados que foram registrados no momento da pesquisa. (Gil, 1991, p.312). A observação, às vezes, fala mais do que o próprio relato e terá sempre o olhar daquele que observa, uma vez que “[...] o que cada um seleciona para ver depende muito de sua história pessoal e principalmente de sua bagagem cultural.” (Ludke e André, 1986, p.25) 19 Em função dessa historicidade, a observação permite uma melhor compreensão dos significados atribuídos ao objeto. Segundo Neto (1994, p. 59), “a técnica de observação se realiza através do contato direto do pesquisador com o fenômeno observado para obter informações sobre a realidade dos atores sociais em seus próprios contextos”. A observação durante o período de estágio ocorreu no Espaço Social “Sonho Meu” com as crianças e adolescentes participantes das atividades do Espaço Social e também com a assistente social em relação ao desenvolvimento do trabalho da mesma. Esse processo demanda registro e reflexão sobre os fatos observados e estes cotidianamente são registrados no diário de campo, o qual auxilia bastante o profissional na análise institucional, sendo um instrumento fundamental para localizar qualquer proposta de inserção interventiva do Serviço Social. É importante frisar que se torna necessário separar dos dados selecionados os relevantes e os irrelevantes. A observação desempenha um papel fundamental no processo de pesquisa, pois através dela será possível adquirir dados que tornem a pesquisa mais evidente, e assim “[...] constitui elemento fundamental para a pesquisa. Desde a formulação do problema, passando pela construção de hipóteses, coleta, análise e interpretaçãodos dados, a observação desempenha papel imprescindível no processo de pesquisa” (Gil, 1999, p. 110). O observador deve estar sempre atento aos movimentos ao seu redor, tendo uma visão crítica para que possa coletar dados para a realização de projetos de pesquisas. “Observar não é simplesmente olhar, observar é destacar um conjunto, objetos, pessoas, animais, ambientes, algo especificamente [...]” (Triviños apud Cardoso 2008, p. 26). 20 1.3.2. Visita Domiciliar A visita domiciliar no percurso da observação e pesquisa possui o propósito “de complementar dados observar relações sociais em sua singularidade, no ambiente de convivência, seja este o lar, a escola ou outro em que se efetivem as relações sociais do usuário” (Magalhães, 2006 p. 54). A visita domiciliar é um instrumento capaz de aproximar o Serviço Social das famílias, das crianças e dos adolescentes, assim, identificando os problemas enfrentados pelas mesmas por meio da entrevista e da observação. A visita domiciliar é um importante instrumento na perspectiva do respeito ao usuário para que em seu próprio espaço possa se expressar. “Assim, possibilitando conhecer melhor este sujeito, seu percurso, suas conquistas e dificuldades, e as respostas que elabora diante das suas vivências, é uma prática relevante no Serviço Social” (Silva, 2000, p. 30). Pode-se utilizar da visita domiciliar toda vez que se entenda indispensável aprofundar a situação familiar e domiciliar do usuário com o objetivo de ter maiores informações para a busca dos objetivos profissionais. Este instrumental durante o processo interventivo se dá na busca dos objetivos definidos para assim constatar a verdadeira realidade do sujeito. A meta do profissional ao visitar, orientando pelo pensamento complexo, é explorar a realidade para melhor questioná-la e aproximar-se da verdade que ela esconde. Esta visita oferece ao profissional um maior número de possibilidades por entrar verdadeiramente na vida do usuário como um observador participante. É utilizada dependendo de cada usuário e situação. (Giongo, 2003, p. 38). O profissional possui sua formação e sua concepção ética e política as quais norteiam o seu agir no dia a dia e permite ter o contato com a vida do sujeito no âmbito do lar para contribuir na garantia de seus direitos e na melhoria de suas condições de vida na família e na sociedade. A entrevista vem sempre junto da observação. 21 1.3.3. Entrevista A entrevista serve de base para se ter mais conhecimento da realidade, buscar informações mais profundas sobre o objeto; é utilizada quando não se dispõe de informações suficientes da realidade do usuário. No caso do Serviço Social, segundo Giongo (2003, p.14), a “entrevista é o principal veículo de trocas e conhecimento no relacionamento entre usuário e assistente social”. As entrevistas realizadas com os profissionais e usuários é que buscarão apreender as reflexões que a pesquisa exige decorrentes da espontaneidade dos entrevistados durante o processo de investigação. A entrevista é um dos meios que garante a aproximação entre assistente social e usuário, possibilitando um processo dialético de construção e desconstrução do problema. Daí dizer que a entrevista não é um mero jogo de ‘pingue-pongue’, como um questionário de perguntas e respostas que inibem e empobrecem uma relação que se quer rica e competente. A entrevista precisa ir além de um mero ‘bate-papo’, ou de uma conversa informal entre duas ou mais pessoas sem traçarem objetivos definidos. Ainda que ocorram busca de dados durante a entrevista, ela não se reduz a isso. (Giongo 2003, p.13) A entrevista é um espaço de escuta na qual o profissional utiliza toda sua habilidade, estratégias, conhecimento e experiência para compreender a realidade do usuário, “possibilitando a obtenção de dados referentes aos mais diversos aspectos da vida social” (Gil, 1999 p.118). A entrevista é um espaço para descobertas de novos problemas e soluções, por isso foi realizada através de questionários para facilitar a busca de maiores informações com as crianças e adolescentes do Espaço Social “Sonho Meu”. A entrevista foi focada para saber o que poderia ser melhorado nas atividades e no próprio Espaço Social. Segundo Gil (1999, p. 124), “o questionário é a técnica de intervenção composta por um número mais ou menos elevado de questões apresentadas por escrito às pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões, crenças, sentimentos, interesses, expectativas, situações vivenciadas.” 22 [...] o questionário é a forma mais usada para coletar dados, pois possibilita medir com uma melhor exatidão o que se deseja. Em geral a palavra questionário refere-se a um meio de obter respostas às questões que o próprio informante preenche, contendo um conjunto de questões, todas logicamente relacionadas com um problema central. (Cervo e Bervian. 2006 p. 15) Nesse caso, um questionário precisa também ser bem elaborado e sempre ocorrer após observações sistemáticas para que seja bem aproveitado tanto o tempo dos pesquisadores e dos pesquisados, quanto a coleta de informações adequadas. No caso presente, aplicou-se o mesmo com as famílias do projeto “Sonho Meu” no município de Ji-Paraná/RO. 1.4. Pesquisa bibliográfica e documental A pesquisa bibliográfica é imprescindível num trabalho, pois serve para embasar as conclusões obtidas através da observação no campo de estágio, bem como a pesquisa documental serve para traçar e nortear as ações com dados mais pertinentes à pesquisa. Essa documentação se dá de forma indireta a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental (Maia, 2007, p. 84). A pesquisa bibliográfica foi fundamental para a construção deste trabalho, pois as leituras permitiram a busca do conhecimento aprofundado sobre o assunto abordado, incentivando o acadêmico à produção do seu próprio conhecimento. O uso de documentos em pesquisa é muito valorizado, a riqueza de informações que deles se pode extrair possibilita ampliar o entendimento de objetos. Portanto, em determinados momentos se faz preciso registrar os acontecimentos que ocorrem de acordo com as particularidades e as ações dos indivíduos com o dinamismo que os atores sociais possuem no seu espaço social. O autor Richardson (1999) salienta que durante o registro de tais acontecimentos ocorre uma relação direta com o evento, o que caracteriza as fontes documentais como experiências concretas de um acontecimento que 23 podem estar marcadas em material escrito tal como transcrições oficiais de uma reunião, análises de quadros, gráficos entre outros. Portanto, a pesquisa documental em determinadas circunstâncias faz-se pertinente como o objeto de investigação na procura de apreender por intermédio dos registros dos acontecimentos que ocorrem de acordo com as particularidades e as ações dos indivíduos com o dinamismo que os atores sociais possuem no seu espaço social. Assim, durante a pesquisa sobre a temática da Criança e Adolescente referente ao Espaço Social “Sonho Meu”, a pesquisa documental foi de extremo valor, uma vez que propiciou o contato com fontes de registros que caracterizam a complexidade da questão. 1.5. Método de Análise 1.5.1 Dialético Empregou-se como linha de raciocínio a dialética para uma apreensão da totalidade quanto ao objeto. O método de análise permite captar a síntese e a essência dos fenômenos econômicos e sociais por ser um método de interpretação dinâmico, vendo a vida social enquanto realidade em permanente transformação e permitindo observar as contradições presentes na sociedade com uma visão ampla. Com base em Marx (1859), podemos compreender que a dialética tem como condição prévia e efetiva o começo pelo real e peloconcreto. Parte das observações para sínteses mais complexas. O concreto é parte da síntese de múltiplas determinações, sendo também unidade de diversidade. Desse modo, os processos de caráter histórico econômico e material se elevam do mais simples ao mais complexo correspondendo ao processo social inteiramente ligado as relações de forças presentes no modo de produção econômico. 24 A dialética preza as contradições e as estruturas que interagem desenvolvendo novas contradições e a visão de conjunto sendo sempre provisória, procurando analisar as dimensões da realidade em constante mudança tornando compreensível a estrutura e as transformações sociais. De acordo com Konder (2004, p.36), “dialeticamente qualquer objeto que o homem possa perceber ou criar é parte de um todo onde se pensa as partes contendo as contradições que está por natureza inseparavelmente ligada à totalidade.” Na qual a apreensão da realidade social a partir de análises críticas se dá na procura da compreensão e de interpretações à luz de uma teoria. Neste caso, possui a intencionalidade de ultrapassar a aparência do objeto em estudo, do seu conteúdo simplificado e buscar a realidade com a complexidade. Segundo Gil (1989, p. 32), [...] “fica claro também que a dialética é contrária a todo conhecimento rígido. Tudo é visto em constantes mudanças, sempre há algo que nasce e desenvolve, e algo que se desagrega e se transforma.” Na qual ocorre uma contradição e uma transformação, isto quer dizer que tudo existe em constante mudança, o fazer e o refazer estão em evidências. A sociedade também passa por constante transformação e desenvolvimento o que é preciso adaptar-se e acessar às necessárias ferramentas para o enfrentamento de tais mudanças. A dialética conduz o pesquisador caminhar em um processo contínuo de buscas e questionamentos a respeito da temática em discussão, o que permite a melhora e o aprofundamento da construção do conhecimento, contribuindo para o entendimento melhor da questão do processo socioeducativo de qualidade com as crianças e adolescentes participantes do Espaço Social “Sonho Meu” no município de Ji-Paraná/RO. A dialética para Demo (1987, p.85) “é a mais correta para as ciências sociais, porque é aquela que, sem deixar de ser lógica, demonstra sensibilidade 25 pela face social dos problemas.” O método dialético permite uma interpretação crítica da realidade, contribui e compreende o fenômeno em sua totalidade. Optou-se então pelo método de análise dialético porque ele permitiu averiguar as contradições que envolvem a problemática e direcionou melhor a compreensão da relação de conflitos vivenciados pelas crianças e adolescentes no Espaço Social “Sonho Meu”. 26 CAPITULO II DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO DECORRER DA HISTÓRIA 2.1. Considerações iniciais a cerca da Infância A questão da história em relação as crianças e adolescentes, está inserida na realidade social de uma forma ampla. Essa história pode ser entendida em seu movimento. Áries (1981) considera as diferentes formas de existência de uma associação historicamente complexa, em relação às crianças, a família e a sociedade, nas quais os comportamentos sociais foram ao longo do tempo envolvidos e moldados por diversas instituições sociais e por níveis contraditórios que englobam desde agressões, doutrinamentos e instâncias de afeto. Conforme aponta Rizzini; No decorrer do tempo, a infância foi tratada de diversas maneiras. As relações sociais com a família, com a igreja, com o Estado e com outros estamentos da sociedade perpetuavam valores morais, religiosos e culturais reproduzindo dominadores e subjugados em seus papéis. (2009, p.15) As crianças e adolescentes estiveram à margem da sociedade capitalista sendo encaixadas nas relações sociais, sendo reprimidas, vítimas de exploração, crueldade e tratadas com indiferença pela sociedade. Esta pesquisa traz uma visão com base nos pensamentos sobre a infância em um período medieval e moderno, logo no final do século XIII, quando o que se entende primeiramente é uma grande falta de sentimento com a infância, principalmente pela família, e o que chama mais atenção neste período é o desconhecimento e a ausência de uma verdadeira infância, sendo a criança o principal instrumento das expressões da questão social. Período este conhecido pelos pesquisadores de Idade Média em países como a França e Inglaterra, que abre portas para uma interpretação das chamadas sociedades tradicionais ocidentais. (Ariés, 1981). 27 a criança sempre foi reservada uma condição de incapaz, por não ser reconhecida como um indivíduo ou um sujeito. Neste sentido, por um longo período da história, a criança restou sem nenhum – ou muito pouco – valor, notadamente a pobre. Nasciam e, por suas naturais condições de fraqueza e dependência, morriam em grandes proporções, vítimas da fome, das doenças, da opressão, da exploração, da violência, da negligência [...] (dos adultos). (Karst. 2002, p. 9) Pode-se dizer que, recorrendo aos autores, percebe-se que a história da infância da criança e do adolescente foi tortuosa, sendo esses os alvos principais dos problemas sociais. Compreende-se que a vida da criança até a fase da juventude não passou por um desenvolvimento saudável, sem serem asseguradas por qualquer tipo de direito, essas tiveram sua infância impedida e completamente marcada pelo trabalho precoce na procura de garantir meios a sua sobrevivência e de sua família. Sendo essas privadas até mesmo de afeto, amor, carinho e direitos essenciais na vida e no crescimento de uma criança. A pobreza é destituição e desproteção. Destituição dos meios de sobrevivência física, marginalização no usufruto dos benefícios do desenvolvimento econômico e no acesso às oportunidades de emprego, consumo e desproteção por falta de amparo público na garantia dos direitos básicos de cidadania. Ser pobre significa consumir todas as energias disponíveis exclusivamente na luta contra a morte e sobreviver por um triz. (Abranches, 1987, in Abreu, 2001, p.45). Sem poder construir seu próprio contexto histórico, as crianças não eram vistas como um ser indefeso e frágil, sujeito de direito e valor, que precisava de um espaço diferenciado na sociedade, mas sim como adultos que eram obrigados a vender sua mão-de-obra para o mercado de trabalho de maneira precoce e em condições desumanas, para ajudar no complemento da renda familiar. Sujeito insignificante com uma vida de desigualdades, sendo rejeitadas pela família e sociedade, servindo de objeto para o mundo dos adultos, foi assim a infância de inúmeras por um longo período do tempo. Percebe-se que por um período do século XIII existiu um sentimento aparente pela criança chamado de “paparicação”, que esta recebia durante os seus primeiros meses de existência. Por um momento, a criança teve atenção e alguma expressão de afeto, o que tornava sua ingenuidade, inocência e graciosidade objeto de diversão para os adultos. Quando alguma criança chegava a falecer, devido às condições precárias de sobrevivência, havia de imediato um 28 sentimento de substituição, logo outra criança nasceria e a substituiria (Ariés, 1981). “Era extremamente alto o índice de mortalidade infantil que atingia as populações e, por isso, a morte das crianças era considerada natural [...]” (Kramer, 1992, p. 37). Era uma espécie de sentimento obscuro frente à infância. Esse contexto faz compreender a posição secundária da infância para a sociedade, condição que perdurou ainda por vários séculos. Vale ressaltar que nesse contexto da Idade Média, a infância terminava para a criança ao ser desmamada, o que acontecia por volta dos seis a sete anos de idade.A partir dessa idade, ela passava a conviver como um adulto, o que nascia era denominado infant (criança), aquilo que não fala (Ariès 1981). De criancinha pequena, ela se transforma imediatamente em homem jovem, sem passar pelas etapas da juventude, que talvez fossem praticadas antes da Idade Média e que se tornaram aspectos essenciais das sociedades evoluídas de hoje. (Ariés, 1981, p. 10) A concepção de criança situava-se como seres sem personalidade, algo desprovido de cuidados especiais. A criança estava inserida no mesmo contexto que os adultos, a educação das crianças era garantida pela aprendizagem junto aos adultos, a partir dos sete anos as crianças eram transferidas para o convívio social com outra família, cortando os vínculos afetivos de origem. (Áries 1981). Segundo (Steinberg e Kincheloe, 2001, p. 11), atestam sobre o conceito de infância como uma classificação específica de seres humanos, necessitadas de um tratamento especial, diferente daquele fornecido aos adultos, ainda não havia sido desenvolvido na Idade Média. Nesse sentido, ressalta-se que as crianças saíam muito rápido da presença da família ocasionando a perda do sentimento afetivo entre pais e filhos. A família se enquadrava como realidade moral e social, mais que sentimental. Para Costa (1989, p.155), “entre o adulto e a criança as ligações existentes eram da propriedade e da religião, não dando lugar a afetividade paternal ou familiar”. 29 As crianças não possuíam caracterizações pessoais, o que havia era o uso de imagens de crianças aparentando homens em miniatura. A infância da Criança nesta época foi limitada aos santos, Jesus, Maria, depois aos discípulos etc. De acordo com Ariés (1981, p.55), “salientamos aqui apenas o fato de que a criança se tornou uma das personagens mais freqüentes dessas pinturas anedóticas [...]”. Foram surgindo temas diversos sobre a infância que contribuíram para a descoberta desta na sociedade e na arte do século XV e XVI. A criança se torna um instrumento da arte para os adultos, “mas nunca um modelo de um retrato de uma criança real” (Ariès, 1981, p.56), e sim apenas um ser desconhecido pela sociedade adulta, que estaria se encaixando conforme era util. Entretanto de acordo com Ariés (1981 p.58), “o aparecimento do retrato da criança morta no século XVI marcou um momento importante na história dos sentimentos”. Em função disso, o advento do fim da Idade Média nos séculos XVI e XVII, a criança conseguiu conquistar um lugar junto à família. A criança retorna a conviver no lar com os pais, sendo este um elemento indispensável da vida quotidiana, sendo que os adultos passaram a se preocupar com sua educação e seu futuro, tornando-se peça fundamental na família. Isto contribuiu para que no período moderno no início do século XVII, na França, tivesse o início das mudanças na mentalidade e na maneira da família se relacionar, retomando os vínculos de afetividade que trouxeram um sentimento de dó pelo ser infantil, passando a perceber a criança real e a utilizarem um sentimento real quanto a este ser na sociedade. (Ariés, 1981). A partir dessa reflexão, pode-se dizer que a infância na França contemporânea foi um período construído por um pensamento do imaginário artístico e religioso no período que se compreende do século XIII e se estende até o século XVII. Esse período foi um período desumano, pois não houve um sentimento de infância foi um tempo de homens jovens. (Ariés, 1981). 30 Esses acontecimentos impulsionaram os primeiros passos de uma sociedade que estaria caminhado para se tornar tutora de uma criança que agora era percebida como frágil e real. Percebe-se que a própria arte que elevou uma infância mística traz no decorrer dos séculos uma visão da infância real para as sociedades, trazendo uma nova percepção de infância. Teóricos e estudiosos passam a separar esta criança em primeiro da vida adulta e depois da vida adolescente, até que esta passasse a ter seu próprio lugar (Ariés, 1981). O estudo histórico de Ariés (1981) destacou que, durante parte da Idade Média, as crianças eram consideradas como meros seres biológicos, sem estatuto social nem autonomia. Sabe-se também que a ideia contemporânea de infância, como categoria social, surge com a Modernidade e tem como principal berço a escola e a família. Sarmento (2001, p. 4) “reitera que, junto com a emergência da escola de massas, a nuclearização da família é a constituição de um corpo de saberes sobre a criança”. A modernidade elaborou um conjunto de procedimentos configuradores de uma administração simbólica da infância. Sarmento (2003) refere-se às normas que coagiram a vida das crianças na sociedade, exemplos como: delimitação dos lugares frequentados pela criança, cuidados com alimentação, horas da participação da criança junto com os adultos e, finalmente, algumas delimitações de uma vida normal de criança. A infância partindo desta visão é um processo de construção social que parte de uma família que também foi se moldando com o decorrer da história, juntamente com toda sociedade que vai do fim da Idade Média ao início da Idade Moderna (Ariés, 1981). Nesta moldagem, além da família, a sociedade e inúmeros elementos que a compõe são mudados por conta de uma adequação destes termos, tais como educação, comportamento afetivo, escola, arte, trabalho, elementos da família como pai, mãe e a própria igreja em sua aplicação da educação religiosa tornando assim possível a mudança que daria origem à infância moderna (Costa, 1989). Concepções sobre a infância variam historicamente e as crianças estão em contínua mudança. 31 Compreende-se uma realidade em constante transformação construções decorrentes de mudanças socioculturais regidas por visões de mundo distintas. E Conforme pontua Ariès (1981), ressaltando em seus estudos que os costumes morais dos grupos sociais e a maneira de viver são expressos nas relações de poder em infinitos espaços do cotidiano de acordo com a ótica político-econômica, cultural e social. A infância é parte da sociedade, melhor dizendo, é uma contribuição imensa para a mudança da sociedade. Pode-se compreender com base em Pinto e Sarmento; Que olhar das crianças permite revelar fenômenos sociais que o olhar dos adultos deixa na penumbra ou obscurece totalmente. Assim, interpretar as representações sociais das crianças pode ser não apenas um meio de acesso à infância como categoria social, mas as próprias estruturas e dinâmicas sociais que são desocultadas no discurso (1997, p.25). Esta afirmação é contraditória ao analisar o contexto histórico da infância das crianças. Percebendo que as crianças não eram apenas rejeitadas, mas sim exploradas pela sociedade. A atenção e dedicação dada à infância foram mínimas, ainda assim as crianças eram entendidas como responsáveis pela sua infância, na qual somente a única era o objeto de negligência, fazendo parte de uma sociedade como apenas um complemento para o mundo dos adultos e não como um ser que constrói sua própria história e contribui muito para a sociedade. Com o advento da República (final do séc. XIX e início do séc. XX), a instituição da Escola Pública inicia no Brasil uma mudança de visão da sociedade sobre a infância. A responsabilidade sobre esses pequenos sujeitos que era somente da família, também passa a ser dever do Estado, o Estado assume essa atenção apenas para uma parte da sociedade, a classe média e rica. Aqueles que eram pobres não possuíam a mesma atenção que as crianças da elite, neste contexto, o ser pobre era aquele merecedor de piedade. Este contexto social incluía e ao mesmo tempo excluía crianças e adolescentes cidadãos de direitos (Áries 1981), deixando claro que a concepção da vida infantil não existia era um tempo caracterizado na vida adulta, isso só vem mudarem meados do século XX. 32 2.2 A História da Infância no Brasil A história da infância no Brasil não é menos traumática do que a de outros países, ela está repleta de preconceito, de exploração e de abandono, pois, desde o início houve diferenciação entre as crianças segundo sua classe social, com direitos e lugares diversos no tecido social. “A desigualdade social assume, entre nós, múltiplas expressões, quer se refiram à distribuição de terra, de renda, do conhecimento, do saber e, mesmo, ao exercício da própria cidadania” (Fontes, 2001 p. 30). A forma como estas concepções modernas de sujeito atingem setores diferenciados da sociedade, no entanto, não é homogênea. Visando discutir a questão do sujeito na infância como um projeto da modernidade, destaca-se sobre concepções de infância e direitos conquistados no decorrer da história no Brasil em diversos momentos. A problemática da infância e adolescência enquanto alvos das desigualdades não é novidade, nem menos dramática do que no início do século. Surge daí a importância deste trabalho, visto que, analisando o passado, pode-se readquirir parte da história com proveito de repensar as práticas institucionais, principalmente aquelas referentes às práticas e discursos sobre a infância, estendendo da década de 1923 a 1970. Com base em (Rizzini, 1995), a partir de 1923 houve um aumento no volume de leis que procuravam cobrir mais amplamente os pontos relativos à assistência à infância. É Criado no Brasil o Juizado de Menores, Mello Mattos foi o primeiro juiz de Menores da América Latina. Aqui começa uma reorganização do Poder Judiciário iniciando um debate de quem seria atribuição da administração do “problema do menor”. De sujeito abandonado, passa-se a perceber a criança sem assistência familiar como menor infrator e do tratamento caridoso dado pela igreja e posteriormente tutelar pelo Estado, passa-se cada vez mais a vê-las como seres tortos a serem reformados por instituições judiciárias. 33 Este foi o primeiro decreto-lei brasileiro específico sobre a infância abandonada e delinquente, dado que, anteriormente, as deliberações a esse respeito restringiam-se a artigos do Código Penal, não havendo leis específicas. Desenvolveu-se sob a compreensão de que se deveria atribuir aos infratores menores de 18 anos medidas educativas, diferenciadas da pena aplicada ao adulto, como castigo. Essas medidas deveriam ser impostas por juízes especiais e não por juízes criminais (Rizzini, 1995). Em 1924 é criado o primeiro juizado de menores do Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, graças as incansáveis lutas em favor da criança desvalida, pelo jurista e legislador Mello Mattos. A criação deste juízo privativo de menores se deu através do Decreto n°. 16.272, de 20 de deze mbro de 1923. (Veronese, 1999, p.23) Esse juizado tinha como função a promoção, solicitação, acompanhamento e orientação em todas as ações judiciais que envolvessem interesses de menores, sobretudo, os que se encontravam internados nos institutos do Governo Federal e nos particulares subvencionais pelo Estado. Percebe-se que apesar da criança e do adolescente não serem mais entendidas dentro dos artigos penais, ainda eram postos como culpados pela sua situação e vistos como pessoas que ofereciam risco à sociedade. O problema era do menor e não do contexto em que a sociedade se encontrava. Em função disso, pode-se compreender, com base em Rizzini (1995), é instituído o Código de Menores, em 1927, também conhecido como Código Mello Matos, pautando-se na Doutrina da Situação Irregular, na qual os menores tornavam-se sujeitos de direito apenas no momento em que se encontrassem em estado prejudicial à sociedade. A intenção desse Código era “resolver” o problema dos menores, embora fosse marcante a vigilância sobre eles. Assim, embora os menores de 14 anos estivessem imunes a qualquer tipo de processo penal, sua vida e de sua família seriam devassadas conforme fosse julgado necessário. Uma questão importante a observar nesse Código é o dispositivo que tratava da internação de menores abandonados, pervertidos ou que estivessem “em perigo de o ser”. 34 Rizzini (1995, p. 131) destaca que “bastaria qualquer desconfiança ou suspeitas de alguma autoridade para que o menor fosse privado de sua liberdade”. O problema das crianças e adolescentes era resolvido de forma imediata, melhor dizendo, era abafado, sem levar em conta seu contexto histórico, não era dado nenhum tipo de voto de confiança para que esses pudessem se tornar pessoas melhores e confiáveis. O Código de Menores brasileiro era representativo das visões em vigor na Europa com elaboradas práticas discriminatórias que desconsiderou as condições econômicas como fatores importantes na condição de exclusão. Para supostamente resolver os maus da delinquência, do abandono e da desocupação, esta doutrina apresentava propostas focalizadas nas consequências dos problemas sociais, isolando totalmente a condição de exploração econômica. O código Mello Matos inaugurou um modelo de assistência pública herdado da ação policial, com funções relativas à vigilância, regulamentação e intervenção diretas sobre os menores abandonados e delinquentes, primando pela sua institucionalização, sistema este que vigorou até meados da década de 1980 no país (Rizzini, 2004, p. 224). Com essa lei em vigor, designou-se o termo "menor", mas não com o entusiasmo de indicar aqueles que tinham idades inferiores, mas sim para distinguir todos aqueles que viviam em extrema pobreza consequente da vulnerabilidade social, as qual estavam submetidos pela má distribuição de renda atribuída pelo capital. Custódio (2007) destaca que a partir desta doutrina são criadas as Delegacias de Menores em 1930. Menor não é apenas aquele indivíduo que tem idade inferior a 18 ou 21 anos conforme mandava a legislação em diferentes épocas. Menor é aquele que, proveniente de família desorganizada, onde imperam os maus costumes, a prostituição, a vadiagem, a frouxidão moral, e mais uma infinidade de características negativas, tem a sua conduta marcada pela amoralidade e pela falta de decoro, sua linguagem é de baixo calão, sua aparência é descuidada, tem muitas doenças e pouca instrução, trabalha nas ruas para sobreviver e anda em bandos com companhias suspeitas. (Rizzini, 1993, p.96). A autora traz que não deve referir-se ao menor e a criança com indiferença sem analisar com um olhar crítico todo seu contexto histórico, levando em conta a infância excludente e discriminadora que vivenciaram. 35 Em função disso, “percebe-se um aumento na utilização de termos psiquiátricos e uma maior preocupação com a saúde mental”. (Rizzini, 1993. p. 87). O SAM (Serviço de Assistência ao Menor), criado em 1941, guiava-se por tais preceitos na tentativa de uma elaboração teórica sobre o "problema da criança" e a "ação social do Juízo de Menores", nos vários instrumentos do Juízo de investigação do Menor, era priorizado o levantamento dos seus antecedentes morais e de sua família (Rizzini, 1993) Por trás da idéia do SAM estão presentes representações amplamente aceitas e discutidas: a imagem da criança pobre enquanto abandonado física e moralmente; uma concepção de infância enquanto uma idade que exige cuidados e proteção específicos; as grandes cidades como lócus de vadiagem, criminalidade e mendicância; os espaços públicos (ruas, praças, etc.) como espaços da socialização da marginalidade. Por fim, a idéia de que cabe a instituições especializadas a "recuperação" e a formação de uma infância “moralizada". Recuperando a "infância desvalida", o Estado contribuiria para a formação de indivíduos úteis à sociedade, futuros bons trabalhadores. (Alvin e Valladares, 1988, p.08) A partir dessa reflexão, pode-se dizer que começa a se terum novo olhar em relação à problemática da infância, cujos objetivos começam a ser a orientação, sistematização e fiscalização dos estabelecimentos oficiais e particulares para menores internados, quando a assistência pública à infância toma novos rumos. Aponta-se, então, a necessidade de desconstrução destas práticas e deste “olhar” sobre a infância objeto da assistência, indispensável à reflexão e ao enfrentamento desta problemática. Observa-se que as preocupações relacionadas à infância trazem um progresso para a busca de uma nova sociedade, a condição da criança vai se redefinindo e passa de um papel secundário e rejeitado para uma condição principal. A partir da criação do SAM, com as mesmas ideias de fundo visando ao controle social, surgem diversas instituições públicas privadas que se voltam para o atendimento às crianças e jovens das camadas populares, porém privilegiando diferentes formas de atuação. Incluem-se aqui a LBA (Legião Brasileira de Assistência), SESI (Serviço Social da Indústria), SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), SENAC (Serviço Nacional de Aprendizado Comercial), 36 SESC (Serviço Social do Comércio) - reformar e educar para o trabalho eram objetivos de tais instituições. Vale ressaltar que em 1942 é criada a LBA que tem por objetivo promover todas as formas de serviços de assistência social, prestados diretamente ou em colaboração com o poder público e as instituições privadas, principalmente à maternidade e a infância. A LBA consolidou sua posição entre as obras assistenciais brasileiras durante vinte anos. A partir da sua atuação surgem centros de proteção à criança e à mãe (creches, postos de puericultura, hospitais infantis e maternidades) (Kramer, 1992). É instalado no Brasil também o primeiro escritório do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) em 1950, em João Pessoa, na Paraíba. O primeiro projeto realizado no Brasil destinou-se às iniciativas de proteção à saúde da criança e da gestante em alguns estados do nordeste do país (UNICEF 1946). O UNICEF tem como objetivo promover a defesa dos direitos das crianças, ajudar a dar resposta as suas necessidades básicas e contribuir para o seu pleno desenvolvimento. Com as inúmeras acusações ao SAM enquanto "escola do crime", a partir de meados de 1960, formula-se uma política nacional de atendimento e com ela a criação da Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM) que em termos federais, estaduais e as FEBEMS (Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor) tinham como base a "reeducação do menor, não pautada exclusivamente na internação, mas no apoio à família e à comunidade" (Alvin, e Valladares 1988, p. 09). A partir da revisão do Código de Menores, Militto e Silva (1995), citam algumas das categorias criadas em 1970 que implicariam na internação do menor, tais como: situação irregular; família desestruturada; criança abandonada sem família (burguesa); criança carente, menor infrator, deficientes físicos e mentais e menor "perambulante" (sem ofício, expulso da escola, fugitivo do lar). Os autores chamam atenção para o fato que essa categorização, que era feita inicialmente por assistentes sociais e depois por equipe multidisciplinar da 37 própria FUNABEM, implicariam "necessariamente o enquadramento da pobreza". (Militto e Silva 1995, p. 21). O internamento ainda era visto como o meio propício à reeducação, reestruturação e ressocialização dessa infância desassistida. (Militto e Silva, 1995). Na prática de tais instituições não ocorreram mudanças significativas nas concepções da infância pobre, mas essas continuavam sendo objetos de reforma e exploração e continuaram as denúncias de maus tratos a crianças e adolescentes em tais instituições. O sistema de Garantia de Direitos é uma conquista recente e que ainda carece de maior proteção, efetividade e qualidade no Brasil. 2.3 História e Direitos da criança na atualidade Pode-se perceber que, numa perspectiva histórica de milhares de anos, em que predominou o total desconhecimento da criança e uma série de dificuldades, ela tem conseguido se firmar. Hoje, o estudo do desenvolvimento da criança é necessário e indispensável para quem deseja falar sobre essa fase da vida humana. Estuda-se a criança e a infância como categorias construídas historicamente, o que abre possibilidades de compreendê-las de modo visível, na sua expressão de vida e perceber que a infância e a vida da criança não se deram de forma linear. Figueiredo afirma; É preciso contar a história de uma vida sem dar a impressão de se estar diante de uma sucessão linear, unidirecional e necessária de momentos, cada um deles sendo tomado como um simples e plenamente significativo "agora". É preciso garantir nesta história lugares para acasos e imprevisíveis, lugares para rupturas, lugares para saltos adiante, para retornos e ressignificações; é preciso evitar a tentação de fazer da existência de alguém um processo meramente aditivo ou subtrativo de atributos que se agregariam ou descartariam de uma substância permanente. (1995, p. 9) As contribuições discutidas permitem olhar a infância hoje empreendendo um esforço para percebê-la na sua concretude, no seu contexto vivido, entendendo-a como sujeito de direitos, direito de se expressar, manifestar 38 vontades, interagir em diferentes espaços e culturas, construir a sua história em constante transformação. Sanches (2004) destaca que o desenvolvimento de uma cultura em que a visão de criança adquire novos significados, sendo considerada cidadã de direitos, deixando de ser apenas propriedade da família, mas também componente da nação, de responsabilidade de todos, cria condições para emergência de novas posturas em relação a esta etapa de vida humana. No entanto vão sendo criadas políticas sociais como estratégias para atender às necessidades desse segmento da população, especialmente a que vive em extrema pobreza ou desamparada, e traz implícita a concepção de soluções imediatas. Para Vieira; O que na atualidade tem sido chamado de políticas sociais (e comumente de políticas públicas) resume-se quase sempre em programas tópicos, dirigidos a determinados focos, descontínuos, fragmentados, incompletos e seletivos, com atuação dispersa, sem planejamento, esbanjando esforços e recursos oferecidos pelo Estado, sem controle da sociedade”. (2004; p.113) A sociedade implora por políticas que sejam verdadeiramente universais e não cada vez mais burocráticas, que possam realmente beneficiar toda a população para quem ela é voltada. E não uma política dimensionada apenas para parte desse segmento da sociedade, selecionando classe social e econômica, mas sim políticas igualitárias que verdadeiramente alcancem todas suas dimensões de forma efetiva. Podendo assim promover uma presente e futura infância e juventude saudáveis. Não existe algo como a criança ou a infância, um ser e um estado essencial esperando para ser descoberto, definido e entendido, de forma que possamos dizer a nós mesmos e aos outros, [...] “Em vez disso, há muitas crianças e muitas infâncias, cada uma construída por nossos entendimentos da infância e do que as crianças são e devem ser. (Dahlberg; Moss; Pence, 2003, p. 63) As diferentes concepções de criança e de adolescente são deste modo construídas a partir de visões distintas. Os saberes vêm sendo produzidos a partir de discursos dominantes localizados nos limites do projeto da modernidade, 39 incorporados muitas vezes sem críticas. É importante saber mais sobre essa parte da população para poder compreendê-la de modo contextualizado. Uma importante conquista para a criança e o adolescente ocorreu na década de 80 quando foi inaugurada uma nova visão da sociedade em relação à infância e juventude. A sociedade civil mobilizou-separa amparar, auxiliar e cobrar do Estado à responsabilidade por essa parte da população que não pode ser negligenciada em virtude do modelo econômico adotado no país. Isto deu abertura para a promulgação, em 1988, da Constituição Federal – (CF) (Rizzini (1995). A legislação foi implementada para reafirmar à criança o princípio da dignidade da pessoa humana na busca de garantir com prioridade os direitos fundamentais da criança e do adolescente para que não haja o descumprimento ou falhas na efetivação desses direitos, sendo assim, reconhecidos como sujeitos de direitos a serem protegidos e garantidos pelo Estado, pela sociedade e pela família com prioridade absoluta. Após um longo e árduo caminho, em 1988 l o Estado brasileiro reconhece a criança e o adolescente como pessoas de direitos, afirmando a necessidade de se garantir a toda criança e adolescente proteção integral para o seu pleno desenvolvimento. Expressa esse reconhecimento, no Art. 227; É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Brasil, 2010. p.116) O artigo constitucional vem reafirmar o princípio da dignidade da pessoa humana, repetindo o Artigo primeiro da Carta que o traz como um dos fundamentos do Estado brasileiro. O referido princípio é, antes, fundamento basilar do Estado de Direito e não se realizará se não for garantido com primazia à criança e ao adolescente. 40 O princípio da dignidade não pode ser negligenciado e deve ser garantido com prioridade à criança e ao adolescente e o seu exercício revela a satisfação da proteção integral para qual é voltado. Deixando claro a amplitude e plena eficácia em seu cumprimento. Qualquer omissão ou falha desses direitos, quando implementados, revela o descumprimento de direitos fundamentais. E cabe ao Estado Democrático de Direito a tarefa primordial de atuar na promoção da dignidade da pessoa humana, sua razão de ser. Sobre o princípio da dignidade da pessoa humana Wolfang; Como tarefa (prestação) imposta ao Estado, a dignidade da pessoa reclama que este guie as suas ações tanto no sentido de preservar a dignidade existente, quanto objetivando a promoção da dignidade, especialmente criando condições que possibilitem o pleno exercício e fruição da dignidade, sendo, portanto dependente (a dignidade) da ordem comunitária, já que é de se perquirir até que ponto é possível ao indivíduo realizar, ele próprio, parcial ou totalmente, suas necessidades existenciais básicas ou se necessita, para tanto, do concurso do estado ou da comunidade (este seria, portanto, o elemento mutável da dignidade) (2004, p. 65). É importante ressaltar que quando se trata do assunto relacionado à criança e ao adolescente não se deve considerar apenas a sua condição especial de pessoa em desenvolvimento, mas também o que está agregado a sua volta e que muitas vezes é o que vulnerabiliza grande número de famílias brasileiras e que lhes são individualmente prejudiciais. O reconhecimento constitucional da criança e do adolescente como sujeitos de direitos, a serem protegidos e garantidos pelo Estado, pela sociedade e pela família com prioridade absoluta, implica, não apenas na sua consagração como direitos fundamentais, direitos humanos, mas sim a prioridade de sua garantia, como sujeitos de valor e dignidade, tendo como condição absoluta o respeito as suas necessidades enquanto pessoas em desenvolvimento. Vale ressaltar que o Estado, a sociedade e a família são as três esferas principais de quem exige uma ação por completo e não uma ação secundária ou apenas de complemento. Essas três esferas precisam atuar essencialmente juntas para que se consiga com efetividade a garantia dos direitos. 41 No respeito ao princípio da prioridade absoluta à garantia dos direitos da criança e do adolescente, o Estado deve se responsabilizar por oferecer serviços adequados e suficientes à prevenção e superação das situações de violação de direitos, possibilitando o fortalecimento dos vínculos familiares e sócio-comunitários, o apoio às famílias e seus membros deve ser concretizado na articulação eficiente da rede de atendimento das diferentes políticas públicas, garantindo o acesso a serviços de educação, de saúde, de geração de trabalho e renda, de cultura, de esporte, de assistência social, dentre outros. (PNAS, 2004, p.69) As políticas sociais precisam ser de boa qualidade e destinadas sem distinção a toda população e não serem privatizadas e nem de melhor qualidade para quem pode pagar, na qual o que sobra para as classes mais baixas é uma política desigual e desumana. O dever do Estado é proporcionar políticas com nível de qualidade de igual para igual a todo cidadão que vier a necessitar da proteção estatal, independentemente do motivo, todo cidadão é digno de receber do Estado a satisfação de seus direitos sociais. A legislação dá abertura ao (Estatuto da Criança e do Adolescente) – (ECA ) criado em 1990, a Lei que revolucionou o Direito Infanto-Juvenil adotando a Doutrina da Proteção Integral com a intenção de regulamentar direitos previstos pela Constituição de 1988. Essa doutrina se baseia na ideia de que a criança e adolescente encontram-se em condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, necessitando, portanto, de proteção diferenciada, especializada e integral. Com a aprovação do ECA é abandonado o termo “menor” passando a definir todas as crianças como sujeito de direitos, com necessidades específicas, decorrentes de seu desenvolvimento peculiar, e que, por conta disso, deveriam receber uma política de atenção integral a seus direitos construídos social e historicamente. Aqui as crianças e os adolescentes passam a ser vistos como cidadão de direitos e deveres e voltam a ocupar o seu lugar de ser humano. (Rizzini, 2005). O Conselho Federal de Serviço Social - CFESS aponta: A proteção integral, explicitamente tratada no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é o paradigma que rege o sistema que, contrariando a anterior concepção menorista, assistencialista e tutelar, é inspirado em convenções e pactos internacionais e reconhece crianças e adolescentes como prioridade absoluta, sujeitos de direitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento (2009, p. 47). 42 Com base em Costa (1993), cria-se também no ano de 1990 A Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente, fundada com a finalidade de promover a defesa dos direitos e o exercício da cidadania da criança e do adolescente. Em 1992, cria-se o CONANDA - O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente - por lei federal. Uma importante atribuição deste órgão é a formulação de políticas públicas e o controle de recursos destinados ao cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente. Sua constituição se dá de forma paritária entre membros do governo e membros da sociedade civil organizada, o que dá abertura para ampliar a discussão relativa aos direitos da criança e do adolescente acontece a I Conferência Nacional dos Direitos da Criança. O CONANDA propôs a realização da primeira Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. As conferências passariam a acontecer a cada dois anos, de maneira sequencial, nos níveis regionais (no caso das metrópoles), municipais, estaduais e nacionais (Costa 1993). Com base em (Vannuchi, 2006), apresenta-se a seguir o Plano Presidente Amigo da Criança e do Adolescente, que prioriza o respeito à legislação expressa na Constituição Federal de 1988 e no Estatutoda Criança e do Adolescente - ECA. O plano apresentado observa ainda os acordos internacionais relativos à criança e ao adolescente ratificado pelo Brasil no Congresso Internacional sobre os Direitos da Criança de 1989 e, particularmente, na Seção Especial pela criança, realizada pela ONU em 2002, que estabeleceu no documento “Um Mundo para as Crianças” os seguintes compromissos: • Promover Vidas Saudáveis; • Promover Educação de Qualidade; • Proteção contra Abuso, Proteção e Violência e • Combate a HIV/AIDS. 43 O mesmo autor Vannuchi (2006) descreve que para garantir o cumprimento desses compromissos foram definidos 16 desafios que o Governo se propõe a enfrentar por meio de um conjunto de mais de 200 ações desenvolvidas por diversos Ministérios. A responsabilidade pela implementação do Plano foi de uma Comissão Internacional, coordenada pela Secretaria Especial de Direitos Humanos e composta por representantes dos seguintes órgãos: Ministério da Assistência Social; Ministério da cidade; Ministério da Educação; Ministério Extraordinário da Segurança Alimentar e Combate à Fome; Ministério da Integração Nacional; Ministério da Justiça; Ministério do Planejamento; Orçamento e Gestão; Ministério da Saúde; Ministério do Trabalho e Emprego; Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e Conselho Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente. Trata-se de um amplo esforço de articulação e integração intergovernamental entre as várias ações que afetam a qualidade de vida das crianças e dos adolescentes. A proposta orçamentária desse plano perfaz um montante de R$ 55,9 bilhões, distribuídos ao longo do período: 2004 e 2007. Assumido como uma das dimensões de um processo transparente e transformador rumo à construção de um futuro melhor para a nação. (Vannuchi, 2006). É importante ressaltar também que ocorreu em Brasília de 7 a 10/12/2009 a 8ª Conferência dos Direitos da Criança e do Adolescente cujo principal objetivo foi a elaboração de um Plano Decenal para as crianças e adolescentes brasileiros. O Plano Decenal é um documento que prevê as diretrizes da Política Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente para os próximos dez anos. Sua principal finalidade é orientar e cobrar do poder público na esfera federal a implementação de políticas que efetivamente garantam os direitos infanto-juvenis, assim como os planos estaduais devem orientar os governos estaduais e os planos municipais, as prefeituras. (CONANDA, 2009) Ao final de todas as Conferências de Direitos da Criança e do Adolescente são construídos planos de ação voltados para a promoção, defesa e garantia dos direitos de meninos e meninas até o período da conferência seguinte, que acontece após dois anos. A grande novidade da última edição é 44 que, pela primeira vez, o país está vivenciando um planejamento de políticas públicas para meninos e meninas em médio prazo através da formulação de um plano com ações previstas para os próximos dez anos. Na prática, isso significa que as ações previstas terão mais tempo para serem executadas pelo poder público e, consequentemente, poderão ter um caráter mais aprofundado. Outro aspecto importante é que o plano está além do planejamento de um governo, uma vez que o seu tempo de execução perpassa três mandatos de presidência. Assim, a proposta do plano é que ele tenha uma continuidade de políticas públicas, independentemente do partido político que estiver ocupando a cadeira da presidência. A Conferência reúne entidades não governamentais, órgãos públicos e a sociedade em geral em discussões e mobilizações sobre o Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes. Os resultados da 8ª Conferência Estadual subsidiarão a lX Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente que acontece em julho de 2012, em Brasília. As conferências estaduais passam a limpo necessidades na defesa dos direitos infanto-juvenis e a estrutura do Estado em atender a essas demandas, permitindo assim que sejam identificadas eventuais falhas na "rede de proteção" e a busca de soluções para a garantia dos direitos. Uma recente conquista importantíssima em termos nacionais para a criança e o adolescente é a campanha de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes que vem sendo realizada todo dia 18 de maio com o objetivo de sensibilização, panfletagem, adesivagem, palestras, rodas de conversação, divulgação de spots em rádios e apresentação de filmes promovidos pela Comissão, pelo Comitê, instituições locais e parceiros. O abuso é qualquer ato que ofenda a pessoa, extrapolando os limites do desenvolvimento ou exercício autônomo e sadio de sua sexualidade, visando unicamente à satisfação de um desejo sexual próprio do agressor. Ou seja: no abuso sexual o agressor procura unicamente satisfazer seus desejos mediante a violência sexual. Por sua vez, a exploração é a obtenção de alguma vantagem, financeira ou não, diversa do prazer oriundo 45 da violência. Caracteriza-se por ser uma relação mercantil, em que o agredido é considerado mera mercadoria. (CONANDA, 2009) Apesar das dificuldades, inúmeras iniciativas têm sido desenvolvidas pelo governo brasileiro e pela sociedade civil organizada no sentido de erradicar essa prática. São planos, programas e projetos com objetivos e metas bem definidas que visam à erradicação dos crimes sexuais cometidos contra crianças e adolescentes. É muito importante essa conscientização da população em relação a esse crime desumano cometido a milhares de crianças. Passa-se a ter novas perspectivas para a infância a partir de 1988. 2.3.1 Estatuto da Criança e do Adolescente A promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Lei 8.069/90) ocorreu em 13 de Julho de 1990. A sua construção se deu por resultados da mobilização civil, a qual deseja ter a criança e o adolescente como prioridade para a nação, na busca de respostas concretas as necessidades e problemas sociais que envolvem a criança e o adolescente. É uma legislação que marca ruptura com os estigmas e as diferenciações da população infanto-juvenil. O Estatuto da Criança e do Adolescente destaca a proteção de forma integral à criança (até 12 anos incompletos) e ao adolescente (entre 12 e 18 anos de idade), sujeitos de direitos civis, humanos e sociais. E por isso que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em seu Artigo 3º deixa claro que: A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Segundo os Artigos 3º e 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a criança e o adolescente são pessoas humanas inseridas num processo especial de desenvolvimento e que têm direitos à vida, saúde, alimentação, cultura, lazer, moradia, profissionalização, dignidade, respeito e liberdade. Devem exercer um importante e necessário papel a família, a sociedade e o Estado. De acordo com Artigo 5º; 46 Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. O Art. 4º do ECA transcreve o Art. 227 da CF, o qual determina que em primeiro lugar é de responsabilidade da família e depois do estado e da sociedade assegurar por todos os meios, formas e com absoluta prioridade, todos os direitos inerentes à constituição de um homem civilizado. Para Liberati (1991, p. 4), “devemos entender que a criança e o adolescente deverão estar