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Ca´lculo III
Departamento de Matema´tica - ICEx - UFMG
Marcelo Terra Cunha
Integrais Duplas e Coordenadas Polares
Nas primeiras aulas discutimos integrais duplas em algumas regio˜es bem
adaptadas a`s coordenadas cartesianas. Seja pela regia˜o, seja pela func¸a˜o a
ser integrada (ou ate´ mesmo por uma questa˜o de te´cnica de integrac¸a˜o), ha´
exemplos onde a integral dupla e´ mais bem adaptada a coordenadas polares.
3.1 Coordenadas Polares: Revisa˜o
Voceˆ deve se lembrar da ide´ia de usar coordenadas polares no plano. Com
relac¸a˜o a uma origem fixada, deve-se dizer qual a distaˆncia e para qual direc¸a˜o
se deve caminhar para atingir este ponto. A distaˆncia e´ dada pela coordenada
radial r e a direc¸a˜o e´ dada fixando-se uma semi-reta e definindo um aˆngulo
θ em relac¸a˜o a ela (por convenc¸a˜o medido no sentido anti-hora´rio).
Se usamos a mesma origem para coordenadas cartesianas e para coorde-
nadas polares e como semi-reta de refereˆncia usamos a parte positiva do eixo
x, temos a seguinte expressa˜o para mudanc¸a de coordenadas:
x = r cos θ,
y = r sen θ.
Exerc´ıcio: Fac¸a uma figura e use trigonometria para obter as fo´rmulas acima.
3.2 Intuic¸a˜o Geome´trica do Elemento de A´rea
Chamamos de retaˆngulo polar a regia˜o determinada por duas semi-retas:
θ = Θ1 e θ = Θ2 e dois arcos de circunfereˆncia: r = R1 e r = R2. (Fac¸a uma
figura e se convenc¸a por que isso e´ um retaˆngulo).
Para calcular a a´rea de um retaˆngulo, primeiro devemos lembrar que um
setor circular de raio R e aˆngulo ∆Θ tem a´rea
Asetor = piR
2∆Θ
2pi
=
1
2
R2∆Θ.
1
O retaˆngulo polar pode ser visto como a diferenc¸a de dois setores de
mesmo aˆngulo e com raios distintos. Denotando ∆R = R2−R1 (considerando
R2 > R1) e ∆Θ = Θ2 −Θ1, temos
Aret = Asetor2 − Asetor1 = 1
2
R22 ∆Θ−
1
2
R21 ∆Θ =
(R2 +R1)
2
∆R ∆Θ.
O primeiro termo pode ser visto como um raio me´dio (a me´dia aritme´tica
dos raios interno e externo). Se passamos a` situac¸a˜o idealizada onde os dois
raios sa˜o muito pro´ximos, teremos R1 ≈ R2 ≈ R2+R12 e assim
∆A = R ∆R ∆Θ.
3.3 Regio˜es entre Gra´ficos Polares
Gra´ficos polares sa˜o curvas do plano que, em coordenadas polares, podem ser
escritas na forma r = f (θ) (lembre que um gra´fico (cartesiano) e´ da forma
y = f (x)). As regio˜es mais bem adaptadas para fazermos a integral dupla
em coordenadas polares sa˜o determinados por dois gra´ficos polares e duas
semi-retas com θ constante. Assim, para cada valor fixo de θ em um intervalo
[Θ1,Θ2], os valores de r variara˜o entre um gra´fico polar e o outro. Se denotar-
mos por ρ (θ) e σ (θ), com ρ ≤ σ, faremos a integral variando primeiramente
r entre esses dois limites de integrac¸a˜o e depois integraremos em θ. Definida
a notac¸a˜o e com R = {(r, θ) ∈ R2 : Θ1 ≤ θ ≤ Θ2, ρ (θ) ≤ r ≤ σ (θ)}, tem-se a
traduc¸a˜o de integrais duplas como integrais iteradas em coordenadas polares:∫ ∫
R
f (x, y) dA =
∫ Θ2
Θ1
∫ σ(θ)
ρ(θ)
f (r cos θ, r sen θ) r dr dθ.
A novidade mais importante nessa expressa˜o e´ que o elemento de a´rea, dA, se
escreve, em coordenadas polares, como r dr dθ. Com a discussa˜o da secc¸a˜o
3.2 na˜o deve haver surpresa com relac¸a˜o a esta expressa˜o. Outro motivo
para esperar uma expressa˜o como esta e´ pensar em termos dimensionais: o
elemento de a´rea deve ter dimensa˜o de a´rea. Enquanto dr tem dimensa˜o de
comprimento, dθ representa um aˆngulo, e aˆngulos sa˜o adimensionais. Assim,
r dθ e´ um comprimento, justificando novamente a expressa˜o.
2
3.4 Recomendac¸a˜o Geral sobre Integrais Du-
plas
Agora que ja´ abordamos integrais duplas tanto em coordenadas cartesianas
quanto polares, ja´ podemos falar de algo geral, que ira´ nos acompanhar pela
disciplina. E´ importante notar que ha´ treˆs ingredientes ba´sicos em toda
integral dupla: a func¸a˜o a ser integrada, a regia˜o de integrac¸a˜o e o elemento
de a´rea trabalhado. A escolha de sistema de coordenadas a ser trabalhado,
bem como da ordem de integrac¸a˜o, depende destes treˆs ingredientes. Feita a
escolha, voceˆ deve escrever uma expressa˜o em termos de integrais iteradas e
depois resolveˆ-las, usando as te´cnicas aprendidas no ca´lculo I.
Como voceˆ ja´ deve ter aprendido pelos exerc´ıcios envolvendo mudanc¸a de
ordem de integrac¸a˜o, tais escolhas de ordem podem fazer muita diferenc¸a.
Agora aparece uma alternativa a mais: mudar o sistema de coordenadas.
3.5 Um exemplo simples mas importante
Para ilustrar tudo isso, digamos que queremos integrar a func¸a˜o f (x, y) =
x2 + y2 no disco unita´rio (isso e´, a regia˜o delimitada pela circunfereˆncia de
raio 1 centrada na origem). Denotemos por D o disco.
Ha´ va´rias maneiras de se resolver esse exerc´ıcio. Uma propriedade que
pode (e deve) ser usada e´ a simetria: como tanto a regia˜o quanto a func¸a˜o
sa˜o sime´tricas pelas trocas x 7→ −x e y 7→ −y, podemos integrar apenas no
primeiro quadrante (uma fatia de pizza) e multiplicar por 4. Vamos denotar
por Q este quarto de disco.
Se voceˆ fosse resolver esse problema com coordenadas cartesianas, a or-
dem de integrac¸a˜o na˜o seria importante, e voceˆ poderia escrever∫ ∫
D
x2 + y2 dA = 4
∫ 1
0
∫ √1−y2
0
x2 + y2 dx dy,
e tentar resolver essa integral.
Agora temos uma outra estrate´gia, mais bem adaptada. Para isso deve-
mos reconhecer que esta mesma func¸a˜o e´ dada por f (r cos θ, r sen θ) = r2 e
3
que o quarto de disco e´ Q =
{
(r, θ) ∈ R2 : 0 ≤ θ ≤ pi
2
, 0 ≤ r ≤ 1}∫ ∫
D
x2 + y2 dA = 4
∫ pi
2
0
∫ 1
0
r2 r dr dθ
= 4
∫ 1
0
r3dr
∫ pi
2
0
dθ =
pi
2
.
Ha´ um detalhe na conta acima que voceˆ deve ter percebido: as integrais
iteradas foram transformadas em um produto de integrais, uma em r e outra
em θ. Esse e´ um expediente que facilita muitos ca´lculos, e sempre que poss´ıvel
deve ser utilizado. Ainda voltaremos a isso mais adiante.
3.6 Um exemplo surpreendente
No curso de ca´lculo I voceˆ deve ter aprendido que na˜o conseguimos escrever
uma primitiva para a func¸a˜o e−x
2
em termos de func¸o˜es elementares. Ale´m
disso, voceˆ deve lembrar que integrais impro´prias sa˜o definidas como limite
de integrais definidas (neste caso) com os limites de integrac¸a˜o indo para
(mais ou menos) infinito. Com isso, dever´ıamos guardar poucas esperanc¸as
de calcular a integral
I =
∫ ∞
−∞
e−x
2
dx.
Vamos ver agora como as integrais duplas em coordenadas polares podem
nos ajudar.
Primeiro note que
I2 =
∫ ∞
−∞
e−x
2
dx
∫ ∞
−∞
e−y
2
dy
=
∫ ∫
R2
e−(x
2+y2) dA.
Agora passaremos a integral dupla em questa˜o para coordenadas polares,
obtendo
I2 =
∫ 2pi
0
∫ ∞
0
e−r
2
r dr dθ
4
que pode ser resolvida sem dificuldade:
I2 =
∫ 2pi
0
dθ
∫ ∞
0
r e−r
2
dr
= 2pi
[−1
2
e−r
2
]r→∞
r=0
= pi
e, portanto, I =
√
pi.
5

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