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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ FACULDADE DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DE SAÚDE Rodolfo Uriel de Castro Moraes CIRURGIAS RECONSTRUTIVAS DE TECIDOS MOLES EM PEQUENOS ANIMAIS COM ÊNFASE NAS AFECÇÕES PALPEBRAIS CURITIBA 2012 CIRURGIAS RECONSTRUTIVAS DE TECIDOS MOLES EM PEQUENOS ANIMAIS COM ÊNFASE NAS AFECÇÕES PALPEBRAIS CURITIBA 2012 Rodolfo Uriel de Castro Moraes CIRURGIAS RECONSTRUTIVAS DE TECIDOS MOLES EM PEQUENOS ANIMAIS COM ÊNFASE NAS AFECÇÕES PALPEBRAIS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Medicina Veterinária da Faculdade Ciências Biológicas e de Saúde da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Médico Veterinário Orientador: Prof. Milton Mikio Morishin Filho. CURITIBA 2012 Reitor Prof. Luiz Guilherme Rangel Santos Pró-Reitor Administrativo Prof. Carlos Eduardo Rangel Santos Pró-Reitoria Acadêmica Profª. Carmen Luiza da Silva Pró-Reitor de Planejamento Prof. Afonso Celso Rangel Santos Diretor da Faculdade de Ciências Biológicas e de Saúde Prof. João Henrique Faryniuk Coordenador do Curso de Medicina Veterinária Profª. Ana Laura Angeli Campus Prof. Sydnei Lima Santos (Barigui) Rua Sydnei Antonio Rangel Santos CEP 82010-330 – Santo Inácio Curitiba – PR Fone (41) 3331-7700 AGRADECIMENTOS Agradeço a todos que sonharam e acreditaram comigo. Cada um teve seu papel que, por menor que tenha sido, foi essencial no cumprimento desta meta. Agradeço a meus mestres, foram eles, cada um há seu tempo e seu modo, que me inspiraram e inspirarão a sempre querer aprender mais. Aos amigos conquistados durante o caminho do aprendizado... Amigos ontem, amigos hoje e certamente amigos amanhã. Aos profissionais amigos especiais, Médicos Veterinários, estagiários, enfermeiros e demais funcionários do Hospital Veterinário Santa Mônica, em especial ao Dr. Ricardo Canever, orientador profissional, pela paciência e cooperação, só tenho que agradecer neste momento. Ao professor Milton, amigo, por estar sempre ao meu lado, transmitindo-me todo seu apoio, pelo incentivo e pela amizade que de forma solidária, só posso repetir muito obrigado. Aos meus pais, irmãos, pois sei que sempre que precisar de conforto entre eles eu vou encontrar. A Ana Helena, pelo carinho companheirismo, incentivo, paciência e amor. A minha maior gratidão a todos que participam dessa caminhada, pois tenho certeza que levo com carinho dentro de mim a semente plantada, aguardando germinar, para minha nova vida profissional, um futuro auspicioso. O término desta etapa é apenas o inicio de tantas outras que percorrerei na minha vida tendo em vocês meus alicerces. Obrigado por estarem ao meu lado. “Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia e, se não ousarmos fazê-la teremos, para sempre à margem de nós mesmos.” Fernando Pessoa Resumo A cirurgia reconstrutiva é uma grande ferramenta utilizada na Medicina Veterinária atualmente, devido à alta frequência de atendimentos a pequenos animais acometidos por lesões cutâneas de diferentes tipos e origens. Nas últimas décadas foram desenvolvidas várias técnicas reconstrutivas, o que permitiu assegurar a integridade funcional e cosmética do animal, melhorando assim, a sua eficácia e fornecendo ao paciente uma melhor qualidade de vida. Em cães e gatos, o sistema de circulação local favorece a realização de técnicas reconstrutivas, embora a técnica cirúrgica a ser escolhida deve estar de acordo com as limitações do local da ferida, obedecer as linhas de tensão e elasticidade da pele bem como a quantidade de tecido disponível para a realização do procedimento cirúrgico, buscando assim um resultado favorável no pós cirúrgico. O presente trabalho de conclusão curso descreve os procedimentos realizados para a correção cirúrgica de um paciente portador de afecção palpebral denominada de entrópio e ectrópio combinados e descreve também as atividades desempenhadas durante o período de estágio obrigatório. Palavras-chave: Cirurgia Reconstrutiva, afecção palpebral, Entrópio e ectrópio combinados. Abstract Reconstructive surgery is a major tool used in veterinary medicine today, due to the high frequency of visits to small animals suffering from skin lesions of various types and origins. In the last decades several reconstructive techniques were developed, which allowed ensure functional and cosmetic integrity of the animal, thereby improving its efficiency and providing improved patient quality of life. In dogs and cats, the local circulation system favors the realization of reconstructive techniques, although the surgical technique being chosen must comply with the limitations of the wound site, obey the lines of skin tension and elasticity as well as the amount of tissue available for the surgical procedure, thus seeking a favorable outcome in post surgical. This paper describes the course completion procedures performed for surgical correction of a patient with eyelid condition called entropion and ectropion combined and also describes the activities performed during the period of compulsory internship. Keywords: Reconstructive Surgery, eyelid disorder, Entropion and ectropion combined. LISTA DE SIGLAS, ABREVIATURAS E SÍMBOLOS UTP Universidade Tuiuti do Paraná HVSM Hospital Veterinário Santa Mônica PR Paraná Mm Milímetros Kg Quilogramas SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO............................................................................................. 13 1.2 APRESENTAÇÃO DO HOSPITAL VETERINÁRIO SANTA MÔNICA......... 14 1.3 CASUÍSTICA GERAL E DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DE ESTÁGIO... 16 2 REVISÃO DE LITERATURA....................................................................... 18 2.1 O SISTEMA TEGUMENTAR........................................................................ 19 2.2 A ESTRUTURA DA PELE............................................................................ 20 2.3 VASCULARIZAÇÃO..................................................................................... 21 3 CARACTERÍSTICAS DAS FERIDAS CUTÂNEAS..................................... 21 3.1 CLASSIFICAÇÃO DAS FERIDAS................................................................ 22 4 CICATRIZAÇÃO.......................................................................................... 23 5 ENXERTOS CUTÂNEOS............................................................................ 24 6 TENSÃO E ELASTICIDADE DA PELE.......................................................24 6.1 RETALHOS BÁSICOS................................................................................. 25 6.2 RETALHOS PEDICULADOS....................................................................... 26 7 LINHAS DE TENSÃO.................................................................................. 27 7.1 PLASTIA EM V-Y......................................................................................... 27 7.2 Z PLASTIA................................................................................................... 27 8 AS PÁLPEBRAS E SUAS PRINCIPAIS AFECÇÕES................................ 28 8.1 HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA, ANATOMIA E FISIOLOGIA PALPEBRAL. 28 8.2 GENERALIDADES SOBRE AS DOENÇAS PALPEBRAIS EM CÃES........ 30 8.3 CONSIDERAÇÕES PRÉ OPERATÓRIAS................................................... 30 8.4 ANTIBIOTICOTERAPIA............................................................................... 31 9 TÉCNICAS E PROCEDIMENTOS RECONSTRUTIVOS RELACIONADOS ÀS AFECÇÕES PALPEBRAIS..................................... 31 9.1 TRAUMA PALPEBRAL................................................................................ 31 9.2 ENTRÓPIO................................................................................................... 32 9.2.1 Entrópio congênito....................................................................................... 33 9.2.2 Entrópio espástico........................................................................................ 33 9.2.3 Técnicas reconstrutivas................................................................................ 34 9.3 ECTRÓPIO................................................................................................... 37 9.3.1 Técnicas reconstrutivas................................................................................ 37 9.4 ENTRÓPIO E ECTRÓPIO COMBINADOS.................................................. 40 9.4.1 Técnicas reconstrutivas................................................................................ 41 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 – HOSPITAL VETERINÁRIO SANTA MÔNICA................................. 14 FIGURA 2 – ESTRUTURA FÍSICA HVSM............................................................. 15 FIGURA 3 – EQUIPAMENTOS DE DIAGNÓSTICO................................................ 16 FIGURA 4 – O SISTEMA TEGUMENTAR.......................................................... 20 FIGURA 5 – RETALHOS PEDICULADOS.......................................................... 26 FIGURA 6 – INCISÃO TRIANGULAR AVANÇANDO PARA COBRIR UM DEFEITO, NA FORMA DE V–Y...................................................... 27 FIGURA 7 – Z PLASTIA...................................................................................... 28 FIGURA 8 – FETO CANINO COM 39 DIAS DE GESTAÇÃO............................. 29 FIGURA 9 – REPARAÇÃO CIRÚRGICA DA PÁLPEBRA.................................. 32 FIGURA 10 – PREGUEAMENTO PALPEBRAL COM ENTRÓPIO...................... 34 FIGURA 11 – MÉTODO DE HOTZ-CELSUS........................................................ 35 FIGURA 12 – MÉTODO DE HOTZ-CELSUS MODIFICADO................................ 35 FIGURA 13 – CORREÇÃO EM Y PARA V........................................................... 36 FIGURA 14 – TARSORRAFIA LATERAL.............................................................. 36 FIGURA 15 – TREPANAÇÃO............................................................................... 38 FIGURA 16 – RESSECÇÃO EM CUNHA............................................................. 39 FIGURA 17 – CORREÇÃO EM V PARA Y........................................................... 39 FIGURA 18 – MÉTODO DE KUHNT-SZYMANOWSKI MODIFICADO................. 40 FIGURA 19 – ENTRÓPIO E ECTRÓPIO COMBINADOS..................................... 40 FIGURA 20 – BLEFAROPLASTIA LATERAL........................................................ 41 FIGURA 21 – RESSECÇÃO DE MASSA PALPEBRAL........................................ 43 FIGURA 22 – RECONSTRUÇÃO DA MARGEM PALPEBRAL............................ 44 FIGURA 23 – RECONSTRUÇÃO LÁBIO – PARA - PÁLPEBRA.......................... 44 FIGURA 24 – MATERIAL CIRÚRGICO................................................................. 45 FIGURA 25 – PACIENTE PORTADOR DE ENTRÓPIO E ECTRÓPIO COMBINADOS................................................................................ 48 FIGURA 26 – SEQUENCIAL DO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO....................... 50 FIGURA 27 – CUIDADOS PÓS OPERATÓRIO.................................................... 51 LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS GRÁFICO 01 - NÚMERO DE ATENDIMENTOS ACOMPANHADOS DURANTE O ESTÁGIO............................................. 16 GRÁFICO 02 - NÚMERO DE CIRURGIAS ACOMPANHADAS DURANTE O ESTÁGIO............................................. 17 GRÁFICO 03 - NÚMERO DE ACOMPANHAMENTOS CLÍNICOS E INTERNAMENTOS.................................................... 18 TABELA 01 - CLASSIFICAÇÃO HISTOGÊNICA E FREQUÊNCIA DOS TUMORES PALPEBRAIS NOS CÃES.............. 43 1 INTRODUÇÃO A medicina veterinária dos animais de companhia tem se desenvolvido extremamente, em todas as suas áreas. Evidenciamos uma maior consciência e conhecimento da população referente aos cuidados adequados com os animais. A relação proprietário-animal se estreita a cada dia, e esta relação conduz o médico veterinário cada vez mais, a buscar especializações e avanços em novas tecnologias. Observa-se que as especialidades médicos cirúrgicas em sua ampla área, já são uma realidade neste âmbito, e muitos médicos veterinários se especializam em cirurgia, neurologia, dermatologia, oftalmologia, oncologia, ortopedia, odontologia, anestesiologia, entre outras. O presente relatório tem como finalidade abordar os procedimentos e atividades realizadas durante o estagio curricular obrigatório, sob orientação do professor Milton Mikio Morishin Filho, docente responsável pelas disciplinas de Técnica e Clínica Cirúrgica na Universidade Tuiuti do Paraná -UTP. O estágio foi realizado durante o período de 30 de julho até 23 de outubro deste ano, totalizando 360 (trezentas e sessenta) horas divididas em seis horas diárias, de segunda à sexta-feira, pelo período da manhã, das 08 às 14 horas. O local escolhido foi o Hospital Veterinário Santa Mônica (HVSM), localizado na Avenida Brigadeiro Franco, 4029, em Curitiba-PR, um dos centros médico veterinários de referência nesta cidade, que é composto por uma ótima infraestrutura e uma equipe extremamente capacitada. O objetivo do estágio foi acompanhar o atendimento clínico e cirúrgico dos pacientes da rotina buscando assim um aprendizado concreto. Neste relatório está exposta a descrição sintetizada da estrutura física do HVSM, sua casuística no período referido e um relato de caso com sua respectiva bibliografia. Os temas abordados neste trabalho de conclusão de curso foram escolhidos por serem atuais, seja por seu alto índice de incidência ou por seu interesse didático, sendo de extrema relevância para a prática da medicina veterinária de pequenos animais. 1.2 APRESENTAÇÃO DO HOSPITAL VETERINÁRIO SANTA MÔNICA O Hospital Veterinário Santa Mônica (HVSM), foi fundado em 2008, entretanto, vem atuando no mercado Curitibano desde 1991, como Clínica Veterinária Santa Mônica. Sua fachada está ilustrada na figura 1 abaixo. FIGURA 1 – HOSPITAL VETERINÁRIO SANTA MÔNICA O HVSM possui atendimcom equipamento médico atua profissionais motivada e pronta O espaço físico do espera/recepção; quatro consu para gatos; ala de isolamento confirmação de doença in ultrassonografia, alé pronto para que sejam realizad ilustra a estrutura física do HVS FONTE: Arquivo pessoal ento de plantão 24 (vinte e quatro) horas, contando lizado e destacando-se por possuir uma equipe de a prestar um serviço de qualidade a seus clientes. HVSM oferece a seus clientes uma sala de ltórios; um internamento geral e um internamento onde são colocados os animais com suspeita ou fectocontagiosa; uma sala de radiografias e o, preparado e sempre m de um centro cirúrgico bem equipad os quaisquer procedimentos. A figura 2, que segue, M. FIGURA 2 – ESTRUTURA FÍSICA HVSM A B C D A) consultório B) isolamento C) centro cirúrgico D) e ergência. FONTE: Arquivo pessoal Os médicos veterinários apresentam-se divididos em áreas de interesse, atuando em áreas muito diversas, tais como a oftalmologia, terapia intensiva, neurologia, oncologia, ortopedia, odontologia, dermatologia, dentre outras. Como serviço de apoio, o HVSM possui departamento de diagnostico por imagem e laboratório de patologia clínica, como demonstra a figura 3. m FIGURA 3 – EQUIPAMENTOS DE DIAGNÓSTICO C A) Laboratório de patologia B) Sala de ultrassonografia C) Sala de Raios – X. FONTE: Arquivo pessoal 1.3 CASUÍSTICA GERAL E DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DE ESTÁGIO Durante o período de estágio foi possível acompanhar grande quantidade de atendimentos, como se observa no gráfico 1. Os atendimentos realizados perfizeram um número total de 222 pacientes. Sendo que a maioria foi de cães, num total de 198 atendimentos, desde filhotes a pacientes geriátricos. Já os felinos totalizaram 24 pacientes, número este que se justifica ainda por ser o cão uma preferência regional como animal de companhia. GRÁFICO 1 - NÚMERO DE ATENDIMENTOS ACOMPANHADOS DURANTE O ESTÁGIO A casuística, incluindo caninos e felinos, foi dividida em duas categorias: acompanhamento cirúrgico e clínico, onde vale ressaltar que, dentre os casos clínicos, ficava estipulado o acompanhamento das consultas e de pacientes internados, além do auxílio durante os procedimentos de diagnóstico. As cirurgias realizadas foram distribuídas entre cinco grandes grupos de maneira generalizada, a saber: cirurgias do sistema tegumentar (biópsias, nodulectomias, correção de afecções palpebrais, plastias de pele), cirurgias urogenitais, cirurgias oftálmicas, cirurgias ortopédicas, bem como o acompanhamento dos tratamentos odontológicos, como ilustra o gráfico 2 abaixo. GRÁFICO 2 – NÚMERO DE CIRURGIAS ACOMPANHADAS DURANTE O ESTÁGIO Os casos clínicos acompanhados, demonstrados no gráfico 3, também foram pesquisados e discutidos durante o período em que se cumpriu o estágio obrigatório. GRÁFICO 3 - NÚMERO DE ACOMPANHAMENTOS CLÍNICOS E INTERNAMENTOS 2 REVISÃO DE LITERATURA O estudo do tratamento e reparação de feridas cutâneas possui extrema importância em medicina veterinária devido à alta frequência no atendimento de pequenos animais acometidos por lesões de diferentes tipos e origens (WENDT 2005). A pele corresponde ao maior órgão dos vertebrados e é fundamental para a defesa e sobrevivência dos animais. Esta estrutura corresponde a 24% do peso corporal de um filhote e a 12% do peso de um animal adulto, recobrindo a superfície corpórea e atuando como uma barreira seletiva entre este e o meio externo, impedindo a entrada de microorganismos e toxinas, além de evitar a perda de fluidos, eletrólitos e calor. A perda da integridade da pele pode resultar em um desequilíbrio fisiológico substancial, e até mesmo a morte (WENDT 2005; THEORET, 2009). Um ferimento corresponde a uma interrupção da integridade anatômica, fisiológica e funcional dos tecidos do corpo. De acordo com as características da pele de cada animal, a tolerância à lesão é variável devido às características físicas como a vascularização e elasticidade peculiares a cada espécie animal (AMALSADVALA &SWAIN, 2006). A cicatrização de uma ferida é um termo utilizado para descrever o processo que naturalmente ocorre na pele lesionada com a finalidade de restaurar a integridade do tecido perdido formando uma cicatriz de colágeno. Existem tanto fatores endógenos como exógenos capazes de afetar a cicatrização dos tecidos lesionados, que devem ser levados em consideração para o sucesso no tratamento dos pequenos animais (GREGORY,1999; FOSSUM 2007). Todas as cirurgias reconstrutivas abrangem as intervenções que são realizadas para reparar ou mesmo reconstruir uma área da pele que tenha sido danificada ou destruída por um ferimento e ou traumas, por tumores, por uma anomalia congênita ou por sequela iatrogênica. As cirurgias reconstrutivas visam restaurar a anatomia local, corrigindo disfunções ou perdas, quer sejam sensitivas e ou motoras. As lesões de pele de grandes proporções em pequenos animais necessitam de reparações cirúrgicas e para as regiões com pouca elasticidade e de difícil aplicação de retalhos pediculados, a enxertia cutânea é a técnica ideal. A maneira pela qual um ferimento é tratado é essencial para favorecer o processo de cicatrização embora esteja a cicatrização diretamente relacionada à quantidade de tecido perdido ou danificado e à presença ou não de infecção no local da lesão (PAVLETIC, 2010). 2.1 O SISTEMA TEGUMENTAR A pele é composta de epiderme, derme e anexos. A camada externa da pele é a epiderme que corresponde à camada mais fina, sendo a camada cutânea protetora. A epiderme é mais delgada em áreas com abundante pelame e mais espessa em áreas onde o pelame é mais escasso (FOSSUM, 2007). A epiderme mais espessa está localizada nos coxins e na área correspondente ao focinho, regiões onde o extrato córneo é mais abundante. A epiderme é avascular recebendo a nutrição por meio dos capilares da derme. (FOSSUM, 2007). A derme apresenta função protetora e de sustentação, sendo o local onde localizam-se as glândulas sebáceas e folículos pilosos. Apresenta ainda fibras colágenas, elásticas e reticulíneas (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004). A derme tem a importante função de nutrir a epiderme, pois esta exige uma constante reposição de nutrientes necessários para manter a atividade mitótica (IRION, 2005). Descrevem- se na derme duas camadas, de limites pouco distintos, que são a: papilar (superficial) e a reticular, mais profunda (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004). A derme é vascularizada, constituída por células como macrófagos, plasmócitos, mastócitos além de vasos sanguíneos e linfáticos, nervos, folículos pilosos, glândulas, ductos, fibras musculares (FOSSUM, 2007). A hipoderme que também é chamada de camada ou tecido subcutâneo, está localizado abaixo da derme, rica em gordura e serve como amortecedor para a derme e a epiderme. Nesta camada se encontram fibras colágenas provenientes da derme que se cruzam entre as células gordurosas acumuladas, fornecendo uma conexão entre as camadas superficiais da pele e a camada subcutânea (SAMPAIO, RIVITTI, 2001; STEVENS, LOWE, 2001; REMINGTON, 2004). FIGURA 4 – O SISTEMA TEGUMENTAR FONTE: Portal São Francisco, disponível em <http://www.portalsaofrancisco.com.br> 2.2 A ESTRUTURADA PELE Pelo desenvolvimento embrionário, a pele é diferenciada em duas camadas principais, a camada externa que se desenvolve a partir do ectoderma, que é a epiderme, e a camada mais profunda (a derme e o subcutâneo) provenientes do mesoderma (KOLB, 1987). O extrato germinativo consiste em uma camada simples de células cilíndricas, que se encarregam, por meio da divisão, da reposição constante das camadas epiteliais superficiais. O estrato germinativo e o estrato espinhoso são os locais onde se encontram os corpúsculos pigmentares, melanina. Em direção ao estrato córneo, o teor de pigmento da epiderme fica cada vez menor (KOLB, 1987). 2.3 VASCULARIZAÇÃO Diferente do que ocorre em humanos, macacos e suínos, que possuem um sistema de vascularização com os vasos primários suprindo a pele denominado músculo cutâneo que correm perpendicularmente a superfície da pele enquanto que em cães e gatos os vasos se aproximam e seguem paralelamente a pele e são denominados de vasos cutâneos diretos. Por essa razão determinadas técnicas de enxertos pediculados utilizadas na medicina tem sua aplicação limitada a pequenos animais. Artérias e veias terminais ramificam-se a partir de vasos cutâneos diretos formando plexos subdérmicos, cutâneos e subpapilares (FOSSUM, 2007). 3 CARACTERÍSTICAS DAS FERIDAS CUTÂNEAS As feridas são interrupções da integridade cutâneo-mucosa e resultam dos desequilíbrios e agravos da saúde da pele (IRION, 2005). De acordo com as características de cada animal, a tolerância à lesão também varia, como em cães e gatos, pois estes possuem um maior desenvolvimento da elasticidade cutânea (SLATTER, 2007). As lesões podem ser classificadas, quanto ao agente causador, em incisa ou cortante; contusa; lacerada; perfurante; penetrante; escoriação; térmica ou queimadura; patológica; iatrogênica, amputação. Quanto à evolução são classificadas em ferida aguda ou crônica (IRION, 2005). De modo geral, a causa da lesão determina a gravidade e a sua extensão, bem como o envolvimento de tecidos adjacentes. Por outro lado, independente do tipo da lesão, o reparo cirúrgico pode ser realizado imediatamente ou deve ser postergado se houver infecção, o que contribuirá para a deiscência da sutura (SLATTER, 2007). 3.1 CLASSIFICAÇÃO DE FERIDAS A forma de classificação mais aceita leva em consideração três aspectos básicos: nível de contaminação, grau de exposição tecidual e localização (LACERDA NETO, 2005). O nível de contaminação indica a divisão entre ferida aberta (com laceração e perda de pele) e ferida fechada (com esmagamento e contusões) que podem não evidenciar lesões graves nas camadas mais profundas da pele e dos tecidos subjacentes (SLATTER, 2007). As feridas abertas podem ser diferenciadas pelo grau de contaminação, pelo tempo de exposição, pela causa e pela profundidade da lesão. As causas mais comuns de lesões abertas são abrasão, avulsão, incisão, laceração e punção. (SLATTER, 2007). A contaminação das feridas abertas acaba sendo um empecilho no tratamento cirúrgico da lesão. Desta forma, estas feridas são classificadas de acordo com o grau de contaminação, segundo Slatter (2007): • Classe I - com laceração, limpas, de zero a seis horas de duração; • Classe II - com laceração, de seis a doze horas de duração e significativa contaminação; • Classe III - com doze ou mais horas de duração e intensa contaminação. Atualmente a classificação é realizada estritamente de acordo com o grau de contaminação. Assim feridas limpas são as feridas cirúrgicas; feridas contaminadas, mas limpas, aquelas com mínima contaminação, de fácil tratamento; as feridas contaminadas, ou seja, sujas infectadas, aquelas com processo infeccioso ativo e com a presença de exsudato (SLATTER, 2007). Independente das classificações adotadas, a viabilidade e o sucesso de uma cirurgia reconstrutiva dependem da boa avaliação por um veterinário experiente da viabilidade dos tecidos envolvidos com a área lesionada. Nem sempre o tempo de exposição dos tecidos é tão importante quanto à verificação das defesas já ativas no processo, da avaliação de possível resistência e do tratamento realizado do momento da lesão até sua avaliação (SLATTER, 2007). Resumindo, feridas contaminadas podem ser ocluídas depois de sua desinfecção adequada, assim como as feridas infectadas, cujos tecidos se apresentem contaminados, mas possam ser removidos completamente de maneira a não contaminarem o campo cirúrgico também podem ser ocluídas, embora em caso de dúvidas sempre considerar a contaminação e manter a ferida aberta (SLATTER, 2007). 4 CICATRIZAÇÃO A cicatrização é um processo biológico que restaura a continuidade do tecido após uma lesão. Trata-se de uma combinação de eventos físicos, químicos e celulares que restauram um tecido substituindo-o por colágeno. O processo de cicatrização inicia-se imediatamente após a lesão ou incisão e correspondem a quatro fases: fase inflamatória, debridamento, reparação e maturação do tecido lesionado. A cicatrização é, portanto, dinâmica, com seus estágios ocorrendo simultaneamente. A cicatrização é influenciada por fatores do hospedeiro, pelas características da ferida e outros fatores externos (FOSSUM, 2007). De acordo com Tazima (2008), existem três formas pelas quais uma ferida pode cicatrizar: I. Primeira intenção: é o tipo de cicatrização que ocorre quando as bordas são apostas ou aproximadas, havendo perda mínima de tecido, ausência de infecção e mínimo edema. A formação de tecido de granulação não é visível. II. Segunda intenção: neste tipo de cicatrização ocorre perda excessiva de tecido com a presença ou não de infecção. A aproximação primária das bordas não é possível. As feridas são deixadas abertas e se fecharão por meio de contração e epitelização. III. Terceira intenção: designa a aproximação das margens da ferida (pele e subcutâneo) após o tratamento aberto inicial. Isto ocorre principalmente quando há presença de infecção na ferida, que deve ser tratada primeiramente, para então ser suturada posteriormente. 5 ENXERTOS CUTÂNEOS Um enxerto cutâneo corresponde a um segmento da epiderme e da derme que é completamente removido de uma área e transferido para o local receptor (HEADLUND, 1997). Os enxertos são classificados em: • Autoenxerto – enxertos autógenos, onde os receptores e doadores pertencem ao mesmo animal; • Aloenxertos - homoenxertos, nos quais receptores e doadores são geneticamente diferentes, mas da mesma espécie; • Xenoenxertos – heteroenxertos, quando receptores e doadores encontram-se em animais de espécies diferentes; • Isoenxertos – enxertos realizados entre gêmeos idênticos; Do ponto de vista clínico, os autoenxertos são o tipo mais bem sucedido de enxertia, e são utilizados como enxerto permanente. Os xenoenxertos e os aloenxertos podem ser utilizados como revestimento temporário, pois sempre ocorre certo nível de rejeição por parte do hospedeiro (SWAIM,1993). 6 TENSÃO E ELASTICIDADE DA PELE As cirurgias reconstrutivas são comumente realizadas no intuito de corrigir lesões provocadas por traumatismos, melhorar anomalias congênitas ou em reparações pós cirúrgicas oncológicas. O importante é escolher a técnicas ou as técnicas apropriadas à correção que se deseja realizar, assim evitam-se complicações desnecessárias. Defeitos extensos ou irregulares podem ser ocluídos utilizando técnicas de relaxamento, plastia como, por exemplo, V-Y plastia ou Z plastia. Defeitos extensos em extremidades muitas vezes exigem a mobilizaçãode tecidos de outros locais, como por exemplo, os retalhos pediculados, já os enxertos correspondem a transferência de um segmento de pele para um local distante – receptor. Técnicas cirúrgicas meticulosas devem ser cuidadosamente planejadas pra evitar a excessiva linha de tensão, retorceu e claro o comprometimento circulatório. A quantidade de tecido disponível para a realização destes procedimentos varia de animal para animal e claro entre as raças (FOSSUM, 2007). 6.1 RETALHOS BÁSICOS Desenvolvimento de retalhos locais pode ser necessário quando a oclusão primária da pele resulta em tensão excessiva. Retalhos cutâneos locais dependem do suporte sanguíneo contido no plexo subdermal e varia segundo a localização corporal. Os retalhos podem tanto avançar ou podem ser girados até 90° para cobrir um defeito adjacente (TOBIAS, 2011). Retalhos em que a pele é deslizada não causam ferimentos adicionais ao paciente. Já quando se faze necessária grande quantidade de tecido para oclusão do ferimento, ou seja, um retalho hiperpediculado, o ferimento resultante ao lado doador pode ser suturado ou pode ser deixado aberto para que ocorra sua cicatrização por meio da granulação tecidual (TOBIAS, 2011). Como a oclusão de ferimentos com retalhos de avanço depende da pele a ser estirada, é possível que estruturas anatômicas próximas sofram distorções. Estas distorções podem ser minimizadas quando se utiliza os retalhos rotacionais (TOBIAS, 2011). 6.2 RETALHOS PEDICULADOS Os retalhos pediculados correspondem a “línguas” de epiderme e derme particularmente destacadas de locais doadores e utilizadas com o intuito de ocluir lesões. A base do pedículo contém o suprimento sanguíneo essencial para a sobrevivência do retalho. Retalhos pediculados geralmente permitem cobertura imediata do leito de uma ferida, evitando assim a cicatrização prolongada, a formação exacerbada da cicatriz, bem como sua contração, associadas a cicatrizações por segundas intenções (FOSSUM, 2007). Segundo Fossum (2007), os retalhos podem ser classificados como: • Retalhos de avanço; • Retalhos rotacionados; • Retalhos de transposição; • Retalhos de interpolação; • Retalhos em bolsa e em dobradiça; • Retalhos de Padrão Axial FIGURA 5 – RETALHOS PEDICULADOS FONTE: TOBIAS, 2003, p.27. 7 LINHAS DE TENSÃO As linhas de tensão cutânea correspondem à direção predominante das forças de tensão criadas pelo tecido fibroso cutâneo; A tensão e a elasticidade podem ser avaliadas de forma prática segurando a pele entre os dedos como uma pinça e, seguidamente, após sua liberação ocorre à retração espontânea (HEDLUND, 2007). 7.1 PLASTIA EM V - Y Esta técnica proporciona um alívio de tensão limitado, sendo utilizada principalmente para a realização de pequenos ajustes na tensão cutânea de forma a permitir a oclusão da lesão. Este recurso é muito utilizado em cirurgias de correção palpebral, para corrigir feridas crônicas e inelásticas (FOSSUM, 2007; HEDLUND, 2007). FIGURA 6 – INCISÃO TRIANGULAR AVANÇANDO PARA COBRIR UM DEFEITO, NA FORMA DE V–Y FONTE: 5 minute consult, disponível em <http://www.5minuteconsult.com> 7.2 Z PLASTIA O procedimento em “Z” é uma técnica que alonga ou relaxa uma incisão. O Z pode ser incorporado à ferida ou mesmo ser adjacente, para facilitar o fechamento com menos tensão. A haste central do Z é a incisão primária, já os dois braços do Z devem ser executados do mesmo tamanho da haste central; A angulação pode variar entre 30° e 90° (FOSSUM, 2007). FIGURA 7 – Z PLASTIA FONTE: Pardeehospital, disponível em <http://www.pardeehospital.kramesonline.com> 8 AS PÁLPEBRAS E SUAS PRINCIPAIS AFECÇÕES 8.1 HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA, ANATOMIA E FISIOLOGIA PALPEBRAL As pálpebras são dobras cutâneas músculo fibrosas, localizadas à frente do adito da órbita e contíguas com a pele da face do animal. Recobrem parte do bulbo ocular, dividindo-se em superior, a pálpebra mais móvel, e pálpebra inferior (SAMUELSON, 1999). As pálpebras se formam a partir da superfície do ectoderma, juntamente com a epiderme, cílios e epitélio conjuntival; a crista neural mesenquimatosa origina as estruturas mais profundas, como a derme e o tarso. As pálpebras crescem juntas e se alongam para recobrir o olho. Durante a formação das pregas palpebrais, as pálpebras e parte da superfície ocular são revestidas pela conjuntiva, desenvolvida a partir da superfície do ectoderma. Nos cães, suas bordas se fundem aos 32 dias de vida uterina e a separação ocorre aproximadamente entre o décimo e décimo quarto dia após o nascimento (COOK,1999, SLATTER, 2007). Este período anquilobléfaro fisiológico é necessário aos carnívoros devido a relativa imaturidade dos tecidos dos olhos e de seus anexos , incluindo a musculatura palpebral e o aparelho lacrimal, no momento do nascimento (BEDFORD, 1999). Segundo Gelatt (2003), durante o período anquilobléfaro (FIGURA 08) é observada uma pequena abertura no canto medial. Embora não existam estudos sobre a formação palpebral nos cães, nos humanos elas aparecem no segundo mês de vida intrauterina sob a forma de uma dobra anular recobrindo o esboço ocular, formando duas pregas que se juntam e delimitam a fenda palpebral rudimentar. No sétimo mês as pálpebras se separam e suas bordas estarão completamente livres ao nascimento (DANTAS 2003). FIGURA 8 – FETO CANINO COM 39 DIAS DE GESTAÇÃO FONTE: Portal da veterinária, disponível em <http://www.portaldeveterinaria.com> As pálpebras são nutridas pelas artérias palpebral medial e lateral, que são ramos da artérias oftálmica e da lacrimal, sendo a drenagem realizada através da veia oftálmica, veias frontais e temporais. A inervação palpebral é similar em todas as espécies, ou seja, os ramos motores provém do nervo facial supraorbital, supratroclear, lacrimal e infraorbital – sensitivo, já o simpático é proveniente do simpático cervical. Os principais músculos palpebrais, o orbicular do olho e o levantador da pálpebra superior, são inervados respectivamente pelos nervos facial e oculomotor (SAMUELSON, 1999; SLATTER, 2007; DANTAS, 2003). As principais funções da pálpebra são a proteção física do globo ocular contra traumas; captação de estímulos sensoriais, através dos cílios que desencadeiam os reflexos protetores; controle parcial da entrada de luz para o globo ocular; produção de componentes das camadas lipídicas e do filme lacrimal, respectivamente pelas glândulas tarsais e células caliciformes; bombeamento do filme lacrimal através do ducto nasolacrimal, evitando a epífora e mantendo sua espessura constante através da conjuntiva palpepral (SAMUELSON, 1999; SLATTER, 2007). 8.2 GENERALIDADES SOBRE AS DOENÇAS PALPEBRAIS EM CÃES As pálpebras apresentam várias doenças características da pele, que podem ser modificadas por estruturas especializadas que compõem as pálpebras. Além disso algumas anormalidades estruturais e patológicas da pálpebra frequentemente resultam em doenças oculares secundárias, especialmente aquelas que envolvem a conjuntiva e a córnea (SLATTER, 2007). As anormalidades congênitas, as alterações traumáticas envolvendo as pálpebras, infecções, inflamações e doenças neoplásicas são condições bem definidas, mas as alterações conformacionais relacionadas a determinadas raças ainda são pouco estudadas. As pálpebras constituem a causa de irritação ocular crônica, notadamente em quadros de entrópio,ectrópio, triquíase e distiquíase. O diagnóstico das doenças palpebrais é fácil, mas a execução da blefaroplastia para sua correção requer uma habilidade especial do cirurgião (BEDFORD & GELLATT,2003). A má condução do procedimento cirúrgico para a correção palpebral pode determinar lesões da córnea que, em casos extremos, levam o animal à perda da função visual (GELATT, 2003). Segundo Gelatt (2003), a estreita relação das pálpebras com o filme lacrimal e a córnea é importante no sucesso do tratamento das enfermidades palpebrais. 8.3 CONSIDERAÇÕES PRÉ OPERATÓRIAS A cirurgia oftálmica bem sucedida requer um diagnóstico correto, uma escolha adequada do método cirúrgico, atenção aos detalhes e instrumentação e equipamentos apropriados. Cada animal deve ser minuciosamente examinado para verificação de anormalidades concomitantes, isso deve incluir um exame físico completo e diagnóstico apropriado (FOSSUM, 2007). Em relação à prática cirúrgica, a tricotomia deve ser cuidadosa para evitar lesões cutâneas que potencializem o autotraumatismo. Utiliza-se uma solução de lavagem de povedina iodada diluída a 1-50, evitando que ela entre em contato com o globo ocular. Não se deve esfregar a pele exageradamente. Irriga-se a conjuntiva com soro fisiológico estéril. De preferência deve-se ter acesso a uma lente de aumento, lupa ou microscópio cirúrgico (DELGADO, 2005). Iniciar, antes da cirurgia, o tratamento das úlceras de córnea e da conjuntivite. Antes de anestesiar o animal, estimar a quantidade de pele a ser removida (FOSSUM, 2007). 8.4 ANTIBIOTICOTERAPIA Uma razão pela qual os antibióticos perioperativos são frequentemente administrados nos animais em cirurgia periocular é a existência de potencias patógenos na microbiota normal da conjuntiva, das glândulas lacrimais e das glândulas tarsais. As bactérias mais frequentemente recuperadas de úlceras de córnea são Staphylococcus e Streptococcus spp., as quais são sensíveis à maioria dos antibióticos. A administração de corticoesteróides, devido às suas propriedades antiinflamatórias e imunossupresoras locais e sistêmicas, é outra razão para a administração de antibióticos. As preparações oftálmicas contendo bacitracina, polimixina e neomicina são frequentemente escolhidas para a profilaxia perioperatório (FOSSUM, 2007). 9 TÉCNICAS E PROCEDIMENTOS RECONSTRUTIVOS RELACIONADOS ÀS AFECÇÕES PALPEBRAIS 9.1 TRAUMA PALPEBRAL Traumatismos palpebrais geralmente são atribuídos às feridas por mordeduras e acidentes automobilísticos e necessitam de reparo o mais breve possível para proteger a córnea e manter um efetivo reflexo palpebral, uma vez que a cicatrização por segunda intenção pode resultar em fibrose considerável e consequente distorção das pálpebras e das margens palpebrais. O reposicionamento direto é possível somente quando a perda tecidual é inferior a um terço da margem palpebral. Lesões maiores que isso requerem retalhos avantajados ou enxertos para o reparo. Vale ressaltar que não importa o tamanho do retalho de tecido decorrente da laceração, ele deve ser preservado e, caso isso não seja possível, a margem palpebral poderá ser reconstruída (FOSSUM, 2007). FIGURA 9 – REPARAÇÃO CIRÚRGICA DA PÁLPEBRA FONTE: FOSSUM, 2007, p.265. 9.2 ENTRÓPIO Entrópio é uma condição caracterizada por uma inversão da margem palpebral, inferior ou superior, condição esta em que os cílios atritam contra a córnea, resultando em injúria frequente, causando uma irritação superficial da conjuntiva e da córnea. Quando essa irritação é severa, o paciente sentirá constante dor e poderão ocorrer ulcerações e auto traumatismo (SLATTER, 2007: GELATT. 2003). O entrópio pode ser classificado das seguintes formas clínicas: a) Congênito b) Espástico c) Cicatricial d) Mecânico Em animais, as etiologias mais frequentes são as de entrópio congênito, espástico e traumático (CRUZ; CHAHUD; GUIMARAES, 1997; FOSSUM, 2007; SLATTER, 2007). 9.2.1 Entrópio congênito O entrópio congênito é o mais observado na medicina veterinária e é considerada uma doença de base genética, com elevada predisposição racial. Dentre as raças mais comumente afetadas, encontramos o Chow Chow, Buldogue Ingles, São Bernardo, Cocker Spainel Americano e Inglês, Basset Hounds, Rottweiler, Poodle, entre outras. Com o aumento da popularidade e a reprodução disseminada da raça Shih Tzu, esta também passou a ser incluída como predisposta a esta afecção (CHRISTMAS et al,1992; GELATT, 2003; SLATTER, 2007). É usualmente uma afecção bilateral, mas frequentemente observada em cães e raramente em gatos, onde a porção lateral da pálpebra inferior é a mais afetada, seguida pela pálpebra superior e raramente pela porção medial da pálpebra inferior (SLATTER, 2007). O diagnóstico deve ser feito após a avaliação física do globo ocular e seus anexos. Quando a pálpebra apresenta-se invertida, os pelos faciais ficam em contato direto com a córnea (BIRCHARD&SCHERDING, 2003). 9.2.2 Entrópio espástico Comumente é bilateral e pode afetar o animal em qualquer fase da vida. A causa da inversão palpebral é o espasmo do músculo orbitário, secundariamente à injúria ocular, que pode ser o blefaroespasmo, triquíase, distiquíase, corpo estranho lesões de córnea e conjuntiva (SLATTER, 2007; STAINKI, 2006). O tratamento inicial é direcionado para a correção da causa original do atrito. O sucesso do tratamento envolve a remoção do agente irritante (FOSSUM 2007). 9.2.3 Técnicas reconstrutivas Segundo Fossum (2007), a seleção da técnica reconstrutiva deve basear-se na espécie animal, gravidade e posição da anormalidade, devendo-se levar em consideração que os índices de sucesso com menores complicações necessitam de trauma tecidual mínimo, ressecção tecidual acurada e boa hemostasia. As úlceras e conjuntivite devem ter o tratamento iniciado antes do procedimento cirúrgico. Em neonatos e jovens (até 20 semanas) o entrópio pode ser temporariamente revertido para uma posição mais anatômica através da utilização de uma gota de adesivo tecidual para aproximação das bordas adjacentes da pálpebra, ou pela realização de suturas Lembert invertidas como mostra a figura 10 (FOSSUM 2007). FIGURA 10 – PREGUEAMENTO PALPEBRAL COM ENTRÓPIO FONTE: FOSSUM, 2007, p.273. A manutenção da posição normal deve ser de 10 a 20 dias para resolver efetivamente a reversão. Nos casos mais graves e em animais adultos, é necessária a ressecção da pele para correção do entrópio. Em casos extremos é indicada a ritidectomia estrelada para remover a pele da região dorsal da cabeça. Podem ser associadas também adaptações do método de Hotz-Celcius, ou métodos de pinçamento, como está ilustrado em seguida (FOSSUM, 2007). FIGURA 11 – MÉTODO DE HOTZ-CELSUS FONTE: FOSSUM, 2007, p.274. Quando a inversão do canto lateral é a responsável pelo entrópio, uma modificação em flecha do método de Hotz-Celcius, através de uma ressecção em forma de V, é a mais indicada. Figura 12 (FOSSUM, 2007). FIGURA 12 - MÉTODO DE HOTZ-CELSUS MODIFICADO FONTE: FOSSUM, 2007, p.274. Outra opção para o cirurgião é a correção em Y para V, como demostra a figura 13 (FOSSUM, 2007). FIGURA 13 – CORREÇÃO EM Y PARA V FONTE: FOSSUM, 2007, p.275. A tarsorrafia lateral permanente é uma técnica auxiliar no tratamento do entrópio amplamente utilizada. Consiste na justaposição da pele apósa excisão das bordas, de acordo com o tamanho do entrópio (Figura 14). FIGURA 14 – TARSORRAFIA LATERAL FONTE: FOSSUM, 2007, p.275. 9.3 ECTRÓPIO Ectrópio é a eversão total ou parcial da pálpebra, permitindo assim a exposição do tecido conjuntival. Pode ser primário, secundário, ou ainda classificado de acordo com as formas clínicas (CRUZ; CHAHUD; GUIMARAES, 1997; GELATT, 2003; SLATTER, 2007): a) Congênito b) Iatrogênico c) Paralitico d) Cicatricial e) Mecânico O ectrópio primário, ou de desenvolvimento, sempre envolve a pálpebra inferior e é uma característica de raças como o São Bernardo, Dog Alemão, Terra Nova, Bull Mastiff, Basset Hound e das raças Spaniel. Ectrópio discreto nestas raças pode ser uma característica de padrão racial, entretanto a correção cirúrgica é sempre indicada (GELATT, 2003). O ectrópio secundário por sua vez, pode ser adquirido secundariamente a uma formação de tecido cicatricial, por flacidez da fissura palpebral, podendo estar associado a acentuado euribléfaro e deficiência do músculo retrator lateral. Já o ectrópio adquirido de ambas as pálpebras pode ser decorrente de trauma, formação cicatricial resultante de inflamação crônica, flacidez do músculo orbicular do olho ou dano no nervo palpebral, além de que o ectrópio pode resultar iatrogenicamente de uma correção de entrópio exagerada. (BIRCHARD&SCHERDING, 2003; FOSSUM, 2007). 9.3.1 Técnicas reconstrutivas Assim como no tratamento cirúrgico do entrópio, para reparar cirurgicamente o ectrópio deve-se selecionar a técnica reconstrutiva baseando-se na espécie animal, gravidade e posição da anormalidade, devendo-se levar em consideração que os índices de sucesso com menores complicações necessitam de trauma tecidual mínimo, ressecção tecidual acurada e boa hemostasia. As úlceras e conjuntivite devem ter o tratamento iniciado antes do procedimento cirúrgico (FOSSUM, 2007). Quando o paciente apresentar discreto ectrópio, a técnica da trepanação é de comum aplicação. A técnica consiste na utilização de um perfurador de biópsia de pele (5 a 7 mm) para retirar um ou mais círculos pequenos de pele e posterior justaposição das bordas da pele com dois ou quatro pontos de sutura, de modo que a linha de sutura seja perpendicular à pálpebra (Figura 15) (FOSSUM, 2007). FIGURA 15 - TREPANAÇÃO FONTE: FOSSUM, 2007, p.277. Em casos leves a moderados, o cirurgião tem a alternativa da ressecção em cunha, onde o tamanho da cunha deve ser ligeiramente menor que a extensão da pálpebra encurtada e a correção prevista como uma correção adicional de 0,5 a 1 mm, que ocorre com a fibrose. Pode ser aplicada também, nestes casos, a técnica de Kuhnt-Hembolt, que é a ressecção da parte central da pálpebra e requer uma divisão extensa da pálpebra, ao longo da linha cinzenta, para uma profundidade de aproximadamente 10 a 15 mm para remoção de um fragmento triangular da camada tarsoconjuntival (GELATT, 2003). Ambas as técnicas encurtam a pálpebra, mas a instabilidade do canto lateral pode levar à instabilidade e recidiva do ectrópio (FOSSUM, 2007). FIGURA 16 – RESSECÇÃO EM CUNHA FONTE: FOSSUM, 2007, p.278. Pode ser aplicada também uma correção V para Y, principalmente para ectrópios cicatriciais e excisão de tumores. É extremamente relevante para o tratamento de lesões com ampla contratura cicatricial. Vale ressaltar que este método não encurta a margem palpebral (Figura 17) (FOSSUM, 2007). FIGURA 17 – CORREÇÃO EM V PARA Y FONTE: FOSSUM, 2007, p.278. Resultados excelentes são rotineiramente obtidos através da utilização da técnica de Kuhnt-Szymanowski modificado, isto porque reduz o risco de cicatriz da margem da pálpebra e de dano aos cílios ou às glândulas meibomianas (GELATT, 2003; FOSSUM, 2007;). Esta técnica está descrita na figura 18. FIGURA 18 – MÉTODO DE KUHNT-SZYMANOWSKI MODIFICADO FONTE: FOSSUM, 2007, p.279. 9.4 ENTRÓPIO E ECTRÓPIO COMBINADOS A combinação de entrópio e ectrópio é alcançada através da soma de fatores variáveis, na qual o comprimento excessivo da fissura palpebral é o mais significante, juntamente com ectrópio central das pálpebras inferiores, como ilustra a figura 19 (GELATT, 2003; SLATTER, 2007). FIGURA 19 – ENTRÓPIO E ECTRÓPIO COMBINADOS FONTE: GELATT, 2003, p.61. 9.4.1 Técnicas Reconstrutivas A correção efetiva requer a consideração de dois fatores: redução do comprimento palpebral e estabilização do canto lateral. Para estabilizar o canto lateral, a cantoplastia de Wyman utiliza pedículos do músculo orbicular do olho, mimetizando assim a ação do músculo retrator lateral e aderir à fissura palpebral ao arco zigomático para reconstruir o grau de retração lateral. Uma excisão da pele em forma de C no canto lateral, com os braços deste C estendendo-se ao longo das margens palpebrais laterais, tem por objetivo abordar o orbicular do olho e corrigir o entrópio em fechamento (GELATT, 2003). Já segundo Fossum (2007), a blefaroplastia lateral, combinando a técnica de Hotz-Celcius para entrópio, com a criação de um ligamento lateral do músculo orbicular do olho, é a mais indicada nestes casos. FIGURA 20 – BLEFAROPLASTIA LATERAL FONTE: FOSSUM, 2007, p.280. A Y e V plastia podem ser uma alternativa viável para esta ressecção da pele em forma de C. Nesta técnica o cirurgião deve basear os pedículos do músculo no canto lateral e rotacioná-los 180°, fixando-os por sutura ao periósteo do osso zigomático (GELATT 2003). A cantoplastia de Kuhnt-Szymanowski, modificada por Bedford, reconstrói a fissura palpebral de modo mais curto, sustentada pelo canto lateral ao tecido da pálpera inferior transposto, através de uma separação e ressecção adicionais da pálpebra superior. Esta, por sua vez, é dividida ao longo da linha cinzenta até uma profundidade de 10 mm para reconstruir as camadas de pele e músculo anterior, bem como a tarsoconjuntival posterior. A quantidade de pálpebra a ser encurtada corresponde ao comprimento desta divisão, e a parte lateral da camada de pele e músculo é então removida por uma ressecção triangular, como corte de tesoura, liberando e correndo dentro da extremidade distal da incisão facial vertical original. A camada de pele e músculo da pálpebra inferior é então transposta dentro deste defeito na pálpebra superior sobrepondo a camada tarsoconjuntival. Alguns cães podem necessitar de ressecção subsequente da pele da cabeça para otimizar o resultado (GELATT, 2003). A técnica é denominada Ritidectomia, ou “face lift”, que envolve a remoção de porção da pele facial cervical dorsal, com o intuito de elevar as fissuras palpebrais para a posição normal, permitindo assim a exposição do bulbo. Durante a ritidectomia, a pele é removida da área cervical dorsal através de uma incisão na linha média, correndo do canto medial até a crista da nuca (GELATT, 2003). 9.5 NEOPLASIAS PALPEBRAIS As pálpebras são comumente afetadas por neoplasias, principalmente em cães idosos. Além da preocupação estética, essas neoplasias palpebrais provocam irritação do nervo trigêmio, acompanhada de lagoftalmo, hemorragia e podem ter caráter maligno, sendo fundamental a intervenção cirúrgica nestes casos (GELATT, 2003). A tabela 1 a seguir demonstra a classificação histogênica e a frequência dos tumores palpebrais nos cães:TABELA 1 – CLASSIFICAÇÃO HISTOGÊNICA E FREQUÊNCIA DOS TUMORES PALPEBRAIS NOS CÃES Adenoma Sebáceo 28,7 - 60% Papiloma Escamoso 10,6 – 17,3 % Adenocarcinoma Sebáceo 2 – 15,3% Melanoma benigno 12,9 – 17,6% Melanoma maligno 2,8 – 7,9% Histiocitoma 1,6 – 3,5% Mastocitoma 1 – 2,5 % Carcinoma Basocelular 1,2 – 2,5% Carcinoma Epidermóide 1 – 2% Todos os outros 1 – 5% FONTE: GELATT, 2003, p.69. 9.5.1 Técnicas reconstrutivas As neoplasias de pele da pálpebra são excisadas como os tumores de qualquer lugar do corpo, com uma incisão elíptica ou circular. Defeitos de pele e de espessura parcial também podem ser reconstruídos utilizando-se retalhos do tipo Z- plastia, transposicional, pedicular, avançado e rombo. Entretanto, neoplasias com envolvimento superior a um terço do comprimento da margem palpebral requerem retalhos avançados para a reconstrução. São alternativas: um retalho avançado de pedículo único e um retalho lábio-para-pálpebra (FOSSUM, 2007). FIGURA 21 – RESSECÇÃO DE MASSA PALPEBRAL FONTE: FOSSUM, 2007, p.287 FIGURA 22 – RECONSTRUÇÃO DA MARGEM PALPEBRAL FONTE: FOSSUM, 2007, p.287. A incisão semicircular no canto lateral para avançar centralmente na lateral da pálpebra inferior ou superior pode ser alternativa. Outros retalhos, incluindo rotacional, Z-plastia, alça de balde e retalho de pálpebra cruzada podem ser utilizados para reconstrução. Pode-se utilizar ainda um retalho lábio-para-pálpebra para reparar grandes defeitos criados pela remoção da neoplasia. Este retalho pode ser utilizado para repor parte ou totalidade da pálpebra inferior e pode ser modificado para reconstruir a pálpebra superior (GELATT, 2003). FIGURA 23 – RECONSTRUÇÃO LÁBIO – PARA - PÁLPEBRA FONTE: FOSSUM, 2007, p.288. 10 MATERIAIS DE SUTURA E INSTRUMENTAL ESPECÍFICO Os instrumentos cirúrgicos devem ser delicados, podendo ser utilizados os instrumentos de macrocirurgia, de menores dimensões, ou instrumentos de microcirurgia. É importante a caixa cirúrgica conter uma pinça de Bishop-Harmon para a pele e conjuntiva, um cabo de bisturi nº 4 para estabilizar a pele durante a incisão e um cabo de bisturi nº 3 para lâmina nº 15, para a realização da incisão. Além disso, é útil possuir uma tesoura de tenotomia de Stevens para efetuar uma dissecção precisa, bem como um porta-agulhas de microcirurgia para permitir a manipulação delicada da agulha do fio 6-0 (DELGADO, 2005). Um perfurador de biópsia de pele pode ser usado quando o ectrópio acomete apenas uma pequena área (FOSSUM, 2007). FIGURA 24 – MATERIAL CIRÚRGICO Da esquerda para a direita: cabo de bisturi nº 3, tesoura de córnea de Castroviejo, pinça de Utrata, tesoura de tenotomia de Stevens, pinça Collibri, pinça de Bishop-Harmon e porta-agulhas de Castroviejo. FONTE: DELGADO, 2005. 11 CONSIDERAÇÕES PÓS-OPERATÓRIAS Fossum (2007) afirma que deve-se recuperar o animal calmamente para prevenir trauma ao local cirúrgico, além de proteger a área após a cirurgia pela colocação de um colar restritor (colar elizabetano). Fornecer analgésicos, conforme a necessidade, pelos primeiros dois a três dias, aplicar antibióticos e corticosteroides, topicamente, após a cirurgia. Usar antibióticos e midriáticos se houver ulceração de córnea. Medicar a conjuntivite bacteriana secundária com antibióticos tópicos (sem esteroides). Espera-se, no pós-operatório, um edema mínimo, o qual deve se resolver em 48 horas. 12 RELATO DE CASO No dia 20 de agosto de 2012, foi atendido no HVSM um paciente da espécie canina e da raça Basset Hound, fêmea, de três anos e sete meses de idade, pesando 40,7Kg, apresentando distiquíase, lagoftalmia, epífora e conjuntivite bilateral. A paciente foi atendida pelo veterinário especialista Ricardo Maia, o qual constatou tratar-se de uma afecção palpebral de caráter congênito passível de correção cirúrgica. O presente caso foi o escolhido para ser relatado. Ao exame oftalmológico inicial observou-se irritação ocular, ceratite superficial, espessamento e hiperemia conjuntival. Estas alterações eram devido a um entrópio bilateral da pálpebra superior, com inversão da margem ao longo de toda a sua extensão, permitindo o contato dos cílios com a superfície ocular. O animal apresentava ainda transtornos da dinâmica palpebral, além da visualização de entrópio superior, havia ectrópio inferior bilateral e anomalia das margens ciliares, como a distiquíase. A combinação de entrópio e ectrópio inferior, bilateral, caracteriza a doença de “diamond-eyes” a qual se faz necessária a correção cirúrgica das pálpebras. Como preparo do paciente para a correção cirúrgica foi instituído a limpeza dos olhos com solução fisiológica e o uso de sulfato de tobramicina colírio sendo instilada 01 gota em cada globo ocular, a cada oito horas, associado ao uso de Epitezan® pomada oftálmica todas as noites, num total de quatro dias que antecederam o procedimento cirúrgico. Após esses quatro dias, o paciente foi submetido a jejum hídrico e alimentar de oito horas para posterior sedação realizada com meperidina (5mg/kg de peso corpóreo) por via intramuscular, e após 15 minutos, indução com propofol (5mg/kg de peso corpóreo), por via intravenosa. A manutenção anestésica foi feita com isoflurano, por meio de vaporizador calibrado com fluxo diluente de 50ml/Kg/min de oxigênio a 100%, por via inalatória, utilizando-se um circuito anestésico com reinalação parcial dos gases. As técnicas utilizadas foram a Ritidectomia, ou “face lift”, devido a quantidade de pele sobressaliente dorsalmente aos olhos, o método de Hotz-Celcius, ou métodos de pinçamento, para correção do entrópio e a técnica de Kuhnt- Szymanowski modificado para correção do ectrópio. FIGURA 15 – PACIENTE PORTADOR DE ENTRÓPIO E ECTRÓPIO COMBINADOS FONTE: Arquivo pessoal. Durante o pré-operatório a paciente fora depilada cuidadosamente na área ao redor dos olhos, até a porção média da cabeça e feita a antissepsia com álcool 70% e clorexidine 2%. Com o paciente em decúbito ventral, a quantidade de pele a ser removida foi estimada sempre avaliando as áreas de tensão. Foi realizada uma incisão elíptica transversal na altura das orelhas, a pele foi então dissecada com o auxílio de uma tesoura romba. A plástica cutânea foi realizada com absorvível 6-0 e a pele foi fechada com o uso de fio de nylon 2-0, em pontos interrompidos. Essa técnica é denominada de ritidectomia. Para a correção do entrópio e ectrópio, o paciente foi posicionado em decúbito lateral e os instrumentos cirúrgicos utilizados eram delicados, foram usados instrumentos de macrocirurgia de menores dimensões e alguns instrumentos de microcirurgia. O fio usado para as suturas foi 6-0 absorvível. No que diz respeito às técnicas utilizadas, serão feitas breves considerações de ordem prática. A técnica de Hotz-Celsus consiste na exérese de uma fatia de pele com o formato de meia-lua, e para tal usa-se um cabo de bisturi nº 4 colocado abaixo da pálpebra para estabilizá-la. Pode-se delinear a quantidade de pele a excisar esmagando-a com uma pinça hemostática, mas esse procedimento traumatiza o tecido e aumenta o edema. A hemorragia que se segue a seguir ao corte deve ser controlada por pressão digital ou com pinças hemostáticas. Não se pode utilizar electrocautério nem bisturi elétricodevido ao risco de fibroses ou cicatrizes secundárias. A primeira incisão é paralela à margem palpebral a 2 mm de distância, o que ajuda a evertê-la. A segunda incisão é em forma meia-lua crescente, devendo nas extremidades reunir-se com a primeira. A meia-lua de tecido removida com disseção cuidadosa, não atingindo a conjuntiva. Usa-se um fio 4-0 a 6-0, de acordo com o tamanho do animal, para obter uma cicatriz o mais imperceptível possível. O primeiro ponto é colocado no meio da incisão para distribuir a pele de modo igualitário. Os pontos realizados são do tipo “split- thickness”, ou seja, a agulha entra na pele a 1-2 mm do bordo da ferida, sai ao nível da junção derme-epiderme, entra ao nível da junção derme-epiderme e sai a 1-2 mm do bordo da ferida. Os pontos ficam afastados 2 a 3 mm entre si, de forma a possibilitar uma cicatrização perfeita e evitar cicatrizes inestéticas. Na técnica de Hotz-Celsus modificada para o entrópio lateral superior e inferior, a incisão prolonga-se para além do canto lateral, ficando com o formato de uma seta. O encerramento da incisão vai corrigir a blefarofimose, devendo o primei- ro ponto ser colocado no extremo lateral da incisão, em forma de seta, e seguindo os mesmos procedimentos que para a técnica de Hotz-Celsus simples. Na blefaroplastia de Stades realiza-se a exérese de uma porção de pele de 10 a 15 mm de largura com origem ao nível do tarso, fazendo mesmo a ablação dos cílios. A incisão começa a 2 a 4 mm do canto medial, prolonga-se ao longo de toda a pálpebra superior e termina a 5 a 10 mm do canto lateral. A porção de pele resultante é retirada com a ajuda de tesoura de tenotomia de modelo Stevens. Sutura-se com um fio reabsorvível a cerca de 2-3 mm da margem palpebral, utilizando para tanto fio de ácido poliglicólico 3-0 com agulha atraumática. O restante de tecido cicatriza por segunda intenção, o que ajuda a everter a margem palpebral. Esta técnica também pode ser utilizada para a resolução de distiquíases exuberantes. A cantoplastia de Kuhnt-Szymanowski, modificada por Bedford, que fora aplicada, reconstrói a fissura palpebral de modo mais curto, sustentada pelo canto lateral ao tecido da pálpera inferior transposto, através de uma separação e ressecção adicionais da pálpebra superior. Esta, por sua vez, é dividida ao longo da linha cinzenta até uma profundidade de 10 mm para reconstruir as camadas de pele e músculo anterior, bem como a tarsoconjuntival posterior. A quantidade de pálpebra a ser encurtada corresponde ao comprimento desta divisão, e a parte lateral da camada de pele e músculo é então removida por uma ressecção triangular, como corte de tesoura, liberando e correndo dentro da extremidade distal da incisão facial vertical original. A camada de pele e músculo da pálpebra inferior é então transposta dentro deste defeito na pálpebra superior sobrepondo a camada tarsoconjuntival. Alguns cães podem necessitar de ressecção subsequente da pele da cabeça para otimizar o resultado FIGURA 26 – SEQUENCIAL DO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO A A) Início da incisão; B) Quantida No período pós-operatório im correção excessiva, devido ao grand cirúrgicas palpebrais. No entanto, à possível avaliar o resultado estético cirurgia, já se pode concluir se foi be B de de pele excisada; C) Sutura. Fonte : Arq ediato é comum parecer que se r e edema que caracteriza todas as medida que o edema vai desap da intervenção realizada, e aos oito m sucedida. C uivo pessoal ealizou uma intervenções arecendo, é dias após a O paciente permaneceu internado durante cinco dias por opção do proprietário, o que favoreceu os cuidados pós-operatórios e o sucesso do procedimento, uma vez que foram realizadas várias suturas na face, e por ser um local facilmente exposto a autotraumatismos e sujeito à deiscência dos pontos. A paciente foi monitorada de maneira intensiva e utilizou rigorosamente o colar de restrição. As feridas cirúrgicas eram limpas de três a cinco vezes por dia com solução salina e clorexidine 2%. Durante o período de internamento foram administrados analgésicos, como o cloridrato de tramadol na dose de 3mg/kg a cada oito horas, via oral durante três dias e o meloxicam 0,1mg/Kg, via oral, a cada 24 horas, durante sete dias. Como antibioticoprofilaxia foi utilizado enrofloxacina 5mg/kg, por via oral,a cada 24 horas, durante dez dias. Para uso ocular foi utilizado um antibiótico tópico de tobramicina sob a forma de colírio, quatro gotas a cada seis horas sobre os pontos. Como a pele palpebral cicatriza rapidamente devido à sua abundante vascularização, os pontos foram retirados com dez dias de pós-operatório. FIGURA 29 – CUIDADOS PÓS-OPERATÓRIOS FONTE: Arquivo pessoal Os resultados obtidos foram excelentes, uma vez que a paciente não apresentou mais quadros de conjuntivite, até o fim do estágio, e teve suas pálpebras reconstruídas com sucesso. 13 CONCLUSÃO O principal objetivo do estágio curricular obrigatório é fornecer ao estagiário a vivência real e prática do mercado atual, além do acesso às tecnologias disponíveis e empregáveis em seu campo de trabalho, contribuindo assim para o aprimoramento dos conhecimentos técnico-científicos adquiridos durante a vida acadêmica. A cuidadosa revisão de literatura sobre a importância das cirurgias reconstrutivas, dando ênfase às cirurgias reconstrutivas em pacientes portadores de afecções palpebrais, permitiu o aprendizado de técnicas e manobras cirúrgicas que visam restabelecer a integridade funcional e cosmética do animal, melhorando assim, sua qualidade de vida. Vale ressaltar que o foco do estágio supervisionado é, sem dúvida, o de deixar bem claro ao formando que, ao concluir esta etapa acadêmica, deve buscar cada vez mais aprimoramento para sua efetiva capacitação ao mercado profissional. BIBLIOGRAFIA AMALSADVALA.T.SWAIN,S.F. Management of hard-to-heal wounds.Veterinary Clinics of North America Small Animal Practice [S.I.]v36,n:4.p.693-711,2006 .
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