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ADMINISTRAÇÃO DA PRODUÇÃO E SERVIÇOS AULA 4 Prof. Vitor Hugo Lopes Lau 28 CONVERSA INICIAL O comportamento do consumidor de serviços Nesta aula serão discutidos aspectos relacionados à avaliação da qualidade do serviço pelo cliente. Discutir sobre qualidade parte do princípio do que outrora era considerado um diferencial importante, mas que atualmente é uma obrigação para as organizações que produzem bens e serviços e querem manter uma posição de destaque no mercado. Como complemento aos aspectos da qualidade, importante também abordar aspectos relacionados com a melhoria de processos com um foco na abordagem Lean Manufacturing aplicada a serviços. Os cinco temas a serem discutidos são os seguintes: • Gestão da qualidade em serviços; • Avaliação da qualidade do serviço pelo cliente; • Abordagem Lean Manufacturing do Sistema Toyota de Produção; • Abordagem Lean Manufacturing aplicadas a serviços; • Melhoria de processos. TEMA 1 – GESTÃO DA QUALIDADE EM SERVIÇOS 1.1 TQM – Gestão da qualidade total 1.1.1 Origem No início da industrialização, não existia grande preocupação com a qualidade e o foco estava todo voltado para a produção de grandes volumes de produtos para atender à demanda cada vez mais intensa. Frederick Taylor introduziu os princípios de gerenciamento científico nas indústrias em 1900, sendo considerado o pioneiro na implantação da análise científica do posto de trabalho, em que, em troca de redução de carga horária e melhoria salarial, ensinava seus colabores a executar suas tarefas de forma metódica, o que trouxe melhorias substanciais de produtividade. Também Frank Gilbreth apresentou grande colaboração a esse processo, com a criação de tempos padronizados para se completar uma tarefa, a partir de seus 17 movimentos 28 básicos e também com a adoção de inovações para a construção civil como a betoneira e o andaime móvel. A primeira preocupação formal com a qualidade surgiu na Bell Telephone Labs. Em 1924, quando Walter Shewhart implantou uma carta de controle de processo em bateladas, marcando o início formal do controle estatístico de processo, por meio das cartas CEP, até hoje utilizadas no segmento industrial. Figura 1 – Carta de Controle Estatístico de Processo Apesar de essa primeira preocupação com a qualidade dar início à fase da gestão da qualidade nas organizações, deixou de ter a atenção dos gestores industriais após a Segunda Guerra Mundial, quando a ênfase mundial se voltou para o volume de produção, pois tudo que se fabricava vendia, devido a uma demanda extraordinária a nível mundial. A única exceção ocorreu exatamente no Japão, que, após a sua derrota, recebeu o Plano Americano Marshall, em que consultores americanos vieram coordenar a reconstrução do país e a marca Made in Japan na época era sinônimo de péssima qualidade e, portanto, seus produtos dificilmente seriam aceitos em nível mundial e a exportação era a única saída porque os mercados locais praticamente não existiam para poder sustentar grandes volumes de produção, o paradigma da época para o segmento industrial. Os gerentes industriais japoneses participaram ativamente dos conceitos para a implantação de programas de melhoria da qualidade, principalmente os trazidos pelo estatístico americano Willian E. Deming, até hoje venerado como o grande guru da qualidade no país. O lema “Fazer Certo da Primeira Vez” passa a ser uma obsessão, e já na década de 1970 o Japão toma conta de segmentos seletos da economia, como a indústria automobilística, naval e eletrônica. 28 1.1.2 Ocidente descobre a qualidade como diferencial competitivo Já nas décadas 1970-1980, o mundo enfrenta pela primeira vez uma crise global com o choque do petróleo, na qual os mercados consumidores desapareceram e muitas organizações globalizadas passaram a enfrentar sérias dificuldades financeiras. Em 1980, a NBC apresentou o documentário Se o Japão pode... porque nós não poderíamos?, que mostrava para os americanos o milagre japonês – apesar da crise, eles estavam enfrentando as dificuldades e crescendo de forma consistente. Tem-se, então, o marco do ressurgimento das preocupações com a melhoria da qualidade, com a chamada por grandes empresas americanas pelo Dr. Deming, que, com a sua palestra “O caminho do sucesso”, apresenta as suas 14 grandes obrigações administrativas para a implantação de um programa de Gestão da Qualidade Total no Ocidente. No final do século XX, com a globalização dos mercados, as organizações começam a enfrentar pressões por parte dos mercados: • Flexibilidade a mudanças; • Orientação para as necessidades dos clientes; • Velocidade e confiabilidade de entrega. A preocupação contínua com a qualidade se evidencia com as novas demandas dos consumidores: • Mercados cada vez mais competitivos; • Oferecimento de produtos e serviços para causar o encantamento dos clientes; • Fidelização de clientes pela alta qualidade do atendimento oferecido. 1.2 Função estratégica da qualidade Uma grande quebra de paradigma ocorre com a mudança na visão que se tinha a respeito da qualidade nas organizações ocidentais. No passado, a função era meramente defensiva, com os famosos DGQ – Departamentos de Garantia da Qualidade, voltados para a entrega ao mercado de um produto com grande confiabilidade, objetivando: 28 • Redução do número de reclamações do cliente; • Ênfase na inspeção – separar o defeituoso do conforme; • Controle de custos por retrabalho ou refugo. Atualmente, a visão deve ser totalmente ofensiva e proativa, em que a abrangência das preocupações com a qualidade passam a ser estratégicas, reduzindo os custos enfrentados pelas organizações a partir da insatisfação dos seus clientes. Tornou-se necessário implantar um programa de melhoria da qualidade com abrangência total para garantir o aumento da participação nos mercados já conquistados e a identificação de nichos ainda não explorados pelos concorrentes. 1.3 Elementos do TQM – Gerenciamento da Qualidade Total Para uma abordagem organizacional focada na produção de bens e serviços com alta qualidade, envolvendo todas as áreas e os níveis funcionais da organização, os elementos principais do gerenciamento da qualidade total são: • Liderança; • Envolvimento dos funcionários; • Excelência do produto ou processo; • Foco no cliente. As principais barreiras identificadas à implantação de programas de melhoria da qualidade nas organizações são: • Não envolvimento da alta direção e gerência média; • Ansiedade por resultados; • Planejamento inadequado; • Treinamento mal feito; • Falta de apoio técnico; • Sistema de remuneração inconsistente; • Escolha inadequada de multiplicadores; • Descuido com a motivação. 28 TEMA 2 – A AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DO SERVIÇO PELO CLIENTE 2.1 O processo de avaliação As organizações que atualmente disputam mercados com intensa concorrência têm dedicado extrema atenção às suas ações mercadológicas para um posicionamento diferenciado no mercado, buscando encantar seus clientes e agregando o maior valor possível nos bens e serviços que comercializam. Uma forma de avaliar a qualidade do serviço ao cliente é por meio de pesquisas que possam levantar o grau de satisfação do cliente, procurando avaliar se suas necessidades e desejos são amplamente atendidas. A Figura 2 apresenta a avaliação proposta por Gianesi e Corrêa (2019, p. 91), com a avaliação do cliente em função das expectativas e percepções do serviço. Figura 2 – Avaliação da qualidade do serviço Fonte: Adaptado de Gianesi e Corrêa, 2019, p. 91. Um aspecto importante a ser destacado para serviços, quando comparado a produtos, é exatamente o grau de tangibilidade, significativamente menor para atividades realizadas por prestadores de serviço. Quandoum advogado dá 100% de certeza do sucesso de uma demanda na justiça, o cliente só poderá atestar após a sentença pelo juiz, correndo ainda o risco de enfrentar recursos da outra parte, podendo frustrar as expectativas que gerou quando da contratação dos serviços pelo cliente. Para todo fornecedor de serviços, é importante a relação entre as expectativas e as necessidades dos clientes. É muito frequente no atendimento que o cliente não saiba exatamente qual é a sua necessidade por serviços e 28 apresentem expectativas distintas, que podem levar a uma insatisfação futura com os serviços fornecidos. As pessoas e os sistemas de inteligência artificial que atuam no atendimento presencial ou à distância, devem, portanto, estar preparados para a correta identificação das reais necessidades do cliente, e inclusive ter argumentos para mostrar realmente como os serviços oferecidos poderão atender às necessidades com a maior qualidade possível para evitar arrependimentos e frustações futuras no relacionamento entre o fornecedor de serviços e seus clientes. 2.2 Fatores que influenciam a formação de expectativas dos clientes Como as expectativas dos clientes antes da aquisição de um serviço podem influenciar fortemente a avaliação da qualidade do atendimento do fornecedor pelos seus clientes, é importante que se analisem os fatores que podem exercer influência nesse processo. Os quatro fatores que podem influenciar a formação de expectativas dos clientes, segundo Gianesi e Corrêa (2019, p. 94) são: • Comunicação boca a boca; • Necessidades pessoais; • Experiência anterior; • Comunicação externa. O mercado concorrente também pode influenciar nas expectativas dos clientes potenciais de uma empresa de serviços, oferecendo diferenciais que possam atrair esses clientes potenciais ou fazendo com que estes tragam experiências positivas por serviços já prestados, e o cliente vai com certeza fazer uma comparação entre os diferentes fornecedores que concorrem em um mesmo mercado. Cabe, portanto, ao fornecedor de serviços estabelecer instrumentos para influenciar as expectativas de seus clientes potenciais, e o uso da comunicação poderá atender perfeitamente a essa necessidade. O composto promocional – ações de propaganda, promoções e publicidade – pode despertar no cliente o desejo em consumir os serviços oferecidos, criando uma segurança que existe em marcas de renome internacional na prestação de serviços. Um bom exemplo pode ser o fornecimento de lanches fast food por grandes empresas em seus franqueados, que em regra geral seguem um padrão diferenciado de 28 atendimento, que atrai clientes em todos os países onde atuam. Como já foi ressaltado no início deste tópico, a comunicação boca a boca entre as pessoas pode ser muito influenciada por essas ações de comunicação, com programas de indicação premiada para clientes que tragam novos clientes para a empresa. 2.3 Fatores que influenciam a formação de expectativas dos clientes Segundo Gianesi e Corrêa (2019, p. 96), os fatores que podem influenciar a formação das expectativas dos clientes são: • Prestação do serviço; • Comunicações externas. Ao utilizar os serviços de um banco digital, um cliente menos ambientado com o ambiente virtual de atendimento pode demonstrar algum grau de irritação com as operações necessárias para a realização de um serviço financeiro, e cabe, portanto, à instituição reforçar em seu processo de comunicação os aspectos de segurança que as transações financeiras pela internet devem atender para segurança do próprio usuário. Importante também que sejam definidos os momentos críticos no ciclo de serviços da empresa, que normalmente ocorrem no início, pela percepção futura do cliente, e no final, por ficarem na memória do cliente. Na Figura 3 está representado o ciclo de serviços que Gianesi e Corrêa (2019, p. 99) apresenta para um supermercado. Figura 3 – Ciclo de serviços para um supermercado Fonte: adaptado de Gianesi e Corrêa, 2019, p. 99. 28 2.4 Critérios de avaliação Parasuraman, Zeithaml e Berry (1990) apresentam um instrumento para a avaliação da percepção dos clientes na qualidade em serviços denominado SERVQUAL, que está baseado em cinco critérios: • Confiabilidade: serviço confiável, precisa e consistente; • Responsabilidade: pronto atendimento; • Confiança: conhecimento e cortesia; • Empatia: atenção personalizada; • Evidências tangíveis: padronização do atendimento. Outros autores também citam fatores adicionais a serem considerados na avaliação da percepção, e Gianesi e Corrêa (2019, p. 103) destacam um modelo que consolida as diferentes visões para indicadores de avaliação, conforme a Figura 4. Figura 4 – Critérios de avaliação da qualidade em serviços Fonte: Adaptado de Gianesi e Corrêa, 2019, p. 103. 2.4.1 Consistência A consistência se relaciona com a variabilidade de um processo, em que o cliente que já experimentou os serviços deve ter sua expectativa atendida com a mesma qualidade que já conhece. Ao buscar por uma alimentação fast food, 28 as pessoas podem dar total preferência a uma determinada franquia exatamente pela sua padronização de atendimento e a garantia da qualidade que a marca lhe proporciona. 2.4.2 Velocidade de atendimento As pessoas não têm tempo para perder e uma espera em um atendimento presencial pode provocar grande insatisfação. Um cliente, enquanto está aguardando seu atendimento, deve ter sua atenção tomada para que a demore não lhe cause irritação. Uma oficina de consertos de aparelhos eletrônicos pode colocar em seu local de atendimento produtos complementares aos produtos principais que normalmente repara, e por meio de expositores convidar o cliente para a experimentação, não tomando o tempo de espera do cliente bem como oportunizando um faturamento complementar com a venda por impulso. 2.4.3 Atendimento/Atmosfera É a transformação no local de atendimento físico ou virtual para favorecer a percepção ao cliente de que existe um grande prazer e presteza na realização do melhor atendimento. Isso pode se evidenciar com uma postura empática por parte dos atendentes e um processo de comunicação o mais transparente possível. 2.4.4 Acesso No caso de um atendimento virtual, deve-se dar muita atenção ao tipo de tecnologia que se oferece ao cliente, de modo a evitar que um sistema de inteligência artificial cause mais irritação em função da dificuldade de acesso ao serviço desejado. O mesmo cuidado deve ser dado a outras possibilidades tecnológicas, como o site e a central telefônica. Já no atendimento físico, ao tomar a decisão pela localização física do local de atendimento, a melhor acessibilidade possível deve ser colocada à disposição dos clientes com fatores importantes, como localização, facilidade de acesso e estacionamento, segurança e amplo horário de atendimento. 28 2.4.5 Custo O custo de um serviço deve ser estabelecido dentro da relação custo-benefício, e esta deve ser deixada muito clara para que o cliente não tente avaliar o serviço prestado apenas pelo seu preço. Com respeito a este fator, é de grande importância o devido preparo das pessoas que fazem o atendimento em realizar a venda evidenciando os benefícios a serem oferecidos para atender às necessidades e desejos do cliente. Um serviço considerado caro pode ter sido um serviço mal vendido. 2.4.6 Tangíveis Evidências físicas que possam transformar o caráter intangível do serviço fornecido, possibilitando ao cliente ter amplo acesso à informação do pacote de serviços que se coloca à disposição do cliente. Isso também pode ser reforçado com preocupações como ter uma equipe de atendimento local e à distância uniformizada, tanto fisicamente quanto na forma de transmitir informações e prestar o serviço adquirido. 2.4.7 Credibilidade e confiançaEsses fatores se evidenciam quando a percepção de risco por parte do cliente em ter uma experiência prazerosa fica demonstrada pela capacidade em se transmitir a credibilidade e a confiança que ele espera ter ao decidir pelos serviços de uma empresa. Isso pode ser feito pela valorização da marca, aquisição de certificações e um processo de comunicação completo antes e após a venda. 2.4.8 Competência A competência pode ser associada ao conhecimento e à capacidade de transmitir a certeza de que a prestação de serviço atenderá perfeitamente às expectativas do cliente. Não adianta apenas ostentar essa competência, é preciso evidenciá-la para dar a certeza de que a melhor solução será apresentada. 28 Quanto mais técnico e complexo for o serviço a ser oferecido, maior deve ser a preocupação, e os gestores devem manter sua equipe treinada e preparada para atender o cliente com o nível de qualidade esperado. 2.4.9 Flexibilidade Devido à ampla gama de possibilidades do segmento de serviços, em que a personalização é uma demanda geralmente buscada, não se pode tentar engessar o cliente a um atendimento padronizado. Quanto mais opções puderem ser oferecidas, mais facilmente serão atendidas as expectativas particulares de cada pessoa. Outro aspecto de flexibilidade está na capacidade de realizar uma pós-venda ainda melhor do que a primeira venda. Erros e problemas podem ocorrer, mas ao dar uma solução definitiva, o suporte técnico pode ser transformado em uma segunda venda, e caso esta seja bem realizada, pode não só recuperar como aumentar a confiança no cliente de ter tomado a decisão correta ao optar por determinado serviço. 2.5 Modelo dos cinco gaps O modelo dos cinco gaps, também conhecido como modelo dos cinco abismos, visa a redução da inconformidade entre as expectativas e a qualidade percebida pelo serviço fornecido. Os cinco abismos foram definidos por Parasuraman, Zeithaml e Berry (1990) e se evidenciam a partir de uma pesquisa de satisfação feita diretamente com os clientes após um atendimento. Segundo Martins e Laugeni (2012), os cinco abismos definidas pelos autores são: • Gap 1: a diferença entre a expectativa do cliente e o que realmente o prestador do serviço percebeu como a expectativa do cliente. • Gap 2: a divergência entre o entendimento da empresa e as especificações que adota para atender o cliente. • Gap 3: a divergência entre as especificações elaboradas e o serviço prestado. • Gap 4: a divergência entre o serviço gerado e o comunicado ao cliente. • Gap 5: a divergência entre o serviço esperado e o fornecido. 28 Figura 5 – Modelo dos cinco gaps Fonte: Martins e Laugeni, 2012, p. 248. A solução da insatisfação com os problemas de qualidade percebidos pelo cliente pode ser realizada em três fases: • Análise das falhas; • Planejamento da ação para diminuir ou eliminar as falhas; • Engajamento de todos na empresa para a solução definitiva das falhas. As razões para que aconteçam os gaps, apontadas por Martins e Laugeni (2012, p. 248), são: • Gap 1 – Identificação falha das necessidades do cliente e falhas de comunicação tanto com o cliente quanto internamente na empresa. • Gap 2 – Falta de engajamento para a qualidade, uso não metodológico para se estabelecer especificações, dificuldade em estabelecer se o serviço é possível de ser executado. • Gap 3 – Falta de conhecimento na realização do serviço; falta de trabalho em equipe, problemas de relacionamento e comunicação. • Gap 4 – Falta de controle no andamento dos trabalhos e das operações, comunicação falha e excesso de motivação para exageros no desempenho da atividade. • Gap 5 - Consequência dos demais abismos. Martins e Laugeni (2012, p. 247) apresentam um exemplo de modelo dos cinco gaps aplicado em uma situação em que tudo dá errado em uma atividade logística na qual um produto deve ser unitizado em caixas de 100 unidades, atendendo um pedido da produção. 28 • Gap 1- o almoxarife entende que a produção quer embalagens com em torno de 100 peças. • Gap 2 – ele ordena a colocação de 100 peças por caixa, na média. • Gap 3 – o separador de peças decide pegar caixas ao acaso e colocar em torno de 100 peças, mas a quantidade sofre variação devido ao tamanho variado das caixas. • Gap 4 – faltando uma hora para o início do turno, o almoxarife avisa a produção que as caixas estão fechadas, mas isso não ocorrera ainda. • Gap 5 – o material chega com atraso, o que provoca a parada da produção, e devido às quantidades variadas, o encarregado da produção se obriga a contar as peças em cada caixa, e como estas têm formato diferente, não admitem ser empilhadas e dificultam o processo de separação. A ação corretiva seria exatamente rever o processo e estabelecer ações que ocasionassem a sucessão de gaps, garantindo a produtividade da empresa e a satisfação do cliente externo. TEMA 3 – ABORDAGEM LEAN THINKING DO SISTEMA TOYOTA DE PRODUÇÃO 3.1 Lean Thinking nas empresas O Lean Thinking (mentalidade enxuta) nasce com a discussão nas empresas ocidentais após a publicação do livro A máquina que mudou o mundo, de Womack, Jones e Roos (2004), sobre o real significado da palavra japonesa muda (desperdício), e que Dennis (2011, p. 38) define como qualquer atividade que o cliente não está disposto a pagar. Ao assumir a direção de produção da Toyota Motors, Taiich Ohno, que é considerado o pai do Sistema Toyota de Produção, identificou como as sete grandes perdas em produção em larga escala deveriam ser perfeitamente identificadas e eliminadas. 28 3.2 O nascimento do Sistema Toyota de Produção O modelo Ford tornou-se nos anos 1930 o grande paradigma para a indústria mundial, e organizações pelo mundo todo tentavam repetir o sucesso da implantação da linha de produção em larga escala. A Toyoda1, em sua fábrica de teares nos anos 1930, estava produzindo o modelo G, seu grande sucesso mundial em teares dentro dos conceitos da produção em larga escala de Ford, mas segundo Lau (2004, p. 17), após a Segunda Guerra Mundial a empresa enfrentava alguns problemas para sua consolidação: • Interferência governamental; • Mercado doméstico limitado; • Problemas trabalhistas; • Economia pobre durante o pós-guerra; • Potencial entrada de concorrentes estrangeiros no mercado japonês. A baixa produtividade de um operário japonês, quando comparada com um americano, também foi apresentada na época como um grande dificultador para a implantação de um sistema de produção consistente para automóveis. Shingo (1996) não admite essa disparidade e identificou que a diferença estava exatamente nas perdas do sistema de produção japonês, e o combate ao desperdício passou a ser fundamental para a implantação de uma forma “melhor para se produzir carros no Japão”. 3.3 A lógica das perdas O primeiro ponto a se discutir para que se entenda a lógica das perdas é a diferença entre o que se gasta e o que representa efetivamente o custo. Gasto é todo sacrifício que o empresário faz para poder realizar seu processo de produção. Poderia, portanto, ser considerado o quanto se comprou de matéria-prima para colocar no processo produtivo. Já o custo representa o quanto efetivamente de matéria prima está presente no produto final, desconsiderando evidentemente qualquer desperdício ou perda que possa ter ocorrido em todo o processo produtivo. 1 O nome de família do Sr. Sakichi Toyoda foi inicialmente dado a empresa por ele fundada para produção de teares. Depois que a empresa resolveu assumir uma posição global, por uma questão de pronúncia no ocidente, o nome da empresa foi mudado para Toyota Motors. 28 Os esforços na empresa, destacados por Dennis (2011, p. 39), podem ser definidos como uma somatória de: • Trabalho efetivo: aquele que agrega valor e é necessário. Exemplo: a soldagem deuma peça de aço. • Trabalho adicional: aquele que não agrega valor, mas é necessário. Exemplo: montar e remover uma peça para soldagem. • Muda: aquele que não agrega valor e é desnecessário. Exemplo: fazer mais pontos de solda que o necessário. A mentalidade enxuta reforça a importância da eliminação completa da muda (desperdício), a análise de fluxo de valor para a redução do trabalho adicional e a otimização do processo para um trabalho efetivo que agregue valor sob a ótica do cliente. 3.4 As sete perdas fundamentais As sete perdas fundamentais, conforme destaca Seixas (2020, p. 37) e que foram identificadas por Sigueo Shingo para o combate ao desperdício, são: • Perdas por superprodução: produção de grandes quantidades, antecedendo a demanda para obter ganhos de escala; • Perdas por transporte: deslocamentos que não agregam valor; • Perdas no processamento em si; • Perdas por fabricação de produtos defeituosos: o de mais fácil identificação, gerando retrabalho ou refugo; • Perdas por movimentos desnecessários: relacionados com questões ergonômicas; • Perdas por espera: tempo sem trabalho; • Perda por estoque: uma consequência das demais perdas. 3.5 O kanban como controle do desperdício Segundo Dennis (2011, p. 89), “o kanban é um sistema de ferramentas visuais (geralmente cartões de sinalização) que sincronizam e fornecem instruções aos fornecedores e clientes tanto dentro quanto fora da fábrica”. O kanban foi identificado por Taiichi Ohno nos Estados Unidos em uma de suas visitas na fábrica da Ford, onde, ao acessar um supermercado para 28 realizar a compra de um item de higiene pessoal, se deparou com uma prateleira em que existiam caixas de determinado produto com um cartão vermelho afixado em cada caixa na parte inferior da prateleira. Essa sinalização servia certamente para informar o check-out da necessidade de reposição daquele produto, e curiosamente era o próprio cliente quem trazia essa informação. Os principais tipos de kanbans adotados nas indústrias e destacados por Dennis (2011, p. 90) são: • Cartão kanban de produção ou em processo: autoriza a fabricação ou montagem de determinado lote; • Cartão kanban de requisição interna ou de transporte: autoriza a movimentação de material entre os postos de trabalho; • Cartão kanban do fornecedor: autoriza a entrega de material pelo fornecedor; • Kanban contenedor: são carrinhos de transporte em que o cartão kanban é afixado diretamente em seu corpo; • Quadrado kanban: identificação no próprio chão de fábrica de um espaço pré-definido para um certo número de itens; • Andon: uso de lâmpadas coloridas para cada tipo de item, tem a função de acelerar o fluxo de informações entre as células; • Kanban informatizado: dispositivo de entrada e saída de dados pré- definidos, interligando via on-line diferentes pontos produtivos entre si. TEMA 4 – ABORDAGEM LEAN THINKING APLICADA A SERVIÇOS Para a aplicação da abordagem Lean Thinking em uma atividade de serviços, Lau (2004, p. 29) apresenta em sua monografia um estudo de caso do setor de lavagem de um posto de combustíveis, que será utilizado para mostrar a importância da identificação das sete grandes perdas em uma atividade de serviços. 4.1 Estudo de caso Auto Posto Rino O estudo de caso a ser discutido pretende mostrar qual é a maior das perdas para uma atividade de serviços, a partir da identificação de cada uma delas e a apresentação de possíveis soluções para que os ganhos de produtividade e de satisfação dos clientes fossem obtidos. 28 4.1.1 MASP – Método de Análise e Solução de Problemas Figura 6 – Do problema para a solução Crédito: Burhanuddin/Shutterstock. O MASP é uma ferramenta derivada do uso do ciclo PDCA, com grande aplicação nas áreas de qualidade, manutenção e segurança do trabalho, com o propósito de criar uma metodologia científica para a solução de um problema, e para ser incluído no estudo de caso do setor de lavagem apresentado neste tema, pode-se verificar o Quadro 1. Quadro 1 – MASP e o PDCA P 1 PROBLEMA: Identificação do problema 2 OBSERVAÇÃO: Reconhecimento das características do problema 3 ANÁLISE: Descoberta das causas principais 4 PLANO DE AÇÃO: Contramedidas às causas principais D 5 EXECUÇÃO: Atuação de acordo com o Plano de Ação C 6 VERIFICAÇÃO: Confirmação da efetividade da ação * DECISÃO: O bloqueio foi efetivo? • Sim, segue-se para passos 7 e 8 • Não, volta para o passo 2 A 7 PADRONIZAÇÃO: Eliminação definitiva das causas 8 CONCLUSÃO: Revisão das atividades e resultados planejamento para trabalho futuro Fonte: Adaptado de Campos, 1994, p, 114. 28 Melhor definindo cada uma das etapas da ferramenta MASP aplicadas ao estudo de caso, pode-se entender melhor a sua aplicabilidade na solução de problemas nas organizações: • Passo 1 – Identificação e reconhecimento do problema A empresa, com um quadro de dez funcionários, altos custos operacionais, operando em instalações antigas e sem adequação às normas ambientais vigentes, estava com grande descrédito junto aos clientes e conveniados devido à constante falta de água fornecida pela rede pública no setor de lavagem, que era utilizado como um diferencial competitivo para a comercialização de combustível no varejo. • Passo 2 – Análise da situação atual A estrutura do setor de lavagem era composta por um elevador hidráulico que estava danificado por falta de manutenção, uma cisterna de 150 litros para acumulação de água de um poço semiartesiano, e oriunda da rede pública. As bombas de pistão para lavagem eram antigas, com um consumo médio de 60 litros por minuto, sendo que os produtos químicos aplicados eram ácidos Intercap e Solupan. Para tentar atenuar o problema de falta de água de forma absurda, foi ligado um cano com água da rede no poço para se tentar acumular água durante a madrugada. • Passo 3 – Plano de ação Foi elaborado um plano de ação para a reestruturação do setor de lavagem, aproveitando uma reforma que estava sendo realizada para a adequação das instalações da empresa às normas ambientais vigentes: o Instalação de uma cisterna 15.000 litros, já que as bombas a pistão deveriam ser atualizadas o Aquisição de uma bomba de lavagem a quente o Adequação de uma bomba WAP que era usada para lavagem da pista o Implantação de um sistema misto de fornecimento de água com uma melhor adequação ambiental o Substituição dos produtos químicos ácidos por biodegradáveis • Passo 3 – Execução Realização da completa reestruturação do setor de lavagem, com as seguintes ações definidas no plano de ação: 28 o Instalação da cisterna 15.000 litros o Aquisição de uma bomba de lavagem a quente o Reforma para a adequação da bomba WAP o Implantação de um sistema misto de fornecimento de água oriunda da coleta pluvial, do poço semiartesiano e da rede pública o Adequação das calhas de chuva e da pista não oleosa, com a instalação de uma caixa separadora para a captação de água pluvial não potável de reaproveitamento o Reforma do poço semiartesiano com o afundamento para eliminar o assoreamento • Passo 4 – Verificação dos resultados obtidos Após implementada a reestruturação, foram efetuadas avaliações durante um mês de operação e os seguintes resultados foram obtidos: o Redução em 50% no consumo de água vinda da rede pública o Disponibilidade de água em período integral o Maior qualidade do serviço pelo uso de água quente para a dar maior eficiência na remoção oleosa o Atendimento a futuras exigências ambientais para reaproveitamento de água utilizada e a redução de exposição a produtos químicos agressivos o Abertura para publicidade: veículos da imprensa e indicação no mês em curso para o Top Empresarial da Associação Comercial do Paraná 4.2 Aplicação da análise das perdas na empresa estudada Efetuando-seum cruzamento das informações que foram apresentadas no Tema 3 desta aula, em que se discutiu as perdas para uma atividade e o seu papel no Sistema Toyota de Produção, com o estudo de caso apresentado, pode-se levantar com segurança qual das perdas poderia ser considerada como a maior de todas. 4.2.1 Perdas por superprodução A superprodução se caracterizou desde a construção do setor de lavagem do estabelecimento e a adoção de bombas com alto nível de pressurização e vazão que dispensavam a necessidade de acúmulo prévio de água. Seu grande 28 inconveniente com o passar do tempo ficou mais evidente pelo aumento significativo da tarifa de água fornecida pela rede pública. O Lean Thinking neste caso se caracterizou com a substituição das duas bombas convencionais pela máquina de água quente, que apesar de ter um custo de aquisição elevado, este se viabiliza rapidamente em decorrência da sua alta eficiência por apresentar um consumo de água cinco vezes inferior aos modelos tradicionais e o uso da água quente permite uma menor aplicação de produtos químicos para a remoção da sujeira. (Lau, 2004, p. 40) 4.2.2 Perdas por tempo de espera Devido à incerteza do fornecimento contínuo de água pela rede pública, os poucos clientes que aceitavam esperar pela ducha de cortesia demonstravam um alto grau de insatisfação. Muitos desses clientes levavam um voucher para retornar no dia seguinte, mas poucos o faziam. Essa espera também era significativa pelo alto tempo de atendimento (lead time). Com a restruturação, essa realidade passou por uma grande melhoria, reduzindo significativamente o tempo de atendimento e permitindo a realização das duchas de cortesia just in time. 4.2.3 Perdas por transporte Para um melhor aproveitamento do tempo com fornecimento assegurado de água, geralmente no período da manhã, havia a necessidade de um elevado número de deslocamentos de veículos pelo pátio, que acabavam dificultando a circulação de veículos de clientes em busca de abastecimento ou dos demais serviços oferecidos. Com as melhorias obtidas, foi possível uma melhor distribuição nos agendamentos de serviços de lavagem, aplicação de cera e higienização dos veículos. 4.2.4 Perdas por processamento em si As distribuidoras de combustível costumam adotar configurações padronizadas para as instalações, e estas, na época, previam o uso de bombas a pistão com grande vazão água pressurizada, que em conjunto com a utilização de produtos à base de ácido tornavam o processo de remoção de graxas e 28 misturas oleosas e terra muito fácil. No entanto, essa solução causava danos potenciais significativos ao meio ambiente e aos trabalhadores do setor. A utilização de água quente permitiu a adoção de produtos biodegradáveis, sem que ocorresse a diminuição da qualidade do serviço, garantindo também um menor impacto ambiental. 4.2.5 Perdas por estoques Lau (2004, p. 42) destaca que as perdas por estoques foram identificadas no setor de armazenamento de produtos químicos, decorrentes fundamentalmente de: • Lote de venda dos produtos por parte do fornecedor; • Manipulação dos produtos pelos funcionários, principalmente na adição de água no sabão químico, produto este que era vendido com alta concentração. As soluções prospectadas no mercado caracterizavam-se por um custo mais elevado e a necessidade da escovação das partes impregnadas para uma limpeza perfeita. A solução ideal foi obtida com a aquisição de um produto biodegradável de alto poder de limpeza, normalmente utilizado em hospitais, com uma dosagem específica na mistura com água para a aplicação com o revolver das lavadoras. 4.2.6 Perdas por movimentação Essa perda se materializa com as questões ergonômicas impostas ao operador em um posto de trabalho – no caso do setor de lavagem, a obrigatoriedade da utilização de EPIs, devido ao alto ruído no ambiente de trabalho, e o risco a saúde, devido aos ácidos manipulados. Também se pode destacar o esforço físico para a movimentação de bombonas com o produto químico preparado para utilização. A adoção do novo conjunto de bombas e do produto biodegradável reduziu em muito as perdas por questões ergonômicas. 28 4.2.7 Perdas por falta de qualidade A adoção de um produto biodegradável também garantiu melhor a integridade das peças plásticas dos veículos, que muitas vezes eram manchadas por produtos ácidos aplicados erroneamente. Lau (2004, p. 43) também destaca a “diminuição de manutenção nas caixas separadoras de resíduos oleosos das águas servidas e a consequente diminuição do maior dano que se poderia causar que é o dano ambiental”. 4.2.8 Controle de desperdício por kanban O desperdício de água tratada foi identificado como um ponto importante a ser atacado, até mesmo antecipando uma possível legislação futura sobre o reaproveitamento de água de reuso por empresas com alto consumo hídrico. A solução encontrada foi a reforma do sistema de coleta de água de chuva, com a ligação das calhas e da coleta de água da pista não oleosa em uma caixa separadora, abastecendo 50% da nova cisterna, passando a ser a principal fonte de abastecimento do setor de lavagem. Para sinalização da eficácia do novo sistema que passou a contar com três fontes de abastecimento: • 50% por coleta pluvial • 30% pelo poço artesiano • 20% de fornecimento pela rede pública A empresa que instalou o sistema também forneceu um sistema de andon (kanban por luzes indicadoras), acionado a partir de boias posicionadas na cisterna e que indicavam a situação do reservatório e o abastecimento pelas fontes de abastecimento. Além desse sistema de autonomação (jidoka), também foi possibilitada a intervenção manual, permitindo o desligamento do fornecimento pela rede e pelo poço quando da previsão de precipitações pluviométricas pela meteorologia. No verão, por exemplo, as chuvas fortes dos finais da tarde praticamente completavam o nível da cisterna, necessitando apenas a reposição no dia seguinte, conforme a demanda. Outro ponto importante de sinalização adotado foi um dosador volumétrico que o fornecedor do shampoo biodegradável disponibilizou sem custo, servindo como um dispositivo poka yoke, impossibilitando o erro e o desperdício de 28 matéria-prima pelos operadores que anteriormente faziam a diluição em água do produto químico concentrado. 4.2.9 A grande perda para uma empresa Segundo Lau (2004, p. 45), “a adoção de práticas de produção enxuta, com o diagnóstico de pontos que levavam a desperdício durante o processo de serviços no setor de lavagem, mostrou que o ganho obtido após as implementações seria sempre significativo”. O autor também destaca o ganho publicitário obtido com a reestruturação do setor de lavagem e com o reaproveitamento de água da chuva, pois a ação de melhoria foi divulgada pelos veículos de comunicação da cidade, e foi também objeto de estudo de caso acadêmico, além da empresa ser indicada para o Top Empresarial da Associação Comercial do Paraná pela sua ação inovadora. Mas ainda não se obteve resposta para a questão: qual é a maior perda para uma empresa? O Dr. Willian Edward Deming, em sua palestra O caminho do sucesso, em que apresenta suas 14 obrigações administrativas, apresenta a resposta para este questionamento. O discurso do famoso guru da qualidade, segundo os japoneses, sempre recomendou que se parasse de calcular o custo com base no preço dos insumos, mas que os gestores deveriam, sim, se basear no custo total. Ele também questionava os gestores das empresas, querendo a resposta para o efeito multiplicador de um cliente insatisfeito. Numa entrevista para uma jornalista que desejava saber de quanto havia sido a redução na conta de água da empresa, a resposta de um de seus proprietários foi incisiva: Pouco importa para quanto baixou a conta de água, o que importa éque a partir da reformulação do setor, a empresa pode atender todos os seus clientes com maior qualidade, oferecendo os serviços prometidos dentro de um prazo satisfatório e este sim é o maior ganho que se pode obter! (Lau, 2004, p. 45) 28 Figura 7 - A maior das perdas para uma empresa Crédito: Gustavo Frazao/Shutterstock. TEMA 5 – MELHORIA EM PROCESSOS Neste tema, serão abordados conceitos relacionados aos processos de melhoria nas organizações e os indicadores normalmente utilizados para a avaliação dos progressos obtidos. Também será discutido o papel do colaborador nesse processo, com um papel proativo de engajamento no processo de satisfação total do cliente. 5.1 Kaizen 5.1.1 Definição O kaizen é uma filosofia desenvolvida quando da implantação dos novos conceitos de produção no Japão, a partir da implantação do Plano Marshall e o surgimento do Sistema Toyota de Produção. Figura 8 – Ideograma para o kaizen Crédito: Nirdalart/Shutterstock. 28 A interpretação do ideograma kaizen remete à melhoria incremental e contínua na sua melhor interpretação. Não se trata de uma ferramenta e tampouco de uma máquina que se possa comprar, mas sim de uma filosofia focada nas ações vivenciadas pelas pessoas envolvidas em todos os processos de uma organização. Seu foco está direcionado para a eliminação das perdas, com ações que possam agregar valor com o mínimo de investimento, e é fundamental para a implantação do Lean Thinking. 5.1.2 Contrastes entre o kaizen e a inovação A filosofia kaizen é um programa implantado em uma organização com o propósito de incentivar as pessoas a apresentarem melhorias nos processos por meio de pequenos passos, aproveitando o conhecimento prático (know how) que cada um adquire no seu dia a dia de trabalho, a partir de esforços orientados para os processos, geralmente com ações e soluções de problemas de modo simples. Apesar dos resultados geralmente serem pouco significativos, a continuidade na identificação das melhorias dará um grande resultado no longo prazo. Já a inovação decorre normalmente, de planos complexos de reengenharia e que, de forma imediata, causam uma disrupção em uma realidade, procurando obter por meio de avanços tecnológicos e grandes mudanças um crescimento significativo de uma atividade. Em regra geral, normalmente envolve grandes investimentos e um planejamento estratégico da alta direção para a sua implementação. Portanto, um bom slogan para um programa de implantação do kaizen numa organização é: “faça o melhor uso daquilo que já tem”. 5.1.3 Filosofia e estrutura A filosofia a ser trabalhada é a do melhoramento contínuo, em que, a cada meta atingida, novas metas devem ser definidas para a satisfação do cliente, aumento de vendas e crescimento do lucro. Isso significa que nenhum dia deve se passar sem que uma melhoria traga um ganho competitivo para a empresa, todas as pessoas devem trabalhar em prol deste objetivo e todo erro ou problema 28 deve ser visto como uma oportunidade de melhoria. Metas otimistas devem ser estabelecidas para a garantia da obtenção de ganhos de produtividade: • Zero de defeitos; • Zero de estoques; • Zero de movimentações; • Zero de lead time; • Zero de tempos de setups; • Lotes unitários. Com relação aos processos de melhoria, pode-se ter dois tipos de empresas: a empresa serrote e a empresa escada. Figura 9 – Empresa tipo serrote Figura 10 – Empresa tipo escada Crédito: Yaowalak Rahung/Shutterstock. Uma empresa com um programa de kaizen consolidado segue o modelo tipo escada, em que sucessivas ações baseadas no ciclo PDCA de Deming garantem a manutenção dos patamares de melhorias obtidos e permitem a subida para um novo patamar de forma continuada. 28 O conceito PDCA norteia um workshop típico para a implantação da filosofia kaizen com trabalhos em equipe: • Detalhamento dos objetivos e treinamento sobre o kaizen; • Avaliação do patamar atual e o estabelecimento de um plano de ação; • Implementação do plano do kaizen; • Avalia-se as melhorias obtidas e se estabelece uma ação corretiva caso seja necessário; • Elabora-se um relatório padronizando a melhoria obtida. 5.2 Técnicas de mapeamento, análise e melhoria de processos Os processos de melhorias em atividades de serviços podem ser implementados a partir da adaptação de algumas ferramentas da qualidade que originalmente foram concebidas para serem utilizadas no ambiente industrial e que devem ser aplicadas com grande personalização para cada tipo de prestação de serviço a ser analisado. 5.2.1 Poke yoke em serviços Poke yoke é uma ferramenta implementada para auxiliar a prevenção de erros humanos em atividades manuais nas indústrias que implantam o Lean Thinking. Normalmente, são dispositivos de simples concepção e que atuam diretamente na verificação da qualidade na fonte. Alguns exemplos do cotidiano podem ser considerados dispositivos poke yoke: • Plug de rede tripolar utilizado no Brasil; • Cabos polarizados e identificados por cores; • Conexões com pinos guias; • Orifício nas pias para evitar que a água transborde. Em atividades de serviços, esse tipo de ferramenta também tem larga aplicação, já que sua natureza fortemente dependente de intervenção humana está sujeita a erros. Os franqueadores de pizza, por exemplo, fornecem a seus franqueados bancadas padronizadas com gabaritos e dosadores que garantem a uniformidade do processo de montagem das pizzas. 28 5.2.2 Fluxogramas BPMN O fluxograma é uma forma gráfica de se representar um processo para facilitar a sua visualização e a identificação de pontos para o estudo de melhorias. Existem diferentes notações para a elaboração de fluxogramas, e normalmente cada empresa adota a que julga ser mais adequada, sendo que a simbologia adotada normalmente depende do tipo de software utilizado para elaborar o mapeamento de um processo. Dentre essas notações, pode-se destacar o BPMN (Notação de Modelagem de Processos para Negócios), que é a notação de modelagem de processos mais utilizada pelas empresas de negócios. Sua simbologia ainda carece de maior conhecimento no mercado, mas, com a oferta cada vez maior de softwares de modelagem específicos, tende a amplamente aceita no segmento de serviços. Na Figura 11 pode ser visualizado um fluxograma elaborado com a notação BPMN. Figura 11 – Fluxograma para dar entrada ao processo de estágio na ESP Uninter RH E M PR ES A AL U N O TU TO RI A CE N TR AL C U RI TI BA INÍCIO A EMPRESA AUTORIZA O APROVETA- MENTO? PREENCHER O PEDIDO DE APROVEITAMENTO DE ESTÁGIO (APÊNDICE 4) SOLICITAR DO RH DA EMPRESA A DECLARAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES (APÊNDICE 5) SIM SEGUIR OS PROCEDIMENTOS DO FLUXOGRAMA DE SOLICITAÇÃO DE ESTÁGIO NO TRABALHO SIM EFETIVAR A DISPENSA NO SISTEMA ACADÊMICO NÃO INFORMAR MOTIVOS ESTÃO ALINHADOS COM AS REGRAS? ANALISAR OS DOCUMENTOS POSTADOS NA TUTORIA PREENCHER O TERMO DE COMPROMISSO SEGUIR EM APÊNCICE 8 NO MANUAL DE ESTÁGIO DISPONIBILIZAR / ASSINAR OS DOCUMENTOS SOLICITADOS POSTAR OS DOCUMENTOS NO CANAL DE TUTORIA NÃO É POSSÍVEL CORREÇÃO DOS DOCUMENTOS? SIM NÃOSOLICITAR CORREÇÕES FINAL 28 5.2.3 Ferramenta 5W2H A ferramenta 5W2H é normalmente utilizada para auxiliar no planejamento e acompanhamento de ações de melhorias. As informações que a compõem são organizadas em forma de matriz e são determinadas por sete perguntas chaves, conforme o Quadro 2. Quadro 2 – Perguntas chaves do 5W2H 5W2H PERGUNTAS What? O quê? Why? Por quê? How? Como? Who? Quem? Where? Onde? When? Quando? How Far? How Much? Até quando? Quanto custa? É usada principalmente para o planejamento e acompanhamento de ações, e para a padronização de rotinas de trabalho. No Quadro 3 pode ser visualizado um exemplo aplicado a serviços, emque uma empresa está estudando uma melhoria significativa na sua rede de Tecnologia da Informação. Tabela 3 – Exemplo de plano 5W2H para serviços O quê? Por quê? Como? Quem? Onde? Quando? Até Quando? Pesquisar necessidades Para poder dimensionar a rede Verificar pontos não atendidos e possíveis expansões Assistente Administrativo Em todas as áreas 01/10/19 20/11/19 Dimensionar nova rede Para evitar aquisição incorreta Solicitar especificações, orçamentos e visitas Gerente Administrativo Junto ao fornecedor 20/11/19 20/12/19 Avaliação das propostas Para obter validação da solução Avaliar planilha comparativa Diretores e Gerente Administrativo Matriz 20/01/20 10/01/20 Aquisição da rede Para solução do problema Qualificar fornecedor e emitir ordem de compra Gerente Administrativo Matriz 12/01/20 15/01/20 Instalação da rede Para ativação da rede Refazer todo o cabeamento e atender à planilha de necessidades Fornecedor Em todas as áreas 01/02/20 20/02/20 Inspeção da rede Para liberar o serviço e evitar problemas futuros Verificar todos os pontos instalados com o usuário e com o fornecedor Assistente Administrativo Em todas as áreas 18/02/20 20/02/20 28 5.2.4 FMEA – Serviços O FMEA, análise do efeito e modo de falhas, é uma ferramenta utilizada para identificar as características de um produto ou serviço que são críticas para várias probabilidades de falhas, facilitando a prevenção antes que elas ocorram. Segundo Seleme (2016, p. 186), existem os seguintes tipos de FMEA: • Sistema; • Produto; • Processo; • Serviço. Para a sua elaboração, é utilizado em um checklist baseado em três perguntas fundamentais: • Qual é a ocorrência de falha? • Qual seria a severidade da falha? • Com qual probabilidade essa falha é detectada? A partir de uma análise quantitativa das três perguntas, baseadas nas planilhas apresentadas no Quadros 3, 4 e 5, calcula-se o NPR (Número de Prioridade de Risco) para cada causa potencial de falha e ações preventivas podem ser recomendadas para as causas que apresentarem o maior NPR. Tabela 4 – Probabilidade de ocorrência Ocorrência Critérios Valor Probabilidade de falha Quase impossível Falha improvável/processo sem falhas 1 1/1,5 x 106 Mínima Número remoto de falhas 2 1/1,5 x 105 Raramente acontece Probabilidade muito baixa de falhas 3 1/1,5 x 104 Baixa Probabilidade baixa de falhas 4 1/2 x 103 Falhas ocasionais Probabilidade pouco ocasional de falhas 5 1/400 Moderada Probabilidade ocasional de falhas 6 1/80 Falhas com frequência Probabilidade moderada de falhas 7 1/20 Alta Probabilidade frequente de falhas 8 1/8 Muito alta Probabilidade alta de falhas 9 1/3 Quase certa Falha quase certa em razão de histórico 10 > 1/3 Fonte: Seleme, 2016, p. 188. 28 Tabela 5 – Severidade de falhas Severidade Critérios Valor Efeito nenhum Nenhum efeito sobre o produto ou processo 1 Efeito mínimo Efeito mínimo no desempenho do produto ou processo 2 Efeito muito pequeno Causa de pequeno incômodo no usuário 3 Efeito pequeno Efeito pequeno no desempenho do produto ou serviço 4 Efeito moderado Resulta em falha em componente não vital 5 Efeito significativo Produto instável, funcionalidade afetada, reparação 6 Efeito grande Usuário insatisfeito, funcionalidade afetada, reparação 7 Efeito extremo Produto inoperacional, insatisfação do consumidor, cumprimento de normas 8 Efeito grave Produto inoperacional, insatisfação do consumidor 9 Efeito catastrófico Não atende a critérios mínimos de segurança / avaria repentina 10 Fonte: Seleme, 2016, p. 189. Tabela 6 – Probabilidade de detecção Detecção Critérios Valor Quase certa Controles atuais detectam falha quase sempre 1 Muito alta Eficiência muito alta 2 Alta Grandes chances de detecção 3 Moderadamente alta Eficiência moderadamente alta 4 Média Média chance de detecção 5 Baixa Pouca eficiência na detecção e avaliação do projeto 6 Muito baixa Chance muito baixa de detecção 7 Mínima Pouca eficiência nos campos de análise do projeto 8 Rara Eficiência de detecção desconhecida ou rara 9 Remota Não existem controles que detectem esta falha 10 Fonte: Seleme, 2016, p. 190. 5.2.5 Estudo de Caso • Uma empresa de transportes identificou três modos de falha associados com a falha Produtos que Chegam Danificados no ponto de entrega o Produtos não presos (modo de falha 1) o Produtos presos incorretamente (modo de falha 2) o Produtos carregados incorretamente (modo de falha 3) • Usando as três perguntas-chave, foram alocadas pontuações para: o Probabilidade de ocorrência § Modo de falha 1 = 5 § Modo de falha 2 = 8 § Modo de falha 3 = 7 28 o Severidade de falha § Modo de falha 1 = 6 § Modo de falha 2 = 4 § Modo de falha 3 = 4 o Probabilidade de detecção § Modo de falha 1 = 2 § Modo de falha 2 = 6 § Modo de falha 3 = 7 o Calcula-se o NPR de cada modo de falha § Modo de falha 1 = 5 x 6 x 2 = 60 § Modo de falha 2 = 8 x 4 x 5 = 160 § Modo de falha 3 = 7 x 4 x 7 = 196 o Assim, a prioridade deve ser dada ao modo de falha 3 (Slack et al., 1999, p. 487-489). FINALIZANDO A discussão sobre os aspectos que envolvem a abrangência da garantia da qualidade é um ponto de grande importância para as organizações, independentemente de seu porte, uma vez que a satisfação do cliente garante a posição de diferenciação em relação aos concorrentes no mercado a cada dia mais competitivo. Muito importante também destacar o papel do Lean Thinking nesse processo e como os japoneses conseguiram se desenvolver apesar de todas as dificuldades enfrentadas no pós-guerra. Nesta aula também procurou-se aplicar os conceitos lean em atividades de serviço, principalmente com foco na busca ao combate do desperdício, agregando valor sob a ótica do cliente. Para finalizar, também mereceu destaque a análise do kaizen nos processos de melhoria e a aplicação de ferramentas normalmente utilizadas no segmento industrial, mas que podem ser perfeitamente aplicados a serviços. 28 REFERÊNCIAS CAMPOS, V. F. TQC: gerenciamento da rotina do trabalho do dia a dia. Rio de Janeiro: Bloch, 1994. DENNIS, P. Produção lean simplificada. Porto Alegre: Bookman, 2011. GIANESI, I. N.; CORREA, H. L. Administração estratégica de serviços. São Paulo: Atlas, 2019. LAU, V. Conceitos de produção enxuta na função serviços. Disponível em: <https://acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/56226/Vitor%20Hugo%2op es%20Lau.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em: 23 mar. 2020. MARTINS, P. G; LAUGENI, F. P. Administração da produção – fácil. São Paulo: Saraiva, 2012. PARASURAMAN, A.; ZEITHAML V. A.; BERRY, L. Servqual: a multiple-item scale for measuring consumer perceptions of service quality. Journal of Retailing, v. 64, n. 1, p.12-40, 1988. SEIXAS, S. E. Administração da produção e serviços. Curitiba: Intersaberes, 2020. SELEME, R. Gestão de operações de serviços. Curitiba: Intersaberes, 2016. SHINGO, S. O sistema Toyota de produção. Porto Alegre: Bookman Artmed, 1996. WOMACK, J. P.; JONES, D. T.; ROOS, D. A máquina que mudou o mundo. Rio de Janeiro: Campus, 2004. 28 LEITURAS COMPLEMENTARES LOPES, T. O.; FROTA, C. D. Aplicação dos conceitos do lean manufacturing para melhoria do processo de produção em uma empresa de eletrodomésticos: um estudo de caso. In: Encontro Nacional de Engenharia de Produção, XXXV. Anais... Fortaleza, 2015. Disponível em: <http://www.abepro.org.br/biblioteca/TN_STO_206_226_28060.pdf>. Acesso em: 27 mar. 2020. MARTINS, R.; COSTA NETO, P. L. de O. Indicadores de desempenho para a gestão pela qualidade total: uma proposta de sistematização. São Carlos, 1998. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104- 530X1998000300010&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 27 mar. 2020. MENEZES,N.; ABRANTES, L.; JAYME NETO, O.; NEPOMUCENO, D. Aplicação do modelo SERVQUAL para medir a qualidade dos serviços prestados por uma empresa de locação de máquinas. In: Congresso Nacional de Excelência em Gestão, XI; INOVARSE – Responsabilidade Social Aplicada, III. Anais... 2016. Disponível em: <http://www.inovarse.org/sites/default/files/T16_343.pdf>. Acesso em: 27 mar. 2020. ROTONDARO, R. G. SFMEA: análise do efeito e modo da falha em serviços - aplicando técnicas de prevenção na melhoria de serviços. Prod., São Paulo, v. 12, n. 2, p. 54-62, 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103- 65132002000200006>. Acesso em: 27 mar. 2020. STOLF, A. L. et al. Aplicação de ferramentas e conceitos Lean em processos de serviços: estudo de caso em uma clínica veterinária. Journal of Lean Systems, v. 4, n. 1, p. 125-151. Disponível em: <https://pdfs.semanticscholar.org/310c/e0300901fab1843c211d6f739d45d9a43 d8f.pdf>. Acesso em: 23 mar. 2020.
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