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Notas de Aula
Heily Wagner
3 de novembro de 2020
1 Álgebras
Antes de definirmos álgebras vamos relembrar o que é um anel e o que é um corpo.
Anéis
Um anel R é um conjunto munido de duas operações, soma (+) e multiplicação (.), tais
que
1. R munido da soma é um grupo abeliano, ou seja,
(a) + é associativa;
(b) existe elemento neutro;
(c) Para todo x ∈ R existe o oposto −x ∈ R;
(d) + é comutativa.
2. A multiplicação é distributiva em relação a soma, ou seja, x.(y + z) = x.y + x.z e
(y + z).x = y.x+ z.x, para todo x, y, z ∈ R;
3. A multiplicação é associativa, ou seja, x.(y.z) = (x.y).z , para todo x, y, z ∈ R.
Obs.: Daqui para frente quase sempre omitiremos o śımbolo de multiplicação.
Dizemos que o anel R é com identidade (ou com unidade) se existir um elemento
1R em R tal que 1Rx = x1R = x, para todo x em R; e dizemos que o anel R é comutativo
se xy = yx, para todo x, y ∈ R. Se R for um anel comutativo com identidade no qual todo
elemento não nulo é invert́ıvel (isto é, para cada x ∈ R existe y ∈ R tal que xy = 1R) então
R é dito um corpo.
1
Álgebras
Seja k um corpo. Uma k-álgebra A é um anel com unidade que ao mesmo tempo é um
espaço vetorial sobre k (com a mesma soma) e tal que as estruturas de anel e de espaço
vetorial são compat́ıveis, ou seja, para todo x ∈ k e para todo a, b ∈ A vale:
x(ab) = a(xb) = (xa)b.
Uma k-álgebra é dita de dimensão finita se A tem dimensão finita como k-espaço
vetorial.
Exemplo 1 A toda k-álgebra A corresponde um outra k-álgebra, chamada de álgebra
oposta Aop que tem a mesma estrutura de k-espaço vetorial de A, mas a multiplicação ∗
é definida por a ∗ a′ := a′a para todo a, a′ ∈ A. Observe que se a estrutura de anel de A
for comutativa então A e Aop coincidem.
Exemplo 2 (Álgebra de Matrizes) Seja k um corpo. O conjunto Mn(k), das matrizes
n × n com coeficientes em k, munido das operações usuais de matrizes, é uma k-álgebra
de dimensão finita.
Exemplo 3 Seja V um k-espaço vetorial de dimensão finita e considere EndV o conjunto
de todos os endomorfismos de V , ou seja, todas as transformações lineares de V em V .
Já sabemos que EndV é um k-espaço vetorial. Se consideraremos a composição de funções
veremos que EndV é também uma k-álgebra.
Exerćıcio 1 As álgebras dos exemplos anteriores são comutativas? Têm unidade? Qual
é a dimensão de cada uma? Existe alguma relação entre elas?
Exerćıcio 2 Você conhece algum outro conjunto que você estudou no curso de Álgebra
linear como espaço vetorial e depois como anel no curso de Anéis? Verifique se se trata de
uma álgebra.
Exemplo 4 Sejam A1 e A2 duas k-álgebras. O produto das álgebras A1 e A2 é a
k-álgebra A = A1 ×A2 com
1. soma dada por (a1, a2) + (b1, b2) = (a1 + b1, a2 + b2)
2. multiplicação dada por (a1, a2)(b1, b2) = (a1b1, a2b2)
3. elemento identidade 1 = (1, 1)
Observe que usamos a mesma notação de soma e de multiplicação em A1, A2 e em A1×A2.
O mesmo para a notação de identidade. Reescreva usando notações diferentes para cada
uma.
2
Vejamos mais algumas definições que vocês já conhecem em outros contextos e que
serão úteis no futuro: subálgebra, ideais e álgebra quociente.
Um k-subespaço vetorial B da k-álgebra A é uma k-subálgebra de A se bb′ ∈ B,
∀b, b′ ∈ B e 1A ∈ B. (Ou seja, B é um k-subespaço vetorial e um subanel.)
Um k-subespaço vetorial I de uma k-álgebra A é um ideal à direita de A se αa ∈ I,
para todo α ∈ I e para todo a ∈ A. Se aα ∈ I, ∀α ∈ I, ∀a ∈ A então I é um ideal à
esquerda de A. Se I é um ideal à direita e um ideal à esquerda, então I é um ideal
bilateral de A ou simplesmente um ideal de A.
Exemplo 5 Consideremos I um ideal de uma k-álgebra A. Seja A
I o conjunto das classes
módulo I da forma a+I= {a+α : α ∈ I}, para todo a ∈ A. Então, A
I tem uma estrutura
de k-espaço vetorial dada por (a+ I)+(b+ I) :=(a+ b) + I e x(a+ I):= xa+ I, para todo
a, b ∈ A e para todo x ∈ k e tem uma estrutura de anel dada por (a+ I) (b+ I) :=ab+ I,
para todo a, b ∈ A. Além disso, essas duas estruturas são compat́ıveis, ou seja, para todo
a, b ∈ A e para todo x ∈ k: x((a + I)(b + I))= (a + I)(x(b + I)) = (x(a + I))(b + I).
Portanto, A
I é uma k-álgebra, a qual chamamos de álgebra quociente de A por I.
Seja I um ideal à direita da k-álgebra A. Um subconjunto S ⊆ I é dito um gerador
do ideal I se I= {
n∑
i=1
αiai | n ∈ N, αi ∈ S, ai ∈ A}. Se S for finito, I é dito finitamente
gerado.
Diremos que um ideal I de uma k-álgebra A é nilpotente se existir um inteiro positivo
n tal que In = 0, onde In := {
n∑
i=1
α1iα2i ...αni | αji ∈ I}.
Exemplo 6 Seja k um corpo. O conjunto A =
(
k 0
k k
)
:=
{(
x 0
y z
)
| x, y, z ∈ k
}
é
uma k-subálgebra da álgebra de matrizes M2(k).
O conjunto I =
(
0 0
k 0
)
é um ideal (bilateral) de A nilpotente e é gerado por S ={(
0 0
1k 0
)}
, onde 1k é a unidade do corpo k.
Um ideal I de uma k-álgebra A é dito maximal se não existir um ideal Ī 6= I, Ī 6= A
tal que I⊂ Ī ⊂ A.
Proposição 1 Sejam A uma k-álgebra de dimensão finita e I um ideal de A. São equi-
valentes:
1. I é um ideal nilpotente maximal.
2. I é a interseção de todos os ideais maximais.
3
Um ideal com as propriedades da proposição acima é chamado de radical (de Jacobson)
de A e é denotado por radA.
Proposição 2 Considere A uma álgebra e radA o radical de Jacobson de A. Então
1. radA é um ideal bilateral e rad (A/radA) = 0.
2. Se I é um ideal (bilateral) nilpotente de A então I ⊆ radA.
3. Se I é um ideal nilpotente de A tal que a álgebra A/I é semisimples, ou seja, é
isomorfa a um produto de cópias do corpo k × k × · · · × k, então I = radA.
1.0.1 Morfismos de álgebras
Sejam A e B duas k-álgebras. Um morfismo ou homomorfismo de k-álgebras de A
em B é uma aplicação ϕ : A → B que é k-linear e é um homomorfismo de anéis, isto é,
para todo a1, a2 ∈ A e x, y ∈ R:
• ϕ(xa1 + ya2) = xφ(a1) + yφ(a2);
• ϕ(a1a2) = φ(a1)φ(a2);
• ϕ(1A) = 1B;
Se ϕ é bijetora então ϕ é dita um isomorfismo de álgebras. Neste último caso,
dizemos que as álgebras A e B são isomorfas e denotamos por A ∼= B.
Exemplo 7 Se A é uma k-subálgebra de B, então a aplicação ι : A → B, definida por
ι(a) = a, é um morfismo de álgebras injetor, chamado de inclusão canônica.
Se I é um ideal bilateral de A então, a aplicação π : A → A
I , definida por π(a) = a+ I é
um morfismo de álgebras sobrejetor e é chamado de projeção canônica.
Se ϕ : A→ B é um morfismo de álgebras então valem:
1. A imagem de ϕ ( Im ϕ := {ϕ(a) | a ∈ A } ) é uma subálgebra de B;
2. ϕ(0) = 0;
3. ϕ(−a) = −ϕ(a);
4. O núcleo de ϕ ( Ker ϕ := {a ∈ A | ϕ(a) = 0} ) é um ideal bilateral de A;
5. ϕ é injetora se, e somente se, Ker ϕ = 0;
6. ϕ(radA) ⊆ radB.
Proposição 3 (Teorema do isomorfismo para álgebras) Se ϕ : A → B é um mor-
fismo sobrejetor de álgebras, então
A
Ker ϕ
∼= B
4
Álgebra conexa
Um elemento e de uma k-álgebra é dito idempotente se e2 := ee = e. Um idempotente e é
dito central se dado a ∈ A tem-se ea = ae. Dois idempotentes e e ē são ditos ortogonais
se eē = ēe = 0. Um idempotente e é dito primitivo se dados os idempotentes ortogonais
ê e ě com e = ê+ ě então ê = 0 ou ě = 0. F
Exerćıcio 3 No exemplo 4, denote por e1 = (1, 0) e e2 = (0, 1) em A = A1×A2. Observe
que a identidade de A é 1 = e1 + e2. Mostre que e1 e e2 são idempotentes centrais.
Uma k-álgebra A, não nula, é dita conexa (ou indecompońıvel) se A = A1 ⊕ A2,
com A1 e A2 duas k-álgebras implicar que A1 = 0 ou A2 = 0; ou equivalentemente, se os
únicos idempotentes centrais são 0 e 1A.
Álgebra básica
Se e é um idempotente da k-álgebra A então eA := {ea ∈ A | a ∈ A} é um ideal à direita
de A e Ae é um ideal à esquerda de A. Um ideal à direita I de A é dito indecompońıvel
se I é não nulo e se I = I1⊕I2 com I1 e I2 dois ideais à direita de A implicar que I1 = 0
ou I2 = 0.
Se e 6= 0 é primitivo então eAé um ideal à direita indecompońıvel eA = eA⊕(1−e)A. Se
A tem dimensão finita então existe um conjunto {e1, e2, · · · , en} de idempotentes ortogonais
e primitivos tais que 1 = e1+e2+· · ·+en. Tal conjunto induz uma decomposição do k-espaço
vetorial A = P1 ⊕ P2 ⊕ · · · ⊕ Pn onde cada Pi = eiA é um ideal à direita indecompońıvel.
Reciprocamente, se A = P1⊕P2⊕ · · ·⊕Pn com cada Pi um ideal à direita indecompońıvel
então existe um conjunto {e1, e2, · · · , en} de idempotentes ortogonais e primitivos tais que
1 = e1 + e2 + · · ·+ en e cada Pi = eiA.
Um tal conjunto é chamado de conjunto completo de idempotentes ortogonais
e primitivos de A.
Exemplo 8 Considere a álgebra das matrizes quadradas de ordem n e ei a matriz que tem
1 na posição (i, i) e zero nas outras. Então, {e1, e2, · · · , en} é um conjunto completo de
idempotentes ortogonais e primitivos de A = Mn(k). Nesse caso, A = e1A⊕· · · enA e cada
eiA é o conjunto das matrizes cujas entradas fora da linha i são todas nulas.
Uma transformação linear f : I → J entre os ideais à direita I e J é dita A-linear se
f(xa) = f(x)a para todo x ∈ I e todo a ∈ A. Se existe uma bijeção A-linear f : I → J
então a inversa também é A-linear e nesse caso escreveremos I ∼ J .
Atenção 1 É importante observar que se I e J são tais que I ∼ J então I e J são
isomorfos como k-espaços vetoriais, mas a rećıproca não é verdadeira.
5
Exerćıcio 4 Considere a transformação linear f : I → J entre os ideais à direita I e J
da k-álgebra A, Suponha que {v1, · · · , vn} é uma base de I. Mostre que para que f seja
A-linear basta que f(via) = f(vi)a para todo i e para todo a ∈ A.
Exemplo 9 No exemplo anterior é fácil ver que eiA e ejA são k-espaços vetoriais iso-
morfos pois cada um tem dimensão n. Vejamos agora que eiA ∼ ejA. Observe que
{ei1, ei2, · · · , ein} é uma base para o k-espaço vetorial eiA. Defina a transformação li-
near f : eiA → ejA fazendo f(eil) = ejl para l = 1, 2, · · · , n. Agora verifiquemos que f é
A-linear. Seja a =
∑
r,s xrsers uma matriz qualquer onde xrs ∈ k. Então, para cada l,
teremos
eila = eil(
∑
r,s
xrsers) =
∑
r,s
eil(xrsers) =
∑
r,s
xrseilers =
∑
s
xlseis
e então
f(eila) = f(
∑
s
xlseis) =
∑
s
xlsf(eis) =
∑
s
xlsejs
Por outro lado,
f(eil)a = ejla = ejl(
∑
r,s
xrsers) =
∑
r,s
xrsejlers =
∑
s
xlsejs
e portanto vale que f(eila) = f(eil)a para l, i e a arbitrários. Segue do exerćıcio anterior
que f é A-linear como queŕıamos. Isso mostra que vale e1A ∼ eiA para todo i = 2, ..., n.
Exerćıcio 5 Justifique cada igualdade dada no exemplo acima.
Exerćıcio 6 No exemplo anterior, construa uma transformação linear de A em (e1A)n
que é também A-linear. Aqui (e1A)n significa (e1A)n = e1A× e1A× · · · × e1A.
Definicão 1 Seja A uma álgebra e suponha que A pode ser decomposta como soma de
ideias à direita A ∼ P1 ⊕ P2 ⊕ · · · ⊕ Pn com cada Pi um ideal à direita indecompońıvel de
A. A álgebra A é dita básica se Pi 6∼ Pj para todo i 6= j.
Vimos que a álgebra de matrizes de ordem n não é uma álgebra básica. Vejamos agora
um exemplo de uma álgebra matricial que é básica.
Exemplo 10 Considere A = T2(k) a subálgebra de M2(k) dada pelas matrizes triangulares
inferiores, ou seja
A =
(
k 0
k k
)
:=
{(
x 0
y z
)
| x, y, z ∈ k
}
Neste caso, {e11, e22} é um conjunto completo de idempotentes ortogonais e primitivos e
uma decomposição de A em soma de ideais à direita indecompońıveis é
A = e11A⊕ e11A =
(
k 0
0 0
)
⊕
(
0 0
k k
)
6
Os ideais e11A e e11A não são isomorfos como k espaços vetoriais (porquê?) e portanto
não existe uma bijeção A-linear entre eles. Logo, A é uma álgebra básica.
Exerćıcio 7 Generalize o exemplo anterior e mostre que Tn(k) é uma álgebra básica para
qualquer n.
Exerćıcio 8 Mostre que a álgebra das matrizes diagonais de ordem n é uma álgebra básica.
O Teorema abaixo é um dos teoremas mais importantes da área e motiva o estudo de
álgebras de caminhos. Seu enunciado não será completamente entendido neste momento do
curso. Mas aos poucos vamos descobrir o que cada termo significa nas próximas semanas.
Quanto a demonstração mais detalhada desse resultado pode ser encontrada, por exemplo,
na Apostila de Flávio Coelho que está nas referências bibliográficas. Tal demonstração
pode ser um dos temas de estudo individual que se dará na segunda parte da disciplina.
Teorema 4 (Teorema de Gabriel) Seja A uma álgebra básica indecompońıvel e de di-
mensão finita sobre um corpo algebricamente fechado. Então existe um quiver finito e
conexo Q e I um ideal admisśıvel da álgebra de caminhos kQ tal que A é isomorfa ao
quociente da álgebra de caminhos kQ/I.
Já sabemos todas as palavras que se encontram na hipótese do teorema, agora vamos
começar a entender a tese.
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