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O Estado de contrainsegurança com coro eleitoral na América Latina Osorio

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23/08/2022 14:43 O Estado de contrainsegurança com coro eleitoral na América Latina – Observatório do Estado Latino-Americano | ODELA
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O Estado de
contrainsegurança com coro
eleitoral na América Latina
POR ODELA / EM 7 DE SETEMBRO DE 2020
Por Jaime Osorio*
Introdução
Nas análises do Estado no capitalismo dependente se
cometem os mesmos erros que estão presentes quando se
analisam as economias da região. Sustenta-se que o Estado
é imaturo; que sofre de uma falta de desenvolvimento,
porque suas instituições se apresentam débeis ou com
pouca estabilidade; que existiria um Estado de Direito frágil
ou simplesmente a uma ausência de leis.
Em posições mais extremas se assume que não existe um
Estado, seja pela imaturidade do fenômeno estatal; ou
porque não haveria uma nação e, portanto, não existiria um
Estado-nação, senão uma dispersão de nações sem alguma
integração; ou porque a comunidade política não teria se
constituído, ou uma vez conformada, teria sido destruída
pela voracidade do capital.
Em alguns casos há uma incompreensão da originalidade do
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capitalismo dependente, sem diferenciar os espaços
nacionais de domínio e poder que estão presentes no
sistema mundial capitalista. Em outros casos, que se somam
ao anterior, prevalece uma concepção do Estado que
privilegia o sentido de comunidade sobre as relações de
poder e de domínio de classes. Em qualquer caso, as
análises são levadas a cabo tendo como parâmetro as
formas, modalidades e processos que apresentam os
Estados do capitalismo desenvolvido.
Aqui argumentaremos desde uma perspectiva diferente. No
capitalismo dependente existe o Estado, e suas formas e
operações são maduras e são as possíveis nesta forma de
capitalismo. O elemento fundamental que outorga sentido
ao Estado é constituído pelas relações de poder e domínio
de classes sociais, seus conflitos e lutas, assim como o
sentido de comunidade possível de se gerar nessas
condições.
Nos interessa nesse escrito precisar o tipo de crise político-
estatal que se vive atualmente na América Latina. Para isso,
nos deteremos em certas determinações do Estado
dependente. A partir dessa base consideraremos as
mudanças nas correlações de força entre capital e trabalho
ao nível do sistema mundial e regional, que permitiram ao
capital uma feroz ofensiva sobre o mundo do trabalho, e que
tomou a forma de ditaduras militares e de Estados de
contrainsurgência nessa região nos anos setenta e oitenta. A
rápida reanimação dos movimentos populares – e aberto o
período caracterizado como de transição democrática -,
permitiu a emergência de governos populares e de governos
progressistas. Analisamos as razões de seu
enfraquecimento, assim como do esgotamento da forma de
governo aberta com aquela transição, e que levou à
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conformação de uma nova forma de governo: o Estado de
contrainsegurança com coro eleitoral, destacando suas
características e objetivos. Por último realizaremos algumas
considerações sobre o triunfo de López Obrador nas eleições
presidenciais no México, em julho passado[1], e as razões
que explicam um projeto a contrapelo das tendências
predominantes na região.
1. Determinações do Estado
1.1. O Estado como condensação das relações sociais de
domínio e poder de classes 
O capital é uma relação social que articula de maneira
simultânea as relações sociais de exploração e as relações
sociais de domínio e poder. Assim como não é possível
compreender a exploração sem considerar as relações
políticas de dominação e poder – que permitem o
surgimento de grupos sociais despojados dos meios de
produção e dos meios de vida, através da violência, da
coerção e do domínio de classes –, da mesma forma não é
possível explicar as relações de domínio e poder
condensadas no Estado de modo alheio às relações sociais
de exploração, processos que o capital, como já destacamos,
busca velar.
As relações sociais de exploração e domínio entre capital e
trabalho conformam as classes sociais, com interesses em
conflito, e que determinam a vida em comum e suas diversas
dimensões no capitalismo. Não é por casualidade, neste
sentido, que o último capítulo de “O Capital”, inconcluso é
certo, seja justamente sobre “As classes”. (Marx. 1973, t. III,
817). Com esse tema buscava terminar os primeiros livros,
conforme assinalado em seus planos de trabalho de 1857, e
que seria, ao mesmo tempo, a ponte para o livro seguinte,
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que trataria justamente do Estado (Marx: 1971, t. I, 29-30,
203-204).
Por sobre esta estruturação das relações, o Estado capitalista
pode “se retirar” da cena imediata da exploração, podendo
se apresentar como uma entidade que está acima da
sociedade. Não é necessário que a polícia acorde e
encaminhe os trabalhadores aos seus postos de trabalho,
esses o farão por decisão pessoal, marcada pelo despojo dos
meios de produção e de vida. Como também não é
necessário que a polícia vigie a produção e a apropriação da
mais-valia, oculta no pagamento do salário, que aparece
como o pagamento de todo o trabalho. Desta forma, o
Estado pode aparecer alheio à exploração, o que, por sua
vez, mistificará o poder e a dominação de classes sobre
classes[2]. 
Não há espaço teórico e nem histórico para posicionar o
Estado em uma dimensão exterior às classes sociais e aos
seus enfrentamentos, que não seja na forma mistificada que
aquele assume no capitalismo. Há que explicar tais
mistificações, mas tal explicação não pode partir eliminando
ou secundarizando o fundamento de sua natureza, sua
condensação das relações de poder e domínio de classes e
de comunidade ilusória[3]. E é a condensação das relações e
dos projetos e interesses de classes que nessas relações
predominam os que conferem ao Estado a organização da
vida comum sua marca particular.
Dizer que a forma-valor é a que predomina em nosso
mundo social, mas sem as referências de classe que isso
implica, é tratar de abstrações, mas ficando atrelados a elas,
sem ponderar o peso que as mistificações de classes
expressam. A partir das classes sociais a vida em comum
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alcança sentido, integrando e desmistificando aquilo que o
capital desintegra e mistifica.
1.2. ‘Quem detêm o poder político?’ e ‘como se exerce esse
poder?’ 
A análise do Estado não pode evitar a interrogação a respeito
de quem detêm o poder político, quer dizer, quais são os
interesses de classe que organizam a vida em comum. A
resposta comum de que é a burguesia ou o capital, é
demasiado genérica quando se considera que essa classe
conta com frações de classe (bancária/financeira, industrial,
agrária, mineira, comercial) e com setores (grande, médio ou
pequeno capital). A resposta deve ser capaz de identificar
quais os interesses das frações e/ou dos setoresda
burguesia que prevalecem em situações históricas
específicas, em que as políticas estatais tendem a favorecer
mais a alguns capitais em detrimento de outros. O que
requer compreender como se conforma o bloco no poder,
isto é, quais frações e/ou setores da burguesia contam com
vantagens para impulsionar seus projetos, e quais
hegemonizam o poder político.
Mas tão importante quanto a pergunta anterior é especificar
também como se exerce o poder, isto é, qual é a forma de
Estado ou a forma de governo que prevalece, em que sentido
determinar se domina por meio de votos ou por meio de
baionetas, e com qual relevância; se existe parlamento e
divisão de poderes; se existe ou não imprensa e meios de
comunicação com autonomia ou se estão controlados; se
operam mecanismos de representação; o peso dos aparatos
armados na vida pública, etc.
As perguntas sobre quem detêm o poder e como se exerce
tal poder se encontram estreitamente associadas. Até o final
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do século XX e início do século XXI o tema da “transição
democrática” se constituiu no eixo de debates e análises
políticas na América Latina. Mas nessa caracterização se
privilegiava apenas uma das interrogações referidas, de
como se exerce o poder. E a multiplicação de consultas
eleitorais estimulou uma visão distorcida que daria passo,
posteriormente, aos estudos sobre a “qualidade da
democracia”, dando por definido que esta já estava
instaurada na região.
Ao dissociar o ‘como se exerce o poder’ da pergunta de
‘quem detêm o poder’, não se ponderou que as próprias
forças sociais e/ou políticas que em momentos prévios
reivindicaram e promoveram ditaduras militares ou governos
civis autoritários contrainsurgentes, eram as mesmas que
agora reivindicavam ou participavam do discurso da abertura
democrática. E que as políticas econômicas que
impulsionaram muitos dos novos governos civis (que não
inclui os chamados governos populares) eram as mesmas
que prevaleceram nos governos militares ou
contrainsurgentes. Em poucas palavras, ao não integrar as
perguntas não se contou com ferramentas para compreender
os limites da democratização em marcha, nem os interesses
de classe que terminaram marcando esses processos.
1.3. Estado e aparato de Estado 
A mistificação das relações de poder e domínio de classes
que implica a forma de Estado, se vê alimentada pela
coisificação de tais relações, assumindo a forma de aparato
de Estado, um conjunto articulado e hierarquizado de
“coisas”, como instituições, corpo de funcionários que
ocupam posições nessas instituições e um corpo de leis.
De modo concreto, a capacidade de mistificação do Estado
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em um aparato de Estado se fortalece. As instituições do
aparato de Estado, o corpo de funcionários que ocupa os
cargos relevantes e os papeis em que se concentram as leis,
não dos dizem que são “coisas” atravessadas por interesses
de classes. Sua linguagem e seu discurso versa, pelo
contrário, sobre os interesses da nação e da sociedade em
seu conjunto.
Não é um assunto menor, no tema da mistificação da vida
social, que a burguesia, em particular, seja a primeira classe
dominante que delegue a administração do aparato de
Estado nas mãos de outras classes. De modo que não é
necessário, em geral, que os membros das classes
dominantes se instalem de maneira direta nos principais
cargos das instituições do aparato de Estado, como postulou
a corrente instrumentalista (Miliband: 1970) para explicar
como que o Estado leva a cabo os interesses das classes
dominantes[4]. É inegável que isso ocorra, mas não se trata
de um procedimento rotineiro. Antes se opera em condições
excepcionais[5].
O fato de que a cada certo tempo as autoridades que
encabeçam o aparato de Estado, e as forças políticas que
representam, podem ser renovadas em consultas eleitorais
por cidadãos e não por classes, alimenta o imaginário que
não subjazem poderes de classe em meio às periódicas
renovações, seja de forças ou figuras políticas. Ademais, o
aparato de Estado permite sem muita mediação que se
identifique as autoridades do aparato como quem detêm o
poder político, com o qual se obscurece justamente a
questão das classes cujo poder político prevalece na
sociedade[6].
Nas eleições e na constante renovação das autoridades do
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aparato de Estado não está em jogo de maneira imediata o
poder político prevalecente na sociedade. Isto nos
demonstra que o aparato de Estado é o aparato de um
Estado específico, com relações de poder e domínio de
classes cuja vigência não se encontra em jogo nos processos
eleitorais.
2. Determinações do Estado dependente
No seio do sistema interestatal mundial, o Estado
dependente é um Estado subsoberano. Isto significa de
imediato que é um poder subordinado a outros poderes
estatais. Tal noção implica romper com a equação da ciência
política tradicional que estabelece “Estado é igual a
soberania”. Esta formulação desconhece a heterogeneidade
econômica e estatal que o capitalismo conforma a nível do
sistema mundial. Por sua vez, implica romper com a ideia de
que carências em matéria de soberania supõem
incapacidades para o exercício do poder político por parte
das classes dominantes locais.
A condição subsoberana do Estado dependente não é senão
a outra face da existência de um sistema mundial em que
operam mecanismos de intercâmbio desigual entre
economias e regiões, que implicam na transferência de valor
desde o capitalismo dependente até o mundo desenvolvido,
pela configuração de uma taxa média de lucro internacional
em que os preços de produção dos bens de exportação das
economias dependentes se localizam abaixo do valor
gerado, enquanto os preços de produção dos bens das
economias desenvolvidas se localizam acima do valor
gerado. Também transferências de valor na mesma direção a
partir da remessa de lucros dos investimentos estrangeiros;
pelo pagamento de juros da dívida pública e privada; pelo
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pagamento de royalties etc., tudo o que dá vida a formas de
capitalismo diferenciadas, sendo a forma do capitalismo
desenvolvido e a forma do capitalismo dependente as mais
relevantes.
As modalidades de inserção no mercado mundial e de
reprodução do capital geradas no capitalismo dependente,
junto às perdas de valor a partir dos mecanismos já
assinalados, exige que as classes dominantes no capitalismo
dependente promovam modalidades de exploração que se
apropriem de parte do fundo de consumo e de vida dos
trabalhadores, para transferir ao fundo de acumulação do
capital. A esta modalidade particular de exploração se
denomina superexploração (Marini: 1973), que se vê
possibilitada pela presença de enormes contingentes de
população excedente, criadas pela própria dinâmica da
acumulação dependente.
O predomínio da superexploração, sob suas diversas formas,
agrava os conflitos sociais e debilita as relações que criam
sentido de comunidade no capitalismo dependente. Esta é
uma das principais razões que explica por que na história
política dos Estados latino-americanos tende a predominar
as formas autoritárias dos mais diversos tipos, e as
dificuldades daquele seassentar, de modo perdurável, em
formas democráticas, ou semidemocráticas, para ser mais
rigoroso. Não é por falta de desenvolvimento político que
isto acontece, senão que é a expressão das formas
particulares de reprodução do capitalismo dependente e das
modalidades de domínio que esse exige.
Em uma economia sustentada na espoliação das condições
básicas de vida para o grosso da população e submetida por
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suas classes dominantes hegemônicas a processos de
desapropriação de valor em direção às economias
desenvolvidas, deriva em um agravamento dos conflitos
sociais e da luta de classes, dado o desenvolvimento das
classes sociais próprias do capitalismo e de seus
enfrentamentos. Nestas condições o Estado dependente
tende a se converter em um elo frágil da cadeia de
dominação mundial do capital, que manifesta de maneira
permanente a atualidade da revolução[7].
O agravamento dos conflitos sociais no capitalismo
dependente e a acentuação da superexploração têm
correlação com o fato do Estado de Direito e o peso das leis
sejam comprometidos e aplicados discricionariamente. As
leis não escritas têm, pelo contrário, um peso significativo
na vida social. As instituições do Estado manifestam
fragilidade, não por imaturidade, senão pelas
particularidades que apresenta a imbricação entre o
econômico e o político. Tudo isso é necessário para
sustentar a condição subsoberana no sistema interestatal, as
particulares formas de exploração no plano local e as
transferências de valor para o capitalismo desenvolvido.
Desta forma, a subsoberania e a superexploração são
suportes da acumulação e do domínio em escala mundial
para o capital.
Ante a fragilidade das instituições do aparato de Estado,
alimentada também pelas recorrentes crises de legitimidade
das autoridades, se produz a tendência a que a classe
reinante assuma maiores espaços de ação. É neste quadro
que no Estado dependente se desenvolvem as condições
para a recorrente emergência de mandos autoritários e de
governos encabeçados por lideranças carismáticas e por
caudilhos políticos.
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O fato de que a reprodução dos capitais mais dinâmicos do
capitalismo dependente realize a mais-valia
predominantemente nos mercados externos ou nos
mercados internos de alto poder aquisitivo, dando as costas
às necessidades da população trabalhadora local, alimenta a
incapacidade das classes dominantes locais de criar projetos
nacionais próprios frente aos poderes que prevalecem no
sistema mundial.
Na mesma lógica opera a enorme presença do capital
estrangeiro nas economias dependentes sob a forma de
investimentos diretos, muitos deles operando em setores
estratégicos, nos distintos padrões de reprodução do capital
que conhecemos. Essa presença não é resultado de
imposições, senão de alianças de setores e camadas locais
das classes dominantes com as burguesias estrangeiras. Isto
propicia ao Estado dependente uma espécie de
descentralização, em que o poder político local deve
contemplar os interesses daqueles capitais, o que redunda
naquilo que já destacamos: a incapacidade das classes
dominantes locais de conformar projetos com uma
perspectiva de desenvolvimento nacional.
Esta limitação das classes que detêm o poder nas economias
dependentes abre constantes fissuras que estimulam a
emergência de forças políticas com projetos que reclamam
maior autonomia nacional e maior soberania, que mesmo
sendo demandas democráticas, nas condições de articulação
das economias dependentes com as economias
desenvolvidas, se constituem em pautas que apontam para
subversão da posição subsoberana no sistema de domínio
mundial.
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A inexistência de estruturas produtivas complexas e a
precoce monopolização da economia em seus diversos
setores, propiciam nas economias dependentes o rápido
surgimento de setores do grande capital, que passam a
predominar na economia e no Estado, reforçando a pobre
diversificação da estrutura produtiva e a baixa diversidade e
força das frações de classes e de setores dominantes.
Ante o peso dos padrões de reprodução do capital
direcionados aos mercados exteriores, na história econômica
regional, prevalece no capitalismo dependente uma espécie
de esquizofrenia política nas classes dominantes da região,
em que frente à necessidade de estar abertas aos mercados
externos e limitar medidas protecionistas, operam
defendendo posições liberais no plano econômico. No
entanto, sustentam posições conservadoras no terreno
político e social. Isto, que já se expressa na segunda metade
do século XIX, segue se apresentado com força desde o
último terço do século XX até os nossos dias, com governos
conservadores no campo político e liberais no econômico,
com fatos relevantes como a presença das ditaduras
militares e governos civis contrainsurgentes. O surgimento
de governo populares e progressistas no século XXI
amenizou esta tendência, que volta a ganhar vida após as
derrotas eleitorais ou pelos golpes brandos que sofreram
esses últimos governos.
3. Mudanças na correlação de forças entre as classes
3.1. Severas derrotas do mundo do trabalho 
Desde a década de setenta do século XX se apresentam uma
série de processos que manifestam e aceleram as mudanças
na correlação de forças a nível mundial e regional, entre o
capital e o trabalho, em prejuízo desse último. Algumas de
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suas expressões mais significativas foram o estabelecimento
de ditaduras militares em grande parte da região sul da
América Latina, e em particular na derrubada do governo de
Salvador Allende no Chile, instaurando o governo
encabeçado pelo general Augusto Pinochet e a imediata
aplicação de políticas econômicas neoliberais.
Também se deve mencionar a implementação de políticas
estatais contrainsurgentes na maioria das sociedades latino-
americanas; o crescente avanço das políticas neoliberais em
outras regiões, promovidas pelos governos de Ronald
Reagan nos Estados Unidos e de Margaret Tatcher na Grã-
Bretanha, neste último caso após uma prolongada greve e da
derrota de poderosos sindicatos mineiros de carvão; a
derrubada da União Soviética e a desintegração do chamado
campo socialista; a constante perda de benefícios sociais,
que colocará fim ao Estado benfeitor na Europa Ocidental e
nos Estados Unidos, e a seus arremedos no capitalismo
dependente latino-americano; mudanças nos processos de
trabalho e avanço da precarização dos empregos; crescente
influência do Banco Mundial, do Fundo Monetário
Internacional e do Banco Central Europeu para impulsionar
políticas de ajuste, com severos golpes aos níveis de renda,
de emprego e de seguridade social da população assalariada
mundial.
É nesse quadro de severa derrota do mundo do trabalho que
o capital põe em marcha novas divisões internacionais do
trabalho, novas revoluções científico-tecnológicas, somado à
baixa de salários, incrementos de jornadas laborais e
instabilidade nos empregos como fórmulas para resolver a
tendência de larga duração à queda da taxa de lucros.
3.2. Seus efeitos no Estado dependente latino-americano 
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Na América Latina, a derrota do mundo do trabalho implicou
na instauração de um novo padrão de reprodução do capital,
o da especialização produtiva sob políticas econômicas
neoliberais, que promoveram a venda de empresas públicas
ao capital privado, nacional e estrangeiro, a retirada de
benefícios sociais, graves rebaixamentos salariais e o
incremento do desemprego, além de reformas trabalhistas
que enfraqueceram aos sindicatos, aumentaram as jornadas
e deterioraram as condições gerais de trabalho.
No terreno político a última década do século XX é um
período dominado pela chamada transição democrática na
América Latina, com a substituição dos governos militares
ou governos civis autoritários por governos civis emanados
das consultas eleitorais, após mudanças e reformas para
acelerar a constituição de novos partidos políticos ou mesmo
da legalização de velhas organizações; criação de padrões
eleitorais, assim como de organismos encarregados de
assegurar a equidade das campanhas.
Este giro, que implicava passar de súdito (menoridade
política) à cidadão (um sujeito de maioridade política), teve
como pano de fundo a busca, pelas autoridades político-
estatais, de uma nova modalidade de legitimidade. Ante o
fim dos benefícios sociais prestados pelo Estado, no auge
neoliberal, as autoridades buscavam agora o reconhecimento
da sociedade ao mando político pela via de torná-la
responsável pelas decisões políticas.
Desde o fim do século XX, mas com maior clareza e força no
início do século XXI, se fez sentir uma inicial recomposição
de diversos setores sociais, decorrentes da repressão
empreendida para aplicar as novas políticas, desde
estudantes, mineiros, povos indígenas, operários,
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desempregados, servidores públicos, professores, etc. A
América Latina viveu nesse tempo um dos períodos mais
convulsivos, expressada nas renúncias, destituição de
autoridades presidenciais e de uma enorme instabilidade
institucional, resultado da promoção de políticas
privatizantes e de ajustes contrários aos interesses do
grosso da população, o que precipitou crescentes
mobilizações.
Umas das expressões desta inicial rearticulação popular foi a
ascensão ao governo de forças políticas criadas no período
recente, contrárias ao avanço das políticas neoliberais e que
reivindicavam políticas mais próximas das necessidades dos
setores populares. Tudo isso acontecia em meio a massivos
protestos e mobilizações. É assim que a América Latina
termina a primeira década do novo século, com pelo menos
três governos populares: de Hugo Chávez na Venezuela, de
Evo Morales na Bolívia e de Rafael Correa no Equador,
definidos assim pela base de apoio que os institui e pelas
políticas e programas que colocam em marcha.
Junto aos chamados governos populares, se constituem por
sua vez, os governos progressistas, que sem a radicalidade
das mobilizações e exigências que deram vida aos primeiros,
reúnem demandas que limitam as agressivas ofensivas dos
capitais hegemônicos, nem sempre com resultados claros no
assunto, e que aplicam inúmeros programas sociais em favor
das camadas mais pobres, de setores operários e da
pequena burguesia assalariada.
Tudo isso se vê favorecido pelo excepcional momento que
vivem as exportações latino-americanas de matérias primas
e alimentos no mercado mundial, durante a primeira década
do século XXI, particularmente estimuladas pela demanda da
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China, economia que vive nesses anos momentos de uma
enorme expansão, e de partes industriais dirigidas aos
Estados Unidos.
Junto aos casos mais emblemáticos dos governos deste tipo,
como os encabeçados por Luís Inácio Lula da Silva no Brasil e
por Néstor e Cristina Kirchner na Argentina, inúmeras outras
forças e figuras políticas com graus muito diferentes em
termos progressistas e que em diferentes tempos triunfaram
no Paraguai, Uruguai, Equador, Chile, Honduras, Panamá e El
Salvador, o que permitiu a criação de uma política com
dimensões regionais, que se propõe a uma maior autonomia
frente aos Estados Unidos, em política exterior e em acordos
comerciais intrarregionais e financeiros[8].
4. Razões do esgotamento político
Não se pode desconhecer o papel que têm desempenhado os
Estados e o capital do mundo desenvolvido no afã de
debilitar, quando não defenestrar os processos políticos
gestados na região durante esse período, aliados aos setores
das classes dominantes locais. A destituição dos presidentes
de Honduras, Paraguai e Brasil, em diferentes tempos, não
estão alheias ao que estamos nos referimos, assim como as
manobras golpistas na Bolívia, Venezuela e Equador.
Também se pôs ênfase no fim do excepcional período
econômico que viveu a região na primeira década deste
século, como um elemento chave para explicar o
enfraquecimento dos governos progressistas e dos governos
populares. Sem desconhecer o significado dos pontos
anteriores, considero que não se outorgou suficiente peso às
razões internas referentes ao que estes governos fizeram e
deixaram de fazer e que alimentaram a sua fragilidade.
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Para o caso dos chamados governos progressistas, e em
particular para os casos do Brasil e da Argentina, um assunto
central está no predomínio de projetos políticos que
privilegiaram a conciliação de classes, isto é, promover
programas sociais para melhorar as condições de vida,
particularmente da população em situação de pobreza,
elevar salários, gerar empregos (com a criação de novas
universidades, entre outras), além de outros benefícios
sociais que favoreceram as classes trabalhadoras e a
pequena burguesia assalariada. Por outro lado, mantendo e
quando não incrementando, no entanto, competências
importantes às frações e setores mais poderosos do capital,
com nenhum ou tímidos projetos de retenção de alguma
quota dos vultuosos lucros que recebiam.
Estes projetos políticos não podiam senão criar fragilidades
para os governos, no curto ou médio prazo, pela dificuldade
de manter o equilíbrio frente às demandas e pressões sociais
contraditórias. Esta razão é a que subjaz à perda de apoio
que sofreram os governos progressistas por parte de alguns
grupos sociais, que terminarão por se agravar quando a
capacidade de sustentar as políticas de equilíbrio se
reduzirem frente à queda dos ingressos captados pelas
exportações.
Se as denúncias por casos de corrupção[9] forem agregadas
à política de conciliação, encontra sentido a desmobilização
e o descontentamento dos setores populares que ocorre
tanto quando o Congresso destitui a presidenta Dilma
Rousseff, no Brasil, como que proporciona a derrota eleitoral
das forças kirchneristas, nas eleições presidenciais na
Argentina. Posteriormente se criaram importantes
mobilizações e protestos, mas isso não permite ocultar o
sintomático isolamento e a desmobilização inicial.
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Quanto aos chamados governos populares, apesar de
diferenças importantes, compartilham debilidadesconsubstanciais a própria concepção do que esses governos
consideram representar e expressar[10]. Existe o erro
comum de assumir o triunfo eleitoral como a conquista do
poder político, ou mesmo como parte de um processo que
se coloca nessa direção, e que se logrará na medida que se
mantenham ditos triunfos e se ganhem maiores posições no
aparato de Estado. Em algum momento se supõe que
produzirá um ponto de bifurcação. E isso acontecerá sem
necessidade de romper com a institucionalidade
imperante[11].
Esta ideia matriz termina por condicionar tudo, tanto que a
acumulação de força social dos dominados precisa se
expressar em força eleitoral e nos tempos que a disputa
eleitoral se estabelece, e deve ainda passar pelos canais
institucionais. Desta forma, as dinâmicas dos movimentos
sociais acabam sendo limitadas a esses tempos e espaços, o
que provoca desgastes, esgotamentos e recuos.
Nestas condições, os setores dominantes travam uma guerra
de desgaste, já que a própria institucionalidade imperante
no aparato de Estado é um território político que entrava o
avanço dos processos e projetos rupturistas. Ninguém pode
ignorar as realizações desses governos. A pergunta chave,
no entanto, é se não contavam com força social suficiente
para tarefas maiores. Porque, ao não lograr tarefas maiores,
pode ter como consequência que muitas das conquistas se
percam sob novas autoridades de governo. É o que acontece
nesse momento no Equador, a partir do triunfo de Lenín
Moreno, seu distanciamento de Rafael Correa e suas
ofensivas contra as conquistas da chamada “revolución
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ciudadana”.
Amarrados à rota estabelecida, o desgaste político dos
governos populares aparece como um caminho previsível. É
neste quadro que incidem a queda dos preços das
exportações e dos recursos dos governos. Mas não está aqui
a razão de fundo de suas debilidades.
Com os recuos e desmobilizações provocadas na região,
resultado dos problemas presentes nos governos
progressistas e populares, não é estranho o avanço eleitoral
e político das forças de direita, que tiraram vantagem dos
espaços concedidos, ou possíveis de arrebatar, assim como
da desagregação e atomização dos amplos setores que
conformavam a antiga força social e a desorientação
propiciada em amplos setores sociais.
5. Em direção ao Estado de constrainsegurança com coro
eleitoral[12]
5.1. Crise da democracia liberal representativa e de seus
arremedos na América Latina 
No mundo desenvolvido, particularmente na Europa Central
e nos Estados Unidos, o triunfo da grande burguesia
produtiva e financeira e seus golpes no mundo do trabalho
levaram a que, em pouco tempo, se apresentasse uma crise
da democracia liberal representativa, forma de governo que
amadurece após a Segunda Guerra. As bases que a tornaram
possível foram resultado de significativas transformações
nos processos de reprodução do capital, a multiplicação da
produtividade e a geração de novos e diversos valores de
uso. Nesse quadro, aumentar o consumo dos trabalhadores
passou a constituir uma necessidade vital para o capitalismo
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desenvolvido, a fim de gerar mercados para a produção de
mais-valia, o que se propiciou a partir do incremento dos
salários, novos benefícios sociais e programas de maior
seguridade social. O chamado Estado benfeitor começava a
tomar forma.
Mas também se encontram razões políticas da maior
relevância neste giro civilizatório do capital no mundo
desenvolvido. A Segunda Guerra implicou um avanço
inesperado do socialismo real em termos territoriais. Uma
faixa nada desprezível da Europa Oriental passou a formar
parte da União Soviética, ao passo que, na China, a revolução
dava um salto significativo em seu poderio com a primeira
explosão atômica, em 1947.
Frente a estas ameaças, as classes dominantes da Europa
Ocidental e dos Estados Unidos tiveram que incrementar os
programas sociais e a renda de sua população trabalhadora,
sobre bases que eram compatíveis com a reprodução
capitalista, a fim de diminuir os perigos que a classe
trabalhadora fosse conquistada pelos discursos da revolução
e do socialismo. Mas esse período chegou ao seu fim com a
acirrada guerra de classes que o capital desatou nas últimas
quatro ou cinco décadas em todo o mundo, após a queda da
taxa de lucros e a posterior derrubada do campo socialista, o
que promoveu uma radical deterioração das condições de
trabalho, de seguridade e de vida para o grosso da
população trabalhadora, processo que ainda prossegue e
que faz da precarização trabalhista a norma, em meio a um
novo reordenamento do sistema capitalista mundial.
A estes elementos se agrega a expansão da acumulação pela
via de atividades ilegais e a multiplicação do dinheiro sujo
em todo o sistema, propiciando que as fronteiras com a
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reprodução legal do capital se faça cada vez mais difusa[13].
Neste terreno minado, a classe reinante e a classe política
não escapam à decomposição imperante, oferecendo
sustentação para a imbricação das operações legais e ilegais,
favorecendo os processos de corrupção de todo o tipo, em
que estão envolvidos desde os altos escalões do aparato
estatal e funcionários de todos os níveis.
Tudo isso tem provocado uma desconfiança crescente em
relação aos funcionários que administram o aparato de
Estado e com os dirigentes políticos, propiciando uma crise
de legitimidade da autoridade política, outra maneira que se
expressa a crise da forma de governo. Além disso se
acrescenta que os partidos políticos, como instância de
representação, têm se debilitado, quando não fragmentado,
tendendo a se converter em espaços de grupos de poder,
burocratas e funcionários, cada vez mais preocupados com
os seus negócios com recursos públicos.
Não há território em que vige a democracia liberal
representativa ou um arremedo de democracia na América
Latina, que não tenha sido golpeado e debilitado,
promovendo o desencanto de camadas crescentes da
população com a política. Todos estes elementos se fazem
presentes também na crise político-estatal das sociedades
do capitalismo dependente. Exceto que nestas sociedades, a
rigor, não se pode falar de uma crise da democracia liberal
representativa, porque simplesmente esta forma de governo
somente alcançou se apresentar na região sob a forma de
arremedos e sombras. 
E muitos das características da crise político-estatal da
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democracia liberal representativa encontram maior
agravamento na organização política do capitalismo
dependente, como a corrupção de funcionários públicos e a
difusa fronteira entre classe reinante, classe política e
aquelas porções do capital que se reproduz a partir de
operações ilegais. A Odebrecht se converteu justamente no
paradigma da corrupção e degradação de setores do grande
capital e de altos funcionários públicos na região, neste
caso, para ganhar substanciais licitações públicas. Esse tipo
de corrupção está associado à impunidade do alto escalão
do aparato de Estado.
5.2. O Estado de contrainsegurança com coro eleitoral: uma
resposta para a crise[14] 
A crise dos arremedos de democracia na região, adestituição dos presidentes em Honduras (2009), Paraguai
(2012) e Brasil (2016) por meio de golpes brandos, a crise
dos governos populares na Venezuela e Bolívia, cada vez
mais cercadas por mobilizações internas e pelo assédio
internacional, e inclusive a ascensão de Maurício Macri à
presidência da Argentina, em um processo de avassalamento
midiático, econômico e judicial contra o governo anterior
(Beinstein: 2018), expressam que o período aberto pela
denominada “transição democrática” chegou ao seu final na
região, e que assistimos a uma reconfiguração das formas
de governo que emergiram daquele processo, com a
instauração de uma nova forma, o Estado de
contrainsegurança com coro eleitoral.
Uma das razões que explicam a força com que amadurece
esta nova forma de governo na segunda década do século
XXI, e que já apresenta antecedentes na década passada, tem
relação com um novo estágio de desenvolvimento da fração
burguesa produtora e exportadora de matérias primas,
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alimentos e de partes industriais ligadas às indústrias
automotora e eletrônica e às montadoras, assim como da
fração bancária e financeira, ambas em estreita relação com
capitais estrangeiros, resultado da enorme expansão de suas
atividades e de ingressos na primeira década do século
atual.
O Estado de contrainsegurança com coro eleitoral é
resultado também dos embates daquelas frações e do capital
internacional que investe na região contra as políticas sociais
dos governos populares e progressistas, o que leva o
conjunto do capital a redobrar os esforços para recuperar a
gestão do aparato de Estado, buscando colocar fim àqueles
governos e a reforçar em toda região as políticas de
segurança. Tais políticas são concebidas em um sentido
amplo, não somente para fazer frente ao crime organizado
ou à delinquência, senão também, às forças sociais,
organizações e líderes que questionam as políticas do
capital. Assim, trata-se de uma resposta às exigências
econômicas e políticas do capital, o que impõem novas
derrotas do mundo do trabalho e dos setores populares.
Nesta nova forma de governo se mantem as consultas
eleitorais, mas sob procedimentos de maior controle, seja
das forças que participam, dos candidatos e dos seus
resultados[15], para reduzir os perigos de uma surpresa
como os governos populares e os progressistas. Isto exige
derrubar a credibilidade e por fim político às organizações
que ameaçam a paz social e eleitoral que os grandes capitais
exigem. Também destruir – quando não eliminar[16] – a
líderes sociais e políticos que possam encabeçar respostas
de massas. A possível “eliminação” de Lula da Silva das urnas
para eleição à presidência do Brasil é parte dessa nova
lógica, como foram as destituições dos presidentes; de igual
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forma pode se interpretar a poderosa ofensiva midiática de
desprestígio que se estendeu contra Cristina Fernández, não
somente para derrotá-la eleitoralmente, senão para destruí-
la como opção para futuras disputas.
No Estado de contrainsegurança com coro eleitoral se busca
alcançar um maior controle da sociedade, a partir de
mecanismos que incrementam a percepção de insegurança
pública; elevando o medo da presença e da ação de inimigos
da paz social e dos valores da “comunidade”; de
desqualificar e reprimir a resistência social, procedimentos
que buscam desarticular as organizações populares e
desmobilizar a sociedade, retirando-lhe a iniciativa e
justificar a vigilância e a intervenção policial e militar. Para
isso é necessário que a imprensa e outros meios de
comunicação, particularmente públicos, sofram embates que
limitem suas atividades, ao mesmo tempo em que se
incrementa o peso da imprensa e da televisão afim aos
interesses sociais que se quer prevalecente.
Ao mesmo tempo e como resposta à carência de
oportunidades de trabalho, se destacam os benefícios do
autoempreendimento, de passar de trabalhador a “sócio” de
alguma marca, como motoristas de Uber, entregadores de
alimentos ou mercadorias, em que os “sócios” não somente
não recebem salários ou benefícios sociais, senão que ainda
pagam alguma porcentagem de sua renda para continuar
sendo partícipes do negócio.
A nova forma de governo apresenta muitos pontos em
comum com o Estado de contrainsurgência, como perseguir
ou eliminar aos que criticam as políticas em marcha ou
denunciam a corrupção, a impunidade ou abusos de
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autoridades civis ou militares[17]; estabelecer novas leis em
matéria de segurança pública[18]; a reorganização de forças
policiais, de aparatos de inteligência, de segurança e das
Forças Armadas,[19] e a sua maior presença nas ruas e nas
cidades[20], além da implementação de novos sistemas de
controle e de vigilância dos opositores[21]. Também de
novos acordos com os aparatos de inteligência, de
segurança e com as Forças Armadas dos Estados Unidos.
Além de impedir que as experiências dos governos
populares e progressistas se repitam, sob essa nova forma
de governo, também se busca lograr outros objetivos que
permitem avançar com os projetos do grande capital local e
transnacional, como redobrar a implementação de políticas
de ajuste, novas reformas trabalhistas e a reformulação das
aposentadorias; prosseguir a venda dos bens e recursos
públicos para capitais privados, construir novos acordos
regionais com outros mercados para expandir o campo de
ação do grande capital exportador da região.
O caminho para configurar essa nova forma de governo não
pode, senão, gerar rechaços em amplos setores da
população, por afetar as suas condições de vida; pela
militarização das ruas e cidades e pela criminalização dos
movimentos sociais e dirigentes; pela sequela da morte de
civis, acusados em geral de formar parte de bandos
delinquentes, sem que tribunais civis possam processá-los.
De maneira mais acelerada em alguns casos, e mais lenta em
outros, esta nova forma de governo se concretiza no
conjunto da região, colocando em marcha as diversas
dimensões que o caracterizam. O incremento da violência
estatal será uma condição necessária para que alcance
formas maduras, e sem contestações, se considerar que os
movimentos populares na região foram golpeados e em
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muitos casos isolados, mas em nenhum caso desarticulados.
*Professor do Departamento de Relações Sociais da
Universidade Autônoma Metropolitana – Unidade Xochimilco
– e da Pós-Graduação em Estudos Latino-Americanos da
Universidade Nacional Autônoma de México.
josorio@correo.xoc.uam.mx
Nota final 1: 
O avanço do Estado de contrainsegurança com coro eleitoral
e a degradação em geral da vida pública, se soma a crise de
projetos alternativos ao capitalismo, o que incrementa a
desorientação política e o imaginário de um futuro com
sentido.
Enfrentar estes processos não passa por retornar aos tempos
passados. Os Estados benfeitores no mundo desenvolvido e
suas políticas sociais e de segurança social responderam a
um momento da reprodução capitalista e da luta de classes
que já não é mais possível repetir. Seus arremedos no
capitalismo dependente também já esgotaram a sua história,
da mesma forma queos arremedos de democracia.
Nota final 2: 
O contundente triunfo de Andrés Manuel López Obrador nas
eleições presidenciais em julho passado no México, e do
Movimiento de Regeneración Nacional (MORENA), constitui
um passo a contrapelo das tendências prevalecentes antes
expostas.
É o primeiro triunfo eleitoral na história política do México
mailto:josorio@correo.xoc.uam.mx
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É o primeiro triunfo eleitoral na história política do México
de uma força de esquerda nas eleições presidenciais. Não
somente isso, o triunfo ocorreu em uma disputa com a
participação de votantes acima da média das anteriores, e
com uma margem de apoio inusitado: com 53% de todos os
votos. Isso levou aos partidos tradicionais que até agora
imperaram, leia-se o Partido de la Revolución Institucional
(PRI) e o Partido de Acción Nacional (PAN), tenham ficado em
minoria no Parlamento, em ambas as câmaras, de deputados
e senadores, e tenham perdido os cargos de governadores e
as maiorias também nos parlamentos estaduais.
O que de particular ocorre no México que explica essa
situação excepcional? Pode-se enumerar muito assuntos: os
agudos níveis de insegurança que prevalecem em amplos
territórios do país; escândalos por processos de corrupção
em que a classe política e as autoridades do governo
estiveram involucradas; a piora das condições de vida do
grosso da população; a divisão das classes dominantes que
chegaram às eleições com dois candidatos, em um sistema
que não conta com segundo turno eleitoral.
Mas tudo isto e muito mais fica na superfície do processo.
No México se assistiu a uma verdadeira rebelião cidadã, que
implicou em que o grosso da população rompesse com
fetichismo, armadilhas ideológicas e amarras culturais que
em geral tendem a se produzir massivamente em momentos
muito particulares das lutas sociais. Nem as ameaças dos
grandes empresários, nem as catástrofes anunciadas fizeram
retroceder os votantes em sua opção pela mudança.
Para além das decisões do futuro governo, amplos setores
da população se manifestaram dispostos a tensionar para
que as transformações prometidas tomem forma. E isto abre
um cenário nada comum.
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[1] Nota do tradutor: a versão em língua espanhola do
presente texto foi publicada em 11 de agosto de 2018.
[2] Para abandonar a noção de ‘poder no Estado’, Ávalos faz
a distinção entre ‘autoridade’ e ‘poder’ (Ávalos: 2015a, 203),
em que a primeira se exerceria sobre os seres livres,
enquanto o segundo seria um mando despótico sobre os
servos e escravos. No entanto, em “O Capital” se demonstra
que a liberdade do operário é justamente sua submissão ao
poder despótico do capital (Marx: 1973, 267-286), pois uma
vez despossuído dos meios de produção pode renunciar a
um capital, para oferecer seu trabalho a outro, o que
demonstra a ficção da liberdade que possui (Ibid., 486).
Toda sua vida está submetida ao capital (Ibid, 518). Somente
assumindo a ruptura entre economia e política no
capitalismo, favorecendo a mistificação, poderia se afirmar
que na esfera econômica há poder, mas que na esfera
política são indivíduos livres que decidem sobre a vida em
comum.
[3] Disse Marx que “(…) el poder del Estado no flota en el
aire”. E remete às classes: “Bonaparte representa a una clase,
que es además, la clase más numerosa de la sociedad
francesa: los campesinos parcelarios”. (Marx: 1980, t. I,
489). Este material, e outros que seguem a suas obras
maduras, constituem para Ávalos “análisis coyunturales (…)
en lo que el plano de lo político se concibe como el terreno
de la transcripción (sic), ciertamente contradictoria y sesgada
por lo efímero (sic), de intereses de clase” (Ávalos, 2007,
34), em seu interesse por minimizá-los, ao não
corresponder com a proposta estatal que oferece.
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[4] Adscrito a esta corrente, para explicar as transformações
estatais das últimas décadas, Ávalos assinala que “el aparato
de Estado fue conquistado (…) por la lógica del capital” e
que “la antigua máquina burocrática del Estado benefactor”
tem sido “desplazad(a) por una dinámica empresarial”
(Ávalos: 2015a, 123). É um “exterior” o que “conquista e
desloca”, e que o Estado, ainda integrando o aparato, em sua
proposição é alheio às classes.
[5] Frente à chegada do empresário Donald Trump ao
governo dos Estado Unidos se pode mencionar outros
triunfos eleitorais recentes que manifestam essa condição
excepcional. Mas nem Ângela Merkel, nem Emmanuel
Macron, por exemplo, são membros das burguesias alemã e
nem francesa.
[6] A solução de Ávalos de integrar o aparato ao Estado
(2015b: 56), alimenta por sua vez esta confusão. Os ex-
presidentes do México como Ernesto Zedillo e Felipe
Calderón, seriam integrantes das classes dominantes, junto
com os Slim, Azcárraga e Larrea. Identificar o Estado e os
aparatos permite dar sustento à tese que é possível alcançar
o poder político ganhando posições no aparato de Estado,
sonho de toda política reformista.  No entanto, entre o
aparato de Estado e o Estado existe um hiato social e
político. É por isso que forças sociais e personalidades
políticas com maiores ou menores conflitos com o capital
podem chegar ao aparato (como Allende, Chávez ou
Morales), sem que isso implique que tenham alcançado o
Estado e com isso o poder político.
[7] O tema, que nos leva aos problemas das revoluções
anticapitalistas na chamada periferia do sistema mundial
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capitalista, tenho desenvolvido inicialmente no livro
Explotación redoblada y actualidad de la revolución.
Refundación societal, rearticulación popular y nuevo
autoritarismo, UAM/Itaca, México, 2009. Um novo
desenvolvimento se encontra no livro Sistema mundial,
intercambio desigual y renta de la tierra, UAM/Itaca, 2017,
México, cap. I, “El despliegue del capital en el Estado-nación
y en el sistema mundial”.
[8] Processos dos quais se excluem o México, Colômbia,
Peru e Chile, os dois primeiros pela presença de forças
políticas tradicionais ou direitistas nos governos. Chile pela
forte dependência do seu comércio exterior com os Estados
Unidos nesses anos e por manter distância com experiências
que recordem os anos da Unidade Popular, ainda que
personalidades políticas progressistas tenham chegado à
presidência.
[9] Não que não houvesse corrupção. Entretanto, a ênfase
midiática local e internacional, para dar conta do problema,
mostram que a cruzada contra a corrupção apontou suas
canetas contra os governos populares e progressistas da
região (Romano: 2018).
[10] Aqui haveria de excluir ao Equador, onde a ideia de
construir o socialismo não teve maior audiência.
[11] O reformismo neogramsciano reinterpreta a guerra de
posições formulada por Gramsci, postura que ganhou peso
nas décadas dos golpes militares na região, particularmente
refletida na obra de Portantiero (1977). Em anos recentes
encontramos na obra de Álvaro García Linera uma
importante retomada, acompanhada com o “último”
Poulantzas (García Linera: 2015).
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[12] “En la tragedia griega el centro del escenario lo
ocupaban casi siempre los héroes (…). La vida cotidiana
tenía reservado (…) un espacio subalterno y sin rostro: el del
coro” (Nun: 1989, 11). Com “coro eleitoral” quero destacar o
peso secundário dos cidadãos e das eleições na nova forma
de governo.
[13] Produção e venda de drogas e entorpecentes de todo
tipo, tráfico de órgãos, tráfico de pessoas, tráfico de
armamentos, de material para fissão nuclear, lavagem de
dinheiro em atividades imobiliárias, massivas operações
fraudulentas pela internet, apropriação e venda de
informação nas redes sociais são algumas das novas
atividades da acumulação do capital.
[14] É comum afirmar que nos encontramos em um período
de crise estatal, e se multiplicam as noções que buscam dar
conta de dita crise: “fragmentação” ou “desintegração” do
Estado (Roux: 2010), “dissolução” do Estado (Ávalos: 2010),
a qual este agrega recentemente a de “crise de estatalidade”,
como resultado da quebra do princípio do Estado Leviatã e
do Estado Res publica (Ávalos: 2015, 237-238), o que
colocaria em discussão a autoridade do Estado e sua
capacidade de expressar essas decisões. No seio do
capitalismo não é possível que a vida em comum possa se
desenvolver sem Estado. A manifestação dos problemas de
segurança, como no México, não tem paralisado os
processos de reprodução do capital e nem o domínio das
classes ligadas a este. Com isso, não se pretende afirmar
que – no México em particular, onde se formularam os
termos anteriores – não ocorre nada. O que se pretende
simplesmente manifestar é que as noções empregadas,
como “fragmentação” do Estado, e pior ainda, “dissolução”
do Estado, conduzem a sérios equívocos teóricos e políticos.
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O Estado feudal é possível “fragmentar”, o que fez possível,
por exemplo, que a revolução chinesa fosse ganhando
poderes parcialmente na grande marcha. Mas o Estado
capitalista é um poder altamente centralizado, o que impede
que se possa destruí-lo e substitui-lo em partes por um
novo poder. Por outro lado, os Estados capitalistas não se
“dissolvem”. Desta forma, seriam desnecessárias as
revoluções. Por isso é que seu fim passa justamente pela
destruição de suas relações nos processos de revolução.
[15] A segurança eleitoral reforça a tendência à realização de
todo tipo de manobras e fraudes, desde a compra de votos,
truques cibernéticos ou simples manipulação de cédulas e
de recontagens. A reeleição de Juan Orlando Hernández
como presidente de Honduras, a partir de uma escandalosa
fraude nas eleições de 2017, forma parte de velhas histórias
em novas condições.
[16] Fórmula contrainsurgente que o Estado colombiano tem
aplicado de maneira efetiva nas últimas décadas,
assassinando dirigentes sindicais operários e camponeses,
líderes sociais e dirigentes guerrilheiros que passaram para a
vida institucional.
[17] Aqui se situa a elevada quantidade de jornalistas
mexicanos assassinados nos últimos anos. Também o
recente assassinato no Brasil (14 de março de 2018) da
vereadora do PSOL, Marielle Franco, tenaz opositora da
presença de militares no Rio de Janeiro e dos crimes das
forças de segurança nas favelas.
[18] No final de 2017 foi aprovada no México uma nova “Ley
de Seguridad Interior”, que outorga maior presença e
operacionalidade às Forças Armadas, após a intervenção do
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Executivo nos estados ou municípios. A nova lei, aprovada
com a oposição de organismos locais e internacionais de
direitos humanos, deverá ser sancionada pela Suprema Corte
de Justicia, por decisão do presidente Peña Nieto.
[19] Por solicitação do presidente Macri em março de 2018,
o Ministerio de Defesa criará uma unidade especial, a
“Fuerza de Despliegue Rápido” (FDR), conformada pelos três
ramos das Forças Armadas, para apoiar às forças de
segurança na luta contra o narcotráfico e para o cuidado dos
recursos naturais, assunto que refere à presença de
organizações mapuches em zonas florestais do sul do país,
entre elas o grupo Resistencia Ancestral Mapuche (RAM), que
reclamam seu direito às terras que ocupam, onde já
ocorreram enfrentamentos em 2017. O mais relevante desta
decisão é que permite operações das Forças Armadas no
interior do território, o que não ocorria desde as ditaduras
militares nos anos oitenta (Beinstein: 2018). No mesmo
sentido, em outubro de 2017, o governo brasileiro aprovou a
criação de um novo Ministério Extraordinário de Segurança
Pública, que agrupa todas as forças da ordem, sob o mando
até então do ministro da Defesa. Tribunais e promotorias
militares investigarão a morte de civis durante as operações
armadas. 
[20] Em 16 de fevereiro de 2018, Michel Temer declarou
“intervenção federal” no estado do Rio de Janeiro,
entregando a um general o comando sobre militares e
policiais.
[21] Em 2017, se informou que os aparatos de inteligência
do Estado mexicano espiavam a jornalistas críticos,
infiltrando com uma mensagem SMS os seus celulares
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através do sistema Pegasus, adquirido de Israel, que permite
que câmera e microfone fiquem sob controle da segurança
estatal. No Chile, como parte da “Operación Huracán”,
iniciada em setembro de 2017, carabineiros detiveram a oito
dirigentes mapuches acusados de queimar igrejas e
caminhões em La Araucanía. Mais tarde se descobriu que a
“Unidad de Inteligencia Operativa Especializada de
Carabineros” não só espiou a jornalistas de diversos meios
que acompanhavam o caso, que se prolongou por meses,
senão também que “plantou” conversas nos celulares dos
detidos, para oferecê-los como prova de culpabilidade e de
pertencer a uma organização subversiva e criminosa. Em
março de 2018, o diretor geral de carabineiros e o diretor de
inteligência da instituição, conhecedoras da montagem,
deveriam apresentar sua renúncia.
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Nota do Observatório do Estado Latino-Americano/ODELA-
UFRGS: O presente texto é uma tradução do original
publicado em língua espanhola, em 11 de agosto de 2018,
no site Viento Sur: https://vientosur.info/el-estado-de-
contrainseguridad-con-coro-electoral-en-america-latina/
Tradução: Mateus Henrique Weber 
Revisão técnica: Leonardo Granato
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https://www.ufrgs.br/odela/tag/teorias-do-estado/
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Del Estado capitalista
dependiente al Estado
socialista en Cuba
Ensaio sobre a burguesia
associada no Brasil
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