Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Autora: Profa. Samantha Ottani Rhein Crocco Colaboradoras: Profa. Mônica Teixeira Profa. Carolina Kurashima Nutrição e Biodisponibilidade de Nutrientes Professora conteudista: Samantha Ottani Rhein Crocco Possui graduação em Nutrição pelo Centro Universitário São Camilo (1999); é pesquisadora do Comportamento Alimentar e de Mindfulness; pós-doutoranda em Mindfulness no Centro Mente Aberta da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp); doutora em Nutrição pela Unifesp; mestre e especialista em Nutrição na Adolescência pela Unifesp/EPM. Sua carreira profissional começou em 2001, com pesquisa e intervenção nutricional, atuando também na área da docência, em cursos de graduação e pós-graduação. Dedica-se à Universidade Paulista (UNIP) como professora e supervisora de estágio em Nutrição. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) G873n Crocco, Samantha Ottani Rhein. Nutrição e Biodisponibilidade de Nutrientes / Samantha Ottani Rhein Crocco. – São Paulo: Editora Sol, 2021. 152 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Biodisponibilidade. 2. Vitamina. 3. Metabolismo. I. Título. CDU 612.39 U512.77 – 21 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Profa. Dra. Marilia Ancona Lopez Vice-Reitora de Graduação Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Unip Interativa Profa. Dra. Cláudia Andreatini Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático Comissão editorial: Profa. Dra. Christiane Mazur Doi Profa. Dra. Angélica L. Carlini Profa. Dra. Ronilda Ribeiro Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista Profa. Deise Alcantara Carreiro Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Ingrid Lourenço Lucas Ricardi Sumário Nutrição e Biodisponibilidade de Nutrientes APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................9 Unidade I 1 DEFINIÇÕES E CONCEITOS ........................................................................................................................... 11 2 BIODISPONIBILIDADE DE VITAMINA A E ZINCO .................................................................................. 18 2.1 Vitamina A: nomenclatura, estrutura química e função ..................................................... 18 2.1.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 22 2.2 Zinco: nomenclatura, estrutura química e função ................................................................. 27 2.2.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 29 2.2.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................... 31 3 BIODISPONIBILIDADE DE VITAMINA D, CÁLCIO E FÓSFORO .......................................................... 33 3.1 Cálcio e fósforo: nomenclatura, estrutura química e função ............................................ 33 3.1.1 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................... 40 4 BIODISPONIBILIDADE DE VITAMINAS K E E .......................................................................................... 46 4.1 Nomenclatura, estrutura química e função .............................................................................. 46 4.1.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 51 4.1.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco e outros) ..................................................... 54 Unidade II 5 BIODISPONIBILIDADE DE FERRO E VITAMINAS C, B9 E B12 .......................................................... 60 5.1 Ferro e vitamina C ................................................................................................................................ 60 5.1.1 Nomenclatura, estrutura química e função ................................................................................ 60 5.1.2 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 62 5.1.3 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................... 67 5.2 Vitamina B9: nomenclatura, estrutura química e função ................................................... 73 5.2.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 76 5.2.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................... 77 5.3 Vitamina B12: nomenclatura, estrutura química e função ................................................ 78 5.3.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 81 5.3.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................... 83 6 BIODISPONIBILIDADE DE VITAMINAS B1, NIACINA, RIBOFLAVINA E PIRIDOXINA ................ 84 6.1 Vitamina B1: nomenclatura, estrutura química e função ................................................... 84 6.1.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 85 6.1.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente,droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................... 88 6.2 Niacina: nomenclatura, estrutura química e função............................................................. 89 6.2.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 90 6.3 Riboflavina: nomenclatura, estrutura química e função ..................................................... 92 6.3.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento .............................................................................................................................................. 95 6.3.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................... 96 6.4 Piridoxina: nomenclatura, estrutura química e função........................................................ 97 Unidade III 7 BIODISPONIBILIDADE DE SELÊNIO E MAGNÉSIO .............................................................................104 7.1 Selênio: nomenclatura, estrutura química e função ...........................................................104 7.1.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento ............................................................................................................................................107 7.1.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ......................................... 112 7.2 Magnésio: nomenclatura, estrutura química e função ......................................................113 7.2.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento ............................................................................................................................................114 7.2.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ......................................... 116 8 BIODISPONIBILIDADE DE MINERAIS: POTÁSSIO, CLORO, CROMO, COBRE E IODO .............117 8.1 Potássio e cloro: nomenclatura, estrutura química e função ..........................................117 8.1.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento ............................................................................................................................................121 8.1.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................ 122 8.2 Cromo: nomenclatura, estrutura química e função ............................................................123 8.2.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento ........................................................................................................................................... 124 8.2.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................ 125 8.3 Cobre: nomenclatura, estrutura química e função ..............................................................125 8.3.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento ........................................................................................................................................... 127 8.3.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................ 129 8.4 Iodo: nomenclatura, estrutura química e função .................................................................129 8.4.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento ............................................................................................................................................131 8.4.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) ........................................ 133 9 APRESENTAÇÃO Caro aluno, Esta disciplina tem como objetivo demonstrar os fatores que interferem nas diferentes fases do metabolismo dos micronutrientes no processo de nutrição. Neste livro-texto discutem-se os temas de interesse para graduandos em Nutrição em relação ao metabolismo dos micronutrientes; enfatiza a importância do conhecimento sobre a estrutura química e a função das biomoléculas; estimula a compreensão das diferentes etapas do metabolismo dos micronutrientes; estuda os fatores atenuadores e promotores de biodisponibilidade de micronutrientes; interpreta aspectos importantes para analisar e explicar as necessidades e recomendações nutricionais dos micronutrientes de acordo com os estágios da vida e o gênero, e as consequências de sua deficiência e excesso. Espera-se, com isso, que o futuro profissional atinja seus objetivos de forma a elucidar o conteúdo proposto, estimulando-os a ter uma atuação em equipe de forma ética e com embasamento teórico científico. INTRODUÇÃO De acordo com o Ministério da Saúde (MS), alimentos são todas as substâncias sólidas ou líquidas presentes nos alimentos e que, levadas ao tubo digestivo, são degradadas e depois usadas para formar e/ou manter os tecidos do corpo, regular processos orgânicos e fornecer energia e nutrientes (BRASIL, 1997). O conceito de equilíbrio de nutriente fundamenta-se essencialmente a partir da Lei de Conservação da Massa, representada pela relação entre o consumo do nutriente e a sua utilização no corpo, o que resulta na alteração das reservas corporais (MICHAEL; MACDONALD, 2006). A consequência dessa reação pode resultar em três desfechos: • Equilíbrio zero: existe uma compatibilidade entre a utilização e a reserva, que permanecem constantes. • Equilíbrio positivo: o aporte excede a utilização e os reservatórios aumentam. • Equilíbrio negativo: a utilização excede o aporte e as reservas são exauridas. O ponto central desta disciplina será o equilíbrio dos micronutrientes no organismo, uma vez que estes, ao contrário dos macronutrientes, não precisam ser absorvidos em grandes quantidades, embora sejam essenciais. Tenha em mente que existem dois tipos de micronutrientes: as vitaminas e os minerais. Ambos não contêm energia, mas são necessários para as reações energéticas e regulam as funções celulares, já que estão envolvidos nas funções de proteção (imunológicas). Muitos deles são essenciais para crescimento, reprodução e manutenção do equilíbrio entre as células, fazem parte de tecidos e estão envolvidos na contração muscular e na transmissão dos impulsos nervosos (CONSELHO REGIONAL DE NUTRIÇÃO, 2005). 11 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Unidade I 1 DEFINIÇÕES E CONCEITOS Segundo Cozzolino (1997), o estudo dos nutrientes e de sua metabolização necessita de técnicasde análise cada vez mais precisas e sensíveis, o que foi possível a partir da década de 1970. Esse avanço tecnológico possibilitou quantificar de forma detalhada a presença de traços de ingredientes em alimentos e fluidos biológicos, além de esclarecer a atuação dos alimentos, tidos como nutrientes nos processos orgânicos. O processo de renovação e utilização dos nutrientes é dinâmico, uma vez que a composição corporal e a composição dos componentes sanguíneos são continuamente utilizadas nas reações metabólicas; logo, é constante a necessidade de reposição. Esse conceito de renovação pode ser aplicado a vários níveis do corpo: molecular, celular, tecidos, órgãos (MICHAEL; MACDONALD, 2006). A área da farmácia foi a primeira a iniciar os estudos no campo de biodisponibilidade com a finalidade de reconhecer a proporção em que os fármacos chegam à circulação e desempenham a sua função no corpo humano (MOURÃO et al., 2005). Ao aplicarmos esse conceito à nutrição, especificamente aos micronutrientes, alguns processos fisiológicos devem ser considerados, uma vez que interferem diretamente no potencial de aproveitamento desses nutrientes: a digestão, a absorção intestinal, a utilização e o transporte da vitamina absorvida nos tecidos, bem como a sua absorção celular e conversão para uma forma biologicamente ativa. A palavra “disponível” é chave para a compreensão de todo o processo, uma vez que os micronutrientes podem ser metabolizados dentro da célula e ficar indisponíveis para excreção subsequente, ou simplesmente podem ser armazenados para uso futuro. Com o aprofundamento dessas inter-relações, percebeu-se a necessidade de estender essa compreensão além dos fármacos. Na década de 1980, partindo do princípio de que a simples presença do nutriente na dieta não garante sua utilização pelo organismo, ficou evidente a aplicabilidade do termo biodisponibilidade para a área da nutrição, abordando, dessa forma, a proporção do nutriente que é realmente utilizada pelo organismo (SOUTHGATE et al., 1989). Essa definição, aceita preferencialmente como um conceito, persistiu até pouco tempo. Entretanto, em 1997, no Congresso de Biodisponibilidade realizado em Wageningen, na Holanda, foi proposta uma redefinição para o termo, que seria: “Biodisponibilidade é a fração de qualquer nutriente ingerido que tem o potencial para suprir demandas fisiológicas em tecidos-alvos”. O processo de aproveitamento intracelular dos nutrientes possui uma regulação precisa e que varia de nutriente para nutriente; alguns desses têm em seu processo de absorção uma situação de saturação, 12 Unidade I e mesmo que o nutriente esteja disponível na corrente sanguínea para o aproveitamento celular ele não será utilizado. Nesse caso, uma certa proporção dos micronutrientes circulantes seria excretada e, aparentemente, estaria indisponível. A compreensão na biodisponibilidade dos nutrientes requer a utilização de métodos analíticos específicos como ensaio microbiológico ou físico-químico, relação dose-efeito e uso de isótopos, que consigam analisar a concentração específica de nutrientes dos alimentos. Porém, essas são técnicas de muita complexidade e bastante difíceis de serem realizadas; portanto, atualmente trabalha-se o conceito de biodisponibilidade relativa (MOURÃO et al., 2005). Para que o conceito de biodisponibilidade ficasse claro, no congresso mencionado, ocorrido na Holanda, foi estabelecido o termo slamanghi para auxiliar a compreensão dos fatores que interferem diretamente nesse processo biológico. De forma clara e simples, por meio da compreensão de cada letra desse termo, é possível identificar os aspectos que devem ser considerados no estudo de biodisponibilidade: • S = Species (especiação do nutriente). • L = Linkage (ligação molecular). • A = Amount in the diet (quantidade na dieta). • M = Matrix (matriz em que o nutriente está incorporado). • A = Attenuators of absorption and bioconversion (atenuadores da absorção e bioconversão). • N = Nutrient status (estado nutricional do indivíduo). • G = Genetic factors (fatores genéticos). • H = Host related factors (fatores relacionados ao indivíduo). • I = Interactions (interações). O quadro a seguir possibilita a compreensão de maneira mais detalhada. 13 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Quadro 1 – Fatores que influenciam a biodisponibilidade dos nutrientes S = Especiação Representa a estrutura química na qual o elemento se encontra no alimento ou dieta; esse é o primeiro passo para determinarmos seu aproveitamento pelo organismo Os nutrientes podem estar nos alimentos de forma livre ou combinada, e neste último caso será necessária a eficiência do processo digestivo para liberá-los de complexos com menor solubilidade, o que irá favorecer a sua absorção. O estado de oxidação também precisa ser avaliado L = Ligação A ligação em que esses nutrientes estão presentes na matriz do alimento garante diferentes solubilidades. A estrutura atômica, o tipo de ligação covalente ou iônica, a presença de pontes de hidrogênio e o estado de oxidação dos elementos são alguns dos fatores que poderão influenciar na biodisponibilidade A = Quantidade na dieta Com relação às quantidades de nutrientes ingeridas numa refeição ou dieta diária, o organismo normal mantém o seu equilíbrio e se autorregula a partir do processo de “down-regulation”, que representa a maior absorção no caso de as reservas estarem diminuídas ou menor absorção quando estão em condições adequadas ou de excesso Ao falarmos de excesso, a proporção de um nutriente pode interferir no aproveitamento de outro M = Matriz De acordo com Cozzolino (1997), na matriz do alimento podemos ter compostos que impedem a absorção de minerais; podemos citar por exemplo o ferro na gema do ovo, que se liga à fosvitina, uma proteína que representa 7% das proteínas da gema e tem uma alta capacidade ligante; no espinafre, o alto conteúdo de ácido oxálico e se liga ao ferro e ao cálcio, diminuindo a biodisponibilidade destes nutrientes A = Atenuadores da absorção e bioconversão Em todo alimento estão presentes substâncias que favorecem ou reduzem o aproveitamento dos nutrientes; o ácido fítico, o ácido oxálico e os taninos podem reduzir o aproveitamento de alguns nutrientes pelo nosso organismo, enquanto alguns aminoácidos e ácidos orgânicos favorecem esse aproveitamento N = Estado nutricional do indivíduo O estado nutricional é o resultado entre o equilíbrio do gasto e o consumo de energia e de nutrientes, fator que terá influência direta na qualidade e na intensidade dos nutrientes que serão aproveitados G = Fatores genéticos Fatores que podem ser responsáveis por alterações na absorção dos nutrientes, incluindo algumas vitaminas e minerais A anemia falciforme, por exemplo, é uma condição clínica de ordem genética e que tem influência direta no aproveitamento do ferro, a partir de sua fixação nas hemácias H = Fatores relacionados aos indivíduos Inúmeras particularidades, como gênero, idade e etapa do desenvolvimento fisiológico, influenciam na forma de aproveitamento pelo organismo Um exemplo esclarecedor pode ser durante a fase do estirão puberal da adolescência, momento que que as necessidades nutricionais desse indivíduo estarão aumentadas para garantir o crescimento; logo, ocorrerá uma maior capacidade de absorção e de aproveitamento No caso dos idosos, a redução na produção e secreção de ácido clorídrico e as alterações fisiológicas específicas da fase terão consequências na biodisponibilidade do cálcio, da vitamina B12, entre outros nutrientes, por exemplo I = Interações As interações minerais versus minerais podem ser diretas, quando estes competem pelo mesmo sítio de absorção, por possuírem propriedades físicas e químicas semelhantes; e de forma indireta, quando o mineral depende de outro para ser transformado para sua forma ativa Temos alguns exemplos bastante descritos na literatura: ferro versuszinco (direta) e selênio versus iodo (indireta) Adaptado de: Cozzolino (1997). 14 Unidade I Observação As informações descritas no quadro anterior são essenciais e podem ser obtidas a partir da anamnese nutricional e da análise do consumo alimentar, este desenvolvido com o auxílio de softwares para cálculos nutricionais ou tabelas de composição centesimal. Outro aspecto importante que deve ser considerado é a biopotência do nutriente, ou seja, a magnitude da influência de uma vitamina (ou nutriente) nos processos biológicos ou, simplesmente, a atividade biológica desta, testada por meio de ensaios clínicos. Essa biopotência está relacionada a outros aspectos descritos no campo da biodisponibilidade, importantes para a compreensão do contexto. São elas: • Bioconversão: é a quantidade de um nutriente já absorvido que é convertida em sua forma ativa no corpo; é o caso da transformação dos carotenoides pró-vitamínicos A em retinol. • Bioeficácia: é o resultado tanto da biodisponibilidade quanto da bioconversão, e se refere à eficiência com que um nutriente ingerido no alimento é absorvido e convertido na sua forma ativa. • Bioeficiência: consiste na proporção da forma ativa convertida do nutriente absorvido que atingirá o tecido-alvo. Outros aspectos irão interferir na biodisponibilidade dos nutrientes, como a estocagem, a fermentação, a germinação, o processamento e a digestão de grãos e sementes, como o ácido fítico, que pode ser parcialmente neutralizado pela desfosforilação (retirada de fósforo mediada pela enzima fitase), para produzir compostos derivados, como pentafosfato (IP5), tetrafosfato (IP4), trifosfato (IP3) e, possivelmente, inositol difosfato (IP2) e monofosfato (IP1). Desses subprodutos, somente IP5 e IP6 têm efeito negativo na biodisponibilidade de minerais. Elevado nível de ingestão de ácido fítico pode estar associado a efeitos nutricionais negativos, visto que esses compostos são conhecidos pela redução na biodisponibilidade de minerais, proteínas e inibição de enzimas proteolíticas (SILVA; SILVA, 1999). Os inibidores de proteases são proteínas de ampla distribuição no reino vegetal, capazes de inibir a atividade das enzimas tripsina, quimotripsina, amilase e carboxipeptidase (SILVA; SILVA, 2000). A inativação total de inibidor de tripsina em feijões (Phaseolus vulgaris) foi possível assim que os feijões foram embebidos em água destilada por uma noite e submetidos à temperatura de 97 °C por 7,5 minutos, impactando a biodisponibilidade de nutrientes. Portanto, técnicas culinárias podem ser utilizadas no intuito de melhorar o aproveitamento dos nutrientes pelo nosso organismo. Podemos concluir que muitos são os fatores que interferem na absorção e no aproveitamento dos nutrientes 15 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES em nosso organismo, e cabe ao nutricionista avaliar esses aspectos para melhor orientar o paciente no momento de avaliação e planejamento alimentar (SILVA; SILVA, 2000). Exemplo de aplicação Será que ao atender um paciente idoso, uma atenção especial deverá ser direcionada para a biodisponibilidade de algum nutriente? A resposta é sim. Durante o envelhecimento, esse processo poderá ocorrer em um contexto fisiológico, chamado de senescência, ou associado a doenças (senilidade). O enfoque de nossa resposta será para o processo natural de envelhecimento. Com o desgaste do esmalte dentário e a perda de dentes, o consumo de alimentos como carnes pode ficar comprometido, assim como o fornecimento de vitamina B12 e de ferro. Há declínio da produção de ácido clorídrico pelas células parietais, favorecendo a hipocloridria e o comprometimento no aproveitamento de vitamina B12, cálcio e ferro, principalmente. Portanto, é importante considerarmos que cada caso é único e que muitos serão os fatores a serem considerados no momento de aplicarmos os conceitos de biodisponibilidade dos nutrientes. Neste livro-texto iremos abordar conceitos importantes sobre as Recomendações Nutricionais – Dietary Reference Intake (DRIs), valores utilizados tanto para a avaliação quanto para a prescrição de dietas. As DRI são definidas como a mais recente revisão de valores de recomendação nutricional (energia, macro e micronutrientes) desenvolvidos por um comitê americano e canadense com publicações sistemáticas a partir do ano de 1997, em parceria com o Instituto de Medicina Norte-Americano. Os valores de DRIs passam por constantes atualizações e devem ser utilizados por profissionais de saúde, uma vez que levam em consideração as necessidades nutricionais de acordo com o gênero, a faixa etária e o estágio de vida ou momento fisiológico (gestação, lactação) dos indivíduos (DOMENE et al., 2006). Considere como valores que compõem esse conjunto de recomendações (FRANCESCHINI et al., 2012): • Estimated average requirement – EAR (necessidade média estimada): consiste no valor médio de ingestão diária, e a quantidade suficiente para suprir as necessidades de pelo menos 50% dos indivíduos saudáveis de referência, respeitando a respectiva idade e gênero. Na prática, esses valores são utilizados para avaliar a adequação e o planejamento da ingestão dietética de grupos populacionais. 16 Unidade I • Recommended dietary allowance – RDA (ingestão dietética recomendada): considera a quantidade do nutriente suficiente para atender à necessidade diária de 98% da população de referência; é obtida matematicamente a partir dos valores de consumo médio (EAR) e geralmente acrescida de dois desvios padrão. Na prática, a sua utilização deve ocorrer como alvo de ingestão no momento da prescrição da dieta para indivíduos saudáveis. • Adequate intake – AI (ingestão adequada): caracteriza-se pelo valor médio de ingestão diária de um nutriente, embora não existam evidências científicas suficientes para o estabelecimento de EAR e RDA. Logo, consiste em um valor estimado. • Tolerable upper intake level – UL (nível máximo de ingestão tolerável): valor que demonstra o limite máximo de ingestão diária de um nutriente e que seja tolerável biologicamente. Torna-se referência na elaboração de alimentos enriquecidos ou fortificados, além de suplementos alimentares. (*) EAR: Necessidade média estimada; RDA: Ingestão dietética recomendada; AI: Ingestão adequada; UL Nível máximo tolerável de ingestão. RDAEAR +2 DP Distribuição da necessidade média do nutriente Po rc en ta ge m d e in di ví du os AI UL Figura 1 – Modelo para os valores de referência da dieta Fonte: Marchioni, Slater e Fisberg (2004, p. 209). No tocante aos valores de UL, é importante ressaltar que eles devem ser utilizados de forma criteriosa, já que não são considerados como referências de recomendação de ingestão; os desfechos mencionados no quadro a seguir normalmente associam-se à utilização do nutriente na forma de suplemento, ou ainda em uso parenteral. O quadro a seguir irá demonstrar os possíveis efeitos desse consumo. 17 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Quadro 2 – Relação das manifestações referentes à toxicidade dos nutrientes Nutriente Manifestação Vitamina A Náusea, vômito e dor de cabeça, com possível aumento da pressão no fluido cerebrospinal – esses sinais tendem a desaparecer em poucos dias com a interrupção do consumo Quando a toxicidade tende a ser crônica pelo consumo prolongado de doses superiores a 7,5 mg/dia e 9 mg/dia para adultos, as consequências podem ser o comprometimento nas funções desempenhadas pelo sistema nervoso central (causando dor de cabeça, náusea, ataxia e anorexia, todas associadas com o aumento da pressão do fluido cerebrospinal) e hepatomegalia, hiperlipidemia e mudanças histológicas do fígado, incluindo aumento da formação de colágeno Na pele pode ocorrer secura excessiva, escamação e rachaduras, descamação e alopecia Zinco Interação negativa com demais nutrientes, como o ferro e a vitamina A, poderão acontecer em situação de consumo excessivo do zinco. Além disso, efeitoscomo diarreia, vômito e náusea poderão ocorrer Vitamina D Diarreia, constipação intestinal, fraqueza, náuseas, inapetência, dor de cabeça, dores abdominais, cãibras e diarreia Quando ocorrer de forma mais grave, o consumo excessivo de vitamina D pode ocasionar hipercalcemia Cálcio Quando este mineral é consumido em excesso, pode relacionar-se à formação de pedra nos rins, síndrome de hipercalcemia e, a médio e longo prazo, à insuficiência renal Fósforo O consumo excessivo do fósforo pode associar-se com a calcificação vascular, alteração nas vias de sinalização celular às quais o nutriente está envolvido, além da diminuição na fertilidade, de predisposição ao envelhecimento precoce e ao aumento do risco de desenvolvimento de câncer De forma aguda, sintomas como tetania, hipotensão e taquicardia poderão ocorrer Vitamina E Até hoje não foram apresentados efeitos deletérios em decorrência do consumo excessivo de vitamina E, porém a prescrição deve permanecer de forma coerente e cuidadosa Vitamina K Para a vitamina K, nas formas de filoquinona e menaquinona, não foram observados efeitos adversos tanto na ingestão via alimentos como na forma de suplemento; porém, uma atenção especial deve ser dada no caso de pacientes em uso de terapia anticoagulante Com relação à menadiona e aos seus derivados, quando consumida em excesso, a vitamina K apresenta potenciais efeitos tóxicos relacionados à função hepática Vitamina C Pouco temos descrito na literatura com relação aos efeitos tóxicos do consumo de vitamina C, porém acredita-se que o consumo diário de até 1 g seja seguro. No entanto, ao atingirmos a quantidade diária de 2 g, para algumas pessoas já é possível a ocorrência de gastroenterite, formação de pedras renais de oxalato (litíase renal) ou diarreia osmótica Ferro O consumo excessivo via suplementação do ferro associa-se ao aumento nos níveis de ferritina e ao aumento no risco cardiovascular. Outra importante consequência é a associação negativa com demais metais Efeitos gastrointestinais, como dor epigástrica, náusea e diarreia, poderão ser notadas Vitamina B9 Embora não seja reconhecido como um nutriente tóxico, o ácido fólico, quando consumido em quantidades superiores a 1 g/dia, pode mascarar uma anemia perniciosa, e a médio e longo prazo pode contribuir (de forma ainda não conhecida) com o desenvolvimento da aterosclerose Vitamina B1 Até o momento, não há confirmação científica sobre a sua toxicidade. Isso ocorre por se tratar de um nutriente solúvel em água e com rápida excreção urinária A atenção maior é exigida nos casos de pacientes com utilização parenteral, que podem manifestar dermatites, irritabilidade, insônia e fraqueza; de forma menos frequente, pode haver comprometimentos respiratórios e choque anafilático Niacina Esta vitamina pode causar vasodilatação seguida de enrubescimento, queimação e coceira da pele. A hipotensão devido à vasodilatação é um efeito possível Riboflavina Não é descrito na literatura risco de toxicidade desta vitamina por se tratar de um nutriente hidrossolúvel, porém a utilização na forma parenteral deve ser monitorada atentamente Piridoxina Até o momento, não há confirmação científica sobre a sua toxicidade. Isso ocorre por se tratar de um nutriente solúvel em água e com rápida excreção urinária Selênio Efeitos como diarreia, vômito e náusea podem ocorrer a partir do consumo excessivo de selênio 18 Unidade I Nutriente Manifestação Magnésio Quando o consumo se torna excessivo e atinge concentração plasmática de 3,5 mmol/L a 5 mmol/L, alguns sintomas como vômito, náusea, hipotensão, bradicardia e fraqueza poderão acontecer Caso os níveis plasmáticos excedam 9 mmol/L, efeitos cardíacos e respiratórios poderão ocorrer, como bradicardia, parada cardíaca e dificuldade respiratória Potássio O consumo diário de potássio em excesso pode relacionar-se à ocorrência de náusea, vômito e diarreia, e consequências mais graves, como disfunção neuromuscular, fraqueza e paralisia Cloro O uso excessivo deste eletrólito pode relacionar-se à hipercalemia ou à alteração na função renal, mesmo em pacientes sem disfunção ou doença renal Cromo A toxicidade deste elemento é questionável e varia de acordo com a sua forma estrutural; quando na forma hexavalente, associa-se a uma provável toxicidade pulmonar, asma brônquica e hepatoxicidade Cobre Dificilmente este nutriente terá desfecho de toxicidade, já que possui um mecanismo de regulação homeostática bastante eficiente No caso de pacientes com doenças hepáticas, no entanto, será necessária a absorção e o monitoramento da suplementação Iodo Em caso de consumo excessivo e de acordo com a vulnerabilidade individual, problemas funcionais na tireoide poderão acontecer Adaptado de: Cozzolino (1997). Observação As informações descritas no quadro anterior devem ser confirmadas e monitoradas a partir de indicadores complementares coletados durante o atendimento nutricional, como os exames bioquímicos específicios, a análise e adequação do consumo alimentar, bem como a avaliação e a interpretação das queixas (sintomas) e sinais apresentados pelo paciente, denominados semiologia. 2 BIODISPONIBILIDADE DE VITAMINA A E ZINCO 2.1 Vitamina A: nomenclatura, estrutura química e função A vitamina A é um pigmento essencial para a visão, sendo inicialmente reconhecida por sua essencialidade para a saúde de humanos e outros seres vivos. Essa vitamina não ocorre nos vegetais, porém muitas plantas contêm carotenoides, pigmentos que absorvem luz e que podem ser convertidos em vitamina A pela maior parte dos animais; esta taxa de conversão é variável e depende de muitos aspectos, incluindo o tipo de carotenoides e o potencial de conversão em vitamina A. Sabe-se que de todos os carotenoides, o β-caroteno é aquele com maior conversão em vitamina A, porém podemos encontrar outros carotenoides nos alimentos-fonte, conforme demonstra a tabela a seguir. Segundo Mourão et al. (2005, p. 315): A biodisponibilidade de vitamina A em alimentos e formulações alimentícias varia de acordo com diversos fatores, alguns deles ainda questionáveis. Com relação, especificamente, aos carotenoides, ressaltam-se as espécies 19 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES presentes, o tipo de ligação molecular, a quantidade de carotenoides consumida na refeição, a matriz na qual o carotenoide está incorporado, e fatores de absorção e bioconversão, entre outros. Para uma melhor assimilação dos carotenoides, é essencial a integridade do sistema digestivo, incluindo a função pancreática e hepática essenciais durante a hidrólise dos alimentos ricos especificamente nesse nutriente. Essa eficiência, durante o trabalho digestivo, favorecerá a ruptura celular da matriz do alimento, contribuindo com a melhor solubilização do nutriente liberado (MOURÃO et al., 2005). Nesse contexto, a microbiota intestinal assume papel de extrema relevância, uma vez que modula a permeabilidade, a integridade das proteínas transportadoras e demais movimentações que ocorram também durante a absorção dos nutrientes. Podemos considerar como microbiota intestinal uma população de organismos microscópicos que habita o intestino; especificamente no trato gastrointestinal de humano localizamos cerca de 100 trilhões de microrganismos com relação simbióticas ou como comensais, na maioria pertencentes aos filos firmicutes, bacteroidetes e actinobactéria (RAMIREZ, 2017). Importante lembrar que alguns dos nutrientes que serão discutidos ao longo deste livro-texto são sintetizados no ambiente intestinal, como vitamina K, vitamina B12 e ferro. Tabela 1 – Teor de carotenoides (μg/g) em alguns alimentos Descrição α-caroteno β-caroteno β-criptoxantina Licopeno Luteína Zeaxantina Violaxantina RAE* Abricó (Mammea americana) – 15 14 (isômeros trans) 0,5 Não quantificado 190 Acerola (Malpighia glabra) Traços 4,0 0,5 Não quantificado Não quantificado 232 Acerola madura sem casca 0,7 8,8 0,8 1,2 0,7 80 Acerola“Olivier” parcialmente madura 0,3 12 0,3 0,7 0,7 102 Acerola “Olivier” madura 0,7 38 1,2 1,1 3,1 325 Acerola “Olivier” parcialmente madura sem casca 0,4 30 1,1 0,7 1,6 256 *RAE = Equivalentes de atividade de retinol (12 μg de β-caroteno ou 24 μg de outras pró-vitaminas). Fonte: Rodriguez-Amaya, Kimura e Farfan-Amaya (2008, p. 50). Embora sejam micronutrientes presentes em níveis muito baixos nos alimentos (microgramas por grama), os carotenoides estão entre os constituintes alimentícios mais importantes. Os carotenoides são pigmentos naturais responsáveis pelas cores de amarelo a laranja ou vermelho de muitas frutas, hortaliças, gema de ovo, crustáceos cozidos e alguns peixes e são considerados substâncias bioativas, com efeitos benéficos à saúde (RODRIGUEZ-AMAYA; KIMURA; FARFAN-AMAYA, 2008). 20 Unidade I O termo vitamina A é empregado atualmente para designar todos os derivados de β-ionona que possuam atividade biológica de retinol, exceto os carotenoides. O termo retinoide se refere ao retinol ou aos seus derivados de ocorrência natural e análogos sintéticos, que não apresentam, necessariamente, atividade semelhante à do retinol. H3C CH3 CH3 CH3 CH3 OH Figura 2 – Estrutura química da vitamina A (retinol) Disponível em: https://bit.ly/3zlOlAz. Acesso em: 21 jul. 2021. Podemos considerar que a vitamina A é a expressão genérica usada para descrever o retinol e todos os carotenoides dietéticos que têm atividade biológica de transretinol. Ela foi descoberta em 1913 por dois grupos independentes de pesquisadores, nas Universidades de Wisconsin e de Yale. Em 1919, Harry Steenbock observou que a vitamina A contida nos vegetais variava com o seu grau de coloração, confirmando sua natureza química e descrevendo que o pigmento das plantas era uma fonte rica de vitamina A. Esse pigmento foi chamado de caroteno, sendo, na verdade, um pool de compostos com a capacidade de se transformarem em vitamina A, entre eles o a-caroteno e o β-caroteno; por isso os compostos carotenoides são chamados de pró-vitamina A. O ácido retinoico, um metabólito do retinol no qual o grupo álcool sofreu oxidação, apesar de ser mais potente que o retinol com relação à promoção da diferenciação e do crescimento do tecido epitelial na deficiência da vitamina A, não apresenta a mesma eficiência na função visual ou reprodutiva; portanto, cada composto com função de vitamina A parece ser mais atuante em tecidos específicos. O fato de os nutrientes, neste caso, os derivados de retinoide, se ligarem em proteínas inespecíficas contribui com a falta de ativação e consequente desempenho de atividade biológica nos tecidos. O pigmento β-caroteno ocorre em vegetais amarelo-alaranjados, como cenoura, batata-doce, pimentão, pêssego, manga, entre outros; e a partir da reação de sua clivagem pode produzir vitamina A. Muitas são as espécies de carotenoides, porém as mais encontradas no plasma humano são α-caroteno, β-caroteno, β-criptoxantina, luteína e licopeno. De maneira geral, esses pigmentos são responsáveis por efeitos benéficos para a saúde humana, sendo necessário evidenciar o seu papel antioxidante. De acordo com Uenojo, Maróstica Junior e Pastore (2007), os carotenoides também possuem a capacidade de modular a resposta imunológica e a comunicação intracelular, além de atuar prevenindo o envelhecimento celular e orgânico, uma vez que desempenham efeito sinérgico com as vitaminas C e E na proteção celular por seu efeito neutralizador das espécies reativas de nutrientes. 21 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Com relação à vitamina A, suas recomendações nutricionais estão descritas na tabela a seguir. Tabela 2 – Recomendações de ingestão para vitamina A e limites superiores toleráveis Estágio de vida EAR (µg/dia) RDA (µg/dia) UL (µg/dia) Lactentes 0-6 meses 7-12 meses – – 400 (AI) 500 (AI) 600 600 Crianças 1-3 anos 4-8 anos 210 275 300 400 600 900 Homens 9-13 anos 14-18 anos 19-30 anos 31-50 anos 51-70 anos > 70 anos 445 630 625 625 625 625 600 900 900 900 900 900 1.700 2.800 3.000 3.000 3.000 3.000 Mulheres 9-13 anos 14-18 anos 19-30 anos 31-50 anos 51-70 anos > 70 anos 420 485 500 500 500 500 600 700 700 700 700 700 2.800 3.000 3.000 3.000 3.000 3.000 Gestantes ≤ 18 anos 19-50 anos 530 550 750 770 2.800 3.000 Lactantes ≤ 18 anos 19-50 anos 880 900 1.200 1.300 2.800 3.000 AI = Ingestão adequada; EAR = Necessidade média estimada; RDA = Ingestão dietética recomendada; UL = Limite superior tolerável de ingestão. Fonte: Yonekura et al. (2016, p. 325). Historicamente, a vitamina A associa-se ao processo visual, já que constitui o grupo prostético das opsinas, proteínas sensíveis à luz e presentes na retina. Portanto, quando há carência, um dos sintomas mais referidos é a cegueira noturna. A vitamina A participa de vários mecanismos biológicos, como diferenciação epitelial, expressão de genes, reprodução e integridade do sistema imunológico. Outras 22 Unidade I funções dessa vitamina são atuar no metabolismo intermediário, na síntese de ácido ribonucléico (RNA) e proteínas, enzimas, globulinas, glicoproteínas, queratina, na permeabilidade celular, nos metabolismos da hemoglobina e do zinco, além de participar dos receptores nucleares e seus ativadores, que regulam a expressão de genes relacionados ao metabolismo da triiodotironina, estrogênio, progesterona, cortisol, aldosterona, testosterona, vitamina D, colesterol e ácidos graxos. Logo, a carência dessa vitamina poderá causar prejuízos ao crescimento, ao desenvolvimento infantil e à reprodução humana. 2.1.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento A vitamina A pré-formada apresenta um percentual de absorção que varia entre 70% e 90%, ao passo que a forma de provitamina alcança um intervalo entre 20% e 50%. Isso ocorre provavelmente pelo tipo de absorção na membrana intestinal. As provitaminas ou carotenoides, por exemplo, sofrem absorção passiva com necessidade posterior de conversão em vitamina A no intestino; a localização desse nutriente na matriz do alimento também dificulta a sua solubilidade e, consequentemente, a sua biodisponibilidade (MOURÃO et al., 2005). Primeiramente ocorre a ruptura mecânica e enzimática da matriz alimentar na boca, no estômago e no duodeno, liberando as moléculas de ésteres de retinila ou carotenoides, que por sua vez são incorporadas às gotículas de lipídios em emulsão no estômago. Segundo Yonekura et al. (2016, p. 297): Com a ação das lipases gástricas, e posteriormente das lipases pancreáticas e sais biliares secretados no duodeno, ocorre a formação de micelas mistas formadas por sais biliares e produtos da hidrólise de lipídios, que são responsáveis pela solubilização de nutrientes lipossolúveis no lúmen intestinal. Ésteres de retinila são hidrolisados pelas lipases pancreáticas no duodeno e pela fosfolipase B na superfície das cé-lulas da mucosa intestinal. O retinol livre, em concentrações fisiológicas, é absorvido via difusão facilitada por transportador ainda não identificado, porém, em concentrações farmacológicas, é absorvido por difusão simples. No interior dos enterócitos, o retinol se liga à CRBP-II (cellular retinol binding protein type-II), é reesterificado pela ação da enzima LRAT (lecitin-retinol acil transferase) e secretado como um componente dos quilomícrons no sistema linfático. A sua melhor absorção intestinal depende da associação com lipídios dietéticos, justamente por se tratar de uma vitamina lipossolúvel. Na mucosa intestinal, em sua superfície externa, ocorrerá a hidrólise de ésteres de retinil, resultando em retinol livre que será incorporado pelo quilomícrom e reesterificado intracelularmente em palmitato pela enzima lecitina aciltransferase microssomal. 23 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Lembrete Toda vitamina lipossolúvel necessita de lipídios (óleos e gorduras) paramelhorar a sua absorção. Isso ocorre porque a presença desses componentes favorecerá a formação de micelas e a consequente absorção, com posterior incorporação dessas vitaminas no quilomícron nascente, formado na célula intestinal. Dessa forma, a vitamina A participará do metabolismo das lipoproteínas e, ao chegar ao fígado, associada ao quilomícron remanescente, será novamente hidrolisada a retinol para se associar à proteína transportadora RBP. Ruptura da matriz alimentar Éster de retinila Éster de retinila Lipídios da dieta Emulsão (diâmetro 20 a 40 µm) Micelas mistas (diâmetro 4 a 60 ηm) Lipases pancreáticas e sais biliares Lipase pancreática Fostolipase B intestinal Lúmen intestinal Sangue Enterócitos Linfa Retinol OH β – caroteno Figura 3 – Estágios da digestão e absorção de vitamina A e β-caroteno Fonte: Yonekura et al. (2016, p. 298). 24 Unidade I O armazenamento da vitamina A é feito sob forma de ésteres de retinil; cerca de 50% a 80% da vitamina A no corpo são estocados no fígado, local em que é ligada à proteína ligadora de retinol (RBP). Esse estoque regula os efeitos de variabilidade nas taxas de ingestão de vitamina A, particularmente contra os riscos de deficiência durante os períodos de baixa ingestão dessa vitamina (MOURÃO et al., 2005). Até que aconteça a necessidade, a vitamina permanecerá como reserva, muitas vezes durante vários meses. Em condição de ingestão elevada de retinol, a via mediada pelo citocromo P450 microssomal será ativada, promovendo a transformação dessa vitamina em metabólitos polares que serão secretados via urina e bile – mas vale apontar que essa via pode ser saturada, em condições de elevada ingestão da vitamina A. A vitamina A pode ser mobilizada do fígado para distribuição aos tecidos periféricos na dependência da oferta do aporte alimentar. Portanto, quando está deficiente no organismo, essa condição ativará no fígado a hidrólise de ésteres de retinil, fazendo com que esse órgão mantenha uma concentração constante de sua forma ativa na circulação. A ligação de retinol a um transportador específico, a RBP, que circula no plasma ligada à pré-albumina, impede a excreção do complexo retinol-RBP na urina. A figura a seguir ilustra o trajeto metabólico da vitamina A e dos carotenoides. Nela, é possível observar que após serem incorporados no quilomícron, a vitamina A e os carotenoides seguirão pelo ducto torácico e acessarão a circulação sanguínea com o objetivo de desempenharem a função de carreadores de ácidos graxos (na forma de triacilgliceróis) para os diversos tecidos. Atividade enzimática, como a da lipase lipoproteica, irá hidrolisar os quilimícrons até que eles fiquem pobres em triacilgliceróis, recebendo o nome de quilomícrons remanescentes. Nesse momento, os ésteres de retinila dos quilomícrons remanescentes entrarão no fígado pela veia porta e serão captados, por meio de receptores específicos, pelas células hepáticas com auxílio da apoproteína E presente em sua estrutura. No ambiente hepático serão hidrolisados a retinol, que então se une à apo-RBP (proteína ligadora de retinol) para a posterior liberação na corrente sanguínea (PATRICK, 2000). 25 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Betacaroteno Retinol Lúmen intestinal Difusão simples Transporte via SR-BI Enterócito Difusão facilitada Difusão simples ApoB-48 Ácidos graxos Lecitina retinol acil transferase Quilimícrons (diâmetro 50 a 200 nm) Quilimícrons remanenscentes Hepatócitos (parênquirna) Ésteres de retinila (ER) Linfa Sangue ER ER ER ER ER ER ER Retinal redutase Retinol Retinol Retinol Retinol Retinol Células estreladas Espaço de disse Epitélio fenestrado Sinusoide CRBP-II CRBP-II RBP Betacaroteno 15, 15' dioxigenase Figura 4 – Captação, metabolismo e secreção de vitamina A e betacaroteno nos enterócitos Fonte: Yonekura et al. (2016, p. 299). A concentração sanguínea não é um parâmetro recomendável para um estudo individual da vitamina A, mas valores baixos de retinol sanguíneo significam que o armazenamento hepático da vitamina pode estar esgotado. A taxa normal de retinol no plasma é de 30 μmol/L a 70 μg/dL (1,04 μmol/L a 2,43 μmol/L). Porém, em indivíduos saudáveis, o retinol plasmático é mantido dentro de uma variação estreita de 1,39 μmol/L a 1,73 μmol/L (40,1 μg/dl a 49,9 μg/dl) em adultos e aproximadamente metade desses valores nas crianças. Visto que a síntese hepática da RBP depende da presença tanto de zinco quanto de aminoácidos e de níveis de retinol plasmático, os níveis da RBP podem ser afetados por diferenças desses nutrientes, bem como deficiência crônica da vitamina A grave o suficiente para depletar estoques de ésteres de retinol hepático. 26 Unidade I Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros). Crianças com desnutrição proteico-calórica tipicamente mostram baixos níveis circulantes de retinol, que pode não responder à suplementação de vitamina A, a menos que a deficiência proteica seja corrigida. Isso ocorre porque, conforme foi citado, a vitamina A liga-se à pré-albumina para atingir a circulação, e consequentemente os tecidos-alvo. A associação com outros nutrientes também pode ocasionar efeitos, conforme pode ser visto no quadro a seguir. Quadro 3 Ferro Pesquisas sugerem que a deficiência de vitamina A prejudique a mobilização de ferro nos estoques Carotenoides Poderá ocorrer competição na incorporação das micelas por serem ambos compostos lipossolúveis Zinco Este micromineral está diretamente ligado à síntese da proteína transportadora de retinol (RBP); portanto, para que ocorra o transporte da vitamina A, existe a necessidade de manutenção dos estoques corporais de zinco Adaptado de: Cozzolino (1997). A forma química dos carotenoides, a quantidade consumida na dieta, o tamanho do alimento, a quantidade de gordura presente na dieta e a quantidade de fibras alimentares, principalmente os solúveis presentes na refeição, são outros fatores que afetam a biodisponibilidade dos compostos provitamínicos A e que podem ser manejados durante a elaboração do planejamento alimentar. Carotenoides cristalinos na forma de β-caroteno cristalino apresentam uma absorção em torno de 50%, portanto mais eficiente ao ser comparada com a absorção do β-caroteno extraído de cenouras (1%). Isso ocorre pela presença das células fibrosas das plantas. Ao compararmos a porção cis e trans dos carotenoides, foi verificado que uma única dose de uma mistura de carotenoides na forma trans encontrada no soro ou na fração da lipoproteína quilomícron foi mais alta do que o isômero cis, demonstrando uma alta absorção ou transporte preferencial dos isômeros trans em relação aos isômeros cis dessa vitamina (MOURÃO et al., 2005). A partir do que foi mencionado, percebeu-se que o tipo de fibra alimentar presente nos alimentos e na refeição como um todo irá interferir na proporção com que os nutrientes serão aproveitados/absorvidos; portanto, podemos afirmar que a fibra do tipo solúvel, como a pectina, a goma guar e a celulose, é aquela que mais reduz a absorção de β-caroteno após a ingestão das refeições-teste (0,15 g de fibra por kg de peso corporal) e mistura de carotenoides (β-caroteno e luteína: 0,4 mg de fibra por kg; licopeno: 0,7 mg de fibra por kg), embora no experimento descrito os carotenoides tenham sido oferecidos na forma de suplemento, diferindo portanto do mecanismo de digestão e absorção decorrente da ingestão desse nutriente a partir de alimentos (MOURÃO et al., 2005). 27 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES O estágio de vida também interfere nas necessidades e no aproveitamento do nutriente, e a gestação é uma fase de grande demanda da vitamina A, sendo que o critério para estabelecer os seus valores de EAR se basearam no acúmulo desse nutrientepelo feto, levando em consideração que o conteúdo hepático é de aproximadamente 50% de vitamina A corporal (CAMPANELLI; VIEIRA; JAPUR, 2007). Outro fator que impacta significantemente a biodisponibilidade da vitamina A é o alcoolismo, pela depleção do estoque de vitamina A hepática, em parte pela redução no consumo. Em situações de subnutrição proteica ou energético-proteica, ocorrerá uma redução na síntese da proteína ligadora de retinol, diminuindo a eficiência do seu transporte nos tecidos-alvo (CAMPANELLI; VIEIRA; JAPUR, 2007). Considerando a teratogenicidade da vitamina A, foi estabelecido valor de UL de 2.800 a 3.000 mcg/dia de vitamina A pré-formada para gestantes com mais de 19 anos (CAMPANELLI; VIEIRA; JAPUR, 2007). No aspecto da saúde pública, quatro são os tipos de programas para a prevenção de cegueira noturna e morte de crianças com menos de 5 anos decorrentes da vitamina A: • Dose única de 60.000 µg de acetato ou palmitato de retinol em óleos ou comprimidos dispersíveis em água. • Encorajar o consumo de alimentos fonte de carotenoides (vegetais verde folhosos, frutas e alimentos de cor amarelo-alaranjado, como manga, abóbora, cenoura, entre outros). • Enriquecimento de alimentos. • Encorajamento para a produção doméstica de alimentos ricos em carotenoides, preferencialmente betacaroteno. 2.2 Zinco: nomenclatura, estrutura química e função Segundo elemento traço com maior presença no corpo humano, o zinco foi descoberto em 1509, e há décadas vem sendo reconhecido como nutriente essencial para a vida. Foi somente a partir dos anos 1960 que foram descritos os primeiros casos de deficiência desse micronutriente, inicialmente entre adolescentes iranianas. O zinco é um microelemento presente em enzimas, atuante no crescimento e na maturação sexual, funções imunológicas, entre outras. A compreensão de sua real relevância para o metabolismo humano veio em 1869 com Raulin, que descobriu sua essencialidade; anos mais tarde e após muitas pesquisas, Tucker e Salmon, em 1955, descobriram problemas de pele associados à carência de zinco. A cada novo estudo mais a sua essencialidade era reconhecida, principalmente em crianças e adolescentes. Em nosso corpo é possível encontrar de 1,5 g a 2,5 g de zinco distribuído por todas as estruturas, principalmente nos músculos estriados (60%), nos ossos (20% a 30%) e no fígado (4% a 6%), porém esse micromineral pode ser encontrado nos rins, pâncreas, olhos, cabelos, unhas, próstata e espermatozoides. 28 Unidade I Pouca quantidade permanece em nossa corrente sanguínea, e desse total 90% estão nos eritrócitos, 9% no plasma e 1% nos leucócitos; enquanto 80% do zinco plasmático estão ligados à albumina, já que normalmente esse mineral se complexa com aminoácidos, peptídeos e nucleotídeos e tem afinidade com grupos tióis e hidrogênio. De acordo com Mafra e Cozzolino (2004), o zinco é um metal que atua diretamente em processos enzimáticos e na estabilização da estrutura molecular dos componentes celulares da membrana em inúmeras variedades de processos metabólicos, atuando na manutenção de um sistema imune saudável, além de ser essencial para o crescimento e para o desenvolvimento normal durante a gestação, a infância e a adolescência. Devido à sua versatilidade, mais de 300 tipos diferentes de enzimas identificadas em diversas espécies vivas necessitam da coordenação de um ou mais átomos de zinco, portanto ele pode ser classificado como fator catalítico, co-catalítico ou estrutural (COZZOLINO, 1997). O zinco desempenha função antioxidante, uma vez que é componente estrutural da enzima superóxido dismutase (SOD), presente no citoplasma de todas as células e que catalisa a conversão de dois radicais, superóxido e peróxido de hidrogénio, reduzindo a toxicidade das espécies reativas de oxigênio (EROs) (KOURY; DONANGELO, 2003). A vitamina A e o zinco possuem uma relação simbiótica e isso ocorre pelo fato de o zinco ser um oligoelemento essencial no desempenho da função da proteína transportadora do retinol (RBP) durante o transporte da vitamina A para os tecidos-alvo. Logo, algumas questões clínicas que são descritas como carência de vitamina A podem também associar-se à deficiência de zinco (COZZOLINO, 1997). Outra ação atribuída ao zinco associa-se ao estímulo pós-receptor da glicose, que aumenta a translocação dos transportadores desse monossacarídeo dos seus sítios intracelulares para a membrana plasmática. Esse mineral melhora a interação entre os hormônios e seus receptores, como observado no hormônio de crescimento e prolactina. A importância do zinco ainda ocorre no sistema imunológico, uma vez que a timulina, hormônio importante para maturação e diferenciação de linfócitos T, tem a sua atividade biológica dependente do zinco (MAFRA; COZZOLINO, 2004). O zinco afeta o sistema imune por meio de mais alguns mecanismos, pois exerce papel extenso sobre a estabilidade da membrana dos linfócitos, assim como sobre diferentes enzimas. Influi diretamente sobre as células imunes, aumentando a atividade das enzimas DNA e RNA polimerase, que são necessárias para replicação e transcrição de DNA (KOURY; PERES, 2006). É essencial também para a síntese proteica e para o crescimento principalmente em adolescentes, momento da vida no qual esse nutriente torna-se fundamental por sua atuação na divisão celular e na maturação sexual. A partir de todas essas explicações, é possível verificar a versatilidade desse mineral e suas inúmeras aplicabilidades e sua importância no metabolismo humano. 29 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES 2.2.1 Metabolismo: digestão, absorção, transporte, utilização, excreção e armazenamento Presente na dieta de forma associada a moléculas orgânicas (proteínas, fitatos e carboidratos) ou na forma de sais inorgânicos (suplementos ou alimentos fortificados), o zinco só é absorvido passivamente, no duodeno e jejuno, na proporção de 10% a 40% da ingestão oral. Parte do processo ocorre por difusão facilitada por carreadores localizados na borda em escova do enterócito (metalotioneína citoplasmática); a presença de glicose no lúmen intestinal auxilia essa captação. Durante a digestão ocorre degradação das moléculas orgânicas e dissociação dos sais inorgânicos, liberando o mineral de seu composto original. Após liberar-se dos alimentos, forma complexos com ligantes endógenos e exógenos, como a histidina, ácido cítrico, as prostaglandinas, os fosfatos e o ácido picolínico, passando para a corrente sanguínea por transporte ativo e combinando-se com a albumina, seu principal transportador, e aminoácidos no teor de 55% e macroglobulinas no teor de 40% (MAFRA; COZZOLINO, 2004). O zinco absorvido é transportado para o fígado (onde fica armazenado) via albumina, e a partir daí para outros tecidos. Sua excreção é feita pela urina (MAFRA; COZZOLINO, 2004). A deficiência de zinco está associada ao aumento da mortalidade, aumento da morbidade e gravidade das enfermidades infecciosas, déficit de crescimento, alterações fisiológicas (anorexia, hipogonadismo, hipogeusia, dermatites, modificações do sistema imune, danos oxidativos e neuropsicológicos) e comprometimento da capacidade cognitiva. Sua deficiência provoca retardo no crescimento, falta de apetite, lesões cutâneas e alterações de comportamento; com relação à ingestão excessiva (mais de 4 gramas), sintomas como náusea, vômitos, diarreia e letargia podem acontecer, sendo que essa quantidade de mineral é consumida via suplementos. Os níveis plasmáticos de zinco são regulados a partir de um ajuste fino e podem ser afetados pelo ciclo circadiano, stress, infeção, jejum prolongado e níveis séricos das proteínas plasmáticas. O zinco sérico, portanto, não é um indicador muito sensível para a deficiência marginal de zinco, mas é utilizado como indicador em estudos epidemiológicos e pode detectar a deficiência grave do elemento (WOOD, 2000). O zinco é eliminado do organismo por meio dos rins, da pele e do intestino.As perdas endógenas intestinais podem variar de 0,5 mg/dia a 3,0 mg/dia. Sob condições normais, 95% do zinco da fração filtrável do plasma é reabsorvido na parte distal do túbulo renal. As perdas urinárias variam de 300-600 mg/dia, influenciadas por mecanismos de secreção no túbulo proximal do néfron (MAFRA; COZZOLINO, 2004). Uma forma de avaliar a biodisponibilidade de minerais é reconhecendo as razões molares entre esses e o fitato, nos alimentos e em dietas. A seguir iremos verificar algumas razões entre fitato e alguns minerais, bem como o impacto que geram no campo da biodisponibilidade; uma dieta com razão molar AF:Zn acima de 15 apresenta baixa biodisponibilidade de Zn (10% a 15%), entre 5 e 15 apresenta média biodisponibilidade de Zn (30% a 35%) e abaixo de 5 apresenta alta biodisponibilidade (SIQUEIRA; MENDES; ARRUDA, 2007). 30 Unidade I Outros minerais também possuem essa razão predefinida, como o cálcio e o ferro. AF:cálcio (Ca) igual a 1,56 tem como desfecho o comprometimento na absorção do íon Ca, e dietas com razão molar AF:ferro (Fe) superior a 14 comprometem a biodisponibilidade desses minerais (SIQUEIRA; MENDES; ARRUDA, 2007). A tabela a seguir demonstra os valores recomendados de ingestão, de acordo com faixa etária e gênero. Tabela 3 – Ingestão dietética de referência (DRI) para o zinco de acordo com os valores propostos pelo IOM, segundo a idade e o gênero Idade EAR RDA UL Homens Mulheres Homens Mulheres 0-6 meses 2,0* 2,0* 4,0 7-12 meses 2,5 2,5 3,0 3,0 5,0 1-3 anos 2,5 2,5 3,0 3,0 7,0 4-8 anos 4,0 4,0 5,0 5,0 12,0 9-13 7,0 7,0 8,0 8,0 23,0 14-18 anos 8,5 7,3 11,0 9,0 34,0 19-50 anos 9,4 6,8 11,0 8,0 40,0 ≥ 51 anos 9,4 6,8 11,0 8,0 40,0 Gestante (14-18 anos) – 10,5 – 12,0 34,0 Gestante (19-50 anos) – 9,5 – 11,0 40,0 Lactante (14-18 anos) – 10,9 – 13,0 34,0 Lactante (19-50 anos) – 10,4 – 12,0 40,0 *AI = Ingestão adequada: é utilizada quando não há dados suficientes para estabelecer a RDA. EAR = Necessidade média estimada: é o valor de ingestão diária que se estima que supra a necessidade de metade (50%) dos indivíduos saudáveis de um determinado grupo. RDA = Ingestão dietética recomendada: é o nível de ingestão dietética diária que é suficiente para atender as necessidades de praticamente todos (97% a 98%) os indivíduos saudáveis de um determinado grupo. UL = Limite superior tolerável de ingestão: é o valor mais alto de ingestão diária continuada que aparentemente não oferece nenhum efeito adverso à saúde em quase todos os indivíduos. Fonte: Cozzolino, Reis e Silva (2016, p. 743). Esses valores foram identificados com base no raciocínio da figura a seguir, que leva em consideração não apenas as necessidades fisiológicas do zinco, mas também o nosso potencial de aproveitamento e as perdas diárias do mineral (COZZOLINO; REIS; SILVA, 2016). Na figura a seguir fica claro que a necessidade fisiológica do zinco recebe influência direta das perdas diárias endógenas, associadas ao zinco necessário para a deposição nos tecidos, culminando na fração do zinco que deverá ser aproveitada para a manutenção da homeostase. 31 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Perdas diárias de zinco endógeno (mg/dia) Zinco necessário para deposição de tecido (mg/dia) Necessidade fisiológica (mg/dia) Fração do zinco absorvido Fração do zinco absorvido Figura 5 – Informações utilizadas para o cálculo das necessidades diárias de ingestão de zinco Fonte: Cozzolino, Reis e Silva (2016, p. 741). 2.2.2 Fatores que interferem na biodisponibilidade (processamento do alimento, características genéticas, doenças, ciclo da vida, interações alimento-nutriente, nutriente-nutriente, droga-nutriente, álcool, tabaco, entre outros) As principais fontes alimentares do zinco são as ostras, camarão, carne bovina, de frango e de peixe e fígado. Outras fontes são o gérmen de trigo, os grãos integrais, as castanhas, os cereais, os legumes e tubérculos como a batata e a mandioca. Considerando que a presença do nutriente no alimento não se associa diretamente ao seu adequado aproveitamento, é importante explorarmos alguns fatores que podem alterar positiva ou negativamente a proporção em que o zinco será aproveitado pelo organismo humano (MAFRA; COZZOLINO, 2004). As boas fontes de zinco não contêm constituintes químicos que inibem a absorção do zinco, e, além disso, a presença de alguns aminoácidos, como cisteína e histidina, melhoram a sua solubilidade (MAFRA; COZZOLINO, 2004). Os alimentos com grande quantidade de ácido fítico em sua composição reduzem a biodisponibilidade de zinco e a razão molar fitato:Zn de 20 já é suficiente para produzir efeito negativo, com todos os cátions bivalentes (MAFRA; COZZOLINO, 2004). Cozzolino, Reis e Silva (2016) demonstraram, por meio da citação do Institute of Medicine (IOM) e do International Zinc Nutrition Consultative Group (IZiNCG), um critério de avaliação qualitativa do zinco que explora essa relação do mineral com o ácido fítico e consequente formação do complexo de baixa solubilidade chamado de fitato. Observe a tabela a seguir: 32 Unidade I Tabela 4 – Avaliação qualitativa da biodisponibilidade de zinco na dieta de acordo com as suas características e a razão molar fitato/zinco Biodisponibilidade Pontos de corte e características da dieta IOM (2006) IZiNCG (2004) Alta Dietas baseadas em cereais refinados, pobres em fibras e ácido fítico, com quantidade adequada de proteína animal Razão molar fitato/zinco < 5 Dietas baseadas em cereais refinados Razão molar fitato/zinco ≤ 18 Média Dietas mistas que contêm proteína animal e dietas vegetarianas não baseadas em cereais integrais Razão molar fitato/zinco 5-15 * Baixa Dietas baseadas em cereais integrais (> 50% da energia proveniente de cereais integrais) e baixa ingestão de proteína animal. Alta ingestão de cálcio inorgânico (> 1 g/dia) Razão molar fitato/zinco > 15 Dietas baseadas em cereais integrais (> 50% da energia proveniente de cereais integrais ou legumes e baixa ingestão de proteína animal) Razão molar fitato/zinco > 18 * O IZiNCG não considera dietas com média biodisponibilidade de zinco. Fonte: Cozzolino, Reis e Silva (2016, p. 742). A interação cobre-zinco é antagônica, uma vez que concentrações elevadas de zinco induzem o aumento na síntese de metalotioneína, proteína que também tem afinidade pelo cobre, retendo-o nos enterócitos. Em dietas vegetarianas, ocorre uma redução no fornecimento e na disponibilidade de zinco, pela característica per si do padrão dietético; porém, principalmente no caso da gestação, o Instituto de Medicina (IOM) recomenda o aumento em 50% nas recomendações para suprir essa característica (CAMPANELLI; VIEIRA; JAPUR, 2007). Lembrete Vamos relembrar como ocorre o transporte ativo, transporte passivo e a difusão facilitada: No transporte passivo, os elementos transportados se movem na direção ou a favor de um gradiente de concentração (do meio de maior concentração para o de menor), sem gasto de energia ou ocorrência de acúmulo. O transporte ativo ocorre contra o gradiente de concentração; logo, apresenta gasto de energia e envolve a enzima ATPase Na+ K+, que acopla a quebra de adenosina trifosfato (ATP) com a movimentação simultânea dos eletrólitos envolvidos para o ambiente intracelular (potássio) e extracelular (sódio). A difusão facilitada possui características similares ao transporte ativo; porém, conta com uma proteína transmembrana que acelera e facilita o processo de absorção, embora sem gasto de energia. 33 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Saiba mais O artigo a seguir apresenta mais informações sobre o zinco. MAFRA, D.; COZZOLINO, S. M. F. Importância do zinco na nutrição humana. Revista de Nutrição, Campinas, v. 17, n. 1, p. 79-87, mar. 2004. 3 BIODISPONIBILIDADE DE VITAMINA D, CÁLCIO E FÓSFORO 3.1 Cálcio e fósforo: nomenclatura, estrutura química e função O cálcio é o mineral mais abundante no corpo humano e estápresente em concentrações em torno de 1000 g a 1200 g; existe no organismo quase que completamente na matriz óssea (99%), dentro de cristais integrados à molécula de colágeno, e o outro 1% está presente nos fluidos extra e intracelulares. Essencial para a mineralização de ossos e dentes e para a regulação de eventos intracelulares em diversos tecidos, suas ações relacionam-se à formação óssea, à coagulação e à função neuromuscular (AWUMEY; BUKOSKI, 2005). O cálcio presente na fração mineral dos ossos e dentes encontra-se sob a forma de cristais de hidroxiapatita [Ca10(PO4)6(OH)2], estrutura que garante a característica de sustentação associada ao esqueleto. Do total de cálcio presente no organismo humano, 1% está distribuído no sangue, fluido extracelular e tecidos moles, sendo que 50% desse encontra-se na forma ionizada (fração biologicamente ativa), 40% ligado a proteínas não difundíveis, principalmente albumina (fração biologicamente inativa) e os 10% restantes sob a forma de complexos com íons fosfato e citrato (MORAIS; COMINETTI; COZZOLINO, 2016b). Cálcio ingerido Cálcio urinário Absorção passiva Secreção endógena Cálcio fecal Cálcio sanguíneo Calcitriol Calcitonina Rim PTH calcitriol PTH calcitriol Calcitonina Osso Absorção ativa Vitamina D Delgado Intestino Grosso Figura 6 – Regulação dos níveis de cálcio no sangue e em tecidos Fonte: Silva, Pires e Cozzolino (2016, p. 615). 34 Unidade I Assim como o cálcio, o fósforo é um elemento abundante na matriz óssea, embora no organismo a maior parte desse mineral não se encontre mineralizado nos tecidos, mas sim disponível na forma de fosfato inorgânico, a forma livre, ou orgânico, a forma covalentemente ligada a açúcares, proteínas e outros componentes celulares (MORAIS; COMINETTI; COZZOLINO, 2016b). A forma inorgânica é altamente ionizável e facilmente difusível através das membranas celulares; foi isolado em 1769, pelo químico sueco Carl Scheele, quando este descobriu que o elemento é um dos constituintes do osso, desenvolvendo um método mais simples para sua extração, originado de um processo semelhante à pasteurização (MORAIS; COMINETTI; COZZOLINO, 2016b). O conteúdo de fósforo corporal total varia de 600 g a 900 g, que correspondem a cerca de 0,8% a 1,1% do peso corporal total no indivíduo adulto. Desse total, 85% está presente junto ao cálcio na estrutura mineral de ossos e dentes, enquanto o restante está, em sua maioria, localizado nos tecidos moles e em menor proporção no líquido extracelular, sendo que esse constitui-se em apenas 1%. A concentração de fósforo nos tecidos varia de 0,25 mmol a 0,65 mmol (7,8 mg/g a 20,2 mg/g de proteína). Para a adequada manutenção dos níveis circulantes e estoques corporais destes minerais e vitamina, é essencial o consumo de seus alimentos fontes, de forma a atender às recomendações nutricionais. Observe as tabelas a seguir: Tabela 5 – Ingestões de referência para o cálcio, para recém-nascidos, crianças e meninos até 13 anos Estágio de vida AI EAR RDA UL Recém-nascidos 0-6 meses 6-12 meses 200 mg 260 mg – – – 1.000 mg 1.500 mg Crianças 1-3 anos 4-8 anos – 500 mg 800 mg 700 mg 1.000 mg 2.500 mg 2.500 mg Homens 9-13 anos 14-18 anos 19-30 anos 31-50 anos 51-70 anos > 70 anos – 1.100 mg 1.100 mg 800 mg 800 mg 800 mg 1.000 mg 1.300 mg 1.300 mg 1.000 mg 1.000 mg 1.200 mg 1.200 mg 3.000 mg 3.000 mg 2.500 mg 2.500 mg 2.000 mg 2.000 mg Mulheres 9-13 anos 14-18 anos 19-30 anos 31-50 anos 51-70 anos > 70 anos – 1.100 mg 1.100 mg 800 mg 800 mg 800 mg 1.000 mg 1.300 mg 1.300 mg 1.000 mg 1.000 mg 1.200 mg 1.200 mg 3.000 mg 3.000 mg 2.500 mg 2.500 mg 2.000 mg 2.000 mg 35 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES Estágio de vida AI EAR RDA UL Gestantes 14-18 anos 19-30 anos 31-50 anos – 1.100 mg 800 mg 800 mg 1.300 mg 1.000 mg 1.000 mg 3.000 mg 2.500mg 2.500 mg Lactantes 14-18 anos 19-30 anos 31-50 anos – – 1.100 mg 800 mg 800 mg 1.300 mg 1.000 mg 1.000 mg 3.000 mg 2.500mg 2.500 mg AI = Ingestão adequada; EAR = Necessidade média estimada; RDA = Ingestão dietética recomendada; UL = Limite superior tolerável de ingestão. Fonte: Morais, Cominetti e Cozzolino (2016b, p. 621). Conforme mencionado, ocorrem ajustes corporais a partir dos estágios de vida; no caso da lactação, os valores recomendados de cálcio se elevam para favorecer o enriquecimento do leite materno, nesse caso um nutriente altamente biodisponível nesse alimento. Tabela 6 – Ingestão de referência para o fósforo Estágio de vida EAR (mg/dia) RDA (mg/dia) UL (g/dia) AI (mg/dia) Recém-nascidos 0-6 meses 6-12 meses – – –– –– 100 275 Crianças e adolescentes 1-3 anos 4-8 anos 9-13 anos 14-18 anos 380 405 1.055 1.055 460 500 1.250 1.250 3 3 4 – – – – Adultos 19-30 anos 31-50 anos 51-70 anos > 70 anos 580 580 580 580 700 700 700 700 4 4 4 3 –––– Gestantes ≥ 18 anos 19-30 anos 31-50 anos 1.055 580 580 1.250 700 700 3,5 3,5 3,5 ––– Lactantes ≥ 18 anos 19-30 anos 31-50 anos 1.055 580 580 1.250 700 700 4 4 4 ––– AI = Ingestão adequada; EAR = Necessidade média estimada; RDA = Ingestão dietética recomendada; UL = Limite superior tolerável de ingestão. Fonte: Morais, Cominetti e Cozzolino (2016b, p. 650). 36 Unidade I O fósforo exerce papel estrutural, uma vez que está presente na composição da membrana celular por meio de sua combinação com lipídios, formando os fosfolipídios, que são lipídios constituídos por uma molécula de glicerol, duas cadeias de ácidos graxos (uma saturada e uma insaturada), um grupo fosfato e uma molécula polar ligada a ele. O esqueleto é o seu principal reservatório desses minerais no organismo, uma vez que abriga, juntamente com os dentes, entre 85% e 99% do total de fósforo e cálcio, respectivamente (SILVA; COZZOLINO, 2016). Podemos encontrar o elemento fósforo no ácido fítico, também chamado de mio-inositol hexafosfato, cuja figura pode ser verificada a seguir. O O O P O O O O R R R R R R OHHO R = * Figura 7 – Estrutura química do ácido fítico Disponível em: https://bit.ly/3rCrDSm. Acesso em: 23 jul. 2021. Considerado um elemento de reserva energética, visto que o fosfato está presente na molécula de adenosina trifosfato (ATP) – principal elemento do metabolismo energético –, apresenta também a capacidade de se associar com metais divalentes (cálcio, ferro, zinco), formando um complexo de baixa solubilidade. Isso acarreta impacto negativo na solubilidade e na biodisponibilidade desses minerais. Para a dissolução dos complexos formados, temos a necessidade de integridade intestinal e consequente secreção das enzimas fitases intestinais, responsáveis pela degradação do ácido fítico (FRANK, 2013). Dando continuidade à discussão sobre os nutrientes em específico, a vitamina D (calciferol), por muitos considerada um pró-hormônio, é sintetizada na pele por via não enzimática, a partir do aquecimento causado pela exposição aos raios UV – radiação B; porém, se a exposição não for suficiente ou adequada, essa vitamina deverá ser suplementada (COZZOLINO, 1997). As formas de vitamina D presentes na natureza são ergocalciferol (D2) e colecalciferol (D3). Porém, para que ela se torne ativa metabolicamente, precisará passar por algumas etapas metabólicas para se transformar em seu metabólito ativo, que é 1,25 (OH)2D3-1,25 dihidroxicolecalciferol, conhecido como calcitriol. 37 NUTRIÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES H3C CH3 CH3 CH3 CH2 Vitamina D2HO CH3 H H H3C CH3 CH3 CH3 CH2 Vitamina D3HO CH2 H H Figura 8 – Estrutura química do ergocalciferol (vitamina D2) e do colecalciferol (vitamina D3) Fonte: Peters e Martini (2014, p. 574). Podemos considerar que o sistema endocrinológico vitamina D é constituído por um grupo de moléculas derivadas do 7-deidrocolesterol, incluindo os precursores da forma ativa e metabólitos, sua proteína transportadora (DBP), seu receptor nuclear (VDR) e as enzimas do complexo do citocromo P450 envolvidas nos processos de ativação
Compartilhar