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Percepção Numérica e Negociações

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Percepção 
Material Complementar 
Percepção Numérica e Negociações 
 
 
 
Prof. Murillo Dias 
PERCEPÇÃO NUMÉRICA E NEGOCIAÇÕES 1 
NEGOCIAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO DE CONFLITOS PROF. MURILLO DIAS 
♦♦PERCEPÇÃO NUMÉRICA E NEGOCIAÇÕES♦♦ 
Por MURILLO DIAS 
ASSUNTO: PERCEPÇÃO 
REFERÊNCIAS: 
1.Dehaene, Stanislas (1997). The Number Sense: how the Mind creates Mathematics. New york: 
Oxford University Press, pp. 67-72. 
2.Gallo, Carmine (2010). Faça como Steve Jobs e realize apresentações incríveis em qualquer 
situação. SP: Editora Lua de papel. 
 
Qual é o máximo de assuntos que devemos levar para uma negociação? 
STEVE JOBS, considerado por muitos um mago das apresentações e discursos 
espetaculares, dizia que o número três era mágico, e afirmava que era a quantidade máxima 
de assuntos que deveriam ser abordados numa exposição qualquer, fosse palestra ou um 
lançamento de um produto. Jobs afirmava que nossas limitações cognitivas faziam com que 
a exploração de mais de três assuntos na mesma apresentação invariavelmente 
condenavam-na ao fracasso, por se tornar maçante, cansativa e enfadonha (Gallo, 2010). 
Será que ele tinha razão? E numa negociação, quantos assuntos devem ser abordados (ou 
itens negociados)? Vamos investigar esse fenômeno. Considere a Figura 1, a seguir e 
responda: quantos pontos pretos você enxerga em nos conjuntos A e B ? 
 
 
 
 
Figura 1: Percepção de quantidades 
Fonte: Dehaene, 1997 
A B 
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Se você pensou em 2 e 3 itens no conjunto A quase que instantaneamente, acertou. Já no 
conjunto B, as respostas são 5, 6, 7 e 8 itens, respectivamente. Qual dos dois conjuntos você 
levou mais tempo para realizar a tarefa? A ou B? B obviamente. Finalmente, ao contar os 
itens do conjunto B teve que conferir para ver se não estava cometendo algum erro, acertei? 
Felizmente você não está sozinho. Testes realizados em laboratório apontam que um 
aumento do número de objetos contados, principalmente após o terceiro, acarreta num 
aumento exponencial da margem de erro e do tempo de resposta (Dehaene, 1997). Em outras 
palavras, nosso tempo de resposta a grandezas numéricas piora sensivelmente a partir do 
quarto objeto contado. Ficamos mais lentos e erramos mais como pode ser visto na Figura 2, 
a seguir: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 2: número de objetos (n) x tempo de resposta (ms) x erro (%) 
Fonte: Dehaene, 1997 
 
 
 
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Nossos ancestrais eram conscientes dessa nossa limitação cognitiva relacionada ao número 
três. Por isso criaram um símbolo diferente para representar o algarismo quatro. Observe 
por exemplo, o que acontece com os algarismos romanos I , II e III. A representação 
numérica é diretamente relacionada com a percepção de quantidade. Já o quarto número 
contém um símbolo novo, o algarismo V (cinco). O algarismo quatro é então representado 
por IV (cinco menos um igual a quatro). 
Outras civilizações adotaram o mesmo princípio de inserção de um símbolo novo para 
representar a grandeza quatro (vide Figura 3). Entretanto, com o passar do tempo, o sistema 
de notação numérica decimal que utiliza algarismos arábicos foi se tornando pouco a pouco 
o padrão adotado universalmente, legando os demais sistemas de notação ao esquecimento. 
No sistema de notação numérica decimal, todos os símbolos de 0 a 9 são diferentes uns dos 
outros. Ou seja: o conhecimento ancestral da limitação cognitiva do ser humano em relação 
à contagem numérica por pouco não se perde em definitivo, não fosse a escrita chinesa ser a 
única a conservar esse princípio em seu sistema de notação numérica até hoje, como pode 
ser observado na Figura 3, a seguir: 
 
Figura 3: diferentes sistemas de notação numérica 
Fonte: Dehaene, 1997 
 
 
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NEGOCIAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO DE CONFLITOS PROF. MURILLO DIAS 
A conclusão a que chegamos é que a percepção de números afeta sim a quantidade de 
assuntos/itens/objetos negociados. Por experiência própria, aprendi que se você quer 
mesmo ser bem sucedido em vendas, por exemplo, deve limitar o número de ofertas ao 
cliente. Duas ou três opções1 no máximo. Mais do que isso o comprador perde rapidamente 
o interesse na aquisição de um produto, serviço ou resultado. 
Se você tem dois itens a vender, um mais caro e outro mais barato, inicie sempre pelo mais 
caro. Se o critério do comprador for preço e você tiver lançado a oferta de menor valor, vai 
ficar sem opção ao oferecer um produto de maior valor agregado. 
Ao planejar a negociação, considere levar no máximo três assuntos para a mesa de 
negociações. Na minha humilde opinião, a melhor escolha é levar dois assuntos/opções no 
máximo. Mais do que isso, o interlocutor vai se cansar rapidamente. Lembre-se de que o 
negociador intuitivo tende a querer resolver tudo de uma vez enquanto que o negociador 
profissional age com eficácia para vencer. 
A escolha da quantidade de temas negociados pertence ao processo da negociação. 
Obviamente, nem sempre conseguimos fazer valer esse princípio no dia-a-dia. Às vezes não 
há tempo hábil para estender o processo de negociação a interações múltiplas. Por vezes, a 
dificuldade é reunir todas as partes interessadas no mesmo lugar ao mesmo tempo. Daí, 
acabamos por dançar conforme a música tocada pelas circunstâncias. Nesse caso, já que não 
dá para alterar o número de assuntos negociados, a técnica é manter o foco no número de 
soluções possíveis para a negociação. Se não consegue controlar a quantidade de itens 
negociados, pelo menos pode diminuir/limitar o número de soluções, de forma a manter o 
foco na eficiência do processo de negociação e sair-se bem sucedido. Se não dá para 
trabalhar o problema, trabalhe a solução. Lembre-se: quando a nossa percepção envolve 
grandezas numéricas, menos é mais. 
. ♦♦♦♦♦ 
 
1 Opção vem do Latim optare que significa escolher. Em negociações, é tudo aquilo que está dentro da Negociação