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Episódio - Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência


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REDAÇÃO 
JORNALÍSTICA E A 
SOCIOLINGUÍSTICA
Marcilene Forechi
Empresas jornalísticas, 
ideologias e sua influência
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
  Discutir a possível influência ideológica sobre o texto jornalístico. 
  Identificar as características dos principais manuais de redação da 
imprensa brasileira.
  Reconhecer a influência da linha editorial do veículo no texto 
jornalístico.
Introdução
A ideologia não pode ser pensada de forma aleatória, desvinculada das 
relações de poder na sociedade. Da mesma forma, o jornalismo é um 
campo que produz realidades a partir de seus discursos e suas práticas. São 
dois conceitos que, ao caminharem juntos, produzem muitas polêmicas, 
principalmente devido ao fato de o jornalismo ser um campo que se 
baseia nos princípios da objetividade e da imparcialidade para produzir 
relatos sobre a realidade. Para entender como a ideologia interfere e 
influencia o texto jornalístico, é importante refletir sobre a distinção entre 
texto e discurso, assim como é fundamental compreender o modo como 
a imprensa se constitui no País e institui sua linha editorial. 
Neste capítulo, você entenderá a influência ideológica sobre o texto 
jornalístico, bem como identificará as características dos manuais de 
redação e reconhecerá a influência da linha editorial do veículo no texto 
jornalístico.
O texto jornalístico e as influências ideológicas
Ideologia e jornalismo são dois conceitos que caminham juntos e que pro-
duzem muitas polêmicas. Isso ocorre em função da natureza do jornalismo, 
concebido na contemporaneidade a partir das premissas da objetividade, da 
imparcialidade. O jornalismo, tomado como o campo que se encarrega de 
produzir um retrato da realidade, assume em suas rotinas a prática de “ouvir 
os dois lados da história”, de não assumir lados e de levar aos públicos um 
relato fi el dos fatos. 
Sabe-se, no entanto, que a objetividade jornalística se refere mais às prá-
ticas de produção textual do que a um modo imparcial de observar e narrar a 
realidade, visto que não é possível que alguma produção não carregue em si as 
subjetividades do contexto em que se insere e dos agentes que a produziram, 
os jornalistas. Pode-se perguntar, então, como a ideologia interfere no texto 
jornalístico e como essa interferência produz sentidos sobre a realidade a partir 
do momento em que circula nos meios de comunicação. 
Para refletir sobre essa questão, é importante entender, entre outras coisas, 
que há uma distinção entre texto e discurso. Enquanto o texto é a materializa-
ção de um relato ou narrativa em um suporte midiático — rádio, TV, jornal, 
internet —, o discurso é parte do texto jornalístico, mas não se esgota nele. 
Em outras palavras, o texto se transforma em discurso a partir do momento 
em que é ressignificado pelo público. O texto é datado, uma vez produzido, 
continuará fixado no suporte material. 
Pode-se dizer, então, que o texto jornalístico carregará as dimensões ideoló-
gicas do momento de sua produção, com todas as particularidades e dimensões 
do atual. Essa carga ideológica presente no texto jornalístico pode ocorrer de 
modo intencional ou apenas ser consequência de um modo de ver e perceber 
a realidade naquele contexto. Todavia, essa influência não ocorre de forma 
isolada, por obra e vontade do jornalista que produz o texto jornalístico. 
O texto jornalístico sofre influência do modo de pensar e se constituir da 
empresa jornalística à qual está inserido, do meio jornalístico e das condições 
políticas, sociais, econômicas e culturais da sociedade. Trata-se, portanto, 
de uma construção coletiva, sendo influenciada o tempo todo pelo discurso 
ideológico dominante, seja para alinhar-se a ele ou para se posicionar de 
forma contrária. 
O discurso jornalístico se constitui em meio a relações de poder na sociedade 
e não pode, portanto, ser compreendido fora dessa perspectiva. Dessa maneira, 
o discurso produzido pelo jornalismo sempre representará um ou mais aspectos 
da realidade em que foram negociados, a partir de vários fatores, entre eles a 
própria organização das rotinas de produção jornalística e a organização dos 
meios de comunicação. 
Ideologia pode ser entendida como um modo predominante como se con-
cebe a realidade em determinado momento da história. No livro Ideologia 
Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência2
e Técnica da Notícia, um clássico que se tornou referência na abordagem da 
notícia, Nilson Lage (2001, documento on-line) diz que foi com o surgimento 
e a ascensão da burguesia que o jornalismo “[...] tornou-se instrumento de 
luta ideológica”. Segundo ele, a burguesia ascendente utilizou o jornal para a 
difusão de ideias de livre comércio e de livre produção que lhe convinham. 
A resposta a essa prática, considerada subversiva pelos governos, viria, ainda 
segundo o autor, sob a forma de regulamentos de censura ou da edição de 
jornais oficiais vinculados aos interesses da aristocracia. 
Ainda que haja muitos questionamentos a serem feitos sobre o conceito 
de objetividade, dada sua impossibilidade diante da inevitabilidade da subje-
tividade, Lage (2001) destaca que há vantagens no uso da objetividade como 
técnica. Entre essas vantagens, ele cita, por exemplo, o compromisso com a 
realidade material, a aceleração do processo de produção e de troca de infor-
mações e a denúncia das formulações arcaicas de manipulação. 
Ideologia é um conceito de difícil definição e, por isso mesmo, de difícil entendimento. 
É importante ressaltar que não existe ideologia boa ou ideologia ruim, uma vez que 
ela não existe descolada do contexto em que se observa seus efeitos. A ideologia se 
manifesta em modos de pensar, de agir, de educar e de ser educado, nas políticas 
públicas, na produção científica. 
Não existe sociedade sem ideologia, sem modos de pensar, sem modos de produzir. 
Assim, em uma perspectiva marxista, a ideologia é um modo de mascarar a realidade 
dos meios de produção, estando relacionada à divisão da sociedade em classes sociais. 
Em uma perspectiva liberal, a ideologia está relacionada à liberdade e à autonomia 
dos sujeitos, que, quaisquer que forem as relações de poder, terão sempre poder para 
decidir sobre sua vida e sua história (CHAUÍ, 2008).
Para saber mais sobre ideologia, você pode consultar o livro O Que é Ideologia, da 
filósofa Marilena Chauí. O livro apresenta de forma breve e simples reflexões que levam 
à compreensão do conceito. 
Manuais de redação
Você já deve ter percebido que é fácil identifi car um texto jornalístico e que 
os veículos de comunicação seguem padrões nos modos de produção e apre-
3Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência
sentação das informações jornalísticas. Contudo, isso nem sempre foi assim, 
tampouco ocorreu de forma natural. Foi a partir de mudanças no modo de 
produzir, do surgimento da tecnologia, da modernização das empresas jor-
nalísticas e da regulamentação da profi ssão de jornalista que esse modo de 
fazer jornalismo conquistou uma identidade própria. 
Lage (2001) afirma que a história do jornalismo brasileiro se divide em 
quatro períodos distintos. O primeiro período corresponde ao de atividade 
panfletária e polêmica, realizada no Primeiro Reinado; na segunda fase, que 
corresponde ao Segundo Reinado, predomina a atividade literária e mundana; 
o terceiro período é marcado pela formação empresarial, na República Velha; 
e o quarto período é marcado por oposições aparentes, intensificadas, em 
grande parte, pelo uso intensivo da comunicação no controle social.
Após o fim da Primeira Guerra Mundial, iniciou-se um período de in-
fluência norte-americana sobre as sociedades e a imprensa. Esse período marca 
o início de uma profissionalização dos veículos impressos, com mudanças 
no padrão gráfico e instituição de normas de redação, que dariam mais uni-
formidade aos textos jornalísticos e sua apresentação. Segundo Lage (2001, 
documento on-line):O idealismo nacionalista marcaria os períodos mais interessantes da vida de 
Última Hora, jornal que Samuel Wainer fundou no início da década de 1950, 
com financiamento bancário. Já se começava a introduzir a diagramação e 
certo padrão era comum nos jornais quando o Diário Carioca e a Tribuna da 
Imprensa, ambos do Rio, adotaram o estilo de redação que buscava adaptar 
às contingências da língua portuguesa a técnica de produção de notícias cor-
rente nos países industrializados e que aqui já chegava através das agências 
estrangeiras.
Os manuais de redação surgiram vinculados às empresas jornalísticas, 
com o objetivo de padronizar e garantir que os jornalistas e veículos sigam 
padrões capazes de garantir objetividade e credibilidade. Em seu formato 
mais contemporâneo, eles surgem, no Brasil, na esteira da modernização dos 
jornais impressos, na década de 1950. Os manuais de redação reforçam a ideia 
do comprometimento com padrões editoriais e de estilo, além de valores como 
exatidão, pluralidade, verdade e imparcialidade. 
O comprometimento previsto em manuais de redação não se limita, por-
tanto, às regras gramaticais da língua portuguesa. Os manuais de redação se 
configuram em autorrepresentações da prática jornalística e em instruções para 
sua regulamentação, sendo possível perceber que, muitas vezes, o que consta 
nos manuais não coincide com a prática diária do jornalismo. Grillo (2003), 
Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência4
em um artigo no qual analisa os manuais de redação dos jornais Folha de S. 
Paulo e O Estado de S. Paulo, diz que essa falta de sincronia entre o que se 
diz e se recomenda nos manuais ocorre por quatro fatores, descritos a seguir.
1. Os manuais, como representação da prática jornalística, integram a pró-
pria retórica do jornal, ou seja, estão fundamentados no conhecimento, 
na construção e na manutenção das expectativas do público leitor. 
2. Os objetivos que constam nos dois manuais ultrapassam a representação 
da prática jornalística e assumem um papel normativo e pedagógico 
em relação à língua portuguesa. 
3. Os profissionais responsáveis pela elaboração dos manuais, apesar de 
pretenderem representar a prática da imprensa, ora são parte de um 
setor específico da redação, ora são profissionais exteriores, contratados 
exclusivamente para a produção dos manuais. 
4. As práticas de linguagem jornalísticas, assim como as demais, são 
regidas por uma estabilidade provisória, que se altera em função das 
inter-relações entre as mudanças da sociedade e as estratégias de iden-
tidade dos órgãos de imprensa.
Os manuais de redação se tornaram parte integrante das redações de 
veículos de comunicações, a fim de padronizar modos de produção de textos 
e modos de conduta, baseados no que se consideram condutas éticas dentro 
do jornalismo. Além disso, os manuais são uma importante ferramenta para 
lidar com os “erros”, apesar de, entre as recomendações, haver explicitamente 
a ideia de que o jornalista deve trabalhar de forma que o produto entregue 
ao público seja livre de erros e seja reconhecido por seu comprometimento 
com a verdade. 
Folha de S. Paulo
Um dos mais conhecidos manuais de redação e estilo é o Manual da Redação 
da Folha de S. Paulo, que não se limita a orientar a prática dentro do veículo. 
A publicação é utilizada em cursos de jornalismo e serve de inspiração para 
que outros veículos produzam suas próprias regras. Publicado pela primeira 
vez em 1984 (Figura 1), o Manual da Redação da Folha de S. Paulo chegou à 
sua 5ª edição em 2018, que incluiu temas como comportamento profi ssional 
nas redes sociais e enfrentamento às fake news. 
5Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência
Figura 1. O primeiro Manual da Redação da Folha de S. Paulo — e o primeiro manual no 
País — foi publicado em 1984. 
Fonte: Cabral (2018, documento on-line).
O diretor de redação do jornal, Otávio Frias Filho disse, por ocasião do 
lançamento da 5ª edição, que o Manual permite dar alguma unidade às dife-
rentes subculturas presentes na redação, reforçando a identidade do veículo. 
Além disso, segundo ele, o Manual da Redação propicia uma régua comum 
por meio da qual se pode observar desempenhos, erros, casos polêmicos, 
etc., sendo uma referência para suprir lacunas na formação do jornalista 
(CABRAL, 2018).
Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência6
Frias Filho aponta que uma das características do Manual é que, por ser 
uma publicação disponibilizada para o público externo, ele se constitui em 
ferramenta para a fiscalização e a cobrança por parte do público leitor. A nova 
edição do Manual da Redação da Folha de S. Paulo levou 24 meses para ser 
produzida e foi dividida em quatro partes. Na primeira, o Manual apresenta 
informações sobre a Folha, sua estrutura, linha editorial e princípios. A segunda 
parte apresenta orientações éticas relativas à prática profissional. A terceira 
parte é dedicada à escrita do texto jornalístico, ao passo que a quarta parte 
do Manual se dedica aos anexos temáticos, incluídos na publicação desde a 
versão de 1994.
Algumas publicações não se intitulam como “manual”, mas como guias de 
boas práticas ou de ética jornalística. Além dos manuais ligados a empresas 
jornalísticas, existem também publicações que são vinculadas a órgãos públi-
cos e instâncias de poder, as quais regem o modo como devem ser redigidos 
textos dos mais variados formatos. Esse é o caso do Manual de Redação da 
Presidência da República, por exemplo.
O Estado de S. Paulo
A primeira edição do seu Manual de Redação e Estilo foi lançada em 1990. 
De autoria do jornalista Eduardo Martins (1997, documento on-line), o livro 
se apresenta como um oásis em meio a um cenário no qual a escrita está des-
gastada, pois “[...] escreve-se pior que em gerações passadas”. O Manual, nas 
palavras do jornalista Aluízio Maranhão (MARANHÃO apud MARTINS, 
1997), contribui para o aperfeiçoamento da atividade dos jornalistas e o acervo 
de conhecimentos, antes confi nado às redações dos jornais, pois expõe, de modo 
ordenado e sistemático, as normas editoriais e de estilo adotadas pelo Estado. 
O principal objetivo do Manual, que tem cunho eminentemente jornalístico, é 
defi nir princípios que tornem uniforme a edição do jornal. O livro é dividido 
em cinco partes, sendo que a primeira apresenta, em ordem alfabética, verbetes 
sobre o que se entende ser um bom texto jornalístico, além de regras práticas 
sobre escrever bem e com elegância. 
Grupo RBS
Publicado em 2011, o Guia de Ética e Autorregulamentação Jornalística 
apresenta informações sobre o grupo RBS, sua linha editorial, ética, comu-
nicação digital, publicidade e autorregulamentação jornalística. Trata-se, 
portanto, de um documento que se distancia da ideia de manual de redação, 
7Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência
pois se constitui em um “[...] conjunto de orientações destinadas a servir de 
referência aos profi ssionais da área editorial da empresa” (GRUPO RBS, 
2011, documento on-line). A publicação traz orientações sobre a ética no 
exercício da atividade — relação com cidadãos e fontes — e na produção do 
texto jornalístico. 
EBC
Em 2013, a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) lançou a versão impressa 
do seu manual, intitulado Somente a Verdade: Manual de Jornalismo da 
EBC, disponível na Web desde 2012. A publicação, coordenada pelo jornalista 
Antonio Achilis (EBC, 2013), é considerada um marco na construção da 
comunicação pública no País. O processo de construção do Manual envolveu 
várias pessoas, inclusive externas à empresa. A publicação é dividida em oito 
capítulos, que incluem os princípios da EBC, orientações para jornalistas e 
temas específi cos, como ética e estratégias de qualidade da informação. O 
último capítulo é dedicado aos anexos, os quais incluem leis, convenções e 
tratados sobre a comunicação e o jornalismo. 
O texto jornalístico e as influências da linha 
editorial
Pena (2006) afi rma que é difícil encontrar, nesteséculo, uma empresa que 
seja estritamente jornalística. O que há são megaconglomerados de mídia, em 
que o jornalismo é apenas uma das atividades. Essa realidade impõe alguns 
desafi os para que se compreenda como os veículos de comunicação se defi nem 
editorialmente e de que modo isso afeta o modo como o texto jornalístico é 
produzido. Compreender a forma como as empresas jornalísticas se consti-
tuem, no Brasil, é uma peça fundamental para entender as dinâmicas nos mais 
diferentes suportes midiáticos. 
Um exemplo é a televisão, uma vez que ela ainda exerce grande influência 
sobre a opinião pública, apesar da disseminação de veículos digitais, com 
produções colaborativas e diversificadas. Há pelo menos dois modelos de 
constituição da televisão: o britânico e o norte-americano (Quadro 1). O 
primeiro surge sob o controle político e editorial do Estado, ao passo que o 
segundo segue uma lógica liberal, sendo fruto de investimentos privados em 
propaganda. 
Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência8
No Brasil, seguiu-se o modelo norte-americano, com o financiamento da 
televisão sendo feito pela publicidade, mas sem qualquer limite de audiência, 
o que permite a veículos, como, por exemplo, a Rede Globo de Televisão, 
alcançarem mais de 90% do território nacional. Nos Estados Unidos, esse 
limite é de 30%. Você pode se perguntar como o modelo de constituição e 
operação das redes de televisão abertas pode exercer alguma influência sobre 
a linha editorial e, por consequência, sobre o texto jornalístico.
 Fonte: Adaptado de Pena (2006). 
País Modelo
Financia-
mento Emissoras Estreia Controle Programação
Estados 
Unidos
Comercial Publicidade ABC, NBC, 
CBS
1939
(Nova 
Iorque)
Limite de 
audiência
(sem 
controle de 
qualidade)
Seriados, 
programas 
de auditório
Grã-
-Bretanha
Público Taxa anual 
paga pelo 
público
BBC, ITV 1936
(Londres)
Controle de 
qualidade 
legislativo
Jornalismo 
documentário
 Quadro 1. Modelos de televisão nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha 
Pode-se dizer que, nos dois modelos, apresentados no Quadro 1, há in-
fluência no conteúdo e na sua forma de abordagem. No modelo inglês, não há 
preocupação com a audiência, já que o financiamento é público. Essa falta de 
preocupação com a medida da audiência, importante para a venda de espaços 
publicitários, permite que haja mais espaço para programações sem apelo 
popular, o que interfere diretamente na linha editorial dos veículos. 
Já no modelo norte-americano — e no brasileiro —, a lógica é outra. Como 
as emissoras são financiadas por verbas publicitárias, a audiência torna-se um 
fator primordial. Quanto maior a audiência em determinado espaço da progra-
mação, mais cara será a veiculação publicitária e maior será a arrecadação da 
emissora. Cria-se um círculo em que a preocupação com a audiência é também 
a responsável pela definição de uma linha editorial com apelo popular, como 
programas de auditório, jornalísticos policiais e sensacionalistas, seriados, etc.
Segundo Pena (2006), os dois modelos apresentam limitações e não podem 
ser considerados totalmente bons ou ruins, apesar de admitir que, aparente-
9Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência
mente, o modelo britânico parece mais democrático e qualitativamente melhor. 
O autor aponta duas limitações importantes nos dois modelos, descritas a seguir. 
  Modelo britânico: mesmo que o controle editorial esteja nas mãos de 
instâncias representativas, a censura governamental pode ser facilitada.
  Modelo norte-americano: esse modelo pode acabar sendo censurado 
pelas grandes corporações, que são seus anunciantes, já que prega a 
desregulamentação. 
Regulamentação e censura são termos bastante controversos no Brasil e costumam 
ser confundidos com muita frequência. Conceitualmente, no entanto, são práticas 
distintas. A censura é exercida de forma abrupta, sem critérios definidos, sem amparo 
legal e sem que haja consultas a órgãos deliberativos. Já a regulamentação diz respeito 
a preceitos formulados por agentes representativos da sociedade e materializados em 
leis, aprovadas dentro de processos democráticos. Pode-se pensar a partir da seguinte 
perspectiva: todas as nossas ações dentro da sociedade são regulamentadas, o que 
é absolutamente normal; existem leis que regulamentam o trânsito, as relações de 
consumo, a produção de alimentos, o uso dos recursos naturais, as condutas éticas e 
morais, entre outras (PENA, 2006). 
A observação de programas jornalísticos televisivos e a leitura de jornais 
e revistas é importante para que haja uma reflexão sobre o modo como a 
linha editorial de um veículo de comunicação interfere no texto jornalístico. 
Academicamente, essa análise de veículos de comunicação é conhecida como 
Estudos Comparados, e, no Brasil, não é uma prática comum entre estudantes 
ou profissionais. O principal objetivo desses estudos é permitir que haja uma 
comparação mais qualificada e mais ampla sobre as diversas possibilidades 
de jornalismo no mundo, nos mais diferentes suportes de mídia. 
O livro Teoria do Jornalismo: Identidades Brasileiras, de autoria de José 
Marques de Melo (2006), é fruto de uma pesquisa que compara o trabalho 
praticado pela imprensa latino-americana e o desenvolvido nos modelos norte-
-americano e europeu. A análise revelou diferenças substanciais na estrutura 
noticiosa entre os jornais. 
De acordo com o estudo, jornais publicados na América Latina atribuem 
prioridade às notícias sobre esportes e espetáculos, informações práticas e 
Empresas jornalísticas, ideologias e sua influência10
variedades, fatos policiais e acidentes, bem-estar público, problemas sociais 
e meios de comunicação coletiva. Já os jornais norte-americanos e europeus 
dedicam mais espaço às notícias sobre economia, política internacional, política 
nacional, educação, cultura e religião. 
CABRAL, G. Manual da redação da Folha chega à 5ª e mais ampla versão: desde os anos 
1980, jornal garante acesso do público externo a suas regras. Folha de São Paulo, 2018. 
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CHAUÍ, M. O que é ideologia. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 2008.
EBC. Manual de jornalismo da EBC: somente a verdade. Brasília: EBC, 2013. Disponível 
em: http://www.ebc.com.br/institucional/sites/_institucional/files/manual_de_jorna-
lismo_ebc.pdf. Acesso em: 7 ago. 2019.
GRILLO, S. V. C. Manuais de redação e estilo: gêneros do discurso, linguagem e objeti-
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Guia_de_Etica_e_Autorregulamentacao_Jornalistica.pdf. Acesso em: 7 ago. 2019.
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MELO, J. M. Teoria do jornalismo: identidades brasileiras. São Paulo: Paulus, 2006.
PENA, F. Teoria do jornalismo. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2006.
Leitura recomendada
PONTES, F. S. O conceito de ideologia na teoria do jornalismo de Adelmo Genro Filho. 
Galáxia (São Paulo, Online), n. 32, p. 151-162, 2016. Disponível em: http://www.scielo.br/
pdf/gal/n32/1982-2553-galaxia-32-00151.pdf. Acesso em: 7 ago. 2019.
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