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AULA 6 AUDITORIA TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA Profª Sayuri Unoki de Azevedo 2 TEMA 1 – SISTEMA DE ESCRITURAÇÃO DIGITAL E AUDITORIA TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA O Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial) foi instituído pelo Decreto 8.373/2014 e é um grande banco de dados com informações trabalhistas, fiscais e previdenciárias dos trabalhadores do Brasil (Manual eSocial, 2017). A ideia inicial com a instituição desse sistema é que os dados sejam disponibilizados para os entes partícipes: a Receita Federal do Brasil (RFB), o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), Secretaria de Políticas Previdenciárias (SPP) e a Caixa Econômica Federal (CEF). O objetivo é que o INSS e a CEF possam usar essas informações para conceder benefícios e a RFB para fins de recolhimento de Imposto de Renda. A SPP, que faz parte do Ministério da Fazenda, fiscaliza a parte de regime próprio e, assim como o MTE, há o interesse nas informações de relações de trabalho que o sistema de escrituração digital também pode fornecer. Além disso, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) faz parte do grupo confederativo, além de entidades representativas de empresas e empresas piloto fazendo parte do grupo de trabalho. Quem alimentará o banco de dados é o empregador (ou o contador representante do empregador). O sistema de escrituração digital tem como objetivo unificar as informações e comunicar ao Governo dados à RAIS e ao CAGED, representando uma grande redução das obrigações inicialmente exigidas das empresas já obrigadas ao eSocial (eSocial, 2020, n/a). Observa-se que as mudanças efetivas à proposta inicial do eSocial visam a desburocratização e simplificação para as empresas no envio de informações pelo sistema. Antes do eSocial, as informações da FoPag de cada empregado deviam ser enviadas para a GFIP (Guia de Pagamento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS e Informações Previdência Social - base de cálculo e valores previdenciários descontados do empregado), entregue pelo sistema da CEF e estarem disponíveis para os entes partícipes INSS - CNIS, RFB e CEF. A ideia do eSocial é suprimir a fase da GFIP com a implementação da DCTFWeb (Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais - Web). A vantagem de substituição da GFIP está em eliminar os problemas decorrentes de erro de informação nos dados dos trabalhadores, diante da complexidade de 3 informar os dados na GFIP, gerando problemas ao empregado no momento de aposentadoria, por exemplo. Os dados enviados do trabalhador na GFIP dependem de correta informação por parte do empregador, pois não há cruzamento de informações, uma vez que o sistema de Folha de Pagamento no modelo anterior ao eSocial é exclusivo do empregador, assim como não há conferência, por exemplo, do código do trabalhador. Dessa forma, em casos de inconsistências, estas não são verificadas pela GFIP, ocasionando prejuízo ao trabalhador. Outro ponto gerador de inconsistências com a GFIP decorre da retificação por parte do empregador, pois o que tem validade é a última GFIP enviada. Por exemplo, suponha uma empresa que enviou as informações e esqueceu de incluir um trabalhador. Caso a empresa envie uma GFIP apenas com os dados referentes ao trabalhador que havia esquecido, esta será a GFIP válida e os dados de todos os demais empregados encaminhados anteriormente serão apagados, acarretando informações erradas no CNIS. Nesses casos, os empregados terão problemas para se aposentar. O correto seria a empresa enviar uma nova GFIP contendo todos os trabalhadores, incluindo o empregado que havia esquecido anteriormente. Com o eSocial, as informações para fins de composição de GFIP, por exemplo, são buscadas no próprio sistema que contemplará as informações de FoPag dos trabalhadores. Buscar os dados diretamente da FoPag reduz a possibilidade de erros. O eSocial fornece as informações da FoPag para os entes e, com isso, há uma base de dados unificada que evita prejuízos aos trabalhadores em relação à, por exemplo, contagem de tempo de contribuição para fins de aposentadoria. As grandes empresas normalmente já possuem um sistema de FoPag. Contudo, empresas pequenas normalmente controlam as informações dos empregados pelo contador e poderão mandar as informações pelo eSocial por meio do próprio contador. Além dessa opção, a exemplo do empregador doméstico que envia por conta as informações, em pequenas empresas, por meio de um código de acesso ou certificado digital, também poderão transmitir as informações por conta sem a necessidade de investir em um sistema específico para Folha de Pagamento ou pelo contador. O eSocial permite utilizar um portal específico para empresas de pequeno porte, microempreendedores, produtores rurais, Pessoa Física (PF), 4 bem como também para empresas de grande porte (mas o trabalho para estas usarem o portal será imenso, não sendo viável sem um software específico de ambiente de folha de pagamento). O Brasil é o campeão mundial em tempo gasto com preenchimento de informações para fins de obrigações assessórias (Oliveira; Miguel, 2016). O eSocial evita a redundância de informações. No caso de empregador doméstico, preenche-se o eSocial, ao invés de FoPAG, GFIP-INSS, GPS-parte previdenciária e DARF para o Imposto de Renda (se necessário), e as informações do eSocial tem como proposta uma guia única para pagamento de todos os encargos. No caso das empresas, a proposta é uma guia da Receita Federal e outra para fins de para INSS a partir da DCTFWeb. Trata-se de uma mudança de cultura por parte das empresas e órgãos públicos, impactando com a necessidade de preparo e conhecimento para envio correto de informações e, no futuro, facilitando o processo de envio de informações trabalhistas e previdenciárias. Contudo, é necessário entender como o Governo estabelecerá o sistema e suas obrigatoriedades. Com a implantação do eSocial, as informações obrigatórias trabalhistas e previdenciárias contempladas pelo sistema passam a ser passíveis de verificação em momento mais tempestivo pela auditoria. De modo geral, a auditoria precisará considerar se não há problemas de divergência de qualificação cadastral, a partir das próprias mensagens de inconsistências do eSocial (ex. CPF nulo ou cancelado e CPF com data de nascimento divergente do informado) e verificar os comprovantes de entrega por meio de consulta no eSocial de informações transmitidas. Contudo, mais relevante será a verificação da própria FoPag, ou seja, se os cálculos estão corretos e as informações estão adequadas no eSocial. Saiba mais Todas as atualizações sobre as mudanças e evoluções relacionadas ao sistema eSocial, bem como as resoluções relacionadas podem ser acessadas no site: eSOCIAL. Disponível em: <portal.esocial.gov.br>. Acesso em: 27 fev. 2020. TEMA 2 – RELATÓRIO DA AUDITORIA Anteriormente às demonstrações encerradas em 31 de dezembro de 2016, o resultado de trabalhos de auditoria executados consistia em um parecer do 5 auditor, contendo sua opinião. Com a vigência das Resoluções do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), o parecer passa a denominar-se Relatório dos Auditores Independentes e apresenta um novo formato. O Relatório dos Auditores Independentes de auditoria pode ser definido como "um instrumento pelo qual o auditor expressa sua opinião, em obediência às normas de auditoria" (Attie, 2011, p. 93). Além disso, o Relatório dos Auditores Independentes é dirigido aos acionistas, ao conselho de administração ou à diretoria, a outro órgão equivalente, ou ainda ao contratante dos serviços, como, por exemplo, um investidor ou futuro comprador da empresa. Após a execuçãodas análises no trabalho de auditoria em questão, o auditor emite sua opinião sobre o que foi verificado. A opinião do auditor pode ser classificada em quatro diferentes tipos: Sem ressalva: quando o auditor concluir que as Demonstrações Contábeis (DCs) são elaboradas, em todos os aspectos relevantes, em conformidade à posição patrimonial da empresa; Com ressalva: quando o auditor encontra distorção relevante em relação à posição patrimonial da empresa; Adverso: quando o auditor concluir que as distorções, individualmente ou em conjunto, são relevantes e generalizadas para as DCs; Com abstenção de opinião: quando há impossibilidade do auditor obter evidência apropriada e suficiente de auditoria (Almeida, 2010, p. 419 e 420). A abstenção de opinião do auditor também pode ser denominada negativa de opinião. Em ambos os casos, ocorre quando, a partir do trabalho de auditoria, o auditor não consegue obter elementos comprobatórios suficientes para firmar sua opinião, levando a limitação de escopo ou incerteza que influem significativamente no objeto em análise (Almeida, 2010). As modificações decorrentes da mudança de Parecer de Auditoria para Relatório de Auditoria são (Relatório, 2016): 1. Opinião vem no início do relatório: a opinião que sempre foi apresentada no final do relatório, em uma estrutura que sempre nos pareceu muito racional, já que a opinião sempre foi tratada como uma conclusão e, conclusão, se coloca no final, ou colocava-se. O texto da opinião é uma mescla do início do relatório anterior e o antigo parágrafo da opinião. Descreve as demonstrações que foram examinadas e em seguida a opinião dos auditores. 2. Ressalva, opinião adversa ou abstenção de opinião: o parágrafo sobre essas circunstâncias será o 2º. Parágrafo, logo após a opinião. 3. Principais assuntos de auditoria: exigida para as empresas listadas em Bolsa de Valores, podendo ser adotada para outras sociedades, opcionalmente. Segundo a NBC TA 701: “O auditor deve descrever cada um dos principais assuntos de auditoria, utilizando um subtítulo adequado para cada um deles, em seção separada do relatório, sob o título de Principais assuntos de auditoria. (...) o texto de introdução dessa seção do relatório deve afirmar que: os principais assuntos de auditoria 6 são aqueles que, segundo o julgamento profissional do auditor, foram os mais significativos na auditoria das demonstrações contábeis do período corrente.” 4. Outras informações que acompanham as DF: No Brasil, as informações adicionais contidas no conjunto de demonstrações contábeis estão contidas no Relatório da Administração, mas podem incluir outras informações além dessa. Anteriormente, o auditor tem a obrigação de ler estes documentos e verificar se não há nenhuma inconsistência de dados em relação ao conteúdo do conjunto das demonstrações contábeis sobre a qual emite sua opinião. No novo formato, o auditor não emitirá opinião sobre estas Outras Informações, no entanto deverá revelar no seu relatório, que estas informações são de responsabilidade da Administração da Companhia, mas deverá incluir no seu relatório o seguinte texto: “Em conexão com a auditoria das demonstrações contábeis, nossa responsabilidade é a de ler o relatório da administração e, ao fazê-lo, considerar se esse relatório está, de forma relevante, inconsistente com as demonstrações contábeis ou com nosso conhecimento obtido na auditoria ou, de outra forma, aparenta estar distorcido de forma relevante. Se, com base no trabalho realizado, concluirmos que há distorção relevante no relatório da administração somos requeridos a comunicar esse fato. Não temos nada a relatar a este respeito.” 5. Parágrafo sobre responsabilidade da administração: a administração, além das declarações já contidas no modelo atual de relatório, deverá, também, declarar que é ela responsável pela avaliação da continuidade operacional da Companhia pelo e o uso dessa base contábil na elaboração das demonstrações contábeis. 6. Parágrafo sobre a responsabilidade dos auditores: Neste parágrafo, além das declarações já contidas no modelo atual de relatório, os auditores afirmarão que “segurança razoável é um alto nível de segurança”; essa expressão que pode parecer pouco importante dá um peso maior ao termo “razoável.” Além disso, esse parágrafo é bem mais detalhado do que o modelo atual. Outro ponto importante é que o auditor conclui sobre a adequação do uso pela administração, da base contábil da continuidade – o auditor não opina sobre a continuidade, que continua sendo uma responsabilidade da Administração, mas diz que concorda com a avaliação da Administração sobre esse assunto. No caso de empresas não listadas, a norma prevê a possibilidade de que as informações sobre a responsabilidade dos auditores (que é um texto mais detalhado) possa ser suprimida do relatório e apresentada no site da Cia. No caso específico de auditoria trabalhista e previdenciária, não há obrigatoriedade em lei que exija que a empresa realize a auditoria com esta finalidade. Desta forma, como resultado do trabalho do auditor, existirá um relatório contendo a opinião dele, incluindo as sugestões de resolução em caso de inconformidade com normas e regulamentações. Esse relatório de auditoria é a peça fundamental em uma auditoria interna realizada, pois apresenta os resultados do trabalho de auditoria, o que foi examinado pela equipe e o que a empresa deverá melhorar ou modificar (Almeida, 2010). Ou seja, o relatório de auditoria deve conter os fatos apurados e de significância, as sugestões e recomendações para melhoras efetivas, demonstrando todos os acontecimentos no decorrer da auditoria para a entidade auditada. 7 O relatório de auditoria trabalhista e previdenciária deverá ser encaminhado ao Conselho da Diretoria ou à Alta diretoria da entidade, contendo as rotinas que estão ou não em conformidade com as normas e exigências legais. Além disso, para as rotinas que não estão em conformidade, deve-se apontar quais são as falhas e inconsistências, bem como as possíveis penalidades decorrentes e soluções viáveis. TEMA 3 – PROCEDIMENTOS DA ORGANIZAÇÃO A PARTIR DO RELATÓRIO DA AUDITORIA Com a finalização da auditoria Trabalhista e Previdenciária, bem como da entrega do Relatório de Auditoria Interna ao Conselho da Diretoria ou à Alta diretoria da organização, cabe a um desses órgãos direcionar as ações que se fizerem necessárias em caso de apontamento de inconsistências pelo auditor. Normalmente, no Relatório de Auditoria Interna, o auditor aponta as inconsistências informando como seria o procedimento/ação correto(a), com as devidas sugestões de ajuste das rotinas trabalhistas e previdenciárias da empresa. O(a) conselho da diretoria/alta diretoria deve, na sequência, entrar em contato com a(s) gerência(s) da(s) área(s) em que o problema foi identificado e informar a necessidade de ações pertinentes. Nesse momento, a(s) gerência(s) deve(m) estabelecer o planejamento das correções e o cronograma de ações para que a empresa possa estar em conformidade com as normas e legislações trabalhistas e previdenciárias a que está sujeita. No cronograma de ações deve haver, como um dos primeiros passos a serem realizados, o levantamento do fluxograma de atividades, contendo os eventos de risco e os controles internos (se existentes). Para os eventos identificados, devem-se estabelecer ou aperfeiçoar os controles internos (se já existentes), com o objetivo de mitigar os riscos relacionados. Além disso, as gerências das áreas (em conjunto com a diretoria) podem estabelecer indicadores-chave de desempenho (Key Performance Indicators – KPIs) para os riscos mais relevantes. Com isso, o controle do processo e dos resultados a partir das ações tomadas após a auditoria pode ser feito de forma mais efetiva. Nos casos em que o Relatório de Auditoria Interna possui mais de um itemde inconsistência, a organização deve estabelecer o cronograma de ação por ordem de prioridade. Ou seja, nem sempre será possível efetuar todas as 8 correções ao mesmo tempo e, nesse caso, geralmente a prática consiste em iniciar pelas inconsistências que apresentam maior risco de passivos trabalhistas e/ou previdenciários que aferem o patrimônio da empresa. No Relatório de Auditoria Interna pode haver, ainda, apontamentos de inconsistências em que o custo-benefício das correções irá direcionar a empresa a aceitar o risco e não realizar as correções. Essa decisão dependerá de cada organização e de sua aptidão a riscos, bem como do custo em termos de recursos financeiros, tempo e outros recursos que seriam despendidos em caso do direcionamento pela resolução da inconsistência. Empresas que são mais avessas à riscos tenderão para o estabelecimento de mais controles. Contudo, dependerá da probabilidade de, em caso de ocorrência, o problema gerar perdas financeiras significativas à organização. Além disso, existem controles que são muito caros de serem implementados e que evitam perdas financeiras não relevantes. Nesses casos, quando o custo de implementar o controle supera o potencial prejuízo, normalmente as empresas tendem a aceitar o risco. TEMA 4 – COMPLIANCE E A RELAÇÃO COM A AUDITORIA TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA Assim como o Controle Interno, o programa de compliance também constitui uma forma para a empresa identificar os riscos e tentar mitigá-los. No Brasil, a Lei Anticorrupção (Lei n. 12.846/13) e outras legislações estatais específicas contemplam as determinações em relação ao compliance. Quanto ao seu conceito, pode-se compreender que: Compliance envolve o que pode e o que não pode ser feito de acordo com o código de conduta da companhia e as melhores práticas da área. (...) tanto o profissional que atua dentro da empresa como aqueles que prestam serviços especializados na área, precisam ter a preocupação extra na hora de avaliar os riscos de suas ações. (...) é muito importante que a comunidade de compliance comece a debater ideias sobre como podemos mitigar os riscos das nossas próprias ações à frente da área (Gonsales, 2017). Na atualidade, tratar de compliance é inerente a qualquer processo organizacional. O conceito etimológico do termo compliance foi aplicado ao uso popular e, para as organizações significa "estar de acordo com regras, legislações, especificações, normas de toda e qualquer natureza, estabelecidas para determinada ação" (Cruz, 2015, p. 8 e 9). 9 No mundo corporativo, a responsabilidade de estar em conformidade (compliance) às regras é das próprias empresas, que devem cuidar de seus processos internos e externos para cumprir as normas aplicáveis. Para que um programa de compliance seja apropriadamente implementado, deve haver maior comunicação da empresa em todos os setores e todos os níveis hierárquicos (empregados, gestores e diretores) sobre as regras, condutas e políticas. É importante que em um programa de compliance não haja foco em protecionismo, pois o objetivo é fazer o que é certo perante a lei/norma. Para que isso ocorra, é primordial para a efetividade de um programa de compliance a existência de um canal de denuncia em que o empregado tenha acesso a uma pessoa que possa resolver conflitos, seja por e-mail, whatsapp, telefone, ou outro meio, mas sempre garantindo o sigilo de quem fez a denúncia. A empresa pode ter internamente um departamento específico que cuide do programa de compliance, ou pode contratar uma consultoria para este fim. Além disso, como o compliance trata de estabelecer uma conduta empresarial preventiva, a auditoria pode ser uma ferramenta de compliance ao manter e analisar áreas de maior risco, como ocorre com a área Trabalhista e Previdenciária. O compliance surge mais fortemente no Brasil em decorrência da promulgação da lei anticorrupção. Não há lei que trate especificamente sobre compliance trabalhista, mas os programas de compliance têm como base as legislações e as regulamentações a que a empresa está sujeita. O compliance tem como objetivo prevenir e corrigir práticas contrárias a esses dispositivos legais. Principalmente diante da reforma trabalhista, um programa de compliance voltado para legislações e regulamentações trabalhistas e previdenciárias é essencial para que a empresa possa se prevenir de ações judiciais e de passivos trabalhistas. Dessa forma, a empresa atua de forma mais segura e preventiva em relação a seus Recursos Humanos, eliminando ou reduzindo a ocorrência de reclamatórias e passivos trabalhistas. Para fins de Compliance Trabalhista e Previdenciário, as revisões periódicas de todos os processos (controle da jornada de trabalho, respeito ao pagamento das horas extras, pagamento dos salários em dia, das convenções e acordos coletivos e suas aplicações, folha de pagamento, encargos, obrigações acessórias e seus procedimentos, contemplando toda a legislação aplicada, 10 inclusive a prevenção de abusos de gestores e empregados em geral, evitando atribuições que não são de competência do empregado, bem como termos de baixo calão, ameaças diversas – ex. ameaça de demissão – etc.) são imprescindíveis (Compliance, 2018). A auditoria como ferramenta de compliance se justifica pelo fato de que o trabalho de auditoria consiste em uma forma de revisão. No caso de auditoria trabalhista, esta revisa as rotinas trabalhistas e, ao final do trabalho, apresenta um relatório com as práticas que não estão em conformidade com as normas e regulamentações, com sugestões para eliminar ou reduzir o risco trabalhista ou o erro encontrado. A auditoria interna pode ainda, além de considerar se os controles da empresa estão sendo aplicados apropriadamente, demonstrar como maximizar os ativos fiscais em relação às contribuições previdenciárias, cujos valores não tenham sido corretamente aproveitados. Em alguns casos, não há necessidade de uma demanda judicial para que créditos financeiros sejam revertidos para a empresa, resultando em melhor fluxo de caixa. Para exemplificar um problema de compliance, considere uma determinada empresa que adota o sistema de compensação por meio de banco de horas, mas não estabelece essa prática no acordo coletivo ou convenção coletiva. De acordo com a súmula 85 inciso V do TST, isso é incoerente, ocasionando risco trabalhista. A auditoria, nesse caso, deve sugerir a celebração de um acordo coletivo com o sindicato, bem como pode efetuar o cálculo de quanto representa financeiramente o risco relativo ao risco levantado. Em caso de risco com valor financeiro baixo, se a empresa não desejar efetuar a correção, deve-se fazer o contingenciamento do risco trabalhista na Contabilidade. Salienta-se que não apenas as práticas da empresa devem estar em conformidade. Os terceiros com os quais a empresa possui relação econômica, como prestadores de serviços, fornecedores etc. devem também estar em compliance. A empresa tem a obrigação de exigir que a organização terceira cumpra as exigências legais e normativas. Em caso de dúvidas, pode-se realizar o processo de due diligence nas empresas terceiras como forma de certificação. O termo em inglês “Due Diligence” pode ser traduzido para o português como diligência prévia e refere-se ao processo de estudo, análise e a avaliação detalhada de informações de uma Empresa alvo da negociação, geralmente chamada de Target, visando a identificação de eventuais distorções relevantes, decorrentes das práticas empresariais (Due Diligence, 2018, n.a.). 11 TEMA 5 – AUDITORIA TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA PARA A GESTÃO FINANCEIRA E PROVISÃO TRABALHISTA A auditoria com o objetivo fiscal pode ter origem interna (prevenção de riscos) ou externa (verificação de cumprimento das obrigações fiscais) à organização. Em caráter interno,normalmente executadas por determinação da diretoria da empresa, são procedidas pelo Departamento de Auditoria Interna ou setor equivalente, com vistas a conferir o exato dimensionamento do passivo fiscal, evitando-se, desta forma, eventuais insuficiências no recolhimento, fato que gera riscos de autuações de parte do fisco, oneradas sobremaneira pela elevada taxa de juros e por multa de ofício proibitiva. (Recktenvald; Bergman, 2002, p. 21–22) Quando a auditoria é realizada por demanda externa, esta pode ser proveniente de exigências da Secretaria da Receita Federal a partir da lei de regulação do imposto de renda (RIR/99) ou da Lei das Sociedades por Ações (Lei 6.404/76 e suas alterações). Ambas as legislações, impõem a realização de auditorias às empresas para averiguação dos aspectos contábeis e, consequentemente, relacionados às questões fiscais. Em relação à auditoria trabalhista e previdenciária, faz-se necessário considerar se a empresa efetua tempestivamente e pelo valor correto todas suas obrigações. Além disso, todas as empresas precisam prevenir riscos e passivos trabalhistas, independentemente se por meio de atuação da auditoria interna ou do Departamento de Recursos Humanos. A implantação de políticas direcionadas para tal propósito será efetiva se alguns fatores forem considerados (Leon, 2017): 1) Estudo das rotinas da empresa, dos serviços desempenhados, e pontos críticos que geram ou tem o potencial de gerar demandas trabalhistas ou administrativas e/ou multas; 2) Pesquisa de satisfação junto aos colaboradores, primando pelo sigilo de quem responde e o que responde; 3) Participação e colaboração efetiva da direção da empresa ao longo do processo de estudo e adoção de medidas; 4) Constante atualização do departamento de Recursos Humanos em normas trabalhistas e sua “humanização”; 5) Treinamento de gestores para que saibam gerir pessoas; 6) Desenho do organograma contendo os pontos críticos, incluindo metas e provisões de tratamento e contingência. Outro fator relevante surge com a promulgação da Lei n. 13.874/2019 que trata da Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, que estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica. Dentre 12 as mudanças, a Lei altera o Código Civil brasileiro em seus artigos 49-A e 50, ficando estabelecido (Brasil, 2019): Art. 49-A. A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores. Parágrafo único. A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos. Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. § 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. § 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. § 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. § 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. § 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. Conforme disposto na Lei n. 13.874/2019, desde que cumpridos os requisitos, não há mais confusão entre patrimônio dos sócios e patrimônio da empresa. Ou seja, em caso de ação judicial contra a empresa, exceto em caso de fraude, apenas os bens da personalidade jurídica serão garantidores e utilizados para o pagamento em caso de perda da ação. 5.1 Provisões Trabalhistas Independentemente do tipo de risco e passivos trabalhistas descritos nos temas anteriores que a empresa precisa prevenir, quando estes acontecem geram passivos sob a forma de provisões. Entende-se por passivo "uma obrigação presente da entidade, derivada de eventos passados, cuja liquidação se espera que resulte na saída de recursos da entidade capazes de gerar benefícios econômicos" (CPC 00). 13 O CPC 25 em seu item 14 estabelece quando uma provisão deve ser reconhecida: 14. Uma provisão deve ser reconhecida quando: (a) a entidade tem uma obrigação presente (legal ou não formalizada) como resultado de evento passado; (b) seja provável que será necessária uma saída de recursos que incorporam benefícios econômicos para liquidar a obrigação; (c) possa ser feita uma estimativa confiável do valor da obrigação. Se essas condições não forem satisfeitas, nenhuma provisão deve ser reconhecida. O reconhecimento de uma provisão trabalhista depende do cenário em que a empresa se encontra, considerando a média ponderada de cada valor diante das probabilidades existentes. Para conclusão do montante que a empresa deve provisionar nesta situação, ela conseguiu as seguintes informações por meio de parecer de consultoria jurídica: • Probabilidade de a empresa perder a ação com valor de R$ 500 mil: 20%; • Probabilidade de a empresa perder a ação com valor de R$ 400 mil: 30%; • Probabilidade de a empresa perder a ação com valor de R$ 300 mil: 30%; • Probabilidade de a empresa vencer a ação: 20%. Considerando os conceitos relativos aos pronunciamentos contábeis contendo os critérios de reconhecimento e mensuração de passivos, a empresa precisa considerar as probabilidades relacionadas aos valores para constituição da provisão: • R$ 500.000 x 20% = R$ 100.000 • R$ 400.000 x 30% = 120.000 • R$ 300.000 x 30% = R$ 90.000 Assim, ao considerarmos proporcionalmente as condições favoráveis e desfavoráveis da situação da empresa, obtemos um valor de provisão pelo total, ou seja, a soma de R$ 100 mil com R$ 120 mil e R$ 90 mil, totalizando R$ 310 mil. Considere que uma empresa foi noticiada de que grupos antigos de empregados entraram na Justiça do Trabalho com reclamatórias trabalhistas no valor total de R$ 500.000. 14 REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. C. Auditoria: um curso moderno e completo. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. ATTIE, W. Auditoria: Conceitos e aplicações. São Paulo: Atlas, 2011. BRASIL. Decreto n. 8.373, de 11 de dezembro de 2014. Planalto, 2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011- 2014/2014/decreto/d8373.htm>. Acesso em: 27 fev. 2020. BRASIL. Lei n. 12.846, de 1º de agosto de 2013. Planalto, 2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12846.htm>. Acesso em: 27 fev. 2020. BRASIL. Lei n. 13.874, de 20 de setembro de 2019. Planalto, 2019. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13874.htm>. Acesso em: 27 fev. 2020. ESTRUTURA conceitual para elaboração e divulgação de relatório contábil- financeiro. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, S.d. Disponível em: <http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos- Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=80>. Acesso em: 27fev. 2020. PROVISÕES, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, S.d. Disponível em: <http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos- Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=56>. Acesso em: 27 fev. 2020. CRUZ, M. Fazendo certo a coisa certa: como criar, implementar e monitorar programas efetivos de compliance. Revolução eBook, 2015. Editora Simplíssimo (Livros Digitais). Disponível em: <https://play.google.com/books/reader?id=ezszbaaaqbaj&printsec=frontcover&o utput=reader&hl=pt_br&pg=gbs.pp1>. Acesso em: 27 fev. 2020. eSOCIAL. Simplificação: eSocial substitui informações para RAIS e CAGED. Governo Federal, 2020. Disponível em: <http://portal.esocial.gov.br/noticias/esocial-substitui-informacoes-para-rais-e- caged>. Acesso em: 27 fev. 2020. LEON. Gestão e Prevenção de Riscos Trabalhistas. Leon Consultoria Empresarial, 2017. Disponível em: 15 <http://www.administradores.com.br/artigos/negocios/gestao-e-prevencao-de- riscos-trabalhistas/105500/>. Acesso em: 27 fev. 2020. MANUAL ESOCIAL. Manual de Orientação do eSocial - Versão 2.4. Governo Federal, 2017. Disponível em: <http://portal.esocial.gov.br/manuais/mos-manual- de-orientacao-do-esocial-vs-2-4.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2020. OLIVEIRA, J.; MIGUEL, C. R. Brasil, campeão mundial em burocracia fiscal. Jota, 2016. Disponível em: <https://www.jota.info/paywall?redirect_to=//www.jota.info/opiniao-e- analise/artigos/brasil-campeao-mundial-em-burocracia-fiscal-15042016>. Acesso em: 27 fev. 2020. RECKTENVALD, G.; ÁVILA, R. B. Manual de auditoria fiscal: teoria e prática. Porto Alegre: Síntese, 2002. RELATÓRIO. Novo relatório do auditor. Grant Thornton, 2016. Disponível em: <https://www.grantthornton.com.br/insights/articles-and-publications/novo- relatorio-do-auditor/>. Acesso em: 27 fev. 2020.
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