Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Sandra canella-Rawls. autora deste livro, e bou/angere, patissiere e chef-instrutora com atuar;:ao em diversas escolas, hotels e restaurantes. Sua *palxao pela boulan - gerie *, aqui confessada, se basela na consclencla de que o pao que hoJe temos resulta de um processo antlgo, de mil hares de anos: "Trata-se de uma heran~ ancestral, de um conJunto de conheclmentos repas- sados, alimentados e slstematlzados no decorrer de gerar;:oes e culturas*. Realista, ela nao chega proprlamente a queixar-se dos atalhos que a sociedade atual adota na produ¢o do pao, mas e evidente que tambem nao nutre slmpatla portais facilldades. Observa que, enquanto um pao de padeiro genuino, sem recurso adicional de fermentos em excesso, melhoradores, farinhas quimicamente manlpuladas, enzlmas, etc., pode demorar dias para salr, sai *por milagre # no supermercado em uma hora! Mas o pao asslm felto, o *pao quente a toda hora", nao e do seu departamento. Ela quer o pao industrial, multiplicado, mas elaborado como deve ser - o bom pao. Por lsso, a este livro chamado slmples- mente Pao, ela acrescenta o subtitulo arte e clencla. Entende que a introdur;:ao de maquinas #retlrou a caracteristica secular do pao, de ser produzido e reproduzido por maos humanas em toda a sua dtnamica". Nao quer que os padeiros se transformem em tecnlcos. renegando a nobre condi¢o de artesaos. Mas, tambem, o artesanato nao slgniflca uma produ¢o lnsuflclente - aflnal, todos preclsam de pao. As pequenas boulangeriesda Europa e dos Estados Unidos sao um exemplo do Pao Arte e clencla l' edi~ao: 2003 2' edi~ao revista: 2 006 3' edi~ao revista e ampliada: 2009 Dados lnternacionais de Cataloga~lo na Publlca~lo (CIP) (Camara Brasileira do Livn,, SP, Brasil) Canella-Rawls, Sandra Pao : arte e ciencia I Sandra Cane lla-Rawl s. - Silo Paulo : Editora Senac Silo Paulo , 2003 . ISBN 978-85- 7359-889-6 Bibliografia. I. Piles (Culinaria) 2. Panifica~llo I. Titulo . 04-6279 indices para catlilogo slstemlitico : CDD-641.815 I. Piles : Tecnica de elabora~o : Culinaria 641.815 2. Pao : Arte e ciencia : Culinaria 641.815 S ~\V\<A Sc..,C0J5 \.i'o-... Sandra Canella-Rawls Pao Arte e ciencia 3a edi~ao revista e ampliada S \\ 2 3 03 '2.oAO ADM!NISTRA<;:AO REGIONAL DO SENAC NO ESTADO DE SAO PAULO Presidente do Conse/ho Regional: Abram Szajman Dire/or do Depar tamento Regional: Luiz Francisco de A. Salgado Superintendente Universitario e de Desenvolvimento: Luiz Carlos Dourado EDITORA SENAC SAO PAULO Conselho Editorial: Luiz Francisco de A. Salgado Luiz Carlos Dourado Darcio Sayad Maia Lucila Mara Sbrana Sciotti Marcus Vinicius Bari Ii Alves Editor: Marcus Vinicius Barili Alves (vinicius@sp.senac.br) CoordenG1;:iio de Prospec,;iio e Produ,;iio Editorial: Isabel M . M. Alexandre (ialexand@sp.senac.br) Supervisiio de Produ,;iio Editorial: lzilda de Oliveira Pereira (ipereira@sp.senac.br) Assessoria e Revisiio Tecnicas: Ronalda Lopes Pontes Barreto Prepara,;iio de Texto: Pierina McCarthy Revisiio de Texto: Adalberto Luis de Oliveira, Debora Lima, lvone P. 8. Groenitz, Leia Fontes Guimaraes, Leticia Castello Branco, Marta Lucia Tasso Textos Institucionais: Luiz Carlos Cardoso Projeto Grafico e Diagrama,;iio: Fabiana Fernandes Fotos: Claudio Wakahara; Ewa Dacko (p. I e 3) llustra,;oes: Gabriela Cannocini Capa: Fabiana Fernandes, sobre foto de Tracy Scott-Murray lmpressiio e Acabamento: Bartira Grafica e Editora Ltda. Gerencia Comercial: Marcus Vinicius Barili Alves (vinicius@sp.senac.br) Supervisiio de Vendas: Rubens Goni,:alves Folha (rfolha@sp.senac.br) Coordena,;iio Administrativa: Carlos Alberto Alves (calves@sp.senac.br) Todos os direitos desta edii;:ao reservados a Editora Senac Siio Paulo Rua Rui Barbosa , 3 77 - 1 • andar - Bela Vista - CEP O 1326-0 I 0 Caixa Postal 3595 - CEP 01060-970 - Sao Paulo - SP Tel. (II} 2187-4450 - Fax (11} 2187-4486 E-mail: editora@sp.senac.br Home page : http ://www.editorasenacsp.com.br © Sandra Cassia Canella-Rawls, 2003 Sumario 6 Nota do editor 10 Apresentac;ao - Ronalda LOfJes Pontes Barreto 14 Prefiicio a 3a edic;ao 18 Prefacio 24 Introduc;ao 26 Culinaria versus boulangerie 28 Boulangerie 32 Breve hist6ria do pao 38 Pao artesanal 39 Estrelas 52 A ciencia por tras da elaborac;ao de paes 54 Os passos basicos na elaborac;ao de paes 84 A quimica por tras da elaborac;ao de paes: os ingredientes basicos 86 Farinha 115 Agua 122 Sal 124 Fermento e fermentadores 136 Fermento natural ou pre-fermento 148 Os ingredientes enriquecedores 149 Ac;ucar 170 Gorduras 183 Ovos 192 Principais flavorizantes e especiarias na panifi.cac;ao 196 A tecnica par tras da elaborac;ao de paes 197 Metodos de mistura da massa 204 Metodologia: o metodo de percentagem 212 Formulas 213 Tipos de paes 326 Bibliografia 333 fndice de formulas 334 fndice geral Nota do editor Uma le~enda de foto ao fun deste livro diz: ''As infinitas possibilidades de sofistica<;ao, aliadas ao seu carater primitivo, fazem do pao o mais sedu- tor dos alimentos" . E em todas as paginas do cuidadoso trabalho de Sandra Canella-Rawls se identificam essas caracteristicas contrastantes do pao: sua antiguidade como alimento, que dele faz um produto tipicamente de arte- sao a ponto de, mesmo tendo hoje tecnologia e maquinas a fabrica-lo, de- pender ainda da mao e do controle do padeiro nos passos decisivos do seu preparo, assim como sua modernidade, no sentido do que ja se criou em panifica<;ao e da interminavel condi<;ao de continuar criando. Por tudo isso, tem-se aqui mais um titulo de relevo de culinaria e gastronomia editado pelo Senac Sao Paulo e dirigido a estudantes e profis- sionais dessa area. Dedlco este llvro a mlnha Familia. a mlnhas grandes amlgas Sandroca e Elaine. a mlnha amlga Regina pelo apolo. a meus estudantes ... Enflm. a todos que estlveram ao meu lado durante essa traJet6rla. .. Apresenta~ao I "Ganhara.s o pao com o suor do teu rosto" ... que triste vatidnio bfblico que nos condenou a trabalhar para ganhar o suado pao de cada dia, mais suado ainda quando pensamos nos padeiros que enfrentam o seu oficio antes do alvorecer. Todos nos associamos as primeiras horas matinais ao cheirinho de pao assado e nao imaginamos os misterios que envolvem a prepara<_;ao de um simples paozinho frances - e uma alquimia que extrapola a combina<_;ao de farinha, agua e fermento. A hist6ria do pao confunde-se com a da humanidade . Ha relatos e tes- temunhos da sua existencia ha cerca de seis mil anos antes de Cristo . Seu inkio deu-se, muito provavelmente, por acaso, quando uma camponesa curiosa percebeu que a massa que deixara cair sobre uma pedra quente transformara-se em algo comestivel e apetitoso e - o que era melhor - , deixando a sensa<_;ao de saciedade . 0 pao esta presente em todos os relatos da humanidade. Na Roma anti- ga, no ano 100 a.C., havia quase trezentos padeiros. Na Grecia antiga, um certo padeiro chamado Theanos foi elogiado por Platao. No Oriente, o alimento assumiu formas diversas como o pitta e o chapati. Na Idade Media o pao era sinonimo de status, e s6 os nobres tinham acesso a farinha de melhor qualidade. Tao cioso de suas qualidades, provocou ate a queda de 12 PAO: ARTE E Cl~N CIA Maria Antonieta, que teria dito ao povo, em tom blase, que comesse brioches, ja que nao tinha pao. Presente em todos os momentos da humanidade, o pao nos chega hoje quentinho, no cafe da manha, habito inaugurado pelos Japoneses. 0 pao esta presente em praticamente todos os nossos momentos, desde o prosaico cafe da manha aos mais requintados jantares. 0 que seria de uma noitada de fondue sem um born naco de pao? Como fazer um autentico vatapa baiano sem um pao frances dormido? No Brasil os portugueses nos trouxeram o salutar habito de comer paes e, com a sua formidavelcapacidade de adapta~ao, substituiram a farinha de trigo pelas farinhas locais, nos legando uma serie de paes nossos de cada dia . E Deus, que e brasileiro, nos brindou com o pao de queijo, esta delicia nacional que come~a a atravessar fronteiras . Injustamente acusado de ser inimigo dos regimes, o pao na verdade nao possui tantas calorias, se ingerido com modera~ao. Hoje alcan~a status de produto de luxo, possuindo ate boutiques egriffis. Ee neste momento de alta que o Senac Sao Paulo mais uma vez se adianta e lan~a este belo trabalho de Sandra Canella-Rawls. Tive o prazer de conhecer a autora deste tratado de boulangerie e e com muita satisfa~ao que escrevo estas palavras de carinho e apoio, na certeza de que, muito em breve, ele sera item obrigat6rio nas prateleiras dos apreciadores da gastronomia . Rnnaldo Lapes Pontes Barreto Professor e assessor das Faculdades de Turlsmo e Hotelarla do Senac Sao Paulo Prefacio a 3a edicao f Do Casamento entre as minhas experiencias em cozinhas na America e das min has experiencias lecionando nos Estados U nidos e no Brasil nas- ceu este livro. Pelo curso de minha carreira, acredito que era previsivel que um dia, conciliando a ciencia de alimentos, a arte culinaria, o ensino de culinaria e minha inquietude em conhecer os porques, eu procuraria infor- ma~6es que nao constam em r6tulos nem em livros levianos de receitas com fotos bonitas. Em sua serie de livros What Einstein told his cook, Robert Wolke, ao capturar a ideia que lhe originou cinco livros sabre alimentos, apresenta um exemplo em que Einstein, em New Jersey, em 1935, entrava em sua cozi- nha e visualizava um guisado sendo elaborado no fogao. Atras de sua men- te interrogativa e criativa, teria na verdade vista um aparato que transforma a energia quimica contida no gas ou na madeira em energia terrnica, aplica- da a um peda~o de galinha. Nada disso teria diminuido seu prazer em degustar a galinha preparada, mas certamente haveria colocado certo tem- pera extra em sua refei~ao, um tempera nao detectavel par intelectos sem a sintonia cientifica. No meu entender, ciencia adiciona razao e profundidade a eventos cor- riqueiros, coma preparar ou comer um alimento. 0 alimento e ao mesmo 16 P.i.o: ARTE E CIENCIA tempo confortante e necessario para a continua<;ao da vida. Mas compreende- lo desde a sua descoberta ate suas aplica<;6es, seus contextos hist6rico-cultu- rais, suas implica<;6es em nossa vida diaria, uma defini<;ao generalizada da pr6pria gastronomia, alimenta nossas mentes e adiciona urn tempera singu- lar ao que ja saboreamos sobre a prepara<;ao e a degusta<;ao culinarias. A coc<;ao de um pao de qualidade nao termina na escolha do metodo certo, da farinha correta ou do forno ideal . E preciso entender que outras rea<;6es, alem da imediata forma<;ao de um produto, estao ocorrendo simul- taneamente: a microbiologia da fermenta<;ao, a mecanica do desenvolvi- mento de urna massa por atrito fisico, a variedade e implica<;6es agriculturais do trigo, os aspectos de processamento dos ingredientes, as rea<;6es quimi- cas levadas a cabo pelas rea<;6es fisicas e tecnol6gicas. E preciso pensar fora da panela! Este livro e uma explora<;ao das tecnicas milenares de elabora<;ao de massas fermentadas, principalmente vistas atraves de urna mente curiosa que tenta repassar o prazer da descoberta e do conhecimento. Na revisao desta terceira edi<;ao, li, reli, repensei, e me satisfaz a op<;ao, certamente delicada, em escrever para uma gama de individuos, desde aqueles que estudaram ciencia mais aprofundadamente ate aqueles que pouco conhe- cem aspectos cientificos, atras de coisas corriqueiras. E entendi ser necessa- ria a introdu<;ao, ou melhor dizendo, a re-introdu<;ao mais enfatizada e em born momento da produ<;ao do pao artesanal, o pao original que nasceu as margens do rio Nilo, no Egito antigo, e migrou para as boulangeries ao redor da Europa e do mundo, operada por artistas chamados "padeiros artesaos". Um padeiro artesanal e possuidor de talento, conhecimento e experien- cia, treinado na habilidade mais invejavel, a de misturar, fermentar, moldar e assar um pao unico. Deve entender da ciencia atras da produ<;ao, das rea<;6es fisico-quimicas dos ingredientes, e administrar o melhor ambiente e condi<;6es para o desenvolvimento de uma produ<;ao artistica e unica. Comparo o padeiro artesanal a qualquer outro artista, semelhante ao traba- lho de um ti.no joalheiro, um talentoso marceneiro, um refinado costureiro . PR.EFACIO ). 3• EDH, AO Ele sabe coma combinar materiais para realizar alga forte e ao mesmo tem- po elegante e delicado. Combinando os materiais de diferentes formas, cria modelagens, texturas, cores. 0 produto final o faz se sentir orgulhoso, afi- nal, tanto empenho intelectual, fisico, monetario e de criatividade foram utilizados. Para a produ~ao <lesses paes artesanais de melhor qualidade, precisamos de uma divulga~ao maior do que e o pao, precisamos qualificar padeiros, educar investidores e proprietarios da industria afun, e acredito que pode- mos iniciar par aqui. Leitura de bans livros, viagens, conversas com outros povos e culturas, cursos de gastronomia responsaveis ... muito a pedir. Mi- nha contribui~ao? 0 que vi, repeti, aprimorei, aprendi e tento repassar para meus alunos e a todos aqueles que me derem a oportunidade de falar dessa minha paixao pelo tema. Assim, agrade~o a Editora Senac Sao Paulo par sua seriedade, investi- mento e pela oportunidade de rever o meu livro, corrigir alguns erros de impressao, alguns erros de interpreta~ao e preencher algumas lacunas de informa~ao que penso serem importantes para expressar minha paixao e minha gratidao pelo fascinio que esse alimento supremo milenar me des- perta : e vamos ao pao. Prefacio Milhares de anos atras, em uma sociedade basicamente rural, quando ci- dades nao passavam de modestas vilas, pode-se dizer que quase todas as familias sabiam uma receita ou outra de pao: agua, farinha, sal e algum mecanismo ou ingrediente fermentador. 0 pao era en tao assado sabre fo- gueiras, brasas ou pedras. Em tais condic;oes provavelmente era produzido um pao duro, seco, que exigia ser consumido ainda quente; ou demandava, digamos ... muita mastigac;ao. Mesmo assim, ja naquela epoca o pao era apreciado por todos. Ao se transferir essa produc;ao da cozinha domestica para as padarias co- merciais, perdemos uma tradic;ao individual, e alguns dizem ate que o pao desde entao vem se transformando em apenas mais um produto. De fato, muitas mudanc;as ocorreram. Mas hoje, se perdeu o carater individual e artesanal, o pao ganhou com as novas conquistas da sociedade moderna. A farinha nunca apresentou tanta variedade e qualidade; cereais nunca foram tao cuidadosamente investigados e produzidos; contamos com o fermento ins- tantaneo; temos misturadeiras, fornos os mais variados possivel, e ... livros! As descobertas as quais temos acesso hoje delineiam a construc;ao de areas multiplas de conhecimento e vem colaborando para a explicac;ao e o controle de variaveis tais como o tempo, a perpetuac;ao da especie e ate a 20 PAO: ARTE E CI~NCIA cozinha. A arte culinaria tambem se reve, se explica, transcende quando a luz do conhecimento. A prodw;ao de massas fermentadas e um exemplo claro - afinal, acontecem rea<_;6es e modifica<_;6es fisico-quimicas . E forma, e arte, e expressao. E adicionar novas elementos, ajustar outros, dar novas formas, criar, melhorar, melhorar. E tudo isso s6 se atinge com conheci- mento e controle de variaveis, com investimento em pesquisa e com muita, muita pratica. Este livro investiga a parte da culinaria que estuda, desenvolve e produz paes e outras massas, especificamente a arte de produzir paes ou massas fermentadas, conhecida coma boulangerie, ou panifica<_;ao. Assar nao depende apenas de uma boa receita ou formula. Requerapli- ca<_;ao de conhecimento, pesquisa; um desafio mais serio e consistente. E capacidade de reprodu<_;ao, apesar das variaveis que acometem o processo, coma a qualidade da farinha, o tipo de sova, a fermenta<_;ao, as bacterias presentes no ambiente, a temperatura, o tipo de forneamento, o acondicio- namento, entre outros. Quando elaboramos uma massa de pao, transformamos a cozinha em um laborat6rio de rea<_;6es, aromas, adores, sabores e texturas . A receita e a expressao de um experimento cientifico. Imagine coma uma massa pegajo- sa e sem paladar pode se transformar em um alimento com a riqueza e o significado do pao? 0 que faz do pao um alimento tao versatil e imprescindivel? Como se desenvolve sua textura leve e porosa? A resposta e gliadina e glutenina, duas proteinas encontradas unicamente na farinha de trigo. Ao misturar-se com um liquido e ser amassada, a farinha forma uma substancia elastica, deno- minada gluten. 0 gluten tern a habilidade de esticar-se e aprisionar as bo- lhas de gas que farao o pao crescer. Tais gases vem de uma a<_;ao fermentadora provocada por fungos minus- culos, unicelulares, chamados comercialmente de fermento biol6gico, e artesanalmente de fermento natural. A combina<_;ao simples de fermento + farinha + liquido resulta em uma massa esbranqui<_;ada e pegajosa. No inte- rior dessa mistura, as moleculas se movem e ocorre a fermenta<_;ao. Algumas PREFACIO 21 enzimas do fermento atacam o amido da farinha, quebrando-o em glicose. Outras enzimas transformam moleculas de glicose em gas carbodi6xido e etanol. 0 gas se expande na mistura, causando o crescimento da massa e suas decorrentes caracteristicas de porosidade, odor, etc. Assar e por defini~ao a aplic(lflio de calor a um alimento, expondo-o a tempe- raturas elevadas. Neste livro, assar se refere a coc~ao de massas e misturas, incluindo massas fermentadas, laminadas, folhadas, levedadas e mistas. Se- guiremos explorando detalhadamente os ingredientes utilizados em massas, hem como uma descri~ao minuciosa das fun~6es pr6prias e por associa~ao que esses ingredientes desempenham. Podemos dizer, gJ"Osso modo, que a leitura deste material oferecera ao leitor tres importantes ferramentas: • No~ao tecnica apurada de ingredientes e como reagem entre si para a elabora~ao de um alimento, nesse caso mais especifico, o pao. • Os procedirnentos envolvidos na produ~ao de massas. • A arte manual e as tecnicas de produ~ao. Este livro nao pretende fornecer receitas, e sim oferecer uma referencia cientifica e profissional para a elabora~ao de paes. Embora haja formulas - extremamente pesquisadas e testadas - na ultima se~ao, o enfoque nao pri- vilegia simples receitas como ponto central. A inten~ao e contribuir para a compreensao e aplica~ao de conceitos e informa~6es basicas envolvidas no processo de elabora~ao de produtos de boulangerie. Assim, dirigimo-nos especialmente aos estudiosos da arte culinaria, sem esquecer do publico em geral que deseja conhecer mais profundamente a area da boulangerie e patisserie e aprofundar-se no entendirnento de como certos ingredientes combinados sao usados na elabora~ao de produtos atraen- tes, saborosos e com grande valor nutricional. Para os experts na boulangerie e patisserie, este livro servira como refe- rencia profissional quanto a ingredientes, metodos e formulas, dos mais basicos aos mais complexos. Para os novi~os, e um guia pratico detalhado da expressao da arte da boulangerie. 0 objetivo e que se compreenda que o boulanger verdadeiro dedica-se a minucias e preocupa-se em elaborar um pao artesanal tao born quanto possa ser, ainda que em escala de consumo. 22 P.i.o: ARTE E ClilNCIA Espero contribuir para que o pao que deu certo (por acaso) hoje possa tambem dar certo amanha, com maior seguran~a e perfei~ao; para que a compreensao das variaveis fa~am-se uteis e constantes, e mais um campo de conhecimento se abra para meu leitor. Quern sabe nascera mais um boulanger ou patissier, que venha engrossar a insipida mas deliciosa e pro- missora carreira profissional em nosso pais. Entao, maos a obra. .. lntroducao I Em nosso pais, vemos um crescimento relativamente recente do estudo sistematico e institucionalizado da arte culinaria. Sao apenas poucos cursos, algumas faculdades na area da gastronomia, uma outra dezena de cursos na area tecnol6gica de alimentos e urna outra centena, talvez, de cursos para donas de casa, hobbie mais do que forma~ao. Porem, essas escolas tern apenas uma parte, e bastante reduzida, de seus programas destinada a boulangerie - produ~ao de paes e massas fermentadas - ea patisserie - produ~ao de artigos de confeitaria -, ambos termos em- prestados do frances, na ausencia de uma palavra em nosso idioma que resuma a complexidade de tais artes . Busca-se apenas a capacita~ao do pro- fissional global - cozinhar, assar ... entender de tudo um pouco. Parte-se do pressuposto que um gastronomo, chef ou cozinheiro chef deveria tambem estar capacitado a elaborar paes e sobremesas, uma vez que a maioria abso- lu ta dos restaurantes, hoteis e afins inclui tais itens em seus menus. Enquanto em toda a America do Norte, Europa e Oriente a carreira de um chefboulanger e patissier, que se dedique exclusivarnente a essa parte da arte culinaria, e bastante difundida e apresenta-se vital para a manuten~ao de padroes de qualidade internacionais, no Brasil nos encontrarnos em ou- tros patamares. Nao ha, no pais, curso de forma~ao superior nas areas de panifica~ao e confeitaria. PXo: ARTE E CJtNC!A Assim, apesar do acentuado crescimento da area da culinaria e gas- tronomia, na area espedfica da boulangerie e patisserie existe grande carencia na coleta e sistematiza<;ao de informa<;6es, e faltam cursos e es- colas especializadas. Por outro lado, esse despreparo gera uma industria de produ<;ao sem qualidade e produz um consumidor sem critica ou exigencia diante dos produtos que leva para casa e com os quais alimenta sua famflia. Vemos esse mercado cada vez mais dominado pelas grandes industrias, pelos grandes supermercados. As pr6prias padarias de bairro vendem de tudo, menos pao. Nesse mercado aberto e sem criterios, a massa folhada se transforma em croissant, usualmente enrolado com presunto e queijo, e a mesma massa do pao frances se transforma sem puni<;6es ou desconforto em ciabatta, pao italiano cuja elabora<;ao exige grande complexidade . Da-se a nomenclatura que hem se entende a esses produtos, em um mercado con- sumidor com lirnitado poder de compra, incipiente poder de julgamento e com paladar viciado. Bern ao ')eitinho brasileiro". Chamamos boulangerie ao estabelecimento comercial que oferece uma gama variada de paes, de diferentes massas, odores, aparencias e texturas, com pre<;os naturalmente diferenciados. Usualmente as boulangeries apre- sentam certa produ<;ao de artigos de patisserie - biscoitos, doces, tortas, bolos, sobremesas. Ouantas boulangeries voce conhece? Na verdade, raramente se tern acesso ao pao fermentado, trabalhado e finalizado rigorosamente, de qualidade infinitamente superior, mas de custo mais elevado. A produ<;ao em escala comercial usualmente causa nao apenas a perda de qualidade, mas principalmente a perda de tradi<;oes e rafzes mais basicas da pr6pria alimenta<;ao humana. Culinaria versus boulan~erie Os procedirnentos de assar e cozinhar tern muito em comum. Ambos fritam, assam, dao forma e modelo, sabor, se preocupam com o apelo visual fNTRODUc;:AO 27 de seu produto. Se o cozinheiro ou chef utiliza-se de receitas, o boulanger ou padeiro trabalha com formulas precisas. 0 pao assado alimenta o organismo, mas a massa em si tern de ser alimentada pelo boulanger, e esse processo e ao mesmo tempo um movimento fisico, intelectual e ate psicol6gico. 0 cozinheiro ou chef pode fazer adequa<;6es de sal, temperas, agua e leite, por exemplo.E usualmente seu produto ou sua receita pode sofrer varia<;6es de ingredientes ou outros elementos sem perda de qualidade e consistencia. J a a elabora<;iio de paes e massas fermentadas, ao contrario da culinaria geral, e ciencia antes de ser arte. Come<;a por um atento e minucioso misc-en-place. Atem-se ao tipo, qua- lidade, combina<;iio e rea<;iio de ingredientes entre si; exige precisao absoluta em pesos, medidas e temperaturas; requer dominio completo de tecnicas e metodos, dentre tantos outros fatores de qualidade. Em termos tecnicos, denominamos misc-en-place (traduzido do frances como "colocar em local apropriado") a organiza<;iio e prepara<;iio que ante- cede uma tarefa culinaria. Trata-se de identificar os ingredientes, observar sua temperatura, a maneira pela qual serao utilizados ( cru, picado, em pure, frio, quente, etc.), reunir o equipamento e utensilios necessarios, os reci- pientes para mistura e coc<;iio, ajustar a temperatura do forno, enfim, todos os detalhes envolvidos na elabora<;iio. No ambiente profissional dizemos que um misc-en-place bem-feito e 50% do sucesso do trabalho. Na organiza<;iio e prepara<;iio de seu trabalho, o boulanger trabalha com medidas exatas de peso, por exemplo. U ma vez que sua baguete esteja no forno, nenhuma outra medida de corre<;iio podeci ser efetuada . Quanta ao forno, o boulanger necessita vigiar a temperatura, analisar a necessidade ou nao de vapor, a dura<;iio da coc<;iio e ate mesmo como seu produto deveci ser retirado da forma e esfriado. Dai'. em diante se dedicaci a conclusao de seu trabalho, decorando e dando a finaliza<;iio e acondicionamento. Em minhas aulas iniciais gosto de dizer que observar a elabora<;iio de uma simples baguete pode ser excelente oportunidade para admirar as tre- mendas voltas das descobertas e inven<;6es humanas. Parece-lhe muito pre- tensioso? PAO: ARTE E Ciil.NCIA Vejamos. A elabora~ao de um pao requer farinha; para obte-la e necessa- rio um cam po cultivado de trigo, que pede cuidados na escolha da semente, na planta~ao, na colheita, alem de sofisticados passos tecnol6gicos para a moagem e a extra~ao final da farinha propriamente dita. Assim coma a agricultura ja se desenvolvia perto de 8000 a.C., tambem naquela epoca ja evoluia a arte de fermentar graos para a produ~ao de vi- nhos, cervejas e massas similares as que consumimos hoje. Para crescer, o pao requer fermento ou algum tipo de processo fermentador. Louis Pasteur, na metade do seculo XVIII, desenvolveu uma linha de raciocinio para ex- plicar a conexao entre fermento e fermenta~ao, que foi a base do conheci- mento utilizado para iniciar a produ~ao industrial de produtos fermentados . Ate chegar aos patamares modernos de produ~ao e manter-se confiavel e suficiente para ser a maior produ~ao de fungos vivas do planeta, o fermento certamente tra~ou um longo percurso. E finalmente, o pao requer forno! E existe uma variedade enorme de tipos de fornos, condu~ao de calor, vapor, etc. Cada um <lesses componentes expressa gera~6es de desenvolvimento, e nao se teria chegado ao que o mundo contemporaneo conhece como pao de outra maneira. Assim, e importante que a essa altura ja tenhamos compreendido que assar nao e apenas um dom ou uma boa receita ou formula. Engloba tambem apli- ca~ao de conhecimento, pesquisa, arte - enfun, e um desafio mais serio e con- sistente. Como diria um chef &ances, meu professor na Johnson & Wales University, nos Estados Unidos: e 10% de inspira~ao e 90% de transpira~ao! Sao muitas as dificuldades que venho enfrentando na minha experien- cia profissional como boulangere, patissiere e chef-instrutora em diversas escolas, hoteis e restaurantes . Discutir, descrever, expor, conscientizar, in- formar, capacitar ... esse e o desafio. Boulan~erie Mas por que essa paixao pela boulangerie? Apenas porque entendo que o pao, particularmente, e de vital importancia para a especie humana, ali- i NTRODUC, AO 29 mentando de maneira singular, jamais apresentada por outro alimento . 0 pao, como o consumimos hoje, e o resultado de um processo antigo, de milhares de anos. Trata-se de uma herarn;a ancestral, de um conjunto de conhecimentos repassados, alimentados e sistematizados no decorrer de ge- ra~6es e culturas. Gregos, hebreus, egipcios, ibericos, americanos, enfim, todas as civiliza~6es que sempre produziram seus alimentos contribuiram para o pao que vemos hoje em nossas mesas. Voce ja se deu conta de quanto pao consumimos por ano? Assim como batatas, vegetais, arroz, etc., cada individuo em media consome mais de 100 kg/ano, ou, digamos, duas vezes seu pr6prio peso corporal. E uma parte tao importante em nossas vidas que deveria ser levado mais a serio. A essa altura, voce ja ate deve ter enumerado suas padarias favoritas, e seus paes favoritos na cidade onde mora. Alem do tao comum pao frances, da baguete, do pao de forma branco, do pao de hamburguer, do pao de cachorro-quente, existem muitos outros tipos, chamados paes "especiais". Sao paes de centeio, de aveia, paes doces, paes com mel e com uva passa, bisnagas de leite, tran~as; e ainda aqueles paes rapidos presentes na mesa de cafe da manha ou no lanche do final da tarde, como o nacionalissimo pao de queijo e a broa de fuba. Todavia, cada vez menos pensamos na figura do velho padeiro, que esta sendo substitu.ido pelos padeiros invisiveis da padaria do supermercado e das fabricas de paes. A industria da alimenta~ao cresce virtuosamente, e a mecaniza~ao e a ordem do dia. Enquanto um pao elaborado pelo padeiro, sem recurso adicional comercial, como fermentos em excesso, melhoradores, farinhas quimicamente manipuladas, enzimas, etc., pode demorar ate mes- mo dias para sair, no supermercado, por milagre, sai em apenas uma hora! Otimo. Apenas nao pensemos que essa otimiza~ao e barateamento de um item tao importante na dieta humana nao compromete o pao que consumi- mos diariamente. Na verdade, ele tern deficiencias em suas caracteristicas principais de sabor, odor, qualidade nutricional, entre tantas outras . No t6pico "Fermento natural ou pre-fermento" abordamos o que e um pao elaborado com o fermento natural, quais as diferen~as de paladar, qualida- 30 PAO: ARTE E CI~NCIA de, conservac;ao e, principalmente, os beneficios para a saude no consumo <lesses paes artesanais. Poderfamos en tao dizer que o pao, apesar dos atalhos adotados pela socie- dade moderna, ainda e um dos alimentos mais fi.nos para consumo diario, e que, de fato, a dieta humana contemporanea nao existiria sem ele. Muitos sao os alimentos superficiais ou superfluos, coma sorvetes, chocolates, bata- ta frita, hamburgueres - na verdade, seria mais saudavel nao consumi-los. U ma dieta balanceada capaz de manter o corpo e a mente em funcionamen- to deve obrigatoriamente canter o alimento primordial: um bom piio. Como veremos no t6pico destinado aos pre-fermentos, o processo de fermentac;ao da massa de um pao levedado se inicia na verdade dentro das quatro paredes da padaria, e pede pouco ou preferencialmente nenhum fer- mento industrializado. Os produtores de paes artesanais costumam dizer que nao querem introduzir em suas massas nenhum fermento oriundo de uma fabrica desconhecida ou de um meio (ambiente) desconhecido. Elabo- ram seu pr6prio fermento, o que eleva a elaborac;ao de paes a um outro patamar de controle de variaveis e qualidade, com a necessidade continua de atentar para os microrganismos que se criam ou proliferam. Na verdade, esse metodo nao «produz" ou faz crescer apenas um tipo de microrganismo, mas uma cultura de bacterias extremamente beneficas ao processo de elaborac;ao de uma massa fermentada. Naturalmente, nao estamos falando de nenhuma novidade. Assim o pao era feito originalmente. Se analisarmos a hist6ria do pao, reconheceremos que o advento do fermento comercial e alga bastante recente: veio com a industrializac;ao,com a necessidade de produc;ao de alimentos em massa e com a introduc;ao crescente de maquinas em substituic;ao as maos humanas. Ate certo momenta, o fermento era produzido na padaria, pelas maos do padeiro, que o alimentava, controlava e conhecia muito bem suas particula- ridades. A introduc;ao de maquinas paulatinamente retirou a caracteristica secular do pao, de ser produzido e reproduzido par maos humanas em toda a sua dinamica. A maquina substituiu o homem e o pao feito pelo homem foi substituido por um artigo industrializado . E padeiros se transformam em tecnicos em vez de artesaos ... INTRODuc;:Xo 31 A popularidade do fermento comercial logo chegou aos lares e as pe- quenas padarias. No mundo industrial perdeu-se o artesanato do pao, expe- rimentado e aprimorado pela humanidade por milhares de anos ... ate que algumas pessoas - como ja acontece em tantos paises do mundo moderno - resolveram voltar a essas tradi~6es e conhecimentos. Embora nem todos os padeiros artesaos dogmaticamente devotem sua produ~ao ao pao levedado naturalmente - contam-se ai a facilidade e a rapidez que o fermento comer- cial oferece -, sem duvida todos querem se reaproximar da fascinante pro- du~o artesanal desse alimento. Os artesaos do pao estao voltados para o processo de cria~ao mais do que para a produ~ao em larga escala. Na Europa e nos Estados Unidos, existem milhares de pequenas boulangeries, com produ~ao limitada, que nao utiliza nada mais do que agua, farinha e sal. Como padeiros, diariamente entram em contato com organismos vivos criadores do pao que eles fazem. Desen- volvem extrema sensibilidade para os fermentos que manipulam: como rea- gem com o tempo, com os ingredientes, com todas as variaveis a que estive- rem suscetiveis. A paixao e o envolvimento despertados nessa maneira pura de elaborar o mais antigo e fundamental alimento de que a humanidade tern noticia merecem todo nosso respeito e admira~ao. Voce sabla? o pao e consumldo ha 7.500 anos; A lndustrla do pao e uma das malores do setor allmentlclo; o pao contem multo pouca gordura e vlrtualmente nenhum ~ucar; 70% do pao que consumlmos e do tlpo pao branco; Sandulches sao respon~ls por cerca de 50% do pao que lnQerlmos; OS trabalhadores Que ergueram as pirAmldes do Eglto foram pagos corn pao; 0 Qrande lnc~lo de Landres. em 1666. c~ou em uma padarla; Em 1942 a Feder~ Brttanlca dos Padelros organtzou sua ~ para servtr de suporte a guerra; Pao e o pr1me1ro fast fcxxlcpe a humanldade conheceu. e continua sendo o melhorl 32 PXo: ARTE E CltN CIA Breve hist6ria do pao A hist6ria do pao permeia a pr6pria hist6ria da humanidade. Diferen- tes origens podem ser encontradas na literatura. Nao pretendo postular nenhuma como a verdadeira. A explicac;ao seguinte, porem, parece bas- tante coerente. Muitos estudos consultados partem da premissa de que os primeiros paes foram elaborados no periodo neolitico, onde hoje esta situada a Suic;a, em um vilarejo as margens do lago Dwellers, cerca de 8 mil anos atras. Essa comunidade construiu suas casas sobre palafitas as margens do lago, cujas aguas eram ricas em minerais. Com o passar dos anos, o local foi submerso; elementos quimicos presentes na agua petrificaram muitos dos objetos aban- donados ali, e, como resultado, cientistas e arque6logos colheram no local uma gama extraordinaria de detalhes do modo de vida dessas pessoas. Um dos indicios encontrados e que eles ja assavam paes. Anti~uidade (8000 a.C.-600 d.C.) 0 homem descobriu o fogo meio milhao de anos atras e os cereais eram provavelmente torrados em fogueiras a ceu aberto pelo menos ha 100 mil anos, quando ja eram cultivados no Oriente Medio. Trigo e arroz eram naquele momenta provavelmente os cereais mais difundidos. Exatamente por vir se alimentando do trigo e derivados por mais de 10 mil anos, nossos corpos foram habituados a elaborar enzimas e outros mecanismos necessa- rios a sua digestao. 0 pao ja era elaborado nos vales dos rios Tigre e Eufrates, na antiga Mesopotamia ( exatamente onde atualmente se encontra o Iraque ) , e no vale do rio Hindu. Supoe-se que tinha formato oval e achatado, como uma pan- queca, e era feito com graos triturados rusticamente, como aveia, cevada, trigo e outras sementes, como gergelim, por exemplo. Os cereais eram mis- turados com agua e deixados sobre pedras, onde levedavam grosseiramente e entao eram assados, envoltos ou cobertos de brasas. Esses paes de formato lNTRODm;:Ao 33 estendido ou achatado, denominados em inglesflatbreads, foram os unicos conhecidos pelas civilizac;oes durante milenios, e ainda hoje sao produzidos e consumidos largamente em todo o mundo, principalmente nessa mesma regiao. E~ito Foi as margens dos bancos de fertilizac;ao, ao lado do rio Nilo, que os egipcios, antes de 300 a.C., transformaram definitivamente essestandard de alimento rustico, conduzindo-o ao campo da arte. 0 Egito antigo desenvolveu os modelos primarios de pedras moedoras, bem como as variedades de trigos mais duras. Nessa epoca, a fermentac;ao da cerveja e a elaborac;ao de paes tornou-se uma habilidade crescente. 0 clima quente dava ao ambiente condic;oes extremamente favoniveis a proli- ferac;ao de fermentos (bacterias), e os padeiros comec;aram a experienciar os primeiros pa.es fermentados. Os relatos supoem que um pedac;o de massa contendo apenas agua e farinha foi esquecido a ceu aberto , e naturalmente foi inoculado pelas bacte- rias presentes no ambiente . Comec;ou assim uma fermentac;ao alco6lica, trans- formada, ap6s alguns dias, em fermentac;ao acida, que ofereceu volume a massa. A alguem teria ocorrido juntar essa massa expandida a uma massa nova. Assim a fermentac;ao teria sido incorporada ao repert6rio culinario. (Esse princfpio de fermentac;ao foi amplamente explorado ate pelo menos o seculo XX, quando padeiros comec;aram a incluir algum fermento comer- cial para acelerar e potencializar a capacidade de fermentac;ao de sua espon- ja ou pre-fermento.) Em seguida os egipcios inventaram o forno fechado, e a produc;ao de paes assumiu grande significado . Um tributo era pago a Osiris, o deus do grao, e pao era usado no lugar de dinheiro, tanto que grande parte dos trabalhadores das piramides foi paga com paes. 0 conhecimento ea importancia do pao no Egito estao cravados nos dese- nhos minuciosos deixados nas tumbas dos fara6s no Vale dos Reis. As figuras 34 PXo: ARTE E CitNCIA mostram o pao sendo oferecido aos deuses, em pelo menos quarenta formas diferentes: arredondados, quadrados, achatados, triangulares, espirais, conicos, e todas suas combina~oes. Muitos desses paes sao bastante semelhantes aos que consumimos atualmente, embora o metodo de manufatura fosse bem distinto: acredita-se que os egfpcios sovavam a massa com os pes! Roma anti~a (1000 a.C.) Em Roma, o pao levedado se tornou popular em torno de 500 a.C., quando foram desenvolvidos moedores circulares, base de toda moagem ate a Revolu~ao Industrial do seculo XIX . A produ~ao de paes na Italia era tao importante que ja o famoso fil6sofo Juvenal professava que os romanos precisavam apenas de duas coisas: panem et circenses, ou seja, pao e circa (no sentido de entretenimento). As primeiras associa~6es de padeiros foram formadas em Roma cerca de 150 a.C. Em torno de 40 a.C. autoridades decretaram que o pao fosse distri- buido gratuitamente a todos os homens adultos. ldade Media 0 crescimento das vilas e cidades ampliou a troca de mercadorias e padei- ros come~aram a investir na produ~ao comercial. Associa~oes de padeiros pro- tegiam os interesses de seus membros e regulamentavam pre~o e peso do pao. Durante a dinastia Tudor, quando a Gra-Bretanha via um momenta de pros- peridade, o pao tornou-se um sirnbolo de status: a nobreza consumia paes brancos, pequenos, e os mais pobres se alimentavam com paes escuros e maiores. Issa porque, na epoca, a farinhamoida e tratada para a elabora~ao de paes brancos era obtida em pequenas quantidades. Padeiros de pao branco e padeiros de pao escuro chegavam a ter associa~oes diferentes, o que duraria ate 1569, quando a rainha Elizabeth I uniu as duas fac~oes. Em Portugal , o dia de santa Isabel, padroeira dos padeiros, e comemora- do em 8 de julho. Conta-se que em 1333 a rainha Isabel, esposa do rei dom Diniz, empenhou suas j6ias para poder continuar a distribuir pao aos pobres. fNTRODU<;:Ao 35 Em um dia de partilha o rei chegou de surpresa ao local da distribui<_;ao. Isabel, ao ve-lo, escondeu os pa.es dentro de suas vestimentas. Indagada pelo rei o que tratava de esconder, ela respondeu: "Rosas!". "Rosas em janeiro? Deixe-me ver", desafiou o rei. Isabel abriu suas vestes e ... cairam rosas. Era industrial (1700-1887) No inkio do seculo XIX, a vida se transform au profundamente pelos efeitos da Revolu<_;ao Industrial. Um grande numero de trabalhadores ru- rais se deslocou para centros maiores a fun de trabalhar em novas industrias. Menas alimento acabou sendo produzido, mais bocas precisavam ser ali- mentadas, e a fame ressurgiu coma um serio problema. Nesse contexto, o consumo do pao coma alimento essencial era largamente difundido. Entre- tanto os cereais disponiveis para sua elabora<_;ao eram escassos e diferencia- dos. Os pa.es integrais, consumidos pelos militares, eram considerados mais saudaveis e sugeridos para a aristocracia. 0 seculo XX Fornos movidos a gas substituiram os fornos de tijolo e lenha, produ- zindo maior quantidade e qualidade na coc<_;ao de pa.es e massas em geral. As unidades automatizadas para elabora<_;ao de pa.es em grande escala au- mentaram sensivelmente a produ<_;ao de pa.es. A partir da decada de 1930 cientistas identificaram os beneficios do con- sumo de farinhas integrais. Na decada de 1940 o calcio come<_;ou a ser adi- cionado a farinha para tentar suprir deficiencias de calcio nas mulheres . A decada de 1960 ja marca o desenvolvimento de um modelo de produ<_;ao e distribui<_;ao industrial avan<_;ado, e a produ<_;ao come<_;a a mudar de endere - <_;o: das pequenas padarias as grandes industrias e supermercados . Na ln- glaterra foi desenvolvido um modo de produ~ao que reduzia o perfodo de fermenta<_;ao, introduzindo um processo de mistura extremamente rapida, diminuindo drasticamente o tempo de produ<_;ao e, par conseguinte, bara- teando o pre<_;o. PXo: ARTE E c 1tNCIA Na decada de 1980 estudos na area da saude come~aram a sugerir a eleva~ao da quantidade de pao a ser consumida para substituir o consumo de gorduras e a~ucar na dieta moderna. Recomendavam ainda que agentes para o tratamento de farinha branca fossem estendidos as farinhas escuras ou integrais. Outro ponto levantado dizia respeito a nao necessidade de enriquecer os paes com vitaminas e minerais. Pao artesanal Estrelas 0 pao continua a sustentar na<;6es, culturas, heran<;as, periodos de guerra e de paz, fome e abundancia. Cada pao e unico, distinto em tamanho, formato e textura . Os paes de urn pais dizem quern e seu povo! Familias ao norte da Europa consomem um pao preto, carregado por alcaravia. Na Austria, urn outro povoado esta provavelmente celebrando com um bolo levedado por fermento biol6gico, algum a<;ucar e muita manteiga. Na Fran<;a, urna longa baguete com mais casca que miolo esta sendo carregada sob os bra<;os de um consumidor comum. Os paes que encontramos ao redor do mundo simbolizam momentos e particularidades da humanidade, e ainda se conectam com os costumes alimentares, com a cultura local e a habilida- de do homem em conquistar territ6rios e expor seus habitos a outros povos. 0 interesse pelo pao artesanal coincide com o aumento de publico para o mercado gourmet, com especialidades e alta qualidade em produtos. Me- lhorar o palato e a cultura do consumidor medio e um desafio que vejo ainda principiando no Brasil. Fica dillcil se falar em Pain Ordinaire en- quanto nosso consumidor esta preocupado em comprar uma goma chama- da "pao'' de queijo, que sequer leva algum ingrediente em comurn na fa- PXo: ARTE E CitNCIA brica~ao de paes. A farinha organica, plantada e tratada organicamente, branqueada sem a adi~ao de bromato de potassio ou outros quimicos sinis- tros e encobertos pelo dinheiro dos grandes moinhos, ainda desponta como um sonho para osgourmets,gourmands, e um pequeno grupo de consumido- res mais atentos e seletivos. No mercado americano, as pequenas boulangeries sao a estrela maior do momenta da panifica~ao, eleito por consumidores conscientes dos beneff- cios do pao artesanalmente elaborado, cuidado e eleito como arte suprema ha rnilenios. Os padeiros da antiga escola fazem de suas pequenas e cuida- dosas produ~6es, de qualidade inigualavel, um neg6cio altamente rentavel e conceituado. Os paes das prateleiras de supermercados, sem fermenta~ao, apenas mais um alimento processado para o consumo das multidoes, nem poderia ser considerado um "pao", apenas uma massa assada. As deturpa~6es de producao, a falta de legisla~ao e standards sao vendidos a cada esquina sem puni~ao. Encontramos croissants que nunca foram croissants, carregados com gorduras plasticas, nocivas a saude, paes integrais que contem uma quantidade irris6ria de farinha integral, as vezes ate sem nenhum conteudo de farinha diferenciada, apenas a adi~ao de um corante barato, aditivos qufmicos e outros ingredientes suspeitos. As tecnicas de elabora~ao, os metodos de mistura, a fermenta~ao controlada, a coc~ao primorosa, nada disso chega as vitrines de nossas panificadoras revendedoras de cigarros e coca-colas. lnfelizmente, principalmente em pafses de terceiro mundo ain- da sao esses os paes conhecidos e consumidos. Obviamente, como uma padeira experiente e amante da arte da verdadeira panifica~ao, muito me entristece a ignorancia de nossos consumidores, que desencadeia um pro- cesso de anticriatividade e anti-responsabilidade profissional e governamental sem precedentes. Nos Estados Unidos, que tern cultura culinaria e compromisso para com o consumidor, o pao artesanal vem sendo explorado e oferecido ate mesmo em mercados comuns. Prateleiras de paes extensivamente processados se vem divididas com paes com mais fibras, graos, tecnicas elaboradas de fermenta- P.i.o ARTESANAL ~ao natural e forneamentos primorosos. No Brasil, ainda nos deparamos com uma massiva e desqualifi.cada produ~ao. Tive certo retorno de leitores, alunos, profissionais serios, que nao est:ao simplesmente ocupados com a moda e a dieta, mas curiosos de como poderiamos disparar no Brasil uma qualidade competitiva e melhores op~oes ao consumidor. Onde encontrar o pao elaborado a partir de ingredientes naturais, muitas vezes organicos, sem a adi~ao de gorduras trans e a~ucares modificados, em alguns casos ate com a introdu~ao de fermenta~ao natural, ao inves da fermenta~ao .rapida, de baixa qualidade, da industria processadora de alimentos? Os paes etnicos tambem come~am a conquistar espa~o no mercado. 0 pao ciabatta, par exemplo, um pao de origem italiana a base de farinha, agua, sal e fermento, cheio de sabor e hist6ria, pode ser considerado um exemplo de novos produtos que alcan~am as prateleiras diferenciadas. Mas nao significa que essa "inova~ao" tenha cunho qualitativo ou traga nossos standards amadores para o nivel desejado. o que e o pao artesanal? A minha compreensao da terminologia "pao artesanal" refere-se prima- riamente ao estilo eurocentrico, de interior umido e granulometria mais aberta, uma presen~a intensa e acentuada no paladar, um odor sutilmente azedo e aromatico, uma textura que varia de borrachuda a crocante, elabo- rado artesanal ou manualmente, em pequenas por~oes, com a presen~a de um artesao de pao, que possui tecnicas de estilo em todos os detalhes de produ~ao do pao, incluindo o conhecimento de ingredientes e mistura,fermenta~ao e o complexo processo de coc~ao. Paes verdadeiramente artesanais sao encontrados em toda a Europa, em pequenas "boutiques" ou padarias familiares, onde o fundador era normalmente o avo ou tataravo do padeiro e dono atual; por norma, manufatura em larga escala nunca foi uma prioridade. Seus paes sao usualmente mais caros do que aqueles pro- cessados e comprados em supermercados e padarias de moda ( nao boutiques). E mais provavel que esses tipos de paes tenham sido originalmente elabora- 42 PAO: ARTE E CitNCIA dos no Oriente Media e depois adotados em toda a Europa, onde fazem parte da cultura e do dia-a-dia de diferentes povos. Nao se pode confundir a visa.a de um pao artesanal com plies de sabores ou plies especiais, usualmente todos cortes de uma mesma massa, insfpida e sem fermenta<sao correta, sem respeito a tecnicas, tradi<s6es e qualidades de- vidas. A adi<sao de vegetais ( o pao de abacate, por exemplo ), nozes e passas, frutas, graos diferenciados, muito queijo, presunto, sardinha, etc ., nao fa- zem um pao de qualidade. A apela<sao <lesses pa.es centra-se em seus aro- mas, textura e benefkios nutricionais pelo acumulo de varios ingredientes «enriquecedores", mas ainda sem a tradi<sao ea tecnica artesanal. Ainda que o desejo de se explorar essa fac<sao diferenciada de mercado exista, os pro- dutores da industria de panifica<sao deparam-se com um desafio 6bvio: como viabilizar a produ<sao de um pao de qualidade, como estender sua vida de prateleira, como levar ao consurnidor a informa<sao necessaria para que esse esfor<so seja apreciado e cres<sa. Como diferenciamos o padeiro do artesao? Primeiro, confira os ingredientes. 0 pao do artesao consiste apenas dos ingredientes que devem estar presentes: agua, sal, fermento e farinha; caso feito por leveda<sao natural, sequer fermento biol6gico industrial deve cons- tar na lista de ingredientes. Pa.es flavorizados, entretanto, podem listar ou- tros ingredientes nao reconhecidos como basicos, podendo incluir frutas oleaginosas (nozes, amendoas, etc .), cebola, alho, presunto e queijo. Vale ressaltar que os produtos de viennoiserie, como um brioche, por exemplo, incluirao leite, ovos, e manteiga, obviamente ingredientes que diferenciam tais produtos . Ao levar um pa.a para casa, lembre-se de que esta consumin- do o alimento mais antigo e basico na dieta da humanidade. Tal produto, como deveria ser tradicionalmente, nao deveria levar aditivos, corantes, emulsificantes, conservantes, todos implementos que definitivamente nun- ca pertenceram a elabora<sao de pa.es e nunca deveriam estar listados. PAO ARTESANAL Depois, pense no local onde esse pao foi elaborado. Recentemente, visi- tei um padeiro alemao em Orlando, Florida, que fez questao de me pro- porcionar um tour em sua pequena padaria. Mostrou-me seu fermento na- tural (o mesmo ha 20 anos), seu forno com camaras importado da Alema- nha, cinturoes e controle de temperatura peculiares. Apresentou-me seu filho, o padeiro em func_;ao, e me contou como o havia treinado segundo as tradic_;oes da familia e o quanto ele entendia da combinac_;ao de ingredientes, do criterio de escolha da farinha, do cuidado com a tecnica. Havia, sim, poucas maquinas, uma modeladora, uma divisora, pec_;as antigas e funcio- nais. Cada pao era finalizado a mao, em um formato irregular e unico . 0 pao, como o queijo, o vinho ou ate mesmo as cervejas artesanais, deve prever o controle de fermentac_;ao e a ac_;ao de bacterias naturais que produ- zem uma variedade de caracteristicas, do sabor mais delicado ao mais rusti- co. Assim como podemos combinar e associar vinhos com alimentos, o mesmo poderiamos fazer com a escolha do pao. U ma baguete adocicada e leve vai perfeitamente com manteiga; um pao italiano, forte e azedo, e per- feito para acompanhar pratos mais fortes de sabores mais definidos. Sabo- reie o maximo de qualidades possivel e aprecie as diferenc_;as e de onde elas vem : tipo de ingredientes, fermentac_;ao, extensao do tempo de elaborac_;ao e as caracteristicas agregadas de sabor, textura e colorac_;ao, assim como voce faria com um queijo, um vinho, uma cerveja diferenciada. Esse esforc_;o nao s6 sera educacional, mas deliciosamente compensador. A Jenda dos ingredientes A farinha A industria de paes busca uma farinha de alto conteudo de proteina, entre 11,5% a 14%, o que facilita o desenvolvimento de uma massa forte que pode apresentar maior resistencia ao manuseio por equipamentos, alem de auxiliar na formac_;ao de crostas mais grossas, com uma granulometria mais aberta, ja que um alto conteudo de gluten auxilia a massa a reter gases 44 P.i.o: A.RTE E CIENCIA durante a manipula~ao industrial. Ja o artesao pode dominar melhor seu produto com menos proteina, entre 10,0% e 10,5%, mas com uma proteina de qualidade . A epoca do ano, a qualidade do trigo, as condi~6es de armazenamento e manipula~ao sao definidores da qualidade da proteina. Um conteudo menor de proteina faz paes mais borrachudos, mais sensi'.veis a manipula~ao, exigindo mais cuidados. Melhor para maos humanas do que para equipamentos massivos. Paes artesanais sao ainda usualmente mais umidos, com um teor de agua maior do que paes especiais ou paes broncos. Essas massas mais hidratadas sao mais pegajosas e difi'.ceis de serem manuseadas por equipamentos, que danificam muito o produto e quebram a ordem do escape dos gases presentes na massa. Fermenta~ao Podemos dizer que a fermenta~ao e o cora~ao de um pao. Os padeiros artesanais usualmente utilizam um fermento natural de acidez e odor carac- terfsticos, o levain (palavra francesa para azedo ou fermentado ), uma colo- nia ativa de microorganismos da qual uma por~ao e retirada e usada para a elabora~ao de uma massa. Levain ou massa azeda e essencialmente uma forma ancestral de pre-fermentar uma rnistura ou massa; refere-se a um processo que fermenta o pao por meio da captura de bacterias selvagens presentes no meio ambiente, em oposi~ao ao uso de fermento comercial, de uma cultura controlada (nao-selvagem), como a de Saccharomyces cerevisiae. A massa azeda, como o tipico pao italiano encontrado em Sao Paulo, por exemplo, ou o Sourdough, de Sao Francisco, na California, mais especifi- camente, refere-se a uma cultura simbi6tica de lactobacilo e bacteria fermentadora (fermento biol6gico), o que oferece um distintivo sabor aze- dado e fermentado por causa, principalmente, da presen~a de acido lactico e acido acetico produzidos pelos lactobacilos. Alem disso, um tempo de fermenta~ao mais longo produz 6timos resultados de volume, sem a neces- sidade de utiliza~ao de melhoradores qui'.rnicos. A manuten~ao dessa colonia de microorganismos (levain) e trabalhosa e sensi'.vel as mudan~as de ambiente, temperatura e nutrientes. 0 padeiro P.i.o ARTESANAL 45 refresca freqiientemente essa colonia, as vezes uma ou duas vezes por sema- na, outras vezes todos os dias, por 365 dias no ano. Para alguns neg6cios, isso significa que nao existem feriados, e o padeiro chefe nao pode esquecer de realirnentar esse processo sob o risco de perder a sinergia presente entre os organismos fermentadores. A perda do balanceamento da cultu ra de bacterias pode resultar em mudan!sas nao desejaveis ao sabor e ao odor do pao. Esse levain e ainda extremamente sensfvel a mudan!sas de temperatu- ra, e mudan!sas podem exacerbar ou privilegiar o crescimento de microorganismos selvagens ou nao desejados. U ma companhia americana desenvolveu uma cultura seca de levedura que e uma mistura de bacterias lacto-acidas e fios de fermento-base Saccharomyces cerevisiae, que incluem Pediococcus acidilacti~ Pediococcus pentosaceus, Lactobacillus plantarum e Lactobacillus brevis. Essas culturas em vitro secas sao cultivadas separadamente e entao misturadas em propor!s6es onde as bacterias estao presentes em 10 partes a cada 100 partes de culturafermentadora. Aroma, sabor e odor Uma fermenta!sao longa produz aroma, sabor e odor {micos ao pao artesanal. Em paes, os organismos levedadores sao responsaveis pelo aroma e sabor finais, ainda mais do que na produ!sao de vinho, por exemplo. 0 sabor e o aroma de um pao e o resultado do tempo do processo de fermen- ta!sao e de sua temperatura. Esses fatores tambem afetam a produ~ao de acido e alcool dos organismos levedadores. J a os paes especiais confiam na adi!sao de agentes flavorizantes naturais ou artificiais para a elabora~ao de suas caracteristicas vitais. A adi!sao de nozes, tomate seco, ervas, uvas passas, azeitonas, frutas secas, queijos, presunto, graos diferenciados, etc., e outra maneira de se incrementar o sabor do pao. Esses ingredientes melhoram a aparencia, textura e adicionam valor nutricional ao pao especial. Aroma, sabor e odor do pao sao largamente influenciaveis pela tempera- tura do forno e pelo grau de fermenta!sao da massa. A mesma farinha fara um pao diferenciado em sabor de acordo com a fermenta!sao, carregada PXo: ARTE E CJtNCIA lenta ou rapidamente, ea temperatura adequada do forno. Uma temperatu- ra alta parece ter o efeito de dispersar rapidamente essencias sulineares e sutis. A forma~ao rapida de uma crosta s6lida certamente auxilia na reten- ~ao de algumas dessas essencias flavorizantes naturais. Hidrata<;ao A quantidade de agua em uma massa define o tipo de pao que sera elaborado. O s exemplos abaixo mostram como diferen~as em hidrata~ao mudam o tamanho da estrutura dos bolsoes e criam um miolo mais aberto. Apesar de as diferen~as em modelagem e tecnicas de coc~ao contarem como diferenciadores em aparencia e miolo, os quatro ingredientes basicos, agua, farinha, sal e fermento, sao sempre os mesmos; assim, e a hidrata~ao que da a massa sua defini~ao e carater. Hidrata~ao padrao 55%: baguete comercial Apresenta uma modelagem regular e uma estrutura de poros pequenos e fechados. Tern uma crosta ge- ralmente fina e levemente dourada, que pode torna- la borrachuda ao inves da tradicional crocante. Hidrata~ao 62%: baguete artesanal Apresenta uma modelagem mais arredondada, visi- velmente feita manualmente e uma crosta mais dou- rada, o que significa que desfrutou de uma fermen- ta~ao lenta e completa e que em sua coc~ao foi apli- cado vapor; os poros abertos sao causados por uma hidrata~ao maior, uma fermenta~ao mais longa e uma manipula~ao diferenciada . 47 Hidrata~ao 80%: baguete artesanal A porosidade na estrutura e causada por uma hidrata1sao de 80% e por uma fermenta1sao esten- dida. Essa estrutura porosa e considerada pela sua dificuldade de elabora1sao. Uma massa hidratada apresenta uma distin1sao em favorecer a reten1sao de sabor, sob a teoria de que em tais condi~oes o fermento tern mais espa~o para "respirar" e funciona melhor, assim, menos inclinado a converter em alimento aqueles constituintes soluveis da farinha, que sao ricos em sabor e odor. Pao comercial (pao de forma tipo Pullman) versus pao artesanal I • ' ' . I\ ~ " 't' ·• .. .... , .. . •;...: ~ ..... •'• . .. Nomeado por sua semelhan~a ao carro de passageiros do trem (Pullman), e tipicamente de interior denso, usualmente elaborado a partir de farinha de alta proteina, fermento biol6gico comercial em quantidade signifi.cativa e baixa hidrata~ao, qualidades nao associadas ao pao artesanal. Essas imagens comparam o pao Pullman comercial a um pao com maior hidrata~ao, aber- tura de miolo diferenciada, colora~ao, aroma e textura unicas. Bagel Com 50% de hidrata~ao, bagels tradicionalmente apresentam um miolo denso, criando uma textura borrachuda. 0 bagel e elaborado exatamente dos mes- mos ingredientes dos paes artesanais, mas um proces- so diferenciado e uma hidrata~ao moderada lhe im- prime uma textura e aparencia distintas . P.i.o: ARTE E Cit.NC!A Colorac;:ao: natural versus artificial Os paes especiais escuros, coma o de centeio, par exemplo, sao obtidos pela adic;ao de corantes pela industria de panificac;ao. Ja para o artesao, que somente utiliza ingredientes naturais, cores artificiais sao proibidas, e ape- nas devem ser atingidas pela cocc;ao correta, ou seja, quando ha a reQ_fao de Maillard que acontece na presenc;a de ac;ucares naturais e das proteinas da farinha. Na produc;ao artesanal o pao de centeio e os paes escuros, em geral, apresentam colorac;ao natural, resultado apenas da combinac;ao de seus in- gredientes e de seu metodo de produc;ao. Conservantes Enquanto a industria largamente utiliza agentes quimicos na preserva- c;ao de seus produtos, tais coma a adic;ao de calcium propionate e inibidores de molde, ao padeiro artesanal nao sao admissiveis tais adic;oes. Ao inves de lan~ar mao de artificios quimicos, o padeiro artesao utiliza sua tecnica para trabalhar com um pH de acidez controlado, entre 4-5, que pode atuar coma conservante natural. Alem disso, a adic;ao de conservantes naturais e uma fermentac;ao longa tambem auxiliam nessa func;ao, e tambem os efeitos no aroma, na estrutura e na textura. A durabilidade ou resistencia ao ressecamento variam no pao artesanal. Baguetes serao excelentes se consumidas ao longo de todo o dia, enquanto certos paes de massa azeda podem durar dais dias ou mais. Paes com ingre- dientes enriquecedores, tais coma ovos, gordura, nozes, tambem tern uma extensao em consumo devido aos ingredientes promoverem um ambiente mais rico internamente, segurando a perda de umidade do produto. Predi- zer a demanda de maneira ac;urada e extremamente interessante para a maximizac;ao do lucro da produ~ao artesanal. o metodo de mistura na produc;:ao artesanal Podemos dizer que o processo de manufatura do pao consiste em tres operac;oes bas1.cas: ffil.Stura (formac;ao da massa), fermentac;ao e cocc;ao. , 49 0 procedimento padrao para um pao branco comum com o metodo esponjoso consiste em misturar parte da farinha e da agua com o fermento em uma massa suave. Essa esponja e entao fermentada em torno de uma hora antes de se agregarem os outros ingredientes para a mistura da massa final. A massa e entao colocada para descansar, o que chamamos de fermen- tac_;ao de piso, por cerca de uma hora antes de ser mecanicamente dividida e colocada para descansar novamente por cerca de 30 minutos. Entao a massa e levemente sovada, moldada, colocada em formas ou assadeiras e deixada fermentar por cerca de uma hora ou ate dobrar de volume. Esse tipo de pao, elaborado pelo metodo esponjoso, oferece uma estrutura de celulas finas, com alta tolerancia ao tempo de manipulac_;ao e outras variac_;oes nas condic_;oes de processamento. A produc_;ao do pao artesanal, entretanto, requer um tipo de mistura diferenciado, um tempo de fermentac_;ao de piso extensivo, manipulac_;ao cuidadosa e delicada da massa, e uma cocc_;ao diferenciada daquela do pao comum. Produzir o pao artesanal requer consideravelmente mais tempo e trabalho manual. Uma realizac_;ao que usa de poucos ou de nenhum aditivo funcional. Para o pao comum, a massa e misturada por um periodo mais longo do que o do pao artesanal, com o objetivo de desenvolver gluten em uma massa de alto teor de proteina. 0 tempo de fermentac_;ao dessas massas e significativamente menor, com praticamente nenhuma pre-fermentac_;ao. A massa do pao artesanal, entretanto, requer menos tempo de mistura para o desenvolvimento do gluten porque apresenta melhor e maior quantidade de proteina de uma farinha de melhor qualidade, que resiste por um pe- riodo de fermentac_;ao maior, o que contribui para as caracteristicas gerais do pao artesanal. Mlsturadeiras. 0 pao artesanal deve ser misturado em equipamento apropriado, nao em batedeiras verticais comuns. As misturadeiras mais apro- priadas sao as espirais de batedor unico em forma de gancho, de velocidade mais baixa do que a dos batedores comuns. PAO: ARTE E CltNC!A Divisoresde massa. A industria de prodw;;ao de pao comum envolve uma manipulac;ao mecanica - mistura, modelagem e finalizac;ao - que e muito rustica para os menos fortes e mais hidratados paes artesanais. Esse e um dos obstaculos mais sensiveis a produc;ao do pao artesanal em grande escala. A industria de equipamento vem trabalhando para melhorar seus produtos e facilitar o processo, em que uma ac;ao mais delicada fornecera uma manipulac;ao com menos prejuizo para a massa. Cocc;:ao. 0 pao artesanal deveria ser assado em fornos de lastro equipa- dos com algum tipo de pedra. Os forros refratarios presentes em certos equipamentos sao muito convenientes para absorver e refletir calor, sendo excelentes para a cocc;ao do pao artesanal. A aplicac;ao de vapor durante a cocc;ao mantem a camada externa da massa flexivel e umida. Isso auxilia na obtenc;ao de um maior crescimento de forno e conseqiiente volume. U ma vez que a camada externa da massa se firma/coagula, os gases dentro do pao nao podem mais se expandir e aumentar o tamanho do produto. Aplicar vapor durante a cocc;ao tambem gelatiniza o amido presente na camada externa, promovendo brilho e caramelizac;ao da crosta. Distinc;:oes dieteticas do pao artesanal. 0 fato de paes especiais terem agregados graos diversos, fiutas, vegetais ou nozes, sejam eles artesanais ou nao, nao diminui as vantagens nutricionais que eles oferecem. Em adi- c;ao a presenc;a de fibras, paes com a presenc;a de cereais integrais sao melho- res recursos de vitaminas B e E e de muitos minerais que nao estao presen- tes em paes comuns . Graos integrais sao tambem born recurso de acido f6lico e selenium. 0 acido f6lico e reconhecido por reduzir o risco de doen- c;as coronarianas e mal formac;oes de fetos, sendo entao especialmente reco- m endado para mulheres gravidas e grupos de risco para doenc;as coronarianas, que deveriam ingerir em torno de 400 microgramas diarias de acido f6lico; uma fatia de pao de grao integral contem cerca de 17,5 microgramas de folacina, enquanto a mesma quantidade de pao comum nao chega a apresentar a metade dessa quantia. A quantidade de selenium em paes especiais e cerca de duas vezes maior do que em paes comuns. A ingestao de selenium, segundo um estudo da Harvard School of Public Health, esta associada a preven~ao do cancer de pr6stata. A introdu~ao de frutas oleaginosas, com destaque para a amendoa, introduz gorduras monossaturadas e proteinas a base de plantas que tambem sao colesterol- free, ricas em fibra, ferro, calcio, acido f6lico e vitamina E . A ciencia por tras da elabora~ao de paes 0 pao, coma o consumimos hoje, e resultado de um processo antigo de milhares de anos. Trata-se de uma heran~a ancestral repassada no decorrer de gera~6es e culturas. Gregas, egipcios, hebreus, ibericos, europeus, en- fim, todas as civiliza~6es que sempre produziram seus alirnentos contribui- ram para o que vemos hoje em nossas mesas. 0 pao e resultado da coc~ao de uma mistura de farinha de trigo, agua, sal, fermento e, em muitos casos, de outros ingredientes. 0 processo basico envolve a mistura dos ingredientes ate que a farinha seja convertida em uma pasta firme ou massa, seguida de um processo de fermenta~ao, sova, modelagem e coc~ao. 0 grande desafio esta em produzir uma massa que crescera e apresentara propriedades requeridas para um pao de aparencia, sabor e odor agradaveis. Cada passo desse processo deve ser medido, controlado, elaborado; caso contrario, nunca se chegara a patamares de consistencia e qualidade deseja- veis. Os ingredientes devem ser selecionados criteriosamente. As caracteris- ticas individuais, bem como as rea~6es fisico-quimicas desencadeadas pela jun~ao de certos componentes de uma massa, sao o ponto central para o sucesso da operai;ao. 54 PXo: ARTE E c1tNC!A Os passos basicos na elabora~ao de paes Sao doze os passos basicos na elaborasao de paes fermentados. Estes passos sao aplicados a produtos fermentados em geral, com algumas varia- soes, dependendo da particularidade de cada um. Pesa~em precisa dos in~redientes Sabemos que existem diferentes sistemas de medidas, utilizados em di- ferentes paises, coma o sistema imperial ingles, o sistema standard america- no e o sistema metrico, par exemplo, mas a maioria das pessoas pode nao saber as diferentes maneiras de medisao de ingredientes utilizadas. U ma grande diferensa e a pesagem ou medisao de ingredientes secos, que pode ser feita par peso (gramas, quilos, onsas, libras) ou par volume ( colheres, xicaras, litro/mililitros ). Par exemplo, nos Estados U nidos a medisao e feita par volume (xicaras, colheres), enquanto na Europa a me- disao e feita par peso (gramas/quilogramas) para ingredientes secos, e par volume para ingredientes liquidos. A pesagem exata dos ingredientes e parte do processo de panificasao. Faze-lo de forma inapropriada resulta em produtos inconsistentes e de qua- lidade inferior. A precisao da medida signifi.ca que as formulas ou receitas sairao perfeitas todas as vezes sem necessitar de ajustes na quantidade de liquidos ou de farinha. 0 uso correto de uma balansa de precisao, seja ela manual ou digital, assegura que as quantidades dos ingredientes estejam em conformidade com o que foi solicitado na formula. Assim, caso voce realmente se inte- resse em produzir paes de boa qualidade, a aquisisao de uma balansa e fundamental . Lembre-se: existem, sim, receitas desbalanceadas ... mas tam- bem existem padeiros descuidados. Antes de julgar a qualidade de uma receita ou formula, certi:fique-se de que seus ingredientes sejam escalados com exatidao. A CitNCIA POR TRAS DA ELABORA<;AO DE PAES Uso de medidas padronizadas Xfcaras - Essas medldas padronlzadas sao encontradas com facl- lldade. e marcam com certa precisao (ao menos a propor~o) 1/4, 1/J. 112, 2/J. l/4, e 1 xicara. Co/heres-Varlam entre os tamanhos 1/s de colher de cha a 1 112 colher de sopa. Agora certamente voce de\e estar se perquntando por que eu estou dlzendo que colheres. xfcaras e copos. por exemplo. nao sao conslderados exatamente medldas acuradas. VeJamos. 1 copo de Farinha - 140 gramas. Entretanto, a medlda varla entre 110 gramas e 160 gramas, dependendo de alguns fatores. como. por exemplo: como a Farinha foi colocada no copo; se o reciplente fol lntroduzldo no saco da farinha; ou se esta fol retlrada as colheradas. A propor~o de umldade presente na farinha tambcm pode lnfluenclar no peso. Em dlas secos a farlnha e mals seca e fofa; em dlas umldos a farinha absof'\e a umldade do amblente e flea mais compactada. Conversoes e equlval~ndas o sistema metrlco e o mals utlllzado no mundo. A lnterpreta~ao de f6rmulas e sempre trabalhosa quando temos de convert~las de livros amerlcanos. por exemplo. que utilizam outro slstema de medlda. demonstrados em llbras. on~. rahrenhelt. quartos ou galoes. lsso slQnlflca que possulr alguns para.metros de con,.ersao real- mente nao e. como dlzemos em portuques. cultura lnutll. f multo necessarlo! Para obter sucesso em uma opera~ao comerclal e preclso que o neg6clo seJa passf- \el de controle. O produto a venda deve obrlgatorlamente ser conslstente todas as vezes que for elaborado. E lmportante para o padelro e para o empreendedor en- tender que o cllente espera a mesma qualldade de produto todas vezes que efetlva uma compra. Standards de medlda foram estabelecldos exatamente para garantlr essa conslstencla. 55 PAO: ARTE E CitNClA t muno dlflcll seQulr uma recelta antlQa de acordo com as vartavels de colheres. xfcaras. pratos fundos, copos ... Uma colher de sopa pode ser capaz de conter 25 Qramas em vez de 15 gramas. O termo standarde deflnldo como ·regras ou medl- das usadas para reallzar padroes e Julgamentos·. Standards podem ser padroes tanto de quantldade como de qualldade. Standardde quantldade e uma medlda de peso, numero e volume padronlzados. Abalxo segue um quadrode Indices referenclals e outro de medldas. Para converter em multlpllque On~ Gramas 28.35 Gramas On~ 0,035 Libras Qullograma 0.45 QullOQrama Libras 2.21 On~ fluldas Mllfmetros 28,35 Quartos Lltros 0,91 Lltros Quartos 1.1 Fahrenheit Centigrado Subtrala 32 da temperatura mostrada em F; multlpllque o resultado por 0.555 CentiQrados Fahrenheit Multlpllque a temperatura em 0 ( por 1.8 e adlclone 32 Medldas secas colher de cha - teaspoon (tsp) colher de sopa - tablespoon (tbsp) 3tsp 1/zoz 1 tbsp 15 gramas 2tbsp 1 oz 1/e cup 28 gramas 4tbsp 2oz 1/4 cup 57 gramas 8tbsp 1/z cup 114 gramas 12 tbsp 3/4CUp A CitNCIA POR TRAS DA ELABORA<;AO DE PAES 57 Mistura de in~redlentes (petrissage) Objetivos gerais da mistura de massa: • Distribui~ao uniforme dos ingredientes; • Otimiza~ao da mistura para produzir caracteristicas de textura de qua- lidade; • Otimiza~ao do desenvolvimento do gluten para obter maior elasticida- de (a elasticidade permite reten~ao de gases formados pelo fermento); • Distribui~ao uniforme das celulas de fermento, para que este receba nutri~ao adequada, evitando a perda de agente fermentador. Ap6s a escolha e a pesagem exata dos ingredientes, vem a mistura. Esse processo, em um primeiro momento, distribui uniformemente os varios in- gredientes, o que ocorre durante a primeira parte da mistura. 0 tempo rema- nescente e necessario ao desenvolvimento do gluten (protema). Os efeitos da mistura ou agita~ao sobre o ingrediente "farinha" e funda- mental ao iniciar o processo de elabora~ao de uma massa fermentada. A farinha, constituida tambem por peda~os de proteina e granulos de amido, deve ser misturada a agua. A a~ao da mistura servira para quebrar fisica- mente os peda~os de protema e trazer a tona sua por~ao hidrofilica. Misturar eficientemente os ingredientes e fator importante em qualquer massa. lnfluencia a viscosidade, o grau de dispersao, a incorpora~ao de ar e outras caracteristicas de qualidade. Temperatura da massa Cada massa tern um periodo correto de mlstura. dependendo da capacldade de absor~ao da Farinha e do metodo escolhldo. Amassar demals produz uma massa multo extensa. mas com proprledades elastlcas reduzldas. Mlsturar pouco pode causar a forma¢o de pequenos nucleos que, uma vez nao lncorporados. nao se desenvolverao e nao crescerao no pao. Porem, o cerne do processo de mlstura. alem da dlstrlbul¢o dos ln~redlentes. e a temperatura com que a massa salra da mlsturadelra. Temperaturas balxas retardam PAO: ARTE E CltN CIA a a~o do fermento. Em condl(:Oes normals. entretanto, a temperatura da massa durante a mistura pela pr6pna ~ mecAnlca de frlc(;aO. tende a elevar-se contlnua- mente. A temperatura elevada dlspara o processo de fermenta¢o quando alnda nao se conclulu o processo de mlstura. Por esse motlvo. usualmente se utillza agua Qelada. Qelo ou mlsturadelras com controle automatlco de ternperatura Na elabora¢<> de massas pelo metodo dlreto de mlstura a massa deve atlnQtr no maxlmo 24 "C. caso contrarlo comprometeia todo o processo. Para metodos que utlllzam um pre-fermento ou esponJa. e aconselhavel uma ternperatura levemente Inferior no lniclo da mlstura Ja que pela pr6prla ~ de uma mlstura Ja fermen- tada le conseqoentemente Ja aqueclda pelo movlmento do fermentol. a massa sofreia uma certa eleva¢<> de temperatura e que, no Qeral. nao de\-eli1 ser supertor a 26 OC:. A tabela que se segue traz a conversao de Qraus Celsius para Qraus Fahrenheit no caso de consulta a f6rmulas estranQelras: Celsius c•ci Fahrenheit (0 F) o 0 c 32 Of 20 °c 68 Of 32 °c 89.6 Of 110 °c 225 Of no 0 c 250 Of 140 °c 275 Of 150 °c 300 Of 170 °c 325 Of 177 °c 350 Of 190 °c 375 °F 200 °c 400 Of 220 •c 425 Of 230 °c 450 Of 245 °c 475 Of 260 •c 500 Of 290 °c 550 Of " A CltNCIA POR TRAS DA ELABORA(,AO DE PAES A lmportancla do uso do termOmetro A utillza~o de term6metro de uso cullnarlo para a medl~o da temperatura lnterna de carnes. aves. confettos e pa.es. entre outros. e extremamente recomendavel. Adqulrlr um term6metro conflavel. de facll leltura. com varla~o de temperatura (entre -17 e O °Ce a maxima de 104 °C - standard) que esteJa nos patamares de nossa manlpula~o dlarla. e de fundamental 1mportanc1a. O term6metro nao s6 nos certlflca de que o allmento atlnQlu sua temperatura Ideal de coc~o. mas alnda determlna o esta.Qlo em que a posstbllldade de contamlna~o de um alimento e ellmlnada. Quando avallamos o custo da prepara~o do allmento. vale o lnvestlmento em um term6metro de qualldade. A maiorla desses term6metros de uso geral e fella com um blmetal. com sensores de a~o lnoxldavel locallzados pr6xlmos da extremldade. Um pontelro lndlca a tem- peratura. apontando para um numero na escala. Vartos tlpos de term6metros estao dlsponivels no mercado: Term6metro nao-instantaneo ana/6{/tco Deve ser lnserldo na area mals sensfvel do allmento, ou seja. a parte central ou mals espessa. durante a coc~ao. usualmente 3 cm a 6 cm adentro. dependendo obviamente da espessura e tamanho do alimento a ser medldo. Em alimentos multo flnos, lnslra o term6metro pelos lados com o sensor voltado para o centro. Cerca de 15 segundos a 20 seQundos sao suflclentes para que a temperatura seJa acurada e marcada no dtsplav. Arredondado. de tamanho relatlvamente Qrande, com pontelros marcando tempe- raturas em Celsius e Fahrenheit. e mals utilizado para a medl~ao de confeltos. cal- das e produtos com espessuras mals slQnlflcativas. Term6metros nJ<>instantJneos anal6gtcos, usados em pies e a/guns produtos de confeltiJlla. 60 P.i.o: ARTE E CltN CIA Term6metro nao-tnstantJneo dig/ta/ Possul um sensor de calor lido d1g1talmente. na ponta do aparelho. lntroduza-o na parte mais espessa do allmento. no mfnimo 2 cm. por cerca de 10 segundos para obter uma leltura acurada. TermtJmetros nao-lnstantJneos dtqltals Como os termometros funclonam Os dols principals tipos de term6metros a dlsposl~o dos consumldores sao aque- les com sensor de temperatura bimetal (com mostradores e numerosl e aqueles que se utlllzam de um fluldo expansor (com coluna de vldro). Ambos apresentam vantagens e desvantagens. alem de uma enorme variedade de modelos. quallda- de e ... pre~os. Term6metro btmetal O metal expande quando aquecldo e contra! quando esfrlado. Metals dlferentes se expandem ou se contraem em varla~oes dlferentes. O sensores do term6metro bl metal sao compostos de dols metals diferentes conectados; quando aquecldos. a combina~ao ·se cuNa·. O metal com a malor taxa de expansao move-se mals rapldamente do que os elementos do outro metal. Term6metros de leltura lnstantanea usam um sensor bl metal hellco e um tubo muito flno de a~o inoxlda1,el. Tai comblna~ao permlte que o instrumento responda acurada e rapldamente as mudan~as de temperatura. Term6metros de tubo de 1idro Esses term6metros utllizam um fluldo selado dentro do tubo de vidro. Um reservat6- rlo ou bulbo. na parte Inferior da coluna. armazena o fluldo. que se expande ou contral atraves do tubo segundo as varla~6es de temperatura. Uma escala de tern- A CIENCIA POR TRAS DA ELABORA<;:AO DE PA.ES peratura impressa diretamente no vidro ou em papel marcara a escala de tempe- ratura. Os term6metros de vidro podem variar muito de prec;:o. dependendo da qualidade do \.idro. do marcador de escala, do fluido e do cuidado com o qual o termometro fol calibrado. TermOmetros de uso cullnarlo A maioria possui lentes de plastico que, embora resistentes, nao sao apropriadas para Ir ao forno quente. Sao destinados a tomadas rapidas de temperatura Com o uso diario o termometro perde naturalmente sua calibragem. Por esse motlvo, al- guns deles apresentam um controle que recall bra a temperatura. Term6metros para daces (arucar//frituras Geralmente os term6metros para doces e frlturas apresentam uma varia- c;:ao de temperatura entre 38 •·c e 260 'CA variac;:ao
Compartilhar