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AULA 2 NEUROLIDERANÇA E NEUROCOACHING Prof. Fábio Eduardo da Silva 2 CONVERSA INICIAL Caro aluno, anteriormente apresentamos alguns conceitos sobre neuroliderança, seus principais protagonistas e suas ideias básicas, com concepções sobre o ser humano, o sistema de recompensa do cérebro, ou o sentido de sentirmos prazer e das quatro necessidades humanas básicas, que são: - Conexão ou apego: a construção de um relacionamento positivo e ligação a uma pessoa de apego. - Orientação e controle: ser capaz de se orientar no mundo e no meio ambiente e exercer influência sobre o ambiente e o contexto pessoal. - Proteção e desenvolvimento da autoestima: a necessidade de construir e desenvolver uma autoimagem e autoestima. - Maximização do prazer e evitação da dor: a luta por estados prazerosos (Ghadiri; Habermacher,; Peters, 2012, p. 83). Nesta aula, vamos: a) explorar essas necessidades e sua aplicação ao ambiente organizacional; b) conhecer o modelo de teoria de consistência, baseado nas necessidades comentadas; c) refletir formas de suprir essas necessidades no ambiente corporativo; d) explorar ferramentas de desenvolvimento organizacional e pessoal; e por fim, e) avaliá-las, descobrindo se suprem ou não as necessidades básicas que estamos considerando. Com isso, avançamos para compreender melhor a aplicação da neurociência no mundo organizacional, com foco na otimização dos processos de liderança. TEMA 1 – APLICAÇÃO DAS NECESSIDADES NA PRÁTICA ORGANIZACIONAL 1.1 Quatro necessidades básicas e motivação Vamos refletir sobre a aplicação dessas necessidades no ambiente organizacional. Essas necessidades representam o “coração emocional dos seres humanos”. Mesmo diversas, elas se relacionam com instintos de sobrevivência e necessidades afetivas. Estão localizadas em níveis cerebrais profundos, áreas filogeneticamente antigas, como o tronco encefálico, no caso dos instintos, e o sistema límbico, no caso das necessidades emocionais. Como esses dois níveis de necessidades (instintivas e emocionais) estão interconectados no cérebro, eles vão “colorir-se” mutuamente, ainda que possam também funcionar separadamente. O Sistema de Recompensas do Cérebro, responsável pelo prazer que sentimos, é também ativado quando nossas necessidades básicas são supridas (instintivas e emocionais). Por exemplo, quando recebemos um elogio, 3 que nos eleva a autoestima, temos a liberação de dopamina como gratificação, ou seja, sentimos prazer em suprir essa necessidade básica. Isso é válido também para as outras duas necessidades, apego e orientação/controle. Em contrapartida, se essas necessidades não forem supridas, isso perturbará o comportamento e o bem-estar. Em situações mais extremas, isso pode gerar transtornos psicológicos (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). Vamos agora olhar para os esquemas motivacionais: as necessidades básicas descrevem nossa interação com o mundo ao nosso redor, mas a partir dessa interação de necessidades básicas e sua realização ou dano, formaremos metas motivacionais que visarão a cumprir ou proteger nossas necessidades básicas. Estes serão manifestados na maneira como interagimos com o mundo. Isto é novamente essencial para nós entendermos como estes explicam o coração, a alma, da motivação e como nós, inconscientemente, escolhemos interagir com o mundo ao nosso redor (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 77). Figura 1 – Fatores que influenciam o comportamento humano Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p .77. De forma consciente e, na maioria das vezes, não consciente, formamos nosso comportamento e interagimos com o meio ambiente para se adeque às nossas motivações pessoais, visando suprir ou proteger nossas necessidades básicas. Quando tentamos e conseguimos supri-las geramos memórias de experiências positivas, que tentaremos repetir. De forma complementar, tentamos proteger nossas necessidades de perigos, ameaças e danos. Quando não conseguimos, registramos tais experiências como negativas e tentamos evitá-las no futuro (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). Necessidade de maximizar o prazer e evitar a dor Necessidade de conexão ou apego Necessidade de desenvolvimento e proteção da autoestima Necessidade de orientação e controle Influência em metas motivacionais individuais e concretas do dia a dia Dois esquemas motivacionais de base definem comportamentos e ações; um que visa atingir o atendimento das necessidades básicas (esquemas de abordagem/aproximação) ou o outro para proteger uma necessidade básica (esquemas de esquiva). 4 A pesquisa mostrou que a satisfação das necessidades básicas na primeira infância ativa vários padrões que influenciam o comportamento posterior dos adultos [...] Esses esquemas mostram que a interpretação das necessidades básicas e a motivação para a realização delas são dirigidas individualmente com base em toda a história de experiências a que cada indivíduo foi exposto. Isso, por sua vez, influenciará a interpretação de vários contextos e levará a várias estratégias e ações de prevenção [esquiva] ou abordagem [aproximação]. A partir dessas necessidades básicas, portanto, desenvolva vários objetivos motivacionais. Estas são formadas a partir das experiências anteriores da satisfação, ou não, das necessidades básicas e dos respectivos padrões neuronais no cérebro (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 78). 1.2 Sistema motivacional e personalidade Os dois esquemas básicos, abordagem/aproximação e evitação, podem ser mediados por características de personalidade. Dentre as várias características, enfatizamos a introversão-extroversão e o neuroticismo, que são considerados no modelo Big Five (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). Colaboradores introvertidos costumam ser mais passivos e observadores, evitam promover a si próprios e, ainda que sejam muito emocionais, não costumam mostrar essa característica. Extrovertidos são funcionários atraídos por grupos sociais, falantes, entusiásticos e animados. Essas duas polaridades se correlacionam com as estratégias de aproximação/abordagem e evitação. Esta estratégia é mais usada por pessoas introvertidas. A estratégia de aproximação/abordagem é mais usada por extrovertidos. A característica do neuroticismo representa a estabilidade emocional de uma pessoa. Colaboradores com altos níveis de neuroticismo têm mais experiências emocionais negativas. Os funcionários que têm altos níveis de neuroticismo serão frequentemente confrontados com estados emocionais negativos (e muitas vezes ficam sobrecarregados com isso) e têm muitos problemas, e esses problemas causam turbulência emocional. Pessoas com alto neuroticismo muitas vezes se sentem inseguras. As pessoas com baixo neuroticismo são calmas e equilibradas, não percebem muitos problemas e são resistentes a situações emocionais e de estresse elevadas (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 79). Em relação à satisfação de necessidades básicas, pessoas com níveis elevados de neuroticismo utilizam mais a estratégia de evitação. O contrário ocorre com as pessoas com baixo nível de neuroticismo, que revelam níveis mais baixos dessa estratégia, e ainda apresentam correlações baixas com emoções negativas. (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012) 5 TEMA 2 – MODELO DE TEORIA DA CONSISTÊNCIA 2.1 Modelo de teoria da consistência e congruência Esse modelo integra as quatro necessidades básicas humanas e os esquemas motivacionais que delas resultam. A consistência refere-se ao estado dos processos neuronais subjacentes e aos estados psicológicos que estão em equilíbrio e harmonia. As pessoas sentir-se-ão melhor quando estas necessidades básicas forem satisfeitas e em harmonia, e isso pode ser conseguido através dos seus próprios esquemas motivacionais (Ghadiri; Habermacher;Peters, 2012, p. 80). Importante notar que esse impulso para alcançar ou proteger as necessidades básicas é gerado, na maioria das vezes, de forma não consciente, por processos neurológicos, e o anseio para satisfazer essas necessidades tem prioridade diante de outras necessidades pessoais. Se uma pessoa pode satisfazer suas necessidades básicas, isso pode, e provavelmente será, reconhecido pelo indivíduo e, portanto, influenciar ainda mais seus esquemas motivacionais. Se estes esquemas motivacionais estão alinhados com a nossa percepção do mundo, ou seja, eles são realisticamente capazes de levar à satisfação das necessidades básicas, então temos congruência (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 80). Congruência é aplicação eficaz de nossos esquemas motivacionais (objetivos) no mundo real. É o elo entre nossos processos neuronais (não conscientes) e seus estados psicológicos (conscientes e não conscientes), com nossa experiência objetiva. Um funcionário trabalha há dois anos em uma grande corporação. Seu trabalho foi bem-sucedido e ele recebeu cada vez mais responsabilidade e autonomia. Este empregado motivado tem usado [tomado como inspiração] para formular metas mais altas e mais desafiadoras que ele alcançou. Portanto, esse funcionário desenvolveu o desejo de promover sua carreira nessa organização e concentrou seus esforços nisso. Após o último projeto bem-sucedido, uma promoção foi dada a esse funcionário (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 80). Porém, quando essa harmonia entre nossa experiência neurológica/psicológica e o mundo é quebrada, temos a incongruência. 2.2 Modelo de teoria da consistência e incongruência Segundo este modelo, a incongruência pode ocorrer em três formas diferentes, como mostra o esquema a seguir. 6 Figura 2 – Formas de incongruência Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p .81. 2.2.1 Incongruência de abordagem/aproximação Tendências neuronais impulsionam um padrão de abordagem. Seguindo-o, a pessoa se esforça para agir e alcançar seus objetivos, mas o receio do insucesso lhe inibe (evitação de riscos), gerando incongruência, pois bloqueia sua abordagem para suprir suas necessidades. Um funcionário gostaria de executar um projeto de forma independente, está, no entanto, preocupado em liderar seu próprio projeto e tomar suas próprias decisões e assumir mais responsabilidade. Esta pessoa, portanto, permanece com relutância e infelicidade como assistente no projeto. (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 81) 2.2.2 Incongruência de evitação Quando fortes tendências de abordagem formadas se sobrepõem às de evitação, nesse caso não há proteção contra o desapontamento, se não for possível suprir as necessidades: “Após vários anos de treinamento e envolvimento em vários projetos, o funcionário agora se sente menos ansioso em assumir um projeto e assume a liderança em um grande projeto. No entanto, as metas não foram alcançadas e o projeto não foi bem-sucedido”. (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 81) 2.2.3 Discordância Tanto as tendências de abordagem como evitação são ativadas simultaneamente e se bloqueiam, resultando que nenhuma é cumprida. Temos um conflito motivacional: Incongruência de abordagem/aproximação Incongruência de evitação Discordância Abordagem Evitação Impacto negativo 7 Nesse caso, o empregado não pode decidir e, portanto, está em conflito interno. A gerência sênior ofereceu a esse funcionário uma posição em uma subsidiária estrangeira. O empregado, por um lado, está feliz com a oferta e as novas oportunidades, mas, por outro lado, tem medo na mesma extensão dos possíveis problemas e desafios. (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 81) O modelo de teoria da consistência é o resultado da integração entre as necessidades básicas, os esquemas motivacionais (de abordagem/aproximação ou esquiva/evitação) e o feedback que recebemos do mundo. Ele sugere explicações de como nossas necessidades básicas se constituem e como se manifestam nos nossos objetivos motivacionais, que vamos construindo ao longo da vida pela experiência concreta com o mundo. Tais construções implicam na formação e consolidação de associações neuronais. A interação dessas associações nos permite um feedback interno, e se convertem na forma como interagimos e nos comportamos no mundo. Considerando o foco do contexto corporativo, essa interação nos interessa em particular, no que diz respeito à liderança e os negócios. A Figura 3 apresenta o Modelo de teoria da consistência. Figura 3 – Modelo de teoria da consistência Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p .82. Em síntese, precisamos de conexão com as pessoas, temos necessidade de orientação e controle, buscamos desenvolver e proteger nossa autoestima, e tentamos aumentar as experiências de prazer e evitar aquelas de dor. Se não conseguimos suprir essas necessidades, entramos em incongruência, e não conseguiremos atingir nossos objetivos. Oposto ao que chamamos de congruência, é quando nossa relação com o ambiente/contexto é harmônica e Necessidades básicas Conexão / apego Orientação e controle Experiência e comportamento Maximização do prazer Nível do sistema Autoestima Esquema motivacional Esquema de convergência, aproximação, abordagem Esquema de evitação, esquiva Sinais de incongruência Ativação do esquema motivacionallal Feedback de saciação das necessidades Esforça-se p/atender as necessidades Inconsistência Esforça-se para consistência 8 quando conseguimos suprir nossas necessidades básicas. Consistência é a harmonia entre os processos neuronais subjacentes e os estados psicológicos. O esquema motivacional é a nossa interpretação dos motivos e impulsos que temos para alcançar nossas metas no contexto em que vivemos, sendo que podemos classificar nosso esquema motivacional em abordagem/ aproximação e evitação/ fuga. Na aproximação, buscamos ativamente suprir nossas necessidades básicas, ao passo que na evitação tentamos proteger nossas necessidades básicas em vez de tentar supri-las. TEMA 3 – COMO AMPLIAR AS 4 NECESSIDADES BÁSICAS O modelo teórico de consistência, baseado nas 4 necessidades básicas, reflete a base da interação entre seres humanos e também de seus cérebros com o ambiente. Por essa razão, criar um ambiente que permita consistência e congruência permitirá aos empregados que desempenhem seu potencial mais elevado; consequentemente, a empresa também funcionará em sua eficácia máxima (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). Passamos a considerar então algumas formas de ativação dessas quatro necessidades básicas. 3.1 Conexão / apego Figura 4 – Efeito positivo da ocitocina Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 87. A interação social intensa produz a liberação do hormônio da conexão, a ocitocina, que auxilia na construção da confiança, viabilizando a conexão com uma pessoa ou com um grupo de pessoas. Por essa razão, líderes precisam estabelecer altos níveis de interação com seus colaboradores, permitindo que a necessidade básica de conexão/vínculo seja suprida. Complementarmente, instrumentos de desenvolvimento organizacional voltados a trabalho colaborativo podem aumentar a interação entre as pessoas e estimular relacionamentos Interação social Vínculo, conexão Ocitocina 9 positivos, integração e união. A oxitocina também pode ser considerada hormônio da confiança; para que exista confiança, alguns critérios são necessários (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 87): A confiança é recíproca, a confiança deve ser dada e não ganha – confie para receber confiança; Os interesses devem estar alinhados; O medo deve ser baixo ou inexistente; Ações e comportamento podem fortalecerou violar a confiança. Em contrapartida, a desconfiança ativa as amígdalas e é vista pelo cérebro como uma ameaça. Nesse ponto, parece não haver meio termo – ou é amigo ou inimigo: Simplesmente confiança é uma forma de amizade e vínculo, enquanto a desconfiança está ligada à ameaça e ao medo. Isso pode dar origem a comportamentos não-construtivos, agressivos e protetores [...] o medo distorce o funcionamento do cérebro e inibe o poder cognitivo, a colaboração e a cooperação e, portanto, a criatividade, ao influenciar negativamente o ambiente (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 87). 3.2 Orientação e controle Figura 5 – Efeito negativo da adrenalina Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 88. Precisamos de orientação e controle. A falta de participação nas decisões sobre o nosso futuro pessoal e profissional é contrária a essa necessidade, e produz reações de estresse e liberação de adrenalina. Por essa razão, é necessário, sempre que possível, que os líderes e as líderes envolvam seus empregados quando estiverem elaborando suas metas, e também que sejam transparentes. Assim, estão suprindo a necessidade de orientação e controle. Outras formas de auxiliar a orientação e o controle é fornecendo informações, como uma forma de recompensa (prazer) secundária. Ofertar informação, mesmo que seja negativa, é melhor que não apresentá-la, pois ela indicará alguma orientação e também pode estimular a confiança na organização. Por outro lado, se a informação for ambígua, vai ativar a o sistema de alerta do cérebro, ou seja, as amígdalas disparam indicando perigo (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). Insegurança, falta de participação nas decisões Orientação e controle Adrenalina 10 Também é possível estimular o controle, permitindo que os colaboradores organizem seu local de trabalho, podendo por exemplo personalizá-lo. Também, em certa medida, sugere-se que possam controlar seus horários de trabalho. Se os funcionários e funcionárias puderem controlar ou influenciar as ações, as metas e seu ambiente de trabalho, isso suprirá a necessidade de controle e orientação, e evitará situações de estresse (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). 3.3 Autoestima Figura 6 – Efeito negativo do cortisol Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 89. Situações que envolvem elogios ou críticas podem, respectivamente, favorecer ou prejudicar a necessidade básica de autoestima. Situações em que o desempenho de um funcionário ou uma funcionária é comentado ou revisado, na qual ocorre uma crítica por parte de um superior, podem levar à liberação de cortisol, se esse colaborador ou essa colaboradora sente seu status ameaçado. Portanto, líderes precisam de sensibilidade para escolher a melhor forma de lidar com seus colaboradores/ colaboradoras, ofertando feedbacks construtivos, que visam o desenvolvimento dessas pessoas. É preciso fazê-lo de forma respeitosa e enfatizar as habilidades e talentos da pessoa que recebe o feedback. O sistema de feedback hambúrguer pode ser muito útil. Nele, o pão representa os aspectos positivos, ao passo que a carne aqueles que precisam ser melhorados. Assim, é necessário começar pelos positivos, abordar os aspectos carentes de desenvolvimento, e finalizar novamente com os positivos. Também é necessário apresentar a carne como algo não-pessoal, ou seja, que não represente a pessoa, mas sim uma parte sua que pode ser desenvolvida. O feedback não pode ameaçar a pessoa na sua integridade, na sua inteireza, mas deve representar uma ação que trará benefícios a ela e à organização. “Este é um método sólido para feedback” (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 88). O feedback não deve estar presente somente em momentos formais de avaliação da performance, mas sim no dia a dia das organizações, visto que também serve como orientação às pessoas. Interações respeitosas que valorizem Feedback subjetivo [negativo, não respeitoso] Autoestima Cortisol 11 o desempenho das pessoas, por exemplo por meio de elogios, podem auxiliar colaboradores e colaboradoras a melhorar sua autoestima e consequentemente seu desempenho. Relações que estimulam retroalimentações diárias são facilitadas e ajudam a produzir bons vínculos e conexões (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). Líderes também precisam estar abertos e estimular/solicitar que seus colaboradores e colaboradoras forneçam feedbacks. Se assim o fizerem, estarão estimulando seu grupo a fazer o mesmo. O exemplo é uma das formas mais eficazes de liderança. 3.4 Maximização do prazer Figura 7 – Efeito positivo da dopamina Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 87. No ambiente corporativo, usualmente as experiências de prazer ocorrem devido ao acaso ou em situações específicas, como por exemplo completar uma tarefa com sucesso ou fechar um grande contrato. Experiências de prazer são mediadas pela liberação de dopamina no sistema de recompensa do cérebro, produzindo satisfação e felicidade, que se converteram em motivação adicional. Somos viciados em sentir prazer, e quando o sentimos desejamos senti-lo novamente. Essa é uma das formas mais básicas de motivação. Assim, líderes precisam aumentar as experiências de prazer de seus funcionários, recompensas por atividades desenvolvidas. Uma das formas mais simples é estimular as experiências de vínculo, de conexão e também de autoestima. Observe que as necessidades básicas podem se sobrepor. Se considerarmos as recompensas primárias, aquelas diretamente ligadas à sobrevivência, observamos que uma comida ou bebida pode estimular o prazer. Uma refeição em equipe pode aumentar o prazer, e ainda a conexão e o vínculo entre as pessoas. Ainda, resolver ou desenvolver tarefas ou atividades que estejam no nível e nas habilidades dos colaboradores, garantindo a eles ou elas liberdade e flexibilidade para fazê-lo, pode também fortalecer sentimentos autoestima e experiências de prazer (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). Atividades desafiadoras, mas alcançáveis Maximização do prazer Dopamina 12 Líderes precisam estar atentos em como recompensar ou ofertar experiências gratificantes aos seus colaboradores e colaboradoras. Pequenos elogios ou presentes pela conclusão de tarefas bem-sucedidas ou pelo aumento de status são exemplos (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). TEMA 4 – FERRAMENTAS DE DESENVOLVIMENTO ORGANIZACIONAL E PESSOAL Após considerar as formas de suprir as 4 necessidades básicas, apresentamos instrumentos de desenvolvimento organizacional e pessoal, e os avaliamos, para identificar se favorecem ou não que essas necessidades sejam cumpridas. Esses instrumentos são organizados em três categorias. Quadro 1 – Instrumentos e categorias Extensão da tarefa 1) Ampliação e 2) rotatividade do trabalho Enriquecimento da tarefa 3) Enriquecimento do trabalho e 4) grupos autônomos de trabalho Motivação e design da tarefa 5) Modelo de características do trabalho e 6) modelo do fluxo Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 84. 4.1 Ampliação do trabalho Trata-se da expansão do trabalho ou da função de um colaborador ou colaboradora. Não se aumenta a carga de trabalho, mas sim a variedade das tarefas que o indivíduo desempenha. A ideia principal é quebrar a monotonia de um trabalho repetitivo. 4.2 Rotatividade no trabalho Neste instrumento, temos a mudança de postos de trabalho dentro da mesma organização. A rotatividade deve ser planejada e organizada para não gerar insegurança e sentimento de injustiça. Deve considerar também habilidades, competências e responsabilidades semelhantes ou de um mesmo nível. A mudança pode se dar no mesmo local do trabalho desenvolvido ou em outras localidades, incluindo outros países em que a empresa tem filiais. Além de quebrar a monotonia, a rotatividade permite dar um impulsoàs capacidades nas experiências e, consequentemente, à qualidade profissional dos colaboradores. 13 4.3 Enriquecimento do trabalho O enriquecimento do trabalho implica em aumento das responsabilidades de uma pessoa, e também da sua liberdade. Envolve a responsabilização por novas tarefas, ou ter um nível de responsabilidade superior em relação às tarefas que já vinham sendo desenvolvidas. Busca-se estimular o interesse e o desempenho dos funcionários e funcionárias. 4.4 Grupos autônomos de trabalho O enriquecimento do trabalho pode envolver não somente uma pessoa, mas um grupo; nesse caso, teremos grupos autônomos de trabalho, que usualmente contêm entre 3 a 10 participantes. Essa equipe trabalho de forma colaborativa dentro de funções fechadas. O nível de autonomia pode variar dependendo das atividades, da corporação e de como o grupo foi organizado. As seguintes categorias podem ser consideradas na avaliação do nível de autonomia (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 94): 1. O grupo pode influenciar seus objetivos a. Com relação à qualidade b. Em relação à quantidade 2. Dentro de determinadas diretrizes, o grupo pode definir a. Onde eles trabalham b. Quando eles trabalham c. Que atividades adicionais eles fazem 3. O grupo pode decidir sobre os métodos de produção 4. O grupo define alocação interna de tarefas 5. O grupo decide quem pertence ao grupo 6. O grupo decide questões de liderança sobre a. Se necessitam de um gerente para questões internas e quem será essa pessoa b. Se gostariam de ter um gerente/ sua para regulação das orientações 4.5 Modelo de características do trabalho Este modelo considera o trabalho de forma específica – que tarefas envolve, como elas são colocadas em conjunto e como isso influencia o desempenho das atividades. A ideia por detrás desta perspectiva é que uma organização ideal de tarefas produz mais satisfação dos funcionários. As características dessa organização são (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 96): Variedade da habilidade: a tarefa deve ter alguma variedade inerente dentro dela de modo que os empregados possam usar competências diferentes e facetas diferentes de suas habilidades. 14 Identidade da tarefa: um funcionário deve ser capaz de ver a tarefa como mais completa e ser mais instrumental na formação de uma tarefa completa, em vez de uma etapa individual de uma tarefa maior. Significado da tarefa: a tarefa deve ser uma parte importante do todo e que permitirá que o empregado seja uma parte de algo maior e sinta que está contribuindo para algo valioso. Autonomia da tarefa: Ao empregado deve ser dado tanto quanto possível o espaço livre para que ele possa terminar sua tarefa independente e a preparação e o planeamento inerentes necessários. Feedback da tarefa: o funcionário precisa de feedback direto sobre o sucesso e satisfação de seu trabalho e sobre o quão bem eles conseguiram suas tarefas Figura 8 – Modelo de características do trabalho Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 97. 4.6 Fluxo A busca e o estudo de estados e estratégias de funcionamento humano “ótimo” ou otimizado tem uma história longa dentro da psicologia humanística e da saúde. Dentre estes estudos, encontram-se aqueles relacionados a diferentes estados de consciência. William James (citado por Dietrich, 2004) foi um pioneiro na busca de explicações para formas alternativas de consciência. Quase um século depois, definições de consciência e de estados alterados ou modificados de consciência ainda são controversas. Apesar disto, investigadores classificaram vários estados alterados, incluindo o sono, sonhos, meditação, hipnose, transe, êxtases psicodélicos e místicos. Nesse contexto, encontramos o estado de fluxo. Mihaly Csikszentmihalyi (1991) desenvolveu estudos sobre criatividade. Verificou que artistas se envolviam tanto com as suas atividades que se desconectavam completamente do mundo. Parecia mudar seu estado de Dimensões da atividade Estado psicológico Influência sobre o trabalho e os(as) trabalhadores(as) Variedade Identidade Significância Autonomia Feedback Importância do trabalho experimentada Conhecimento sobre os resultados atuais do trabalho Responsabilidade experimentada pelos resultados do trabalho Fortalecer o potencial de crescimento dos(as) funcionários(as) • Alta motivação intrínseca • Alta qualidade • Alta satisfação • Baixa taxa de flutuação • Baixo absenteísmo 15 consciência, perdendo a noção do tempo e até o senso de necessidades básicas, como comer, beber e dormir. Nesse estado, considerado por Csikszentmihalyi como a experiência ideal, os participantes se sentiam inteiramente satisfeitos e felizes, além de completamente motivados (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012). Csikszentmihalyi (1991) descreveu-as como um estado de fluxo porque é caracterizado por um estado de consciência altamente focalizado, porém sem esforço, quase automático. As experiências envolvem frequentemente atividades difíceis, que estendem a capacidade da pessoa e envolvem um elemento de novidade ou descoberta. Esse estado ocorre quando: 1. há metas claras para cada passo do caminho ou direção; 2. há retroavaliação imediata das ações da pessoa; 3. há um equilíbrio entre desafios e habilidades; 4. ação e consciência são fundidas; 5. as distrações da consciência são excluídas; 6. não há preocupação com falhas ou fracasso; 7. a autoconsciência desaparece; 8. a noção de tempo é modificada; e 9. a experiência se torna recompensadora em si mesma. Dietrich (2004) apresenta um estudo no qual integra pesquisas teóricas e empíricas recentes em ciência cognitiva e neurociência com o conceito da experiência de fluxo. Fala dos sistemas cerebrais explícito e implícito, sendo aquele associado com as mais altas funções cognitivas dos lobos frontal e temporal mediano que evoluíram para aumentar flexibilidade cognitiva. Já o sistema implícito é associado com o conhecimento baseado na habilidade, apoiado principalmente pelo gânglio basal, e tem a vantagem de ser mais eficiente. Da análise deste intercâmbio de flexibilidade e eficiência emerge uma tese que identifica o estado de fluxo como um período durante o qual uma habilidade altamente praticada que é representada na base de conhecimento do sistema implícito é implementada sem interferência do sistema explícito. É proposto que uma condição prévia necessária para a experiência de fluxo seja um estado de hypofrontalidade passageiro que habilita a supressão temporária das capacidades analíticas e meta-conscientes do sistema explícito. Examinando as habilidades de integração de sensório-motoras que parecem tipificar fluxo como desempenho atlético, escrita e a improvisação livre de jazz, a nova estrutura clarifica como este conceito relaciona com a criatividade e abre avenidas novas de pesquisa (Dietrich, 2004, p. 746). Pensando em nosso contexto corporativo, vemos que Csikszentmihalyi (citado por Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012) indica características do ambiente de trabalho necessárias ao estado de fluxo. Entre elas, o equilíbrio entre desafio e habilidade. O excesso de desafio pode levar à ansiedade e ao estresse; a falta dele, ao tédio e à desmotivação. É necessário também que os 16 objetivos sejam claros, e que haja feedback objetivo e imediato das atividades. Interessante notar que os jogos digitais, altamente viciantes, cumprem tais requisitos. Dessa forma, para que o estado de fluxo possa ser obtido no ambiente corporativo, seria necessário (Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 98-9): Os funcionários devem ter objetivos claros, idealmente objetivos individuais que foram definidos mutuamente. Os líderes precisarão dar aos funcionários um feedback consistente, regular, construtivo e positivo de seutrabalho. Os funcionários devem receber tarefas que têm o valor de pré- requisito de desafio com base em suas habilidades e competências. O funcionário deve ter alguma influência sobre a direção e maneira de resolver a tarefa dada. Em tempos de mudança de funcionários devem ser autorizados a alterar de forma flexível a sua gestão de tempo. TEMA 5 – AVALIAÇÃO DAS FERRAMENTAS DE DESENVOLVIMENTO ORGANIZACIONAL E PESSOAL As 6 ferramentas apresentadas podem ser avaliadas quanto ao seguinte fator: favorecem ou não que as 4 necessidades básicas sejam cumpridas? Naturalmente, a forma como são implementadas pode influenciar, positiva ou negativamente, seu impacto sobre as necessidades básicas comentadas. O quadro a seguir mostra uma possível avaliação. Quadro 2 – Avaliação das ferramentas de desenvolvimento organizacional e pessoal, se suprem ou não as 4 necessidades básicas humanas Ferramentas de desenvolvimento organizacional e pessoal Necessidades básicas Conexão / apego Orientação e controle Autoestima Maximização do prazer e evitação da dor 1) Ampliação do trabalho ● 2) Rotatividade do trabalho ● ● ● 3) Enriquecimento do trabalho ● ● 4) Grupos autônomos de trabalho ● ● 5) Modelo de características do trabalho ● ● ● 6) Modelo do fluxo ● ● Fonte: Ghadiri; Habermacher; Peters, 2012, p. 112. 17 FINALIZANDO Chegamos ao final da segunda ela, ao longo da qual adicionamos mais informações sobre a relação entre neurociência e liderança organizacional, explorando de a importância das necessidades básicas no ambiente de trabalho. Mais adiante, você encontrará modelos de neuroliderança, estilos de liderança que podem ser avaliados com base na neurociência, e ainda vai conhecer mais sobre os neurotransmissores, ou os rios químicos pelos quais navegam quase todos as informações e processos neuronais! 18 REFERÊNCIAS CSIKSZENTMIHALYI, M. Flow: the Psychology of Optimal Experience. 1. ed. New York: Harper Perennial, 1991. DIETRICH, A. Neurocognitive Mechanisms Underlying the Experience of Flow. Consciousness and Cognition, v. 13, p. 746–761, 2004. GHADIRI, A.; HABERMACHER, A.; PETERS, T. Neuroleadership: a Journey Through the Brain for Business Leaders (Management for Professionals). New York: Springer, 2012.