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Glicídeos 35 GLICÍDEOS IMPORTÂNCIA O s glicídeos e seus derivados encontram-se amplamente difundidos na natureza e desempenham um papel fundamental na vida dos animais, dos vegetais e dos microorganismos. Os glicídeos mais simples são utilizados na produção de energia, na síntese de compostos não glicídicos e são constituintes essenciais de substâncias como ácidos nucléicos e outros cofatores requeridos pelo metabolismo celular. Os glicídeos mais complexos são os principais componentes das paredes celulares de plantas e microorganismos, desempenhando um papel estrutural. Podem funcionar, também, como material de reserva. Outros polímeros lubrificam juntas esqueléticas e participam no reconhecimento e adesão entre células. Polímeros mais complexos covalentemente ligados a proteínas ou lipídeos atuam como sinais que determinam a localização intracelular ou o destino metabólico dessas moléculas híbridas, denominadas glicoconjugados. CONCEITO Os glicídeos podem ser definidos como polihidroxialdeídos ou polihidroxicetonas ou como substâncias que produzem um destes compostos por hidrólise. CLASSIFICAÇÃO Os glicídeos podem ser classificados em 3 grupos: �Monossacarídeos �Oligossacarídeos �Polissacarídeos Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 36 Monossacarídeos: (mono em grego = um) - São glicídeos simples, não hidrolisáveis, hidrossolúveis, sólidos e de sabor doce. Eles têm como fórmula geral (CH2O)n onde n t 3. Na natureza, o monossacarídeo mais abundante é o açúcar de seis carbonos D-glicose, também denominado dextrose. Exemplo: D-glicose e D-frutose C O C H OH H H C H OH C H OH C CH 2 O H HO D-Glicose HO CH2 OH C OHH C OHH C H C O CH2 OH D-Frutose Oligossacarídeos: (oligo, grego = pouco) - São compostos de 2 a 10 moléculas de monossacarídeos unidos por ligações glicosídicas. São hidrossolúveis, sólidos e de sabor doce. Os mais abundantes são os dissacarídeos com duas unidades de monossacarídeos como a sacarose ou açúcar de cana, constituídos pelos açúcares de seis carbonos D-glicose e D-frutose. Nas células, a maioria dos oligossacarídeos com 3 ou mais unidades de monossacarídeos não ocorrem como entidades livres mas ligadas a outro tipo de moléculas, lipídeos ou proteínas. O CH2OH OH OH CH2OH H H H O O CH2OH OH OH OH H H H H H O resíduo de D-D-glicose resíduo de E-D-frutose Sacarose (ligação D-1, E-2) Polissacarídeos: (poli, grego = muito) - São compostos que podem conter centena ou milhares de monossacarídeos por hidrólise. São insolúveis em água, sem gosto e possuem elevado peso molecular (PM). Algumas dessas moléculas de polissacarídeos como a celulose são cadeias lineares enquanto que outras, como o glicogênio, apresentam cadeias ramificadas. Tanto a celulose quanto o amido são constituídos por unidades de D-glicose, mas diferem no tipo de ligação glicosídica e, consequentemente, apresentam notáveis diferenças em suas propriedades e papéis biológicos. Exemplo: Amido, glicogênio, celulose. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 37 MONOSSACARÍDEOS Importância e ocorrência biológica Os monossacarídeos mais abundantes nos alimentos, principalmente em sucos de frutas, são D- glicose e D-frutose; outros como D-galactose, D-manose, D-xilose, L-arabinose e D-ribose são também encontrados, porém, em pequenas quantidades. Desses, a glicose é o monossacarídeo mais importante sendo encontrado em muitas variedades de plantas assim como no sangue de animais. A glicose pode ser estocada sob a forma de glicogênio (músculo e fígado de animais e em microorganismos) ou amido (vegetais) e é o açúcar oxidado preferencialmente por todos os tipos de células para a produção de energia. Classificação Os monossacarídeos podem ser classificados em aldoses e cetoses, se tiverem um grupamento aldeído e cetona, respectivamente. Dependendo do número de átomos de carbono, eles podem ser classificados em trioses, tetroses, pentoses, hexoses, heptoses, por exemplo. Características Isomeria - Centros assimétricos Isômeros são todas aquelas substâncias que apresentam a mesma fórmula geral. C2H6 0 álcool etílico CH3 CH2 OH C2H6 0 éter metílico CH3 O CH3 A isomeria pode ser dividida em isomeria estrutural (de função, de cadeia, de posição) e estereoisomeria (ótica e geométrica). Dois tipos de isomeria são encontrados nos glicídeos: isomeria estrutural de função e estereoisomeria ótica. A D-glicose e a D-frutose são exemplos de isomeria estrutural de função, pois apresentam a mesma fórmula molecular e diferentes grupos funcionais (grupamentos aldeído e cetona, respectivamente). Os isômeros óticos são de 2 tipos: enanciômeros e diastereoisômeros. Enanciômeros: apresentam as mesmas propriedades químicas e físicas (ponto de fusão, ponto de ebulição, solubilidade em água, etc.) diferindo apenas no desvio do plano da luz polarizada, sendo um isômero a imagem especular do outro. Exemplos: D e L-gliceraldeído HO CH 2 OH H OH H C O C C O C H H CH 2 OH D-Gliceraldeído L-Gliceraldeído O D(+)Gliceraldeído desvia o plano da luz polarizada para a direita enquanto o L(-)Gliceraldeído o faz para a esquerda. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 38 Este composto existe em duas formas diferentes porque possui um centro de assimetria (1 átomo de C assimétrico). Todos os monossacarídeos apresentam átomos de C assimétricos e quanto maior o número de átomos de C assimétricos maior o número de isômeros óticos. O gliceraldeído é tomado como referência para a determinação da configuração de toda a série de substâncias oticamente ativas. A configuração do C assimétrico mais distante do grupamento funcional aldeído ou cetona determina se o glicídeo pertence à série D (hidroxila representada para a direita) ou à série L (hidroxila representada para a esquerda), isto é, se está relacionado estruturalmente ao D ou ao L gliceraldeído. Exemplo: D e L-glicose C C C C C H H H H OH OH OH OH CH2OH H O CH2OH C C C C C OH OH OH OH H H H H H O D - glicose e L - glicose são enanciômeros D-Glicose L-Glicose O fato do glicídeo pertencer à série D não implica necessariamente no fato de que ele seja dextrorrotatório, ou seja, desvie o plano da luz polarizada para a direita. Exemplo: A D-glicose e a D-frutose pertencem ambas à série D, entretanto, a D-glicose é dextrorrotatória (D(+) glicose) enquanto que a D-frutose é levorrotatória (D(-) frutose). Diastereoisômeros: apresentam propriedades físicas e químicas diferentes. A maioria das hexoses dos organismos vivos são D-isômeros. Cada uma das oito D-aldohexoses que diferem na estereoquímica do C-2, C-3 ou C-4 possui seu próprio nome: D-glicose, D-galactose, D-manose. Exemplo: D-glicose, D-manose, D-galactose HO C O C H OH H HC H OHC H C CH2 OH HO D-Manose C O C H OHH HC H OHC H OHC CH2 OH HO D-Glicose HO C O C H OHH HC H OH C H C CH2 OH HO D-Galactose Quando diastereoisômeros de uma mesma série diferem um do outro apenas em relação à configuração de um único átomo de C assimétrico (que não seja aquele que determina a série) eles são ditos epímeros, como é o caso da D-glicose e a D-manose ou a D-glicose e a D- galactose. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 39 Mutarrotação Por uma questão de didáticae simplificação, até agora as estruturas de várias aldose e cetoses foram representadas na forma de cadeias lineares. De fato, em solução aquosa, aldotetroses e todos os monossacarídeos com cinco ou mais átomos de carbono em seu esqueleto ocorrem, predominantemente, como estruturas cíclicas (anéis) em que o grupo carbonila formou uma ligação covalente com o oxigênio de um grupo hidroxila localizado ao longo da cadeia. A formação destas estruturas em anel é o resultado de uma reação geral entre aldeídos ou cetonas e álcoois formando derivados chamados hemiacetais ou hemicetais que contêm um novo centro quiral, o carbono da carbonila (átomo de carbono assimétrico adicional) e, então, pode existir em duas formas estereoisômeras. A reação de uma segunda molécula de álcool produz um acetal ou cetal. Quando o segundo álcool é parte de uma outra molécula de açúcar, a ligação resultante é denominada ligação glicosídica. R C O H R` OH+ + R` H O CR OH OHR` O R C O H R` R` aldeído álcool hemiacetal acetal cetalhemicetal álcoolcetona O CR O R`OH OH R C O R` ++ OHR`` O CR R` R`` R`` R`` R`` No caso dos glicídeos, a existência desses grupamentos numa mesma molécula, (grupamentos aldeído ou cetona e grupamento alcoólico) permite uma reação intramolecular. Por exemplo, a D-glicose existe em solução como um hemiacetal intramolecular, em que o grupo hidroxila do C-5 reagiu com o grupo aldeído do C-1 tornando este C-1 um centro quiral e produzindo 2 estereoisômeros designados D e E. Formas isoméricas de monossacarídeos que diferem somente em sua configuração em torno do átomo de carbono hemiacetal ou hemicetal são denominados anômeros e o átomo de carbono hemiacetal ou hemicetal é chamado carbono anomérico. Os D e E anômeros da D-glicose sofrem interconversão em solução aquosa por um processo denominado MUTARROTAÇÃO que pode ser visualizado quando a D-glicose, por exemplo, é dissolvida em água. Esta solução tem um poder rotatório específico inicial, que vai se modificando gradativamente até atingir o valor de (+52,7o). Isto acontece porque a reação intramolecular dá origem a mais um C assimétrico na molécula e por conseguinte, a duas formas isômeras de D-glicose, denominadas D-D-glicose (com poder rotatório de (+112,2o) e E-D-glicose (com poder rotatório de (+18,7o). Se tivermos uma solução recém preparada de D-D-glicose, esta vai se transformando em E-D- glicose até atingir um equilíbrio entre as duas formas e vice-versa. Essa mistura consiste de cerca de um terço de D-D-glicose e dois terços de E-D-glicose e de quantidades muito pequenas das formas lineares e anéis de cinco componentes. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 40 O OH H H H H O H OH C H 2 O H H O H O OH H H H H OH OH CH2OH H OH C C C C C H O O H O H O H H O H H H H C H 2 O H CH2OH OHH C C C C C OH OH OHH H H O D -D-Glicopiranose -D-Glicopiranose E OH hidroxila heterosídica = E-D-glicoseD-D-glicose Como esta reação intramolecular é reversível, a solução de glicose apresenta na realidade as três estruturas em equilíbrio, sendo que a forma aberta representa somente cerca de 0,025% do total dissolvido. De acordo com o esquema anterior para a forma cíclica da glicose, notamos que o grupo aldeído do carbono 1 e o grupo hidroxila do carbono 5 reagiram para formar o hemiacetal cíclico, dando aparecimento a um anel de 6 elementos chamado piranose que é o mais comum para todos os glicídeos. Entre os glicídeos também encontramos hemiacetais cíclicos com 5 elementos denominados furanose. Estas denominações são dadas por analogia aos éteres cíclicos pirano e furano. CHHC CH O HC O OH OH H H H C 2OH CH2OH OH H H2C CH CHHC HC O O OH OH OH OH H H H H H CH2OH Furano Fruto-furanose Pirano Glicopiranose Este tipo de projeção representa melhor a configuração das oses. As fórmulas em perspectiva de Haworth são comumente usadas para mostrar as formas em anel dos monossacarídeos. Entretanto, o anel de 6 membros não é planar, como as perspectivas de Haworth sugerem, e tendem a assumir uma das duas conformações em cadeira. Nele, o anel está situado no plano horizontal e as OH e os H estão em plano perpendicular. As OH situadas à direita na projeção de Fischer são representadas abaixo no plano do anel, e as situadas à esquerda, acima. A estrutura UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 41 cíclica dos glicídeos explica melhor as suas propriedades, uma vez que eles se comportam mais como hemiacetais do que como aldeídos ou cetonas. Obs: A presença de OH heterosídica livre (isto é, não comprometida numa ligação química) confere à molécula poder redutor. Propriedades Químicas Ação de ácidos Soluções diluídas de ácidos inorgânicos à temperatura ambiente, além de catalisarem a anomerização têm pouco efeito sobre os monossacarídeos. Ácidos inorgânicos concentrados, a quente, produzem mudanças complexas que envolvem desidratação. As pentoses quando tratadas, por exemplo, com HCl 12% a quente são completamente transformadas em furfural. C C CC C H H H H H OH OHHO HO O H C C CC C O H H H H O H + H2O+ 3 Pentose Furfural As aldohexoses produzem 5-hidroximetilfurfural. Acredita-se que no primeiro estágio da reação haja formação do 1,2 enediol correspondente, que então sofre posterior desidratação e ciclização, de acordo com o esquema a seguir: H O H 2 C H H H C C C C O OH OH HO HO H C O C C C C H H H H H + H2O + H H H C C C C HO HO OH OH H O H2C CHOH C HOHHOH2 C HO OH OH HO H O H 2 C C H OH +H2O O C C C C H H H H H C C C C O CHOHHOH2C OH H2O + HOH 2 C O C C C C H H C O H aldohexose 5-hidroximetilfurfural H+ ' cetohexose As cetohexoses, particularmente a D-frutose, são também convertidas a 5-hidroximetilfurfural mais facilmente e com maior rendimento. Segundo Haworth, isto ocorre porque a frutose reage na forma furanosídica. Testes coloridos para vários açúcares baseiam-se nestas reações. O 5-hidroximetilfurfural pode sofrer uma posterior degradação dando ácido levulínico e quantidades consideráveis de produtos de condensação escuros, conhecidos como huminas. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 42 H O C H H C C C C O H O H 2 C + H2O HCOOH HO H C H C HH C O C O CH3 5-hidroximetilfurfural ácido fórmico ácido levulínico 2 Ação de bases Os monossacarídeos sofrem profundas mudanças em soluções diluídas de bases inorgânicas. As reações podem ser divididas em 3 grupos: �isomerização �clivagem em produtos com menor número de átomos de carbono �mudanças estruturais profundas com simultânea oxidação e redução produzindo ácidos sacaríneos. Isomerização O álcali exerce este efeito estabelecendo o equilíbrio entre o monossacarídeo e uma estrutura enediol. Exemplo: O CH2OH OH OH OH H H H H H OH C C OH H OH C C OH OH H OH - Uma aldose dá origem a uma mistura de substâncias que contém além da aldose original, seu epímero e a cetose correspondente a esse par de epímeros. Assim, quando uma solução de glicose é colocada em álcali diluído (por exemplo:NaOH 0,05N), à temperatura ambiente por determinado tempo e, posteriormente acidificada, fornece uma mistura de manose (25%), frutose (31%) e glicose (63,5%). Acredita-se que um produto intermediário nestas conversões é sempre um 1,2 enediol que, no equilíbrio, pode dar um par de aldoses epímeras e uma cetose. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 43 OH OH H C CC O C H OHH C C HHHO HO HO C C H O CH 2 O H Aldose Aldose Cetose 1,2 enedio l HC C C H HHO HO O Uma permanência por mais tempo na solução de NaOH 0,05N ou o uso de soluções mais concentradas (por exemplo, NaOH 0,5N) leva à formação não apenas do 1,2 enediol, mas também do 2,3 e 3,4 enedióis, que são aparentemente produzidos a partir de cetoses presentes na mistura. Poder redutor Tanto as aldoses como as cetoses (que têm a OH heterosídica livre) apresentam as mesmas propriedades que os aldeídos e são capazes de serem oxidadas por soluções alcalinas de metais (Cu2+, Fe3+, Ag+, Bi3+ e Hg2+), quando o grupo carbonila é oxidado a grupo caboxílico. A esta propriedade denomina-se poder redutor. Glicose e outros açúcares capazes de reduzir esses íons, são denominados açúcares redutores. A oxidação do carbono anomérico da glicose e de outros açúcares é a base para a reação de Fehling. Sob condições alcalinas é produzido o ion cuproso, Cu1+, que forma um precipitado vermelho de óxido cuproso. Na forma de anel hemiacetal, o C-1 da glicose não pode ser oxidado pelo Cu2+. Entretanto, como a forma em cadeia aberta está em equilíbrio com a forma cíclica, eventualmente a reação de oxidação é completada. A reação com Cu2+ não é tão simples quanto parece: além do D-gliconato, alguns ácidos de cadeia menor são produzidos pela fragmentação da glicose. É possível estimar a concentração desse açúcar, medindo-se a quantidade de agente oxidante reduzido. As cetoses são agentes redutores tão efetivos quanto as aldoses embora as cetonas simples não o sejam. Alguns autores apontam os enedióis formados nesta interconversão aldose-cetose em soluções alcalinas, como substâncias altamente reativas e responsáveis pela redução dos agentes oxidantes. Outros atribuem esta propriedade ao grupamento aldeído na forma aberta que também está presente nesta interconversão. Outros ainda, sugerem que, em meio básico, há a formação de uma série de produtos de degradação que apresentam propriedades redutoras . O poder redutor é uma propriedade muito usada para determinações quali e quantitativas de açúcares, sendo os reagentes contendo Cu2+ os mais comumente utilizados. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 44 O CH2OH OH OH OH H H H H H OH 1 3 4 2 6 5 C C C C C OH OH OH HO H H H H H CH2OH O Cu2 2+ Cu2 + C C C C C OH OH OH HO H H H H CH2OH OO - 1 3 4 2 6 5 E-D-Glicose D-Glicose D-Gliconato (forma linear) Clivagem em produtos com menor número de átomos de carbono: Um tratamento de hexoses com bases fortes dá origem a fragmentos contendo 3 átomos de carbono como o 2-hidroxipropionaldeído, ácido pirúvico, metilglioxal e ácido lático, formados a partir de gliceraldeído e di-hidroxi acetona (os primeiros da degradação). OLIGOSSACARÍDEOS Importância e ocorrência biológica Alguns oligossacarídeos ocorrem livres na natureza, enquanto outros são obtidos como produtos de hidrólise parcial de polissacarídeos. Entre os oligossacarídeos naturais temos a sacarose, presente como reserva da cana e beterraba, em néctar de flores e em frutos; é o nosso açúcar de mesa, usado abundantemente como fonte de alimentação animal. A lactose, açúcar do leite de mamíferos, é importante também na alimentação animal e é obtida comercialmente como subproduto da fabricação de queijos. A trealose é encontrada em bolores, leveduras e na hemolinfa de insetos e a rafinose, em beterraba e sementes de algodão. Existem outros que ocorrem eventualmente na natureza, como é o caso da maltose, que aparece durante a germinação de grãos de cevada (malte) como produto da ação de amilases sobre o amido e da celobiose, obtida por hidrólise parcial da celulose. Classificação Os oligossacarídeos podem ser classificados de acordo com o número de unidades de monossacarídeos presentes na sua molécula em: dissacarídeos, trissacarídeos, tetrassacarídeos, entre outros. Dissacarídeos, como maltose, lactose e sacarose, consistem de dois monossacarídeos unidos covalentemente por uma ligação O-glicosídica que é formada quando um grupo hidroxila de um açúcar reage com o carbono anomérico de outro. Esta reação representa a formação de um acetal a partir de um hemiacetal (como glicopiranose) e um álcool (grupo hidroxila de uma Segunda molécula de açúcar). Quando um carbono anomérico participa de uma ligação glicosídica, ele não pode ser oxidado por íons Cu2+ ou Fe3+. O açúcar que contem o átomo de carbono anomérico não existe mais na UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 45 forma linear e não pode mais agir como um açúcar redutor. Na descrição de dissacarídeos ou polissacarídeos, o final da cadeia com um carbono anomérico livre é denominado terminal redutor. O dissacarídeo maltose contem dois resíduos de glicose unidos por uma ligação glicosídica envolvendo o C-1, carbono anomérico, de um resíduo de glicose e o C-4 de outro. Como ainda existe um carbono anomérico livre (presente no segundo resíduo de glicose) que pode ser oxidado, a maltose é um dissacarídeo redutor. A sacarose, ao contrário de maltose e lactose, não contém átomo de carbono anomérico livre. Os carbonos anoméricos de ambos os monossacarídeos estão envolvidos na ligação glicosídica e, portanto, a sacarose não é um açúcar redutor. O O H H H H H O H O H C H 2 O H H O H O OH H H H O H C H 2 O H H O H OH H + H2 O H O H H H H OH OH CH2 OH H OH O + -D-Glicose -D-Glicose ligação glicosídica -maltose D E E -1,4 D O OH H H H OH H O H C H 2 O H A ligação glicosídica pode ser estabelecida entre 2 unidades glicídicas iguais, como no caso da maltose (apresentada acima) ou entre 2 unidades glicídicas diferentes, como no caso da sacarose e lactose. O H O H H O H C H 2 O H H H OH OHH H H O H O resíduo de D -D-Glicose resíduo de E -D-Frutose Sacarose (ligação -1, -2) D E E resíduo de -D-Galactose D resíduo de -D-Glicose E D -Lactose (ligação -1,4) O H C H 2 O H C H 2 O H O H O H CH2 OH O H OH H OH H H C H2 O H H H OH O H H O H OH Se as duas unidades glicídicas forem iguais, os dissacarídeos formados poderão ser diferentes: �se a ligação glicosídica envolver formas anoméricas diferentes (D e E). Exemplo: celobiose e maltose Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 46 resíduo de -D-Glicose resíduo de -D-Glicose E O H H E H OHH OH -Celobiose (ligação -1,4) E E O H H O H H O H O H OH H CH2OH H C H 2 O H OH �se os átomos de C envolvidos na ligação glicosídica forem diferentes Exemplo: maltose e trealose O H H H HH OH OH OH CH2OH O CH2OH OH OH OH HH H H H O Trealose (ligação D-1,1) resíduo deresíduo de D-D-glicose D-D-glicose Claro está que os dissacarídeos obtidos são substâncias diferentes, apresentando, portanto, propriedades físicas e químicas diferentes, como por exemplo, ponto de fusão, solubilidade, reatividade. Em relação ao poder redutor pode-se ter dissacarídeos redutores ou não. Um dissacarídeo é redutor desde que, pelo menos uma das hidroxilas heterosídicas esteja livre, isto é, não envolvida na ligação glicosídica. Daí, a sacarose e trealose serem não redutoras, enquanto maltose, lactose e celobiose o são. POLISSACARÍDEOS Importância e ocorrência biológica Os polissacarídeos são polímeros encontrados na natureza e podem ter função estrutural ou de reserva. Entre os principais encontra-se o amido, a maior fonte glicídica da alimentação animal; ocorre como reserva dos vegetais, principalmente em cereais e tubérculos. Nos animais e microorganismos, o material de reserva é o glicogênio. Esse polissacarídeo é encontrado na maior parte dos tecidos, principalmente no fígado e músculos. Importante também é a celulose, matéria orgânica mais abundante na natureza, principal constituinte das partes fibrosas das plantas (97 a 99% no algodão, 41 a 53% nas madeiras), tendo portanto uma função estrutural. Outros polissacarídeos que podem ser citados são: inulina (material de reserva, encontrado em bulbos de algumas plantas); quitina (material estrutural do esqueleto dos artrópodes, crustáceos e insetos); pectina (encontrada na polpa de frutas cítricas, maçãs, cenouras, tendo também uma função estrutural); agar (mucilagem vegetal obtida de algas); goma arábica. Existem também os mucopolissacarídeos amplamente distribuídos nos tecidos animais, como o conjuntivo, onde desempenham diferentes funções. Exemplo: heparina (anticoagulante natural) - encontra-se no fígado e pulmão de mamíferos e na parede das artérias. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 47 Este mucopolissacarídeo é composto de unidades repetitivas de seis resíduos de açúcar, cada um consistindo de uma seqüência alternada de derivados sulfatados de N-acetil-D-glicosamina e ácido D-idurônico. Classificação Os polissacarídeos podem ser classificados em: �Homopolissacarídeos - aqueles que contêm na molécula uma única espécie de monossacarídeo. Ex: amido, glicogênio, celulose, inulina. �Heteropolissacarídeos - aqueles que contêm na sua molécula duas ou mais espécies de monossacarídeos (ou seus derivados). Ex: quitina, mucopolissacarídeos. Estrutura dos principais polissacarídeos Amido: Não é um produto puro, já que é constituído de 2 componentes moleculares de estruturas químicas semelhantes mas não idênticas: amilose - cujos resíduos de glicose são unidos por ligações D-1,4, formando um polímero de cadeia linear; amilopectina - polímero de estrutura molecular complexa cujas unidades glicosídicas encontram-se unidas por ligações D-1,4 e D-1,6. O amido, em geral, contém em torno de 20% de amilose e 80% de amilopectina. Glicogênio: A estrutura do glicogênio é análoga à da amilopectina só que o intervalo entre as ramificações é menor (8-12 resíduos) o que torna a molécula ainda mais ramificada. Celulose: Outro polímero de D-glicose, de cadeia linear, cujas moléculas estão unidas através de ligação E-1,4. Na celulose as cadeias encontram-se empilhadas, em forma fibrilar, compactas e rígidas. Quitina: Também é substância de sustentação semelhante à celulose. É linear, com ligações E-1,4 entre as unidades de N-acetilglicosamina. Inulina: É uma polifrutosana linear onde a ligação é do tipo E-2,1; a molécula é constituída por um número relativamente pequeno de unidades de frutose (< 1000), sendo, por isso, facilmente solúvel em água. Agar: É um polissacarídeo de estrutura não estabelecida completamente, extraído de algas do gênero Rhodophyciae. Sabe-se conter D-L-galactose com radicais sulfato. Pectina: É um derivado metilado do ácido péctico. Este é constituído de unidades de ácido galacturônico unidas através de ligações D-1,4. Degradação enzimática de oligossacarídeos A hidrólise de dissacarídeos e demais oligossacarídeos ocorre no sentido da reação descrita abaixo: Dissacarídeo + H2O o Monossacarídeo + Monossacarídeo Este processo é catalisado por enzimas, denominadas glicosidases, que constituem um subgrupo das hidrolases. As glicosidases, em geral, apresentam especificidade de grupo, condicionada à natureza do açúcar presente e ao tipo de ligação; daí, distinguirem-se as D-glicosidases, E-glicosidases, D-galactosidases, E-galactosidases, E-frutofuranosidases, por exemplo. Algumas glicosidases recebem denominações especiais, como: Maltase hidrolisa maltose Invertase ou Sacarase hidrolisa sacarose Trealase hidrolisa trealose Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 48 Degradação enzimática de polissacarídeos As enzimas mais importantes no processo de digestão são as amilases, que degradam o amido e o glicogênio a fragmentos menores. Há dois tipos de amilases: D-amilase (dextrinogênica) E-amilase (sacarogênica) Elas estão amplamente distribuídas na natureza. As D-amilases estão presentes principalmente na saliva (ptialina) e no intestino (amilopsina - secretada pelo pâncreas), aparecendo em pequenas quantidades no malte (grãos de cevada germinada), além de poderem ser excretadas por alguns tipos de microorganismos. As E-amilases se encontram quase que exclusivamente no reino vegetal, principalmente em grãos em germinação como, por exemplo, o malte. A hidrólise do amido pela amiloglicosidase processa-se de maneira progressiva a partir dos terminais não redutores da molécula, liberando glicose com a configuração E no carbono anomérico, através de um mecanismo semelhante ao da E-amilase. Apesar de sua ação mais lenta sobre oligossacarídeos do que sobre polissacarídeos, a amiloglicosidase difere das D e E-amilases, porque é capaz de hidrolisar tanto a maltose como a isomaltose. Contudo, o rompimento das ligações D-1,6 é mais lento do que o das ligações D-1,4 sendo a hidrólise da isomaltose 30 vezes mais lenta que a de maltose. A amiloglicosidase é também conhecida como “enzima sacarificante”. Várias pesquisas têm sido realizadas para imobilizá-la em suportes inertes devido a seu grande potencial de utilização nas indústrias na conversão de amido em glicose. Outras polissacaridases importantes são as celulases (responsáveis pela degradação de celulose), presentes em microorganismos, alguns deles presentes no rúmem de alguns animais. POLISSACARÍDEOS DE RESERVA Glicogênio O glicogênio é o principal polissacarídeo de reserva das células animais, sendo encontrado principalmente no fígado, onde pode atingir até 10% do peso deste órgão; e, em muito menor quantidade, no músculo esquelético (cerca de 1 a 2% do peso). Entretanto, como a massa total de músculo é muito maior que a do fígado o glicogênio total estocado no tecido muscular é duas vezes maior do a que é encontrada nos hepatócitos. O glicogênio também é encontrado em diversos microrganismos, como fungos filamentosos e leveduras, em quantidade variável, dependendo da espécie. Células animais e de microrganismos estocam glicose na forma de glicogênio porque este exerce pouca pressão osmótica e pode ser prontamente mobilizado de acordo com a demanda. Metabolicamente, o armazenamento de energia sobre a forma de glicogênio possui diversas vantagens em relação ao armazenamento de ácidos graxos sob a forma de triacilgliceróis. De um modo geral, as células podem mobilizar a energia armazenada nas unidades de glicose do glicogênio muito mais rapidamente do que a energia armazenada nas moléculas de ácidos graxos dos triacilgliceróis. A glicose liberada pela hidrólise do glicogênio pode ser oxidadaanaerobicamente pela via glicolítica, uma rota metabólica de geração rápida de energia. Além do mais, humanos e outros animais não podem converter ácidos graxos em glicose e, desta forma, o metabolismo das gorduras não pode manter adequadamente os níveis deste carboidrato no sangue. Nas células musculares e hepáticas o glicogênio é armazenado em grânulos citoplasmáticos que contém até 120.000 unidades de glicose, com massa de 107 Da, chamadas de partículas E, com diâmetro de 25nm. Nos hepatócitos, mas não nas células musculares, várias partículas E se associam formando as partículas D, em forma de rosetas, com 100-150nm de diâmetro. Estes UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 49 grânulos também possuem as enzimas que catalisam sua síntese e degradação, bem como algumas das proteínas que regulam estes processos. Figura 1. Microscopia eletrônica do citoplasma de uma célula hepática apresentando acúmulo de glicogênio. O glicogênio se apresenta como partículas eletrodensas, freqüentemente em agregados ou rosetas, intimamente associado com os túbulos do retículo endoplasmático liso. Observa-se também a presença de numerosas mitocôndrias nesta região. Estrutura do Glicogênio O glicogênio apresenta uma estrutura básica análoga a da amilopectina – o principal componente do amido. O glicogênio é um homopolímero de glicose altamente ramificado cujos resíduos são unidos por ligações do tipo D-1,4, contendo a cada 8-12 resíduos ramificações da cadeia principal por meio de ligações D-1,6. Figura 2. Estrutura do glicogênio. O glicogênio é um homopolímero de glicose altamente ramificado cujos resíduos são unidos por ligações do tipo D-1,4 contendo a cada 8-12 resíduos ramificações da cadeia principal por meio de ligações D-1,6. No citoplasma das células hepáticas e musculares o glicogênio ocorre como partículas de até 120.000 unidades de glicose, com massa molecular de até 107 Da. (A) estrutura ramificada do glicogênio, com as extremidades não redutoras representadas em cinza, e os pontos de ramificações indicados por esferas escuras. O primeiro resíduo de glicose incorporado à estrutura do glicogênio está localizado à direita, ligado covalentemente à glicogenina. (B) Estrutura primária do glicogênio próximo a um ponto de ramificação. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 50 Degradação do Glicogênio As reservas de glicogênio do fígado e do músculo servem a papéis diferentes. Nas células musculares, o glicogênio funciona como uma reserva energética para a síntese de ATP durante a contração muscular, em ocasiões em que as quantidades de glicose ou O2 são escassas. Nos hepatócitos, o glicogênio estocado serve como reserva para a manutenção das concentrações sanguíneas de glicose. Nestas últimas células, os níveis de glicogênio variam muito em resposta à ingestão de alimentos, sendo acumulado em altos níveis logo após uma refeição. Então, decrescem lentamente à medida que são mobilizados para manter os níveis de glicose no sangue constante, em benefício de outros tecidos, especialmente cérebro e eritrócitos. Estas alterações na taxa de síntese e degradação do glicogênio no fígado são controladas por hormônios, como a insulina, a adrenalina (ou epinefrina) e o glucagon. O glicogênio, contudo, é de pouca utilidade para o próprio fígado, que obtém energia para suas funções principalmente por meio da degradação de lipídeos. Figura 3. Mecanismo de reação catalisado pela enzima glicogênio fosforilase. (A) A ligação glicosídica D-1,4 é clivada pela adição de uma molécula de fosfato a ligação entre o último e o penúltimo resíduo de glicose da molécula de glicogênio gerando uma partícula com n-1 resíduos de glicose e uma molécula de D-D-glicose-1-fosfato. (B) Devido a impedimento estérico, a glicogênio fosforilase só consegue se aproximar de um ponto de ramificação até o quinto resíduo de glicose, gerando uma dextrina residual com quatro unidades de glicose. Para que a degradação do glicogênio continue, é necessária a ação de uma outra enzima, a enzima desramificadora, que possui duas atividades catalíticas diferentes: uma atividade 4-D-glucano transferase e uma atividade amilo-1,6-glicosidase. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 51 As unidades de glicose contidas na molécula de glicogênio são mobilizadas por meio da remoção seqüencial, a partir das extremidades não redutoras, sob a ação da enzima glicogênio fosforilase, que é capaz de clivar as ligações glicosídicas tipo D-1,4 pela adição de uma molécula de fosfato (fosforólise), como mostrado na figura 3. A estrutura altamente ramificada do glicogênio permite sua rápida degradação devido à possibilidade de remoção simultânea de unidades de glicose de cada uma de seus ramos. A natureza ramificada da molécula de glicogênio, se por um lado agiliza sua degradação por causa da presença de várias extremidades não redutoras, que servem simultaneamente como substrato para a enzima glicogênio fosforilase, por outro, impõe certas restrições ao funcionamento desta enzima. Devido ao impedimento estérico, a enzima glicogênio fosforilase só consegue se aproximar de um ponto de ramificação até o quinto resíduo de glicose. Como resultado, são gerados ramos com quatro unidades residuais de glicose, que não são substratos para esta enzima. Neste momento, a ação da enzima desramificadora, a segunda enzima envolvida na degradação do glicogênio, é necessária. A enzima desramificadora possui duas atividades catalíticas diferentes: inicialmente, ela transfere em bloco os três resíduos de glicose (ligados à unidade de glicose localizada no ponto de ramificação) para a cadeia principal do glicogênio (figura 3B). Esta reação é catalisada pela atividade 4-D-glucano transferase da enzima desramificadora, que desfaz a ligação D-1,4 na ramificação, que é refeita na cadeia principal. Esta reação deixa o resíduo de glicose presente no ponto de ramificação (unido à cadeia principal pela ligação D-1,6) intacto. Posteriormente, este resíduo é hidrolisado pela segunda atividade da enzima desramificadora, atividade amilo-1,6- glicosidase, liberando uma unidade de glicose. A transferência direta do ponto de ramificação (ligação D-1,6) para a cadeia principal (ligação D-1,4) não é possível porque a ligação D-1,4 é mais energética e, portanto, esta reação é termodinamicamente desfavorável. Síntese do Glicogênio A síntese de glicogênio é realizada pela enzima glicogênio sintase, que utiliza UDPglicose e a terminação não redutora de uma molécula de glicogênio como substratos (figura 4). A ativação da glicose que será usada na síntese do glicogênio é realizada pela enzima UDPglicose pirofosforilase. Esta enzima troca o fosfato na posição C-1 da molécula de glicose-1-fosfato por UDP. A energia da ligação fosfo-glicosil da molécula de UDPglicose é usada para catalisar a incorporação da glicose no glicogênio, com o UDP sendo subseqüentemente liberado pela enzima. As ramificações D-1,6 do glicogênio são produzidas por outra enzima, a amilo-(1,4-1,6)- transglicosilase, também chamada de enzima ramificadora, a qual transfere um fragmento terminal de 6-7 resíduos de glicose, de um polímero com pelo menos 11 resíduos de glicose de extensão, para a hidroxila na posição C-6 de um resíduo interno de glicose (figura 5). Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 52 Figura 4. Reação catalisada pela enzima glicogênio sintase. A glicogênio sintase utiliza como substratos UDPglicose e uma extremidade não redutora de uma molécula de glicogênio pré-formada. O novo resíduo de glicose, proveniente da molécula de UDPglicose é adicionado à hidroxila da posição 4 da glicose presente na extremidade não redutora da molécula de glicogênio, formando uma ligação glicosídica do tipo D-1,4. A energiada ligação fosfo-glicosil da molécula de UDPglicose é usada para direcionar esta reação. Figura 5. Atividade da enzima ramificadora. As ramificações D-1,6 do glicogênio são produzidas pela enzima ramificadora, que transfere um fragmento terminal de 6-7 resíduos de glicose de um polímero com pelo menos 11 resíduos, para a hidroxila na posição C-6 de um resíduo interno de glicose. Para que seja formada uma nova partícula de glicogênio é necessária a existência de um iniciador. Este fato era há muito conhecido, pois se verificou que a enzima glicogênio sintase não era capaz de sintetizar glicogênio, se não fosse adicionado ao ensaio, um polissacarídeo pré-formado. Entretanto, por muito tempo a natureza da primeira molécula de glicogênio, que poderia atuar como iniciadora, permaneceu desconhecida. Recentemente, se descobriu que uma proteína, conhecida como glicogenina está localizada no cerne da molécula de glicogênio. A glicogenina tem a propriedade de catalisar sua própria glicosilação, ligando o carbono C-1 da glicose presente na molécula de UDPglicose à hidroxila da cadeia lateral de um resíduo de tirosina. Posteriormente, a própria glicogenina liga a este primeiro resíduo mais 7 resíduos de glicose, por meio de ligações D-1,4. Este polissacarídeo ligado à glicogenina, serve como o iniciador requerido pela glicogênio sintase. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 53 Figura 6. Duas reações químicas distintas catalisadas pela glicogenina. (a) A glicosilação inicial do grupamento hidroxila da Tyr194 resultando na formação da ligação glicose 1-O-tirosil. (b) A glicosilação subsenquente do grupamento hidroxila C4' da glicose terminal no polímero nascente de glicogênio resultando na formação da ligação glicosídica D-1,4. Figure 7. Glicogenina. Dímero de glicogenina mostrando a molécula de UDPglicose, a cadeia lateral da Tyr194 e o íon Mn2+. A distância entre o átomo C1'' da glicose na molécula de UDPglicose e a hidroxila da Tyr194 está indicado por setas. Figura 8 - Biossíntese e degradação das partículas de glicogênio. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 54 Existem duas formas de glicogênio que podem ser diferenciadas por sua solubilidade em TCA (ácido tricloroacético). Uma população é formada pelo glicogênio insolúvel em TCA diluído, chamado de proglicogênio, com massa molecular de 400.000 Da, que é intermediário na síntese e degradação do macroglicogênio, que é a forma bem caracterizada de glicogênio, solúvel em TCA diluído, com massa molecular de 107 Da. No início do processo de biossíntese de glicogênio, a glicogenina adiciona autocataliticamente um resíduo de glicose à sua Tir-194. Então, em média, mais sete resíduos são adicionados a esta primeira glicose para formar um maltossacarídeo ligado à proteína, que serve como iniciador para a síntese do proglicogênio. A biossíntese do proglicogênio é realizada por uma isoforma da glicogênio sintase (proglicogênio sintase), distinta em suas propriedades da glicogênio sintase “clássica” (macroglicogênio sintase), que transforma o proglicogênio em macroglicogênio (a massa molecular limite é 107 Da, em células musculares), com o auxílio da enzima ramificadora. O proglicogênio também funciona como um intermediário na degradação do glicogênio. Amido O amido é a principal reserva glicídica dos produtos alimentícios de origem vegetal e é composto por duas frações de polissacarídeo constituídas por unidades de D-glicose: �amilose - constitui 20-30% da maior parte dos amidos nativos e é formada por muitas unidades glicosídicas (250-300) unidas por ligação D-1,4. As cadeias não são ramificadas e tendem a assumir um arranjo helicoidal que apresenta seis resíduos de glicose em cada passo. O diagrama a seguir reproduz uma parte da molécula; o anel em negrito é aquele que representa o terminal redutor. �amilopectina - constituinte principal do amido natural (70 a 80%); composto por moléculas de glicose unidas através de ligações D-1,4 e D-1,6, apresentando em contraste com a amilose, uma estrutura ramificada. O intervalo médio entre os pontos de ramificação (ligação D-1,6) é de cerca de 20-25 resíduos e o comprimento médio das ramificações é de 12 unidades. É bem possível que tanto as cadeias principais como as laterais representadas linearmente, apresentem-se na realidade retorcidas. Reproduzido de Voet D., Voet, J.D. em Biochemistry - 1a ed., John Wiley & Sons, Inc.(1990), pág. 256 e 257. Os cereais (milho, trigo, cevada, arroz, sorgo), os tubérculos (batata, mandioca, inhame), alguns frutos (banana, babaçu) e troncos (palmeira do sagu) são particularmente ricos em amido. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 55 A utilização do amido na alimentação e na indústria depende, em grande parte, de suas propriedades coloidais, pois o comportamento do amido frente a água é extremamente complexo. Na célula vegetal, ele é armazenado em grânulos microscópicos que não são afetados de maneira perceptível pela água fria e são resistentes também ao ataque enzimático. No entanto, se a parede externa da célula for rompida por algum método mecânico (por exemplo, moagem) e tratada com água aquecida, os grânulos ainda intactos absorvem água, incham e iniciam um processo de desintegração, assim a amilose e amilopectina passam para solução. A uma temperatura crítica (80-85oC) o amido liberado sofre uma rápida gelatinização com aumento substancial do volume da suspensão por conta do desenovelamento das cadeias. Esta etapa é conhecida, na indústria, como cozinhamento. A suspensão coloidal formada apresenta-se como um mingau ou goma e, a frio, solidifica dando origem a géis consistententes com propriedades adesivas. O amido gelatinizado é largamente empregado como agente espessante, como adesivo ou como encorpante de tecidos e papéis. Se o aquecimento for mantido e temperaturas de 100oC ou mais elevadas forem atingidas, o grânulo inchado é totalmente desintegrado e hidratado até formar um sol coloidal. A completa desagregação do amido na água pode ser obtida por aquecimento sob pressão (120-130oC) por 2 a 4 horas. Nestas condições, a estrutura das cadeias, tanto de amilose e quanto de amilopectina é desenovelada, o que a torna mais susceptível à hidrólise. Ao se diminuir a temperatura de uma dispersão de amido, pode-se, em certas circunstâncias, observar o fenômeno de retrogradação ou regeneração que corresponde à volta para a condição de insolubilidade, com formação de agregados cristalinos, devido à tendência das cadeias de amilose, principalmente, se reassociarem. A retrogradação é um fenômeno parcialmente reversível por aquecimento do material cristalizado. No entanto, repetidos ciclos de retrogradação levam a formação de um material irreversivelmente insolúvel. Na produção de amido puro (exemplo polvilho) a partir de tecidos vegetais, é necessário realizar a extração a frio de modo a evitar as dificuldades decorrentes da gelatinização. Para tal, realiza- se primeiro a desintegração mecânica das raízes ou grãos, seguindo-se a mistura com água; a separação do amido é feita em extratores de estágios múltiplos dotados de centrífuga. Ao deixar o último estágio da extração, praticamente todo o amido é praticamente recuperado sob forma de "leite de amido". Este ainda contém muitas impurezas que só serão eliminadas no processo de refinação, quando o material sofre múltiplas centrifugações e lavagens. A degradação do amido pode ser realizada por via química ou enzimática, sendo o processo conhecido como sacarificação. Amido como matéria prima industrial A produção de álcool etílico a partir de matéria prima amilácea segue uma linha industrial bem definida que apresenta as seguintes etapas: (a) Tratamentoda matéria prima; (b) Cozimento da pasta crua; (c) Liquefação e sacarificação do mosto; (d) Fermentação; (e) Destilação. Processo clássico para a produção de álcool de mandioca Uma raiz típica, arrancada em época de maturidade completa e adequada para uso industrial, apresenta composição que varia entre os limites mostrados abaixo: água vegetal 60-65% amido e outros glicídeos 25-32% outros componentes 2-3% celulose 1-2% proteína 0,5-1% Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 56 As raízes de mandioca fresca, após a recepção industrial, são separadas de materiais estranhos, como terra, pedras e outras impurezas através de lavagem. A raiz lavada e isenta de córtex é fragmentada de uma só vez ou através de reduções sucessivas de tamanho até que a pasta esteja na granulometria desejada. A pasta assim gerada é, em seguida, diluída com 500 a 1000 litros de água por tonelada de mandioca e recebe cerca de 25% da quantidade total da enzima D-amilase utilizada no processo. Nesta etapa, usualmente denominada homogeneização ou pré-liquefação, o objetivo é garantir a liquefação do amido por acaso liberado durante a fragmentação. No cozimento, que ocorre em seguida, este purê efluente da homogeneização é submetido a uma temperatura geralmente situada entre 70 e 150 oC, sob pressão de até 4 a 5 atmosferas durante um tempo de cerca de meia hora e, no máximo hora e meia, acarretando assim o rompimento das paredes celulares e liberação total do amido, além do desenovelamento das cadeias, o que favorece a atuação da enzima. A liquefação total do purê cozido é normalmente efetuada a uma temperatura entre 65 e 90 oC com adição dos 75% restantes da enzima D-amilase, cujo consumo total depende de sua origem e fabricante, mas que em geral é de 0,5 a 1,0 kg por tonelada de amido. Nesta etapa, cerca de 20% das ligações glicosídicas são hidrolisadas e a viscosidade da pasta cai para valores bastante baixos. O restante das ligações glicosídicas é hidrolisado na etapa de sacarificação com o emprego da enzima amiloglicosidase, após o resfriamento do purê liquefeito para cerca de 55oC. Esta sacarificação pode ser efetuada totalmente nos vasos sacarificadores, mas razões econômicas obrigam que a mesma seja parcial e sua complementação se dê simultaneamente com a fermentação, de modo que o consumo de amiloglicosidase permaneça no nível de 1,5 a 2,0 kg por tonelada de amido. A fermentação é levada a cabo em temperatura entre 30 e 35oC com adição de quantidade suficiente de levedura e é completada após cerca de 60-80 horas, uma vez que é efetuada simultaneamente com a sacarificação das dextrinas ainda existentes no mosto. Após a fermentação, faz-se a retirada do material sólido grosseiro presente no 'vinho', de modo a evitar problemas de obstrução no equipamento. O mosto fermentado, com cerca de 5 a 10% em álcool, é então destilado de modo a obter-se álcool na concentração desejada (vide Fermentação). Produção de glicose pura a partir do amido A transformação do amido em glicose por hidrólise se processa com auxílio de HCl diluído (0,5N) e cozimento em reatores especiais utilizando vapor d'água e pressão em uma temperatura próxima a 145oC. A suspensão, após aquecimento de 30 minutos, passa pelas fases de gelatinização e liquefação e pelas transformações em dextrina e glicose com uma conversão amido-glicose com mais de 90% de rendimento. Após a hidrólise, faz-se um resfriamento da suspensão e correção do pH com carbonato de sódio. Em seguida, filtra-se com terra diatomácea e carvão ativo; a concentração da solução é realizada em evaporadores de múltiplo efeito. O produto final obtido, com pureza alimentícia, apresenta concentração ideal para consumo em indústrias do ramo como, confeitarias, sorveterias e outros. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 57 TEORIA DA PRÁTICA DOSAGEM DE AÇÚCARES REDUTORES PELO MÉTODO DO 3,5-DINITROSSALICILATO E xistem vários métodos para a determinação quantitativa de glicídeos, sendo que vários deles baseiam-se nas suas propriedades redutoras. Sabe-se que as aldoses e cetoses com hidroxilas heterosídicas livres são capazes de reduzir soluções alcalinas de determinados compostos como, por exemplo, o 3,5-dinitrossalicilato: COO- OH O2 N a ç ú c a r r e d u t o r + OH- O 2 N NH2 N O 2 O H C O O - + produtos oxidados 3-amino-5-nitrosalicilato laranja avermelhado 3,5 dinitrosalicilato (DNS) amarelo O produto obtido é estável e a reação forma 1 mol de 3-amino-5-nitro salicilato por mol de açúcar redutor presente. Portanto, pela intensidade da luz absorvida a 540 nm, pode-se determinar a concentração de açúcar redutor presente na solução. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 58 ROTEIRO DA PRÁTICA DOSAGEM DE AÇÚCARES REDUTORES PELO MÉTODO DO 3,5-DINITROSSALICILATO (J.B. Sumner, J.Biol.Chem. 62, 285, 1924) MATERIAL �solução padrão de glicose (10 Pmol/mL) �solução problema (glicose 80-150 mM) �ácido 3,5-dinitrossalicílico em solução alcalina (DNS) �banho-maria à 100oC �espectrofotômetro OBJETIVO Dosagem de açúcares redutores por espectrofotometria na faixa do visível. PROCEDIMENTO Construção da Curva Padrão de Glicídeos Redutores Sensibilidade do método químico: 1-10 Pmoles de glicose �Seguir o protocolo abaixo utilizando a solução padrão de glicose (10 Pmoles/mL) TUBO Solução de glicose (mL) H2O (mL) DNS (mL) Abs (540 nm) [Glicose] (Pmoles/mL) B � 1,0 1 � � � 1 0,2 0,8 1 2 0,4 0,6 1 3 0,6 0,4 1 4 0,8 0,2 1 5 1,0 � 1 �Após a adição dos reagentes agitar e aquecer à 100oC por 5 minutos, resfriar e completar o volume a 15 mL com água destilada. �Usando o tubo B como “branco de reação”, determinar as absorvâncias a 540 nm. �Lançar em gráfico as leituras de absorvância x concentração de glicídeo e determinar o coeficiente angular ¸¸¹ · ¨¨© § ¦ ¦ c Abs K e o fator ¸¸¹ · ¨¨© § ¦ ¦ Abs c f da reta obtida. �Verificar quais os limites de sensibilidade do método para a aparelhagem utilizada. ¦ ¦ c Abs K Espectrofotômetro Baush &Lomb nº _____ UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 59 Determinação da Concentração de Glicose em uma Solução Problema Utilizando a curva padrão obtida, os mesmos reagentes e o mesmo espectrofotômetro, determinar a concentração de glicose em uma solução de concentração desconhecida, sabendo que sua molaridade está na faixa de 80 a 150 mM. Diluição da solução problema: Calcule as diluições necessárias para que a dosagem seja realizada dentro da faixa de sensibilidade do método. Discriminar os volumes utilizados. Protocolo de dosagem da solução problema diluída. Cálculo da concentração da solução problema. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 60 ESTUDO DIRIGIDO 1. De posse de uma solução de glicose de concentração 22,5 mg/mL, qual a diluição que se deve fazer para que 1 mL desta solução dê absorvância de 0,4 quando dosada pelo método do DNS? f = 12,5 Pmoles/mL PM glicose = 180 2. Com o objetivo de determinar o grau de pureza de uma maltose comercial, 2 mL de uma solução de concentração de 150 mg/mL foram diluídos a 120 mL e, desta diluição, tomaram-se duas alíquotas de 1 mL, em duplicata, para a dosagem com o DNS. Alíquota volume Abs a 540 nm a 1 mL 0,51 b1 mL 0,49 Com base nos resultados da tabela acima, calcule o grau de pureza desta maltose comercial. f = 12,5 Pmoles/mL PM maltose = 342 3. 5 mL de uma solução de glicídeo redutor foram diluídos a 20 mL com água destilada, originando a solução B. 0,2 mL dessa solução B, após reação com DNS, apresentou uma Abs igual a 0,30. Pede-se a concentração de A em Pmoles/mL, sabendo-se que 1 mL de uma solução do mesmo glicídeo de concentração 4 Pmoles/mL forneceu uma Abs igual a 0,5. 4. Alíquotas colhidas após 60 e 90 minutos de crescimento de células de levedura em meio contendo glicose foram ensaiadas para a verificação do consumo de glicídeo. Ao fazer a dosagem do sobrenadante com DNS foi perdido o branco de reação. Se não se pudesse fazer outro branco por falta de reagente, como verificar se houve consumo de glicose no intervalo considerado? 5. A concentração de uma solução de glicose é de 1 mol/100 mL. Que diluição deverá ser feita para que 1,0 mL da solução resultante contenha 1 milimol? UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 61 6. Para a dosagem de uma solução de maltose de concentração desconhecida foi necessário proceder-se a diluições de modo a se ter leituras de Abs dentro da faixa de obediência à lei de Lambert-Beer. Assim: a) tomaram-se 4 mL da solução que foram diluídos, em balão aferido, a 100 mL obtendo-se a solução B. b) 10 mL da solução B foram diluídos a 25 mL obtendo-se a solução C. c) da solução C retirou-se uma alíquota de 0,4 mL para a dosagem de maltose com o reagente do DNS, e obteve-se uma Abs em 540 nm igual a 0,30. Qual será a concentração em mg mL da solução original, sabendo-se que o PM da maltose é 342? Expresse o resultado também em molaridade. Dado: fator = 12 Pmoles/mL de amostra 7. Uma solução de glicose foi preparada de modo que 45 mg do glicídeo foram solubilizados em um volume final de 10 mL. A que volume devem ser diluídos estes 10 mL de forma que uma alíquota de 1 mL de solução diluída forneça Abs= 0,25 quando dosada pelo método do DNS? Dados: f = 10 Pmoles/mL de amostra PM glicose = 180 8. Um mililitro de uma solução A de glicose de concentração 150 Pmoles/10 mL foi ensaiada pelo método apropriado, fornecendo a Abs de 0,9. Qual será a concentração de uma solução B que apresenta uma Abs de 0,3, utilizando-se para a dosagem 1 mL de solução. Dê a resposta em Pmoles/mL. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 62 TEORIA DA PRÁTICA PROPRIEDADES QUÍMICAS DE GLICÍDEOS Diferentemente dos aminoácidos que apresentam reações específicas baseadas principalmente na natureza química de seu radical R, os glicídeos apresentam estruturas muito parecidas entre si o que torna quase impossível identificá-los de per se. Neste caso, o que se faz é caracterizar grupos de glicídeos utilizando suas propriedades químicas comuns. As reações utilizadas nesta prática estão baseadas principalmente em 2 dessas propriedades: �Desidratação de glicídeos em presença de ácidos minerais fortes �Poder redutor Desidratação de glicídeos em presença de ácidos minerais fortes Hexoses e pentoses colocadas nestas condições são desidratadas, respectivamente a hidroximetilfurfural e furfural; esses compostos são capazes de se condensar com substâncias fenólicas, com aminas aromáticas, tiocompostos, uréia, etc. Os complexos formados são, algumas vezes, coloridos e utilizados para a caracterização de certos grupos glicídicos. Neste caso, situam-se: �Reação de Antrona �Reação de Seliwanoff �Reação de Bial Reação de Antrona Teste geral para glicídeos O reagente de Antrona contém antranol em meio de H2SO4 concentrado. O calor liberado pela diluição do H2SO4 é suficiente para que a reação ocorra. No caso de oligo e polissacarídeos, o H2SO4 atua como catalisador de hidrólise convertendo-se a monossacarídeos (hexoses e pentoses) e também como agente desidratante levando à formação de hidroximetilfurfural e furfural que, em presença de antranol, dão produtos de condensação coloridos. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 63 O C O H OH H H OH C + + C OH HH OH H C O OH O CH OH H H C O H2O hidroximetil furfural antranol composto verde azulado O hidroximetilfurfural proveniente da desidratação de hexoses produz uma substância de coloração verde azulada relativamente estável enquanto que o furfural proveniente da desidratação de pentoses fornece produto de cor análoga, mas que em alguns minutos se torna vermelho amarelada ou rubi. A exposição do hidroximetilfurfural a essas condições por um longo intervalo de tempo promove sua decomposição a ácido levulínico e ácido fórmico, o que redunda na formação de produtos de condensação escuros conhecidos como humina. Outras substâncias orgânicas produzem descolaração do reagente e aparecimento de uma cor marrom, fruto de sua decomposição. O teste de Antrona é muito sensível e pode ser usado, quando modificado, para a quantificação de glicídeos. Reação de Seliwanoff Teste de diferenciação entre aldoses e cetoses A reação é feita com resorcinol em meio de HCl, à quente. As cetohexoses dão um produto de coloração vermelha que se desenvolve rapidamente; as aldohexoses correspondentes reagem mais lentamente. Durante o tempo em que as cetohexoses são desidratadas e reagem com o resorcinol fornecendo o produto, as aldohexoses fornecem apenas um produto de cor rosa pálido. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 64 H2O2 OH OHCOH + cetohexose hidroximetil furfural resorcinol produto de coloração vermelha estrutura desconhecida H CH2OH OH HOH2C O H OHH H H O HOH2C H O teste de Seliwanoff foi modificado de modo a ser utilizado para a quantificação. Reação de Bial Teste para a identificação de pentoses e certos ácidos urônicos* (galacturônico, glicurônico e outros) que se decompõem durante o aquecimento, em presença de H+, formando pentoses O reagente consiste de orcinol em meio de HCl concentrado e em presença de íons Fe3+. O furfural proveniente da desidratação de pentoses, quando aquecido em presença do reagente de Bial, fornece um produto de cor verde. O hidroximetilfurfural (hexoses) reage formando um produto de cor diferente que oscila do amarelo ao marrom. produto de coloração verde estrutura desconhecida orcinol (5-hidroxi-1,3- dihidroxibenzeno) furfuralpentose + OH 2 H2O H HO OH H OH H HO CH3 C C C C HO H COHH O HH COH H O teste de Bial foi modificado de modo a permitir quantificar pentoses, trioses e o ácido 5-ceto- aldônico**. As cetoheptoses fornecem produto de coloração púrpura, as cetohexoses e metilpentoses formam inicialmente um produto de cor laranja, que posteriormente, em repouso, precipita apresentando uma cor verde escura. * Ácidos urônicos - produtos de oxidação do grupo álcool primário dos glicídeos **Ácidos aldônicos - produtos de oxidação da carbonila aldeídica dos glicídeos. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 65 Poder Redutor Os açúcares contêm grupos aldeídos e cetonas capazes de reduzir sais de metais pesados; desses são mais usados os sais de Cu2+. O princípio fundamental de todos os procedimentos analíticos que utilizam Cu2+ é sua dissolução em meio alcalino, em presença de ácidos orgânicos - como o ácido cítrico e o ácido tartárico - capazes de formar complexos. Também podem ser empregados outros ácidos orgânicos como EDTA, ácido lático, ácido trihidroxiglutárico ou um ácido sacárico. Ácidos sacáricossão o produto da oxidação da carbonila aldeídica e do grupamento álcool primário dos glicídeos, sendo portanto ácidos dicarboxílicos. A reação de formação do complexo ocorre, em geral, em meio fortemente alcalino e isto promove profundas modificações na estrutura do açúcar. Os açúcares de per se apresentam poder redutor diferente sobre o íon Cu2+; isto significa que dois tipos de hexoses, em uma mesma concentração, fornecem quantidades diferentes de óxido cuproso (produto final da redução). De qualquer forma, os métodos podem ser adaptados de modo a se tornarem reprodutíveis e a haver proporcionalidade entre a quantidade de Cu2O produzido e a concentração de glicídeo presente dentro de um certo limite (ou certa faixa de concentrações). A quantidade de íons cobre reduzida pelos diferentes glicídeos é função do pH, da temperatura, da concentração e dos tipos de glicídeos e íons orgânicos complexantes. Há diversos métodos para a determinação do teor de Cu2O como, por exemplo, gravimetria e colorimetria. No último caso, o Cu2O formado é dissolvido em excesso de reagente como fosfomolibdato, fosfotungstato ou arsênio-molibdato, formando-se um complexo de cor azul. Este procedimento é muito adequado para a verificação de glicídeos em materiais biológicos. Dentre os testes baseados no poder redutor dos glicídeos, pode-se destacar os testes de Benedict e de Barfoed modificado. Teste de Benedict Teste geral para glicídeos redutores O reagente consiste de uma única solução onde estão presentes íons Cu2+, citrato e carbonato de sódio. A reação é complexa e influenciada por uma série de fatores podendo ser esquematizada por: Cu 2+ + glicídio composto oxidado Cu2O+ precipitado vermelho As transformações intermediárias sofridas pelo glicídeo não são completamente conhecidas, mas foram identificados produtos com ácidos metassacarínios e osonas, resultantes de reações de oxiredução intramoleculares e rearranjos. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 66 osonaácido metassacarínio C CH2OH H O O CH2OH H H OH COOH Teste de Barfoed modificado Teste de diferenciação entre monossacarídeos e dissacarídeos redutores. A reação é feita usando-se acetato de cobre em meio de ácido lático (reagente de Barfoed), a quente e por 30 segundos; o produto formado nesta primeira etapa é posteriormente revelado com solução de fosfomolibdato. Só os monossacarídeos formam produto de cor azul. Esta diferenciação pode ser explicada pelo fato de que, em meio ácido, a mutarrotação ocorre em velocidade cerca de 4000 vezes menor do que em meio alcalino. Dentro de um curto intervalo de tempo os monossacarídeos, devido a sua estrutura, têm maior reatividade e talvez formem o enediol (um dos possíveis responsáveis pelo poder redutor dos glicídeos) mais fácil e rapidamente que um dissacarídeo. A adição posterior do ácido fosfomolíbdico leva à formação de um complexo corado de cor azul intensa. +Cu2O composto oxidadoglicídio +Cu 2+ H3PO 4. MoO 312 complexo de cor azul de estrutura desconhecida Teste com Iodo Teste de identificação do amido O amido é composto de dois tipos de cadeia: a amilose e a amilopectina. Foi verificado que a amilose é capaz de formar com o I2 um complexo de inclusão de coloração azul. O grau de adsorção do I2, a partir de uma solução diluída de KI-I2, pela amilose nativa é de 19-20%, enquanto que a amilopectina adsorve 0,5%. Para que a cor azul apareça é necessário que a amilose tenha no mínimo 40 resíduos (unidades) de glicose. Cadeias pequenas de amilose ou amilopectina também adsorvem o I2, só que é necessário usar soluções mais concentradas de KI-I2. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 67 O mecanismo da reação envolve a inclusão de um arranjo linear de poli KI-I2 na hélice da amilose. O I2 parece interagir através de valências secundárias; sabe-se que os íons I - são necessários mas se desconhece a exata natureza do arranjo do poli KI-I2. A estimativa do teor de amilose presente no amido pode ser feita através da determinação do I2 livre por titulação ou pela medida da intensidade de absorção do complexo azul num comprimento de onda, relacionando-se então com uma curva padrão. Infelizmente a cor azul depende não só do peso molecular da amilose, como também de sua forma de extração (impurezas presentes) e portanto este método tem aplicação restrita. A amilopectina dá uma cor violeta ou avermelhada com I2. As dextrinas (formadas a partir da ação da E-amilase sobre a amilopectina) são muito ramificadas e produzem uma cor vermelha assim como o glicogênio (composto apenas de amilopectina, ainda mais ramificada do que a existente no amido). As dextrinas de pequeno peso molecular não dão cor com o I2. A cor produzida pela reação do I2 com amilopectina é usada para indicar o grau de ramificação. REAÇÃO PROPRIEDADE REAGENTES APLICAÇÃO Antrona antrona + H2SO4 concentrado identificação de glicídeos Seliwanoff resorcinol + HCl concentrado diferenciação entre cetoses e aldoses Bial desidratação com ácido forte seguido de condensação com derivado fenólico orcinol + HCl + FeCl3 identificação de pentoses e certos ácidos urônicos Benedict CuSO4+ citrato e carbonato de sódio identificação de glicídeos redutores Barfoed modificado oxidação do glicídeo com íons Cu2+ em meio alcalino ou ácido 1)CuAc2 + ác. lático 2)ácido fosfomolíbdico diferenciação entre mono e dissacarídeos redutores Iodo formação de complexo de inclusão com a amilose I2 + KI (Lugol) identificação do amido Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 68 ROTEIRO DA PRÁTICA REAÇÕES QUÍMICAS DE GLICÍDEOS MATERIAL �soluções de glicídeos na concentração 0,1 M �suspensões de dextrina 0,5% �carboximetilcelulose (CMC) 0,5% �agar 0,5% �amido 0,5% �ácido poligalacturônico 0,5% �solução de furfural 2,3 Pg/mL �reagente de Antrona: Antrona em H2SO4 concentrado �reagente de Bial: Orcinol em HCl concentrado + Fe Cl3 �reagente de Seliwanoff: resorcinol em HCl concentrado �reagente de Benedict:CuSO4 em meio alcalino �reagente de Barfoed modificado: CuSO4 em meio levemente ácido �Solução de Lugol: KI-I2- �banho-maria a 100oC OBJETIVO Caracterizar grupos de glicídeos a partir de suas propriedades químicas PROCEDIMENTO Teste de Antrona �Em tubos de ensaio colocar 0,2 mL das soluções a serem testadas. �Adicionar CUIDADOSAMENTE 1 mL do reagente de Antrona. �Fazer o teste com soluções de glicose 0,1 M, sacarose 0,1 M, ácido glutâmico 0,1 M, amido 0,5% e CMC 0,5%. �Fazer um branco de reação com 0,2 mL de água destilada. A reação é praticamente imediata e o teste é considerado positivo se apresentar cor verde intensa. OBSERVAR: �Com que glicídeo aparece mais rapidamente a cor verde. �Em que tubo a coloração verde é mais intensa. �O aquecimento provocado pela diluição do H2SO4 na água tocando cuidadosamente a base do tubo. Anotar os resultados em tabela anexa. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 69 Teste de Seliwanoff �Em tubos de ensaio colocar 0,2 mL das soluções a serem testadas. �Adicionar 1 mL do reagente de Seliwanoff. �Aquecer em banho-maria a 100 oC por 3 minutos. �Fazer o teste com soluções de glicose 0,1 M, frutose 0,1 M, sacarose 0,1 M, lactose 0,1 M e CMC 0,5%. �Fazer um branco de reação com 0,2 mL de água destilada. No teste é considerado positivo se apresentar cor vermelha. OBSERVAR: �Em que tubos a cor aparece e o tempo necessário para que isto ocorra. �A coloração obtida nos outros tubos. Anotaros resultados em tabela anexa. Teste de Bial �Em tubos de ensaio colocar 0,5 mL das soluções a serem testadas �Adicionar 1 mL do reagente de Bial. �Aquecer em banho-maria à 100 ºC por 2 minutos. �Fazer o teste com soluções de glicose 0,1 M, arabinose 0,1 M, ácido poligalacturônico 0,5% e furfural 2,3 Pg/mL. �Fazer um branco de reação com 0,5 mL de água destilada. No teste é considerado positivo se apresentar cor verde ou verde azulada OBSERVAR: �Em que tubo há o aparecimento imediato da cor verde. �A coloração obtida nos outros tubos. Anotar os resultados em tabela anexa. Teste de Benedict �Em tubos de ensaio colocar 0,4 mL das soluções a serem testadas �Adicionar 1 mL do reagente de Benedict. �Aquecer em banho-maria a 100 ºC por 5 minutos. �Fazer o teste com soluções de glicose 0,1 M, frutose 0,1 M, sacarose 0,1 M, lactose 0,1 M e amido 0,5%. �Fazer um branco de reação com 0,4 mL de água destilada No teste é considerado positivo se houver formação de precipitado vermelho. OBSERVAR: �Em que tubo(s) verifica-se a formação do precipitado. �Em que tubo(s) não há formação do precipitado. Anotar os resultados em tabela anexa. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 70 Teste de Barfoed modificado �Em tubos de ensaio colocar 0,2 mL das soluções a serem testadas. �Adicionar 1 mL do reagente de Barfoed. �Aquecer em banho-maria à 100 º �C por 30 segundos. �Resfriar. �Adicionar 0,5 mL do reagente fosfomolíbdico. �Fazer o teste com soluções de glicose 0,1 M, lactose 0,1 M e sacarose 0,1 M. �Fazer um branco de reação com 0,5 mL de água destilada. No teste é considerado positivo quando apresenta cor azul intensa. OBSERVAR: �Em que tubo(s) ocorre o desenvolvimento da cor azul intensa. �Em que tubo(s) ocorre a coloração azul pálida. Anotar os resultados em tabela anexa. Teste do Iodo �Em tubos de ensaio colocar 2 mL das soluções a serem testadas. �Adicionar 0,1 mL do reagente de Lugol (I2+ I�). �Aquecer em banho-maria à 100 ºC por 2 minutos. �Fazer o teste com suspensões de amido 0,5%, dextrina 0,5%, CMC 0,5% e agar 0,5%. �Fazer um branco de reação com 2 mL de água destilada. No teste é considerado positivo se apresentar cor verde ou verde azulada OBSERVAR: �Em que tubo aparece o complexo de cor azul. �Qual(is) a(s) cor(es) que aparece(m) nos outros tubos. Anotar os resultados em tabela anexa. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 71 TABELA DE RESULTADOS TESTE SUBSTÂNCIAS TESTADAS OBSERVAÇÕES glicose sacarose amido CMC ANTRONA ácido glutâmico glicose frutose sacarose lactose SELIWANOFF CMC arabinose ácido poligalacturônico glicose BIAL furfural sacarose lactose amido glicose BENEDICT frutose lactose sacarose BARFOED modificado glicose CMC agar amido IODO dextrina Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 72 ROTEIRO DE PRÁTICA APLICAÇÃO DAS REAÇÕES QUÍMICAS DE GLICÍDEOS MATERIAL �Soluções padrão e reagentes, como descrito na prática de Reações Químicas de Glicídeos �banho maria a 100oC �liquidificador �espremedor de frutas �legumes �frutas �substâncias dietéticas ( bebidas, balas, por exemplo.) �adoçantes OBJETIVO Determinar a presença de glicídeos em diferentes tipos de alimentos. Caracterizar, quando possível, os glicídeos no material analisado. PROCEDIMENTO Dependendo do tipo de alimento a ser testado será necessária uma etapa de preparo: frutas - trituração ou extração do suco. materiais sólidos - trituração. Dispondo-se do material sólido (triturado), do extrato, do suco e da solução (adoçantes, bebidas) procede-se conforme o roteiro de prática de Reações Químicas de Glicídeos. As alíquotas a serem usadas, bem como o volume dos reagentes empregados podem ser diferentes dos descritos no roteiro da prática de Reações Químicas de Glicídeos Os resultados obtidos devem ser colocados na tabela a seguir. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 73 Tipo de Alimento Nome do Alimento Teste da Antrona Teste de Seliwanoff Teste de Bial Teste de Benedict Teste de Barfoed Teste do Iodo Frutas Legumes Bebidas Dietéticos Compare os resultados encontrados para os diferentes grupos de alimentos quanto ao teor e tipo de glicídeo presente Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 74 ESTUDO DIRIGIDO 1) Qual o teste a ser feito para demonstrar a presença de glicídeos em materiais biológicos? Justifique. 2) Por que não é conveniente realizar o teste de iodo com uma solução de amido aquecida? 3) Após extração de lipídeos com metanol e posterior precipitação de proteínas (caseína) com TCA 10%, que teste deveria ser feito no filtrado com o objetivo de evidenciar a presença de glicídeo em uma amostra de leite de vaca? Com os testes realizados na prática, seria possível provar que este glicídeo é lactose? Por que? 4) Que testes você faria com um dissacarídeo para definir as seguintes características: a) poder redutor b) se pelo menos um dos monômeros constituintes é uma cetose c) se pelo menos um dos monômeros constituintes é uma pentose 5) Identifique dentre os dissacarídeos abaixo os que dão testes positivo com o reagente de Benedict: maltose: glicose (D-1,4) glicose lactose: galactose (E-1,4) glicose sacarose: glicose (E-1,2) frutose trealose: glicose (D-1,1) trealose 6) Duas aldohexoses diferem apenas na configuração do carbono 5, de modo que em uma a hidroxila pode ser representada à direita e na outra à esquerda. Podemos dizer que estas oses são epímeros? 7) Dos glicídeos abaixo, assinale aquele que satisfaz a todas as seguintes condições: 1- Teste de Benedict positivo A ( ) sacarose 2- Teste de Barfoed positivo B ( ) glicose 3- Teste de Seliwanoff negativo C ( ) arabinose 4- Teste de Bial positivo D ( ) maltose UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 75 TEORIA DA PRÁTICA GLICOGÊNIO DE CÉLULAS ANIMAIS EXTRAÇÃO Várias são as técnicas de homogeneização celular utilizadas em bioquímica, por exemplo, rompimento mecânico, ultra-som e choque osmótico. São descritas, também, várias metodologias para a extração do glicogênio de células animais tais como H2O gelada, H2O quente, soluções alcalinas a quente, TCA a frio e outras. A fácil permeabilização das células do fígado permite que o glicogênio seja extraído por métodos suaves (H2O gelada), o que faz com que sua forma e seu peso molecular estejam bem próximos aos nativos. Observou-se, no entanto, que quanto mais drástico o método de extração, maior teor de glicogênio é obtido, porém com forma e peso molecular muito diferentes dos nativos. Como o objetivo é demonstrar uma forma de extração e de quantificação do glicogênio, será empregado o rompimento mecânico das células do tecido, em um homogeneizador de tecidos, com concomitante extração do polissacarídeo com TCA 10%. O TCA tem também nesta etapa, a função de precipitar as proteínas celulares (vide capítulo de Proteínas). PRECIPITAÇÃO O glicogênio será isolado do material extraído, por precipitação com etanol 95%, já que os polissacarídeos e outras macromoléculas são bem menos solúveisque as substâncias de baixo peso molecular. O etanol é um agente desidratante, portanto diminui a camada de solvatação do glicogênio, além de baixar a constante dielétrica do meio, promovendo a aproximação e conseqüente precipitação das moléculas. Antes da adição do etanol, o extrato celular é aquecido suavemente em banho-maria. Este aquecimento promove um afrouxamento na estrutura da macromolécula devido ao rompimento das pontes de hidrogênio envolvidas na sua manutenção, permitindo maior acesso do agente precipitante (etanol) ao interior da molécula. Como as macromoléculas, na sua grande maioria, são sabidamente mais insolúveis em baixas temperaturas, a precipitação é efetuada com etanol gelado e em banho de gelo. DOSAGEM Para que se possa dosar o glicogênio é necessário que ele seja hidrolisado, ou seja, convertido a unidades de glicose (glicídeo redutor). A hidrólise pode ser enzimática (amiloglicosidase) ou química (pelo rompimento das ligações D-1,4 e D-1,6, em meio ácido, a quente) No caso do glicogênio de células animais, será feita a hidrólise química com HCl 1 N à 100oC, com objetivo de converter totalmente o glicogênio em glicose. Após a neutralização com NaOH 1 N, a glicose obtida será quantificada pelo método do DNS. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 76 ROTEIRO DE PRÁTICA EXTRAÇÃO E DOSAGEM DO GLICOGÊNIO DE FÍGADO MATERIAL �material biológico: tecido de fígado de boi �ácido tricloroacético (TCA) - 10% �etanol 95% �ácido clorídrico (HCl) - 1N �hidróxido de sódio (NaOH) - 1N �ác. 3,5 dinitro salicílico (DNS) em meio alcalino �homogeneizador de tecidos �papel de filtro �centrífuga �banho de gelo �espectrofotômetro �banho-maria à 37 e 100 oC �solução padrão de glicose 10 Pmoles/mL OBJETIVO Extração e dosagem de glicogênio em tecido animal. PROCEDIMENTO �Picar bem miúdo 100 g de fígado e colocar em becher contendo TCA 10%, na proporção de 1g de tecido para 1 mL de TCA. �Homogeneizar a mistura em homogeneizador de tecido até homogeneização total. �Centrifugar o homogeneizado a 4000 rpm por 5 minutos e filtrar o sobrenadante em papel de filtro. �Desprezar o precipitado e medir o volume do sobrenadante. �Tomar .... mL do sobrenadante e aquecer esta alíquota suavemente em banho-maria (r37oC) por 3 minutos. Adicionar etanol 95% gelado sobre o sobrenadante aquecido, na proporção de 2 mL de etanol para 1 mL de sobrenadante. �Homogeneizar com auxílio de um bastão de vidro e deixar em repouso em banho de gelo por 15 minutos. �Centrifugar a 3500 rpm por 15 minutos e desprezar o sobrenadante. �Adicionar 1 mL de HCl 1N no tubo contendo o precipitado, vedar o tubo e aquecer à 100oC por 30 minutos. �Resfriar e colocar 1 mL de NaOH 1N. �Pipetar duas alíquotas diferentes de amostra, completar a 1 mL com água destilada e adicionar 1 mL de DNS - aquecer à 100oC por 5 minutos. �Completar a 15 mL com água destilada e ler a Abs a 540 nm contra o branco da reação. �Paralelamente, fazer a dosagem com DNS em duas alíquotas da solução padrão de glicose. �Calcular o fator de conversão do valor de Abs em concentração. �Calcular a concentração de glicose em Pmoles/mL e em mg/mL usando o fator obtido. �Calcular a massa de glicogênio expressa em termos de mg de glicose por grama de fígado. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 77 TEORIA DA PRÁTICA SÍNTESE, EXTRAÇÃO E DOSAGEM DE GLICOGÊNIO DE CÉLULAS DE LEVEDURA INTRODUÇÃO Células de Saccharomyces cerevisiae começam a acumular glicogênio quando se deparam com condições de limitação de nutrientes, como ocorre em meio líquido com glicose como fonte de carbono durante a fase de transição do crescimento exponencial para diauxia (fase de adaptação ao metabolismo respiratório). A limitação nutricional de fontes de carbono, nitrogênio, fósforo ou enxofre, isoladamente ou em conjunto, pode disparar o aumento da síntese deste polissacarídeo por esta levedura. Em Saccharomyces cerevisiae, como em todos os organismos eucariontes, a síntese de glicogênio requer a atividade da glicogenina (codificada pelos genes GLG1 e GLG2), da enzima glicogênio sintase (codificada pelos genes GSY1 e GSY2) e da enzima ramificadora (codificada por GLC3); enquanto que a sua degradação necessita das enzimas glicogênio fosforilase (codificada por GPH1), da enzima desramificadora (codificada por GDB1) e, sob certas condições, da glicoamilase (SGA1), também denominada amiloglicosidase. A síntese e a degradação do glicogênio estão sob complexo e intrincado controles transcricionais e pós-transcricionais, ligados ao estado energético da célula e a disponibilidade nutricional do ambiente. Durante o ciclo de vida das leveduras e de outros microrganismos, a habilidade de perceber a disponibilidade de nutrientes no meio externo é uma propriedade fundamental. Esta habilidade requer sistemas de transdução de sinais similares, ao menos em princípio, a aqueles encontrados em células de mamíferos respondendo a sinalização hormonal, fatores de crescimentos e outros reguladores extracelulares. A disponibilidade de glicose no meio extracelular, por exemplo, é um fator importante na determinação do comportamento de Saccharomyces cerevisiae, levando à repressão de genes necessários à utilização de outras fontes de carbono e das proteínas necessárias ao metabolismo respiratório. Além do mais, a exaustão de nutrientes no meio de cultura produz sinais que modificam o programa metabólico da célula de forma a adaptá-la a nova condição vigente. REGULAÇÃO DO METABOLISMO O acúmulo de glicogênio por células de Saccharomyces cerevisiae no fim da primeira fase de crescimento exponencial, antes da exaustão da glicose no meio de cultura, ocorre devido ao aumento da expressão dos genes das enzimas requeridas ao metabolismo deste polissacarídeo e por mecanismos regulatórios que atuam modulando a atividade destas enzimas. A expressão do gene GSY1 e a atividade da proteína correspondente são constitutivas ao longo de todas as fases de crescimento. Entretanto, a expressão de GSY2 e GLC3 aumentam durante a fase de transição, acompanhando o acúmulo de glicogênio. GSY2 codifica a principal isoforma da enzima glicogênio sintase e sua expressão é regulada pela disponibilidade de nutrientes no meio de cultura. Em fase estacionária, Gsy1p e Gsy2p são responsáveis, respectivamente, por 10% e 90% da atividade glicogênio sintase total da célula de levedura. Contrariamente ao que se poderia esperar, nesta mesma fase do crescimento a expressão dos genes GPH1 e GDB1 também é aumentada. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 78 O fato de todas as enzimas que participam do metabolismo do glicogênio estarem presentes ao mesmo tempo, em um mesmo compartimento celular, impõe a este sistema a necessidade de um mecanismo regulatório atuando sobre a atividade destes componentes. Assim, verificou-se que as vias de síntese e degradação deste polissacarídeo são moduladas principalmente pela regulação das atividades das enzimas glicogênio sintase e glicogênio fosforilase. A regulação da atividade destas enzimas é feita por interconversão covalente de formas, envolvendo fosforilação e desfosforilação de determinados resíduos de Ser e Tre de suas cadeia peptídicas, e também por ativação e inibição alostérica mediada pela glicose 6-fosfato. A fosforilação dos resíduos de Ser-650, Ser-654 e Tre-667, localizados na porção COOH-teminal da isoforma da enzima glicogênio sintase codificada pelo gene GSY2, inativa sua capacidade catalítica. A substituição simultânea destes três resíduos por Ala, ou a deleção da região contendo os aminoácidos fosforilados, por mutação sítio dirigida, produz uma glicogênio sintase sempre ativa, e alinhagem celular que carrega esta forma alterada da enzima acumula glicogênio em grande quantidade, em comparação com uma cepa normal. A fosforilação dos resíduos Ser-654 e Tre-667 é feita, tanto in vivo quanto in vitro, pela ação do complexo ciclina Pcl10p/proteína quinase Pho85 (uma proteína quinase dependente para sua atividade das ciclinas Pcl8p ou Pcl10p). Entretanto, a proteína quinase responsável pela fosforilação do resíduo de Ser-650 ainda não foi identificada. A desfosforilação da enzima glicogênio sintase é realizada pelo complexo formado entre a fosfoproteína fosfatase do tipo 2A, codificada pelo gene GLC7 e as proteínas reguladoras codificadas pelos genes GAC1 e PIG1. A glicose 6-fosfato funciona como um ativador alostérico que pode reverter a inativação da Gsy2p causada pela fosforilação. Desta forma, a razão da atividade da enzima glicogênio sintase medida na ausência e na presença de glicose 6-fosfato é freqüentemente usada como uma medida do estado de ativação desta enzima. Figura 1. Cinética de UDP-glicose das formas fosforilada e desfosforilada da enzima glicogênio sintase. A atividade glicogênio sintase foi determinada sobre condições padrões com 6,7mg/ml de glicogênio e sete diferentes concentrações de UDP-glicose, na faixa de 0,075 a 5,0mM. Quando presente, a concentração de glicose 6-fosfato era de 7,2mM. As atividades foram determinadas sob quatro diferentes condições: não fosforilada , com ( ) ou sem ( ) glicose 6-fosfato, e fosforilada, com ( ) ou sem ( ) glicose 6-fosfato. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 79 Vmax 13 Km 2 Vmax / Km ~ 6 P II III I + Glicose 6-fosfato Vmax 30 Km 2 Vmax / Km ~ 17,5 Vmax - não detectável Km - não detectável Vmax / Km ~ 0,2 + Glicose 6-fosfato Figura 2. Modelo de três estados para a regulação da enzima glicogênio sintase de Saccharomyces cerevisiae (Gsy2p). Com base nos dados cinéticos, foi proposto que Gsy2p pode existir em três estados. A forma com menor atividade corresponde a Gsy2p fosforilada em ausência de glicose 6-fosfato (estado I). A enzima desfosforilada possui atividade intermediária (estado II). Os estados I e II podem ser convertidos ao estado de maior atividade ao se ligarem à glicose 6-fosfato (estado III). As unidades de Km e Vmáx são, respectivamente, mM e µmol/min.mg. A enzima glicogênio fosforilase de Saccharomyces cerevisiae é fosforilada em único resíduo de Tre localizado na porção NH2-terminal (Tre-10). Este resíduo é fosforilado in vitro pela fosforilase quinase de levedura e pela proteína quinase dependente de AMPc, nenhuma das duas capazes de fosforilar a glicogênio fosforilase de mamífero. A proteína fosfatase que desfosforila esta enzima ainda não foi identificada. A enzima glicogênio fosforilase é ativada por fosforilação, enquanto que a isoforma desfosforilada é praticamente inativa. Ao contrário da enzima glicogênio fosforilase de mamíferos, a enzima de levedura não é ativada por AMP nem inibida por glicose. Entretanto, a forma ativa da enzima glicogênio fosforilase de levedura é fortemente inibida por glicose 6-fosfato. Além da glicose 6-fosfato atuar como regulador alostérico das enzimas glicogênio sintase e glicogênio fosforilase, este metabólito também interfere, de uma forma ainda não bem compreendida, nos processos de fosforilação e desfosforilação das enzimas chaves do metabolismo de glicogênio. A presença de altos níveis intracelulares de glicose 6-fosfato mantém a glicogênio sintase em sua forma desfosforilada (ativa) e a glicogênio fosforilase em sua forma desfosforilada (inativa), propiciando o acúmulo de glicogênio. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 80 CONDIÇÕES NÃO PROLIFERANTES Concentrações intracelulares elevadas de glicose 6-fosfato são encontradas quando as células de Saccharomyces cerevisiae são submetidas a condições não proliferantes. Nestas condições, em presença de glicose e ausência de fontes de nitrogênio, a glicose transportada para o interior da célula não pode ser consumida para o crescimento e divisão celular e se acumula sob a forma de glicose 6-fosfato e outros intermediários da via glicolítica. EXTRAÇÃO, HIDRÓLISE E DOSAGEM Células de leveduras, diferentemente das células animais, apresentam parede celular que têm em sua estrutura polissacarídeos, tais como manana e glucana. Um dos métodos descritos para a extração de glicogênio de leveduras utiliza Na2CO3 (carbonato de sódio) a quente e, para impedir perdas por centrifugação, o glicogênio é dosado sem purificação prévia. Para que se possa dosar o glicogênio é necessário que ele seja hidrolisado, ou seja, convertido a unidades de glicose (glicídeo redutor). Para que os polissacarídeos da parede não interfiram na dosagem do glicogênio, a hidrólise do material extraído deve ser processada com a enzima amiloglicosidase que rompe as ligações D-1,4 e D-1,6, não hidrolisando os polissacarídeos componentes da parede celular. A glicose obtida será quantificada pelo método do DNS. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 81 ROTEIRO DE PRÁTICA SÍNTESE, EXTRAÇÃO E DOSAGEM DE GLICOGÊNIO DE CÉLULAS DE LEVEDURA MATERIAL �material biológico: fermento comercial ou células de S. cerevisiae �tampão fosfato de sódio 50 mM pH 6,0 �tampão acetato de sódio 0,2 M pH 4,8 �glicose 100 mM em tampão fosfato �Na2CO3 0,25 M (solução feita na hora) �Ácido acético 3 M �balança �placa com agitação �banho-maria a 37 e 100oC �banho de gelo �espectrofotômetro �centrífuga �ác. 3,5 dinitro salicílico (DNS) em meio alcalino �amiloglicosidase OBJETIVO Demonstrar a síntese de glicogênio por células de levedura, em condições não proliferantes, seu isolamento e quantificação. Este procedimento deverá ser realizado em 2 aulas práticas sucessivas. PROCEDIMENTO Tratamento prévio do fermento comercial O fermento comercial deve ser exaustivamente lavado com grandes volumes de água destilada, para retirada da goma que envolve o produto. A seguir, as células deverão ser incubadas apenas em tampão fosfato de sódio 0,05M pH 6,0, com agitação e temperatura controladas, por cerca de 24 horas, para diminuir o conteúdo de glicogênio já existente. Incubação em condições não-proliferantes 1) 2) 3) 4) Retirar 12,5 mL da suspensão celular (30 mg de peso úmido por mL de tampão fosfato de sódio 50 mM pH 6,0) para erlenmeyer. Iniciar a incubação em placa com agitação rotatória, pela adição de 12,5 mL de uma solução de glicose 100 mM no mesmo tampão, à suspensão celular. Nos tempos determinados (0, 20, 40 e 60 minutos) tomar uma alíquota da suspensão celular com um volume de 5 mL. Observe que o tempo zero tem que ser colhido imediatamente após a adição da glicose à suspensão celular. Centrifugar a 3000 rpm por 3 minutos cada uma das alíquotas, em tubo previamente gelado. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 82 5) 6) Recolher o sobrenadante em tubos previamente marcados. Estes sobrenadantes serão utilizados, posteriormente, para a determinação da glicose residual. Lavar por centrifugação a 3000 rpm por 3 minutos com água gelada. Desprezar as águas de lavagem. Extração e hidrólise do glicogênio acumulado 7) 8) 9) 10) Às células lavadas e empacotadas, adicionar 1 mL de Na2CO3 0,25 M e homogeneizar. Transferir 0,8 mL da suspensão obtida no item anterior para tubo de vidro com tampa de rosca. Aquecer os tubos a 100 oC/ 60 minutos. Resfriar e adicionar a cada tubo: 0,2 mL de ácido acético 3 M, agitar. 2,9 mL de tampão acetato de sódio 0,2 M pH 4,8 0,1 mL de solução de enzima (amiloglicosidase300U/mL). [E] em 4mL de ensaio=15U/mL Incubar à 37oC por 22 h (os tubos serão tirados no tempo aprazado e congelados) Dosagem de glicose pelo método do DNS (aula seguinte) 11) 12) 13) Após o descongelamento, centrifugar e coletar o sobrenadante. Tomar alíquotas de 0,2 mL e 0,4 mL do sobrenadante do item anterior e dosar pelo método do DNS. Dosar o sobrenadante do item 5 (glicose residual) pelo método do DNS. Resultados 14) 15) Construir os seguintes gráficos: Glicose residual (mM) x tempo de incubação (minutos) Acúmulo de glicogênio Pg de glicose/mg células (peso seco) x tempo de incubação (min) Calcular o rendimento de formação do glicogênio (G), com relação à glicose consumida (S) Y (G/S) = 'G /'S Observação: O fermento comercial possui, aproximadamente, 70% de água (intracelular e intersticial). Glicose residual Glicogênio formado Tempo (min) Abs (540nm) Glicose (mM) Abs (540nm) Glicose (Pg/mg cél.) 0 20 40 60 UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 83 ESTUDO DIRIGIDO 1) Na prática de extração e dosagem do glicogênio explique o que ocorre em cada uma das etapas: a- homogeneização do tecido com TCA b- adição de etanol gelado c- adição de HCl 1 N e aquecimento a 100oC por 30 minutos. d- adição de NaOH 1 N e- reação com o DNS 2) Qual a conveniência de se efetuar a hidrólise do glicogênio com HCl em concentração inferior a 2 N? 3) 100 g de fígado foram homogeneizados com 100 mL de TCA 10% e após centrifugação, recolheu-se um volume de 100 mL correspondente ao filtrado do sobrenadante. A 5 mL desse filtrado, adicionaram-se 10 mL de etanol gelado; após a permanência à 0oC por 20 minutos, procedeu-se à nova centrifugação com o objetivo de separar o precipitado. Este foi dissolvido em 1 mL de HCl 1 N e incubado à 100oC durante 30 minutos, tomando-se as devidas precauções para que a evaporação fosse mínima. Depois de resfriada, a solução foi neutralizada com 1 mL de NaOH 1 N e duas alíquotas de 0,2 mL foram utilizadas para a dosagem do poder redutor pelo método do DNS, fornecendo Abs de 0,24 e 0,26. Sabendo-se que 1Pmol de glicose corresponde a 180 Pg e que o coeficiente angular da curva padrão de açúcar redutor pelo método do DNS é 0,125 (Pmol mL)-1, pergunta-se qual a massa de glicogênio. Expresse em termos de massa de glicose por grama de tecido. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 84 TEORIA DA PRÁTICA HIDRÓLISE ÁCIDA DO AMIDO A cinética de clivagem das ligações glicosídicas por ácidos depende basicamente da concentração e do tipo de ácido utilizado, assim como da temperatura do processo. A hidrólise ácida do amido é considerada, em linhas gerais, como aleatória porque todas as ligações glicosídicas do amido são igualmente susceptíveis à clivagem, levando à formação de D-D-glicose. No entanto, existem informações que, em condições não muito enérgicas, as ligações D- 1,6 são 1 a 10 vezes mais resistentes ao rompimento que as ligações D- 1,4 e que as ligações mais internas resistem um pouco mais (cerca de 1,8 vezes) que os terminais redutores da molécula. A ação de ácidos sobre o amido nos grânulos é extremamente lenta quando comparada ao amido em suspensão, o que explica a necessidade do prévio 'cozinhamento' para facilitar a hidrólise. Este procedimento expõe as ligações glicosídicas ao ataque de ácidos diluídos, como H2SO4 15% ou HCl 7-10%, sendo que a velocidade da hidrólise pode ser acelerada pelo aumento da temperatura. É importante ressaltar que os ácidos, quando em altas concentrações (por exemplo, HCl 2N) e a temperaturas elevadas, levam à formação de huminas (vide Glicídeos). Este tipo de hidrólise só é utilizada quando se deseja obter glicose pura para finalidade alimentícia, já que exige equipamentos resistentes à ação de ácidos e corrosão, e a necessidade de vapor eleva os custos de produção. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 85 ROTEIRO DA PRÁTICA CINÉTICA DE HIDRÓLISE DO AMIDO I - HIDRÓLISE ÁCIDA MATERIAL �Amido em solução aquosa - 2 mg/mL �HCl 2N �NaOH 1N �Ácido 3,5 dinitro salicílico (DNS) em meio alcalino �Espectrofotômetro �Banho de gelo �Banho-maria �Solução padrão de glicose - 10 Pmoles/mL OBJETIVO Acompanhar a cinética de hidrólise do amido utilizando um catalisador químico (ácido) PROCEDIMENTO 1) Seguir o protocolo abaixo: TUBOS B 0 3 6 9 12 15 20 30 H2O (mL) 0,5 � � � � � � � � Amido (mL) 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 HCl (mL) � 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 2) Após a adição dos reagentes, agitar e proceder à hidrólise, incubando os tubos em banho- maria à 100oC. Obs: Os tubos B e 0 não devem ser aquecidos. 3) Nos tempos 3, 6, 9, 12, 15, 20 e 30 minutos interromper a hidrólise colocando os tubos em banho de gelo. 4) Neutralizar todos os tubos com adição de 1 mL de NaOH 1N. 5) Após a neutralização, adicionar a cada tubo 1 mL de DNS. 6) Aquecer em banho-maria à 100oC por 5 minutos. Resfriar. Completar a 15 mL com água destilada. Homogeneizar. Ler a Abs a 540 nm. 7) Paralelamente, fazer a dosagem com DNS em duas alíquotas da solução padrão de glicose. 8) Calcular o fator de conversão do valor de Abs em concentração. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 86 9) Calcular a concentração de glicose em Pmol mL e em mg mL, para cada tempo, usando o fator obtido. 10) Lançar em gráfico os valores de concentração do produto formado x tempo. 11) Calcular a percentagem de conversão do amido em glicídeos redutores. TUBOS 0 3 6 9 12 15 20 30 Abs (540 nm) [Glicose] (Pmol/mL) [Glicose] (mg/mL) UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 87 TEORIA DA PRÁTICA HIDRÓLISE ENZIMÁTICA DO AMIDO INTRODUÇÃO Existem várias enzimas capazes de catalisar a hidrólise de amido (entre elas as D-amilases, E-amilases, amiloglicosidases, amido fosforilase, isoamilase) que estão amplamente difundidas na natureza e se diferenciam não só pela composição em aminoácidos, como também, pelo modo de ação, pH ótimo, temperatura ótima e outros. Estes parâmetros também podem variar para cada enzima segundo sua origem (animal, vegetal ou microbiana). Devido à amplitude do assunto, serão consideradas apenas as três primeiras enzimas porque estas são as preferencialmente usadas na indústria. D-Amilases As D-amilases são encontradas virtualmente em todas as células vivas. A maior parte dos estudos descritos na literatura foi feita com amilases de origem animal, que atuam no processo digestivo (ptialina e amilopsina), com amilases de origem vegetal, encontradas em cereais em germinação (malte) e ainda com amilases de microorganismos (alguns bolores e bactérias) capazes de usar amido como fonte de carbono (vide Glicídeos). As D-amilases são endoenzimas, visto que atuam dentro da cadeia amilácea de forma aleatória, rompendo ligações D -1,4. Em uma suspensão de amido gelatinizada, a adição de D-amilase leva a uma queda rápida da viscosidade, evidenciando a fragmentação da cadeia polimérica. Como resultado deste processo o amido gelatinizado é transformado em fluido fino que pode ser resfriado sem que haja formação de gomas ou produtos de retrogradação. Cerca de 20% dos fragmentos hidrolíticos encontrados nos primeiros estágios de hidrólise são constituídos de oligossacarídeos de baixo PM (maltose, maltotriose, maltotetrose) formados pela quebra simultânea de várias ligações glicosídicas. Os 80% restantes são constituídos de oligossacarídeos de PM variável, denominados genericamente como dextrinas, por isto a D-amilase é conhecida industrialmente como“enzima dextrinizante”. O produto final da hidrólise completa da amilose pelas D-amilases são maltose e D-D-glicose. Por outro lado, como estas enzimas não atuam nos pontos de ramificação (ligações D 1,6) os produtos finais de hidrólise da amilopectina são maltose, glicose e dextrinas ramificadas de baixo PM. As D-amilases em plantas têm grande importância fisiológica na conversão do amido em açúcares redutores durante a germinação da semente, quando o estoque de amido deve ser rapidamente mobilizado para fazer face ao processo de crescimento. Neste momento, a D- amilase, que se encontra sob forma inativa, é rapidamente convertida a sua forma ativa dando início ao processo de germinação. Este fato é utilizado na produção de D-amilases de origem vegetal pelo processo de “maltação” sendo “malte” o nome dado aos cereais em germinação que são largamente usados na fabricação de cervejas, bebidas destiladas e na panificação. As D-amilases de origem microbiana também têm grande aplicação comercial. As D-amilases de bolores, como Aspergillus niger, chamadas de Takadiastases têm considerável relevância no processo de fermentação do arroz (sakê), e são usadas também como suplemento digestivo. As D Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 88 -amilases bacterianas, especialmente as do gênero Bacillus, são de interesse industrial como agentes solubilizantes de amido, sendo capazes de atuar em altas temperaturas (70-75oC). E-Amilases Ocorrem na maioria dos tecidos vegetais, onde agem sobre o amido fornecendo principalmente maltose e dextrinas de alto peso molecular como produtos finais. Como a maltose liberada na reação tem a configuração E, adotou-se o termo E-amilase para distinguí-la da D-amilase. Estas enzimas são particularmente abundantes em certas sementes como soja, trigo, cevada e na batata doce. Elas aparecem também em altos níveis durante a germinação ou maltação, isto explica a contaminação das preparações comerciais de D-amilases. As E-amilases são exoenzimas porque realizam a hidrólise a partir dos terminais não redutores das cadeias, liberando paulatinamente a E-maltose e baixando lentamente a viscosidade da suspensão de amido gelatinizado. Sua ação sobre a amilose contendo um número par de unidades glicosídicas resulta na conversão completa em E-maltose; já as cadeias de número ímpar são convertidas em E- maltose e maltotriose, que só será convertida em glicose e maltose por exposição prolongada a altas concentrações da enzima. Em relação à amilopectina, sua ação a partir dos terminais não redutores é limitada, pois por não hidrolisar ligações D-1-6, é produzida uma dextrina de alto PM, contendo todas as ramificações originais, chamada “dextrina limite”, que foi de grande importância na elucidação das estruturas do amido e glicogênio. Os produtos finais de degradação do amido por ação conjunta da D e E amilases são principalmente maltose e isomaltose. A glicose só é formada como conseqüência da hidrólise da maltotriose em dois fragmentos. Amiloglicosidases As amiloglicosidades ou glicoamilases são enzimas que catalisam a hidrólise da amilose, amilopectina e oligossacarídeos em glicose, o que, em termos industriais, representa completa conversão do amido em açúcares fermentáveis. Elas são produzidas por várias espécies de bolores do gênero Aspergillus e Rhizopus e por certas espécies de leveduras e bactérias como Saccharomyces diastaticus e Clostridium acetobutylicum. São também encontradas no fígado de animais superiores onde participam do metabolismo do glicogênio. As enzimas de alguns bolores são excretadas para o meio de cultivo em quantidades apreciáveis e através de uma metodologia de fracionamento razoavelmente simples pode-se obter preparações semi purificadas, por isso têm grande interesse industrial. A hidrólise do amido pela amiloglicosidase processa-se de maneira progressiva a partir dos terminais não redutores da molécula, liberando glicose com a configuração E no carbono anomérico, através de um mecanismo semelhante ao da E-amilase. Apesar de sua ação mais lenta sobre oligossacarídeos do que sobre polissacarídeos, a amiloglicosidase difere das D e E-amilases, porque é capaz de hidrolisar tanto a maltose como a isomaltose. Contudo, o rompimento das ligações D -1-6 é mais lento do que o das ligações D -1- 4, sendo a hidrólise da isomaltose 30 vezes mais lenta que a de maltose. A amiloglicosidase é também conhecida como 'enzima sacarificante'. Várias pesquisas têm sido realizadas para imobilizá-la em suportes inertes devido a seu grande potencial de utilização nas indústrias na conversão de amido em glicose. UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 89 ROTEIRO DA PRÁTICA CINÉTICA DE HIDRÓLISE DO AMIDO II - HIDRÓLISE ENZIMÁTICA MATERIAL �Solução de amido (2 mg/mL em tampão fosfato de sódio 0,02M pH 6,9) �NaCl 0,05M �Amiloglicosidase �Ácido 3,5 dinitro salicílico (DNS) em meio alcalino �Espectrofotômetro �Banho-maria a 37oC e a 100 oC �Solução padrão de glicose - 10 Pmoles/mL OBJETIVO Acompanhar a cinética de hidrólise do amido utilizando um catalisador biológico (enzima) PROCEDIMENTO 1) Seguir o protocolo abaixo: TUBOS B 0 2 4 6 8 10 12 16 20 30 Tampão (mL) 0,5 - - - - - - - - - - Amido (mL) - 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 Enzima (mL) 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 2) Imediatamente após a adição da enzima, agitar e cronometrar o tempo, incubando os tubos a 37 ºC. 3) No tubo 0 adicionar 1 mL de DNS antes da adição da enzima. 4) Nos tempos 2, 4, 6, 8, 10, 12, 16, 20 e 30 minutos interromper a hidrólise adicionando 1 mL de DNS em cada tubo. 5) Adicionar 1 mL de DNS ao tubo B. 6) Após o término da hidrólise, aquecer todos os tubos a 100 ºC por 5 minutos. Resfriar. 7) Completar a 15 mL com água destilada. Homogeneizar. Ler a Abs a 540 nm. 8) Paralelamente fazer a dosagem com DNS em duas alíquotas da solução padrão de glicose. 9) Calcular o fator de conversão do valor de Abs em concentração. 10) Calcular a concentração de glicose em Pmol/mL e em mg/mL usando o fator obtido. 11) Lançar em gráfico os valores de concentração do produto formado x tempo. 12) Calcular a percentagem de conversão do amido em glicídeos redutores. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 90 TUBOS 0 3 6 9 12 15 20 30 Abs (540 nm) [Glicose] (Pmol/mL) [Glicose] (mg/mL) UFRJ • Instituto de Química Glicídeos 91 ESTUDO DIRIGIDO 1) Na hidrólise enzimática do amido, a ação da D-amilase é paralisada pela adição de 3,5 DNS, enquanto que na hidrólise ácida a paralisação é feita adicionando-se NaOH em banho de gelo (0 oC). Explique porque as reações são interrompidas diferentemente. 2) Que propriedades guardam em comum a D e a E amilases e em que diferem as duas ações enzimáticas? 3) Como se verificaria experimentalmente qual das duas ações enzimáticas, D ou E amilase, estaria atuando sobre determinada amostra de amido? 4) Realizou-se um estudo comparativo da influência da temperatura sobre a ação da D e a E amilases. Através da medida do poder redutor obtiveram-se os seguintes perfis, sendo o período reacional em todos os ensaios igual a 1 minuto. Correlacione os perfis abaixo. Abs 0,3 0,2 0,1 20 40 60 80 100 T ( oC ) 5) Verificando experimentalmente a cinética das hidrólises ácida e enzimática através da medida do poder redutor, a observação do máximo de conversão em cada passo revela que a hidrólise ácida leva a um maior rendimento que a enzimática. Como explicaria o ocorrido tendo por base os mecanismos de ação? 6) Sabe-se que tanto a D como a E amilases levam à formaçãode dextrinas residuais, maltose e mínima quantidade de glicose. Como confirmaria experimentalmente esta afirmativa? 7) 50 mL de uma solução de amido contendo 3 mg mL foram submetidos a uma hidrólise ácida. 1 mL de hidrolisado foi diluído 5 vezes e desta diluição retiraram-se alíquotas de 0,5 mL para a dosagem de poder redutor através do 3,5 DNS. Obteve-se como resultado, usando solução padrão de glicose o correspondente a 1,85 Pmoles. Igual volume da mesma solução sofreu hidrólise enzimática, sendo 1 mL diluído 2 vezes. Novamente 0,5 mL da diluição foram retirados para a dosagem de poder redutor pelo mesmo método, obtendo-se Abs=0,14. Considerando que a hidrólise ácida leva a uma conversão de 100%, calcule a eficiência da hidrólise enzimática. Nota: Sabe-se que o fator da curva padrão é igual a 13,2 Pmoles mL de amostra. 8) Em nosso laboratório preparamos rotineiramente farinha de mandioca para preparo de mosto a ser fermentado para a produção de etanol. O preparo consiste no tratamento seqüencial de 1 kg de farinha suspensa em água, em volume final de 3 litros, contendo as enzimas D-amilase e amiloglicosidase que transformam totalmente o amido contido na farinha em glicose. Instituto de Química • UFRJ Cursos Práticos em Bioquímica 92 Para a determinação do teor de glicose no mosto resultante, tomou-se uma alíquota de 0,5 mL desta suspensão e levou-se a 500 mL em balão volumétrico. Do mosto diluído tomaram-se, em duplicata, alíquotas de 0,5 mL e procedeu-se à determinação de glicídeos redutores, obtendo-se valores de Abs a 540 nm de 0,15 e 0,16. Calcule o percentual de amido contido na farinha de mandioca, sabendo-se que a dosagem de uma alíquota de 1 mL da solução contendo 100 Pg de glicose mL forneceu Abs a 540 nm igual a 0,25. UFRJ • Instituto de Química Aminoácidos Capítulo Quarto Universidade Federal do Rio de Janeiro • Instituto de Química