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Análises Bromatológicas e Toxicológicas Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Esp. Flávia Bonfim Lima Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin Revisão Técnica: Prof. Everton Carlos Gomes Introdução à Bromatologia Introdução à Bromatologia • Apresentar ao aluno as bases da bromatologia, o avanço histórico e como ela se relaciona com as demais áreas da ciência; • Apresentar características gerais dos principais nutrientes; • Abordar as principais técnicas de análises e suas aplicações em controle de qualidade e demais áreas. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Introdução; • Histórico; • Nutrientes; • Proteínas. UNIDADE Introdução à Bromatologia Introdução A Bromatologia é a Ciência que estuda os alimentos, mais especificamente, do ponto de vista das interações químicas. O estudo aprofundado na composição dos alimentos torna a Bromatologia uma Área da Ciência que permite conhecer e enten- der como os macro e micronutrientes, bem como as biomoléculas e componentes inorgânicos atuam na manutenção da vida. Esse conhecimento serve de ferramenta prática para o desenvolvimento de novos produtos para o Mercado alimentício, controle de qualidade, combate à fraude ou adulteração, avalia o valor nutricional e calórico e investigação de contaminantes tóxicos que, eventualmente, podem estar presentes nos alimentos, garantindo a se- gurança, a higiene e a integridade dos alimentos. A análise dos alimentos é muito importante para a preservação da saúde. Por meio dela, hoje conhecemos diferentes componentes presentes em alimentos que podem ser fator de risco para doenças, como intolerância à lactose e ao glúten, entre outras. Vejamos o quadro a seguir: Quadro 1 – Importância da análise dos alimentos Componente do Alimento Importância Açúcares As pessoas acometidas pelo diabetes devem restringir a ingestão de açúcares. Lipídeos Alguns grupos específicos da população (por exemplo, aqueles com ele-vada colesterolemia) devem restringir a ingestão de gorduras. Metais pesados Presentes como contaminantes nos alimentos, por serem extremamente tóxicos, devem ser evitados Lactose Pessoas que sofrem de “intolerância à lactose” devem evitar a ingestão de alimentos que contenham lactose Fenilalanina Pessoas que sofrem da doença genética chamada Fenilcetonúria devem restringir seu consumo durante os primeiros anos de vida (a critério médico). Lisina É considerado um aminoácido essencial, que pode sofrer alterações químicas, por reações de escurecimento, tornando-se nutricional- mente indisponível. Fonte: Adaptado de GHARIB; MELLO, 2018 Por meio desse conhecimento, hoje, temos acesso a alimentos desenvolvidos para atender as diferentes necessidades dietéticas da população, representando um gran- de avanço tecnológico com impacto social em Saúde. Para compreendermos mais sobre esse assunto, é importante diferenciar as áreas de estudos que apresentam o “alimento” como objetivo em comum. Então, qual é a diferença entre Bromatologia, Engenharia de Alimentos e Nutrição? 8 9 Quadro 2 Ciências dos Alimentos (Bromatologia) Tem como foco o estudo do alimento (matéria-prima e produto final), e suas interações químicas, o estudo e otimização de processos tecno- lógicos, controle de qualidade dos alimentos, garantia da qualidade, pesquisa e desenvolvimento (P&D). Engenharia de Alimentos O Engenheiro estuda os processos de produção, estocagem, acondicio- namento, conservação dos alimentos. Pode, também, trabalhar com a administração geral dos processos tecnológicos e no desenvolvimento de procedimentos e máquinas ligadas à produção de alimentos. Nutrição Estudo dos nutrientes e do comportamento do alimento do organismo humano. Coordena a alimentação em instituições diversas como Esco- las, Empresas, Hospitais, SPAs etc., visando à alimentação saudável e de acordo com as necessidades das pessoas. Fonte: Adaptado de Wikimedia Commons Teste Seu Conhecimento • O que é Bromatologia?; • Cite seis situações práticas em que o conhecimento sobre Bromatologia pode ser aplicado; • Nos Supermercados, podemos encontrar prateleiras de alimentos para pessoas que possuem necessidades nutricionais específicas. Qual a influência da Bromatologia nesse campo? • Quais as diferenças entre Bromatologia, Engenharia de Alimentos e Nutrição? Histórico Outro ponto importante que devemos conhecer é o histórico da Bromatologia ao longo do tempo. A forma como nos alimentamos está diretamente relacionada a nossos hábitos sociais que, por sua vez, mudam constantemente ao longo do tempo. Observar e entender essa dinâmica é fundamental no estudo dos alimentos na busca do melhor aproveitamento de forma segura e saudável. A origem do estudo dos alimentos sob o ponto de vista químico é tanto quanto desconhecida. Podemos dizer que, em um período mais remoto, a escolha dos ali- mentos para consumo humano era feita de forma empírica. Embora não haja informações suficientes para construirmos um histórico completo da ciência dos alimentos, alguns personagens e fatos importantes devem ser pontuados. A partir do século XX, notamos o estudo da química dos alimentos tomando uma forma mais definida e individualizada, o que antes era parte da Química e da Agronomia. As descobertas mais relevantes feitas por muitos químicos se deram no final do século XVIII, mais especificamente, entre 1780 e 1850, e todos esses trabalhos jun- tos contribuíram para a evolução da Química de Alimentos moderna. 9 UNIDADE Introdução à Bromatologia Vejamos um pouco mais sobre essas descobertas: Tabela 1 Nome Profissão Ano Contribuição Carl Wilhelm Scheele Farmacêutico 1742-1786 • Isolamento e determinação de propriedades da lactose; • Preparou ácido múcico pela oxidação do ácido láctico; • Isolamento o ácido cítrico de suco de limão; • Isolamento o ácido málico de maçãs. Nicolas-Théodore de Saussure Químico 176-1845 • Estudou as trocas de CO2 e O2 durante a respiração das plantas; • Fez a primeira determinação precisa da composi- ção elementar do etanol. Joseph Louis Gay-Lussac e Louis- Jacques Thenard Químico 1777-1857 • Elaboraram, em 1811, o primeiro método para de- terminar as porcentagens de carbono, hidrogênio e nitrogênio em substâncias vegetais desidratadas. Sir Humphrey Davy Químico 1778-1829 • Isolou os elementos K, Na, Ba, Sr, Ca e Mg; • Sua contribuição para as químicas agrícola e de alimentos tornou-se ampla por meio de seus li- vros sobre Química Agrícola, dos quais o primeiro (1813) foi Elements of Agriculture Chemistry, in a Course of Lectures for the Board of Agriculture. Dr. William Beaumont Médico 1785-1853 • Realizou experimentos clássicos sobre digestão gástrica, desmistificando o conceito existente desde Hipócrates, de que os alimentos contêm um único componente nutritivo. Justus von Liebig 1803-1873 • Mostrou, em 1837, que o acetaldeído ocorre como um intermediário entre o álcool e o ácido acético durante a fermentação do vinagre; • Em 1842, ele classificou os alimentos como ni- trogenados (fibrina vegetal, albumina, caseína, carne e sangue) e não nitrogenados (gorduras, carboidratos e bebidas alcoólicas). Fonte: Adaptado de SRINIVASAN; PARKER, 2019 O século XIX pode ser considerado o Período qualitativo no qual os constituintes dos alimentos foram descobertos, bem como sua importância no consumo humano. Também foi o período de desenvolvimento dos processos para determinação dos constituintes dos alimentos. Em paralelo a esse período, houve uma crescente ne- cessidade de fiscalização em virtude de graves problemas relacionados a práticas de adulteração em alimentos, relacionados aos avanços da química dos alimentos na Revolução Industrial. Na primeira metade do século XX, temos a descoberta, nomeação e caracte- rização dos aminoácidos, ácidos graxos e vitaminas. Também foi um período de descobertas e avanços nas metodologias analíticas, conhecimento da interação dos nutrientes com as células e foram estabelecidas asnecessidades diárias. No final do século XX e início do século XXI, temos a conhecimento da relação entre o consumo de sal e a alteração da pressão arterial, a correlação entre o consumo excessivo de gordura de origem animal e o surgimento de doenças cardiovasculares e a importância do consumo de fibras (SILVA, 2012). 10 11 Teste Seu Conhecimento • Os séculos XVIII e XIX foram marcantes para a química dos alimentos levando as aná- lises a um patamar mais alto e originando a Química moderna dos alimentos. Cite 5 destas descobertas que tiveram como objeto central os alimentos; • No século XX e XXI tivemos quais descobertas?; • Com o avanço do conhecimento acerca dos alimentos, surgiu a necessidade de qual prática? Por quê?; • O século XIX foi importante pois é considerado referência em dois pontos na trajetória da química dos alimentos. Cite quais são. Conceitos e termos técnicos utilizados Para melhor compreensão do estudo dos alimentos, vamos conhecer alguns ter- mos técnicos que são utilizados dentro da Bromatologia. Entender cada um dos ter- mos e conceitos traz maior esclarecimento sobre a área: • Alimento: é toda substância ou mistura de substâncias, no estado sólido, líquido ou pastoso, destinadas a fornecer energia e elementos naturais para a formação, o desenvolvimento e a manutenção do organismo. Os alimentos podem estar nos estados natural, semi-industrializado ou industrializado (SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017); • Matéria-prima alimentar: toda substância de origem vegetal ou animal, em estado bruto, que para ser utilizada como alimento precise sofrer tratamento e/ ou transformação de natureza física, química ou biológica (BRASIL, 1969); • Alimento in natura: todo alimento de origem vegetal ou animal, para cujo con- sumo imediato se exija apenas a remoção da parte não comestível e os tratamen- tos indicados para a sua perfeita higienização e conservação (BRASIL, 1969); • Alimento enriquecido: todo alimento que tenha sido adicionado de substância nutriente com a finalidade de reforçar o seu valor nutritivo (BRASIL, 1969); • Produto alimentício: todo alimento derivado de matéria-prima alimentar ou de alimento in natura, ou não, de outras substâncias permitidas, obtido por proces- so tecnológico adequado (BRASIL, 1969). Teste Seu Conhecimento • Qual a diferença entre o alimento e o alimento enriquecido?; • É correto afirmar que o alimento in natura é aquele que pode ser consumido direta- mente após sua obtenção?; • Quais estados o alimento pode ser encontrado de a cordo a sua definição?; • Qual a relação entre a matéria-prima alimentar, alimento in natura e produto alimentício? 11 UNIDADE Introdução à Bromatologia Nutrientes São elementos químicos que fazem parte da constituição dos alimentos e que apresentam importante papel na saúde humana. Esses elementos podem ser classi- ficados em macronutrientes (proteínas, carboidratos, lipídeos) e micronutrientes (vi- taminas, sais minerais). Antes de falarmos especificamente sobre os macronutrientes e os micronutrien- tes, vamos conhecer um pouco mais sobre um outro elemento que constitui os ali- mentos e que é importantíssimo para a manutenção da vida: a água. Água A água pode ser encontrada em basicamente três estados físicos, sólido, líquido ou gasoso, dependendo da temperatura em que se encontra. É a substância em maior abundância no corpo humano e, portanto, é vital para equilíbrio homeostático do organismo. Ela desempenha funções como transporte de nutrientes e oxigênio, hidratação de tecidos e solvente, entre outros. Nos alimentos, a água exerce importantes funções, também assim como no corpo humano, inclusive nos alimentos industrializados nos quais influencia fortemente no sabor, textura, na conservação e na apresentação final do produto. Com a manipulação da água nos alimentos, é possível obter produtos mais está- veis e com maior tempo de prateleira, como, por exemplo, os desidratados, suco em pó, leite em pó e batata em flocos entre outros. Do ponto de vista químico, a água é uma molécula composta por dois átomos de hidrogênio e um átomo de oxigênio que ligados por meio de ligação covalente, formam um arranjo tetraédrico, esse tipo de arranjo e a disponibilidade de pares de elétrons para fazer ligações contribuem para a principal característica da água, a sua polaridade. Figura 1 Fonte: pt.khnacademy.org 12 13 Lipídeos Os lipídeos são moléculas encontradas na Natureza e estão amplamente distribu- ídas tanto no reino animal quanto vegetal, ocupando funções importantes dentro do metabolismo dos seres vivos. Nos vegetais, podem aparecer desempenhando funções como, reserva energética, pigmentos, impermeabilizantes de folhas, síntese de precursores, confere textura e aroma aos frutos, entre outras. Os lipídeos aparecem nos animais como participantes de várias reações e proces- sos importantes, como precursores na síntese de hormônios e vitaminas, transporta- dores, reserva energética e estrutura celular, entre outros. Do ponto de vista químico, os lipídeos são moléculas constituídas basicamente de carbono, hidrogênio e oxigênio, algumas vezes podem aparecer associados a outros átomos como de enxofre e nitrogênio. Sua principal característica físico-química é insolúvel em água. Isso se deve à na- tureza da sua composição química. Além disso, diferem em óleos e gorduras em fun- ção do seu estado físico em temperatura ambiente, isto é, os óleos são lipídeos que se encontram na forma líquida à temperatura ambiente, e gordura, no estado sólido. Figura 2 – Óleos e gordura Fonte: asaga.org.ar Embora os lipídios sejam apontados como vilões da saúde nos últimos anos, é importante lembrarmos que esse papel de “vilão” está diretamente relacionado ao consumo excessivo desses lipídios e o consumo adequado é importante para a dieta do ser humano. Como vimos anteriormente, eles são importantes tanto no reino vegetal quanto no reino animal. Quando falamos de um alimento industrializado, os lipídios também aparecem desempenhando funções importantes como conferir ao alimento palata- bilidade, aroma, texturas características ao alimento além de fornecer grande quan- tidade de energia na forma de calorias. 13 UNIDADE Introdução à Bromatologia Vejamos os principais tipos, classificação de lipídeos e suas principais fontes: Lipídeos Classi�cação geral Compostos pelos ácidos graxos, gorduras neutras e ceras. Lipídeos simples: Fosfolipídeos, es�ngolipídeos e lipoproteínas. Lipídeos compostos: Compostos por esteróis. Lipídeos derivados: Figura 3 – Classificação dos Lipídeos Os lipídeos podem ser subdivididos também em função da sua estrutura química: Tabela 2 Lipídeo Característica Forma presentes nos alimentos Exemplos de fontes Ácidos graxos saturados Constituídos por cadeia saturada (sem duplas ligações), alta den- sidade (gorduras) e alto ponto de fusão de acordo com o tamanho da cadeia. Ácidos acético, butírico, caproico, caprílico, cáprico, láurico, mirístico, palmítico, esteárico e araquídico. Produtos de origem animal: man- teiga, carnes, leite, queijo gorduro- sos, chantilly, creme de leite, banha e bacon, entre outros. Ácidos graxos insaturados São constituídos por uma (mono) ou mais (poli) duplas ligações. Ácido graxos monoinsaturados: • Ácido palmitoleico; • Ácido oleico; • Ácido cis 9-eicosenoico. Ácidos graxos poli-insaturados: • Ácido linoleico; • Ácido linolênico; • Ácido araquidônico; • Ácido eicosapentaenoico; • Ácido docosaexaenoico. Ácido graxos monoinsaturados: azeite de oliva, óleo de canola e de amendoim. Ácidos graxos poli-insaturados: • Óleos vegetais: girassol, soja, milho; • Óleo de peixe e oleaginosas: castanhas e amêndoa. Ácidos graxos essenciais Não são sintetizados pelo organis- mo, são obtidos por meio da inges- tão de alimentos que são fontes. Apresentam uma dupla ligação do tipo cis no carbono 3 ou 6. Ômega 3: • EPA (ácido eicosapentaenoico); • DHA (ácido docosa-hexaenoico); • ALA(ácido alfa-linolênico); Ômega 6: • Ácido linoleico; • Ácido araquidônico. Ácidos graxos trans Obtidos a partir da saturação par- cial da cadeia carbônica por meio da hidrogenação de óleos vegetais. As duplas ligações da molécula são convertidas na forma trans. Esse processo tem como finalidade ori- ginar produtos oleosos mais densos (semissólidos) e estáveis. Gordura trans Derivados São compostos por esteróis. • Colesterol; • Vitamina D; • Sais biliares; • Vitaminas K, E e A; • Carotenoides. 14 15 Teste Seu Conhecimento • Qual a principal característica da água que está relacionada à composição dos alimentos? • Qual a diferença entre óleo e gordura? • Cite 3 contribuições dos lipídeos nos alimentos; • Quais as diferenças químicas entre os ácidos graxo saturado e insaturados? Proteínas Para entendermos um pouco mais sobre a importância das proteínas no âmbito alimentar, vamos resumidamente recordar sobre quem são as proteínas e suas prin- cipais características. As proteínas são macromoléculas biológicas complexas abundantemente distri- buída no reino animal, que exercem funções primordiais nos seres vivos e também compõem os alimentos, são compostas basicamente de carbono, nitrogênio, hidro- gênio e oxigênio. A proteína é formada por uma série de aminoácidos ligados entre si por meio de uma ligação chamada de ligação peptídica. Essa união origina o que chamamos de estrutura primária da proteína, ou seja, o “esqueleto”. O arranjo espacial desse “esqueleto” surge na estrutura secundária, na qual os átomos se arranjam e giram em torno de eixo para assumirem uma confor- mação espacial mais adequada. A interação desses aminoácidos entre si confere uma terceira forma à proteína, chamada de estrutura terciária. Nessa conformação tridimensional, a proteína adqui- re estabilidade e compactação e, por fim, a estrutura quartenária confere à proteína a característica de cadeia polipeptídica, pois teremos duas ou mais cadeias proteicas ligadas entre si formando um grande complexo proteico. Figura 4 – Conformações das proteínas Fonte: edisciplinas.usp.br As proteínas apresentam características importantes para os alimentos também e conhecê-las e dominá-las proporcionou à indústria alimentícia grande avanço na tecnologia de desenvolvimento de novos produtos, controle de qualidade e segurança dos alimentos. 15 UNIDADE Introdução à Bromatologia Extremos de pH (concentração hidrogeniônica do meio) levam à desnaturação das proteínas. Da mesma forma, o aumento da temperatura influencia negativamente na atividade das proteínas, a concentração salina e a composição de solventes também. Todos esses fatores afetam justamente a conformação da proteína, rompendo as pontes de hidrogênio, gerando a desestabilização e, consequentemente, a desnatura- ção (ou perda da conformação e função) da proteína. As proteínas possuem grande influência sobre os atributos sensoriais dos alimen- tos. Por exemplo, as propriedades sensoriais dos produtos de panificação estão rela- cionadas às propriedades viscoelásticas e de formação da massa do glúten do trigo. As características de textura e suculência de carnes dependem muito das prote- ínas musculares (actina, miosina, actomiosina e várias proteínas solúveis da carne). As propriedades de textura e de coagulação dos produtos lácteos são fruto da estrutura coloidal singular das micelas de caseína, e a estrutura de alguns bolos, bem como as propriedades de batimento de alguns produtos de sobremesa, dependem das propriedades das proteínas da clara do ovo (SRINIVASAN, 2019). Tabela 3 – Funcionalidade das proteínas nos alimentos Função Mecanismo Alimento Tipo de Proteína Solubilidade Hidrofilicidade. Bebidas. Proteínas do soro de leite. Viscosidade Ligação à água, forma e tamanho hidrodinâmicos. Sopas, molhos de carne, molhos para salada, sobremesas. Gelatina. Ligação à água Ligações de hidrogênio, hidratação iônica. Salsichas de carne, bolos e pães. Proteínas da carne, proteínas do ovo. Gelificação Retenção e imobilização de água, formação de redes. Carnes, géis, bolos, produtos de panificação, queijo. Proteínas dacarne, do leite e do ovo. Coesão-adesão Ligações hidrofóbicas, iônicas e de hidrogênio. Carnes, salsichas, mas- sas, produtos assados. Proteínas dacarne, do ovo e proteínas do soro de leite. Elasticidade Ligações hidrofóbicas, ligações cruzadas dissulfeto. Carnes, produtos de panificação. Proteínas da carne, proteínas de cereais. Emulsificação Formação de película e adsorção nas interfaces. Salsichas, almôndega, sopa, bolos, molhos. Proteínas da carne, do ovo e do leite. Formação de espuma Adsorção interfacial e formação de película. Chantilis, sorvetes, bolos, sobremesas. Proteínas do leite e do ovo. Fixação de lipídeos e aroma Ligações hidrofóbicoas, retenção. Produtos de panificação com baixo teor de gordura. Proteínas do leite e do ovo. Fonte: Adaptado de KINSELLA et al., 1985 Classificação das proteínas Como vimos anteriormente, as proteínas são macromoléculas que desempenham diferentes papéis, o que reforça a sua importância na manutenção da vida. 16 17 Em decorrência das suas características elas podem receber diferentes classifica- ções, vejamos quais são: Tabela 4 Classifi cação Tipo Característica Composição • Simples;• Conjugada. • Proteína simples: é aquela que ao sofrer hidrólise libera apenas aminoácidos; • Proteína conjugada: é aquela que, ao sofrer hidrólise, além de liberar aminoácidos, também libera o que chama- mos de grupos prostéticos, ou seja, outros compostos que não são aminoácidos. Cadeia polipeptídica • Monoméricas; • Oligoméricas. • Monoméricas: são compostas por uma única cadeia polipeptídica; • Oligomérica: são formadas por mais de uma cadeia poli- peptídica, em geral, são as proteínas que assumem as fun- ções mais complexas. Estrutura • Fibrosas;• Globulares. • Fibrosas: são proteínas de alto peso molecular, geralmen- te insolúveis em água, e sua estrutura forma um arranjo de longos filamentos altamente resistentes como cordas en- trelaçadas. essa característica está associada à sua função que, em geral, é estrutural: colágeno, queratina e elastina; • Globulares: são solúveis em água e apresentam um nível de complexidade estrutural maior. possuem es- trutura terciária diferente das fibrosas, que apresentam apenas a secundária. por apresentar um nível estrutural mais complexo, sua conformação é esférica, resultado dos vários dobramentos das proteínas. por exemplo: en- zimas, hemoglobina. Função biológica • Enzimas; • Transportadores; • Estruturais; • Armazenadoras; • Hormônios; • Defesa; • Contração. • Enzimas: catalizam (aceleram) diversas reações químicas; • Transportadores: transportam outros componentes pela corrente sanguínea, como a hemoglobina, que transporta oxigênio, a albumina é o principal transportador de diver- sos fármacos, e as proteínas que atuam como canais de transportes ancoradas nas células, realizando o transporte seletivo de nutrientes para dentro da célula; • Estruturais: são aquelas que fazem parte da constituição de estruturas como do citoesqueleto, a parede celular, a pele e anexos, o fluido sinovial e as cartilagens; • Armazenadoras: fornecem aminoácidos e podem estocar outros elementos como ferro por exemplo. Ovoalbumina, ferritina, caseína e gliadina são alguns exemplos; • Hormônios: atuam como sinalizadores de funções primor- diais no organismo, por exemplo, temos a insulina, gluca- gon e GH; • Defesa: atuam no Sistema Imunológico, são os anticorpos; • Contração: responsáveis pela contração muscular, por exem- plo, temos as de musculatura esquelética miosina e actina. Nutricional • Proteínas de Alto Valor Biológico (AVB); • Proteínas de Baixo Valor Biológico (BVB); • Proteínas de referência. • Proteínas de Referência: apresentam maior quantidade de aminoácidos essenciais, os quais nosso organismo é in- capaz de sintetizar; • Proteínas de Alto Valor Biológico (AVB):apresentam quantidade relevante de aminoácidos essências; • Proteínas de Baixo Valor Biológico (BVB): não apresen- tam quantidades de aminoácidos essenciais relevantes. As principais fontes de proteínas são: carnes, frango, ovos, leite, peixes, feijão, lentilha, tofu, grão de bico, quinoa e brócolis, entre outros. As fontes mais completas, e que apresentam maior digestibilidade e maior valor biológico são encontradas nos alimentos de origem animal. 17 UNIDADE Introdução à Bromatologia Teste Seu Conhecimento • Quantas são as estruturas que compõem uma proteína? Descreva cada uma delas; • Cite 4 funcionalidades das proteínas nos alimentos e qual mecanismo de cada uma dessas funcionalidades; • Qual a diferença entre Proteína de Alto Valor Biológico (AVB) e Proteína de Referência? • Cite 5 fontes de proteínas. Carboidratos Os carboidratos com compostos muito conhecidos e consumidos em grandes quantidades de diferentes formas. Conceitualmente, os carboidratos são moléculas formadas basicamente por áto- mos de carbono, hidrogênio e oxigênio. São moléculas relativamente pequenas (podem ter de 3 a sete carbonos), mas que podem originar grandes polímeros por meio de uma ligação específica chamada ligação O- glicosídica. Os carboidratos assumem como principal função o fornecimento de energia rápida para o organismo. Quanto à sua classificação, eles podem ser mono, di, oligos e polissacarídeos. Vejamos as diferenças: Tabela 5 Classificação Descrição Exemplo Monossacarídeo Unidade monomérica de açúcar, geral- mente, apresentam de 3 a 7 carbonos em sua estrutura. São solúveis em água, a sua maioria apresenta o sabor adocicado. E são fonte de energia rápida. Frutose, manitol, galactose, glicose, sorbitol, manose, ribose, desoxirribose. Dissacarídeo Formados a partir da união de dois monos-sacarídeos por meio da ligação o-glicosídica. Sacarose, maltose, lactose, isomaltose. Oligossacarídeos É uma pequena sequência de monômeros de açúcar ligados entre si também por meio da ligação glicosídica. Podem conter de 3 a 10 monossacarídeos nesta pequena cadeia. Rafinose: (galactose + glicose + frutose); Estaquiose: (glicose + glicose + glicose + frutose). Polissacarídeos É uma longa cadeia formada por monôme- ros de açúcar. Sendo assim, quando hidroli- sados, são capazes de fornecer um grande número de monossacarídeos. São vistos como uma forma de reserva de açúcar tanto nos animais como nos vegetais. Glicogênio, amido (amilose e amilopectina), amidos modificados, polissacarídeos não amido (não glucanos), derivados da parede celular (celulose, hemicelulose, pectinas), polímeros de armazenagem (inulinas, frutanos e goma ágar), gomas de plantas, exsudatos e mucilagens de sementes. • Exemplos de monômeros de açúcar. Disponível em: https://bit.ly/35guEhM • Exemplos de oligossacarídeos, maltose (duas moléculas de glicose), sacarose (uma molécula de glicose e uma de frutose), lactose (glicose e uma molécula de galactose). Disponível em: https://bit.ly/2FdBNVF 18 19 Figura 5 – Estrutura da amilose Fonte: SILVA; DENARDIM, 2009 As principais fontes alimentares de carboidratos são: arroz, inhame, cana-de- açúcar, beterraba, milho, mandioca, trigo, batata, feijão, abacaxi, leite (lactose), cevada (maltose), mel e frutas, massas, pães e cereais. Na maioria das vezes, os carboidratos são encontrados na forma de polissacarí- deos, como o amido. Figura 6 – Exemplos de fontes de carboidratos Fonte: Fotolia 19 UNIDADE Introdução à Bromatologia Fibras Atualmente, ouvimos muito sobre a importância de incluir as fibras na alimenta- ção. Seus benefícios são bem conhecidos. Mas afinal, o que são as fibras? As fibras dietéticas ou fibras alimentares, como são conhecidas, nada mais são do que carboidratos complexos, (geralmente, formados por arabinoxilanos, celulose, amido resistente, dextrina resistente, inulina, lignina, ceras, quitinas, pectinas, beta- -glucanos e oligossacarídeos) e que não podem ser digeridos nem absorvidos total- mente pelo nosso organismo, ou seja, passam pelo trato gastrointestinal sem sofrer nenhum tipo de modificação, sendo eliminados nas fezes. As fibras podem ser classificadas em dois tipos: solúveis e insolúveis. As fibras solúveis podem ser dissolvidas em água, formando um gel. As insolúveis não se dissolvem em água. Você deve estar se perguntando sobre qual seria a importância de um nutriente que não é absorvido pelo nosso organismo? Pois bem, ele tem muita importância. Vejamos, a seguir, as principais funções das fibras: • Diminuem a absorção de gorduras e carboidratos simples: as fibras solú- veis, quando se ligam à água, formam um gel. A formação desse gel leva ao retardo do esvaziamento gástrico e com isso, ocorre menor absorção de gor- duras e carboidratos; • Regulam o trânsito intestinal: as fibras solúveis e insolúveis atuam no aumento do volume do bolo fecal. Em alguns casos, aumentam o trânsito intestinal e em outros diminuem; • Atuam como pré-bióticos: as fibras contribuem para o crescimento das bi- fdobactérias, que são bactérias benéficas, capazes de produzir vitaminas, ácido fólico e biotina; • Causam sensação de saciedade prolongada: como não é digerida, permane- ce um tempo maior no estômago provocando a sensação de saciedade. Além disso, o consumo de água concomitante leva ao aumento de volume por ex- pansão, e alguns tipos de fibra, quando absorvem a água, formam um gel que também causa a mesma sensação de saciedade. Vejamos, na figura a seguir, os principais tipos e suas respectivas fontes: 20 21 Figura 7 Fonte: BERNAUD; RODRIGUES, 2013 Teste Seu Conhecimento • Cite 3 exemplos de monossacarídeos; • Com relação à estrutura química, qual a diferença entre os dissacarídeos e os oligossacarídeos? • A amilopectina e a hemicelulose são exemplos de que tipo de carboidrato? • Cite os 4 benefícios das fibras para organismo; • Na camada externa de grãos e cereais, podemos encontrar que tipo de fibra? 21 UNIDADE Introdução à Bromatologia Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Leitura Estudo do Consumo Alimentar: em Busca de uma Abordagem Multidisciplinar https://bit.ly/35t1In6 Fibra Alimentar – Ingestão Adequada e Efeitos sobre a Saúde do Metabolismo https://bit.ly/2FdFOJQ Estrutura dos Grânulos de Amido e sua Relação com Propriedades Físico-químicas https://bit.ly/35qwGvT Química de Alimentos de Fennema SRINIVASAN, D., PARKER, K. L. Química de Alimentos de Fennema. 5.ed. Artemed, 2019. Capítulos 3 e 5. https://bit.ly/3jYOgeB 22 23 Referências BERNAUD, R. S. F., RODRIGUES, C. T. Fibra alimentar – Ingestão adequada e efei- tos sobre a saúde do metabolismo. Arq Bras Endocrinol Metab., v. 57, n. 6, 2013. BOBBIO, F. O.; BOBBIO, P. A. Introdução à química de alimentos. 3.ed. São Paulo: Varela, 2003. MORETTO, E. Introdução à ciência de alimentos. Florianópolis: UFSC, 2002. DECRETO LEI nº 986, de 21 outubro de 1969. Institui normas básicas sobre ali- mento, Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/assuntos/vigilancia-agrope- cuaria/ivegetal/bebidas-arquivos/decreto-lei-no-986-de-21-de-outubro-de-1969.doc/ view>. Acesso em: 20/01/2020. DENARDIN, C. C.; SILVA, L. P. da. Estrutura dos grânulos de amido e sua relação com propriedades físico-químicas. Cienc. Rural, Santa Maria, v. 39, n. 3, p. 945- 54, June 2009. KINSELLA, J. E. et al. Physicochemical and functional properties of oilseed proteins with emphasis on soy proteins. New Protein Foods: Seed Storage Proteins, Altshul, London: A. M. Wilcke, H. L. ed./Academic Press, 1985. p. 107-79. NICHELLE, G. P.; MELLO F. Bromatologia. 2018. OLIVEIRA, P. S; THÉBAUD-MONY, A. Estudo do consumo alimentar: em busca de uma abordagem multidisciplinar, Rev. Saúde Pública, v. 31, n. 2, São Paulo, abril, 1997. SALINAS, R. D. Alimentos e nutrição: introdução à bromatologia. 3.ed. Porto Alegre: Artmed, 2002 SILVA, C. O.; TASSI, E. M. M.; PASCOAL, G. B. Ciência dos alimentos: princí-pios de Bromatologia. São Paulo: Rúbio, 2017. SILVA, C. A. O Análise de Alimentos: uma abordagem multidisciplinar. Belo Ho- rizonte, 2012. SRINIVASAN, D.; PARKER, K. L. Química de Alimentos de Fennema. p. 1-4. Cap.1. 5.ed. Artemed, 2019. 23
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